Acórdão nº 50113118220218210008 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Primeira Câmara Cível, 13-07-2022

Data de Julgamento13 Julho 2022
ÓrgãoVigésima Primeira Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50113118220218210008
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002340984
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

21ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5011311-82.2021.8.21.0008/RS

TIPO DE AÇÃO: IPTU/ Imposto Predial e Territorial Urbano

RELATOR: Desembargador MARCELO BANDEIRA PEREIRA

APELANTE: LUIZ IGNACIO BITTENCOURT (EMBARGANTE)

APELADO: MUNICÍPIO DE CANOAS (EMBARGADO)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por LUIZ IGNÁCIO BITTENCOURT da sentença que, nos autos dos embargos de devedor que ajuizou incidentalmente à execução fiscal que lhe move o MUNICÍPIO DE CANOAS, julgou improcedentes os pedidos, condenando-lhe ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios de 10% sobre o valor da causa, suspensa a exigibilidade por ser o embargante beneficiário da gratuidade judiciária.

Em suas razões, alegou que o terreno sobre o qual está sendo cobrado o IPTU e a TCL é alvo de discussão judicial em ação civil pública para regularização do loteamento do qual faz parte, sendo que o município não cumpriu com a sua obrigação relativamente às obras de infraestrutura. Salientou que o imóvel possui destinação rural, o que pode ser percebido pelas fotos trazidas pelo próprio ente público, não se observando destinação urbana na região, tratando-se apenas de um terreno cheio de terra, com uma plantação no lote ao lado e uma plantação ainda maior no terreno do fundo. Disse que não se nega a regularizar o loteamento, mas é o Município que dificulta a regularização, valendo-se disso para seguir cobrando imposto indevido. Invocou a ocorrência de cerceamento de defesa, pois não houve manifestação do juízo acerca do pedido de coleta do depoimento pessoal do representante da embargada, a fim de que esclarecesse o motivo pelo qual o município ainda não cumpriu sua obrigação estabelecida na ação civil pública, ainda não tendo sido analisadas as alegações da petição iicial e da réplica. Pediu o provimento do apelo, para que seja reformada a sentença e julgado procedente o pedido, reconhecendo-se a destinação rural do imóvel e, por isso, não incidência do IPTU, além do reconhecimento da ilegalidade praticada pelo Município ao não regularizar o loteamento onde se localiza o imóvel. Requereu, ainda, a manutenção da gratuidade judiciária.

Não foram apresentadas contrarrazões.

A Procuradoria de Justiça opinou pelo desprovimento do apelo.

É o relatório.

VOTO

Desde logo adianto que o recurso vai desprovido, sendo mantida a bem lançada sentença recorrida.

Inicialmente, nada há a analisar quanto à gratuidade judiciária que, corretamente deferida na origem, sequer sofreu impugnação da parte adversa, sendo, por certo, mantida nas demais instâncias e atos processuais praticados pela parte dela beneficiária, no caso, a apelante.

Descabe a concessão de efeito suspensivo ao apelo que, no caso, vem dotado apenas do efeito devolutivo, uma vez que, além de não ter sido postulado nos termos em que disposto no artigo 1.012, §3º, incisos I e II, do CPC, revelam-se improcedentes os pedidos vertidos nos embargos de devedor, não verificando verossimilhança nas alegações ou mesmo perigo de dano no seu recebimento somente no efeito legal (artigo 1.012, §1º, inciso III, do CPC), uma vez que o prosseguimento da execução, com atos próprios a ele, não se denota carcaterizador do perigo de dano ao executado.

No mérito propriamente dito, não verifico cerceamento de defesa, tendo a sentença apreciado todas as alegações tecidas, refutando expressamente a alegada necessidade de depoimento pessoal do representante do ente municipal quanto ao não cumprimento da obrigação decorrente da ação civil pública, no que respeita à regularização do loteamento em que localizado o imóvel cujos créditos de IPTU estão em cobrança na execução contestada por meio dos embargos de devedor que ora se aprecia.

Reitero os argumentos sentenciais, no sentido de que se fazia completamente desnecessária a oitiva da municipalidade acerca da regularização do imóvel, uma vez que tal é procedimento a ser tomado, se for o caso, na própria ação civil pública, em nada interferindo acerca da legalidade da cobrança do tributo nesta execução.

Ademais, ao trazer apenas parte do dispositivo sentencial da ação civil pública, o embargante, ora apelante, tenta induzir em erro o juízo, procurando fazer crer que a obrigação principal era do ente público, quando, na verdade, este restou condenado de modo subsidiário a regularizar o loteamento, sendo a obrigação principal do loteador.

Transcrevo, neste ponto, parte da bem lançada sentença:

"O embargante requereu o depoimento pessoal do representante do ente embargado com o fim de "elucidar a razão do não cumprimento do Município de Canoas nos termos da sentença da Ação Civil Pública no qual foi determinado que o Ente Público regularize a referida faixa de terrenos quais foram os fatos geradores dos impostos objetos da ação executiva" (evento 26); entretanto, entendo que essa providência é irrelevante para o deslinde da controvérsia, pois os motivos de eventual descumprimento da decisão prolatada em ação civil pública devem ser ventilados no bojo da referida demanda.

A propósito, o STJ possui enunciado sobre o tema:

Súmula 262 - A incidência do IPTU sobre imóvel situado em área considerada pela lei local como urbanizável ou de expansão urbana não está condicionada à existência dos melhoramentos elencados no art. 32, § 1º, do CTN."

Entretanto, tais circunstâncias desimportam à cobrança dos tributos incidentes sobre o imóvel, sendo relevante no caso a análise das alegações e documentos que possam elucidar a destinação do imóvel, se rural (como alegado pelo executado/embargante) ou se urbana (como afirmado pelo município).

E, neste ponto, razão assiste à municipalidade, como já afirmado na sentença, pois não há qualquer comprovação de que o imóvel possui destinação rural.

Nada trouxe aos autos o apelante capaz de caracterizar a destinação do imóvel como sendo rural (não há notas de produtor rural, não há fotos que demonstrem a existência de plantação, como por ele alegado, sequer havendo comprovante de pagamento de ITR).

Ao contrário, trouxe o município várias fotografias que indicam haver no imóvel edificação que abrange sua quase totalidade, nada restand de área livre à agricultura ou pecuária ou mesmo atividade extrativa.

As fotos do Evento 17, Anexos 3 a 8, evidenciam que se trata de imóvel com destinação urbana, ainda que possam haver áreas de terras livres ao seu lado ou nos fundos, áreas essas que também não se pode apreender com precisão a atividade nelas desenvolvida.

Assim, cabia ao embargante, ora apelante, a comprovação de que seu imóvel tinha destinação rural, ônus do qual não se desincumbiu, prevalencendo a caracterização feita pelo município de que se trata de área e destinação urbana e, portanto, incidente o IPTU.

A corroborar este entendimento, valho-me dos fundamentos do parecer da lavra da Procuradora de Justiça, Dra. Magali Ferreira Mannhart, nos seguintes termos:

Com efeito, a fim de averiguar a classificação do imóvel como rural ou não, não deve ser observada simplesmente sua localização, mas sim sua destinação econômica.

No ponto, o art. 32 do CTN destaca que o imposto, de competência dos Municípios, sobre a propriedade predial e territorial urbana tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil, localizado na zona urbana do Município.

Ainda, consta do art. 29 do CTN que o imposto, de competência da União, sobre a propriedade territorial rural tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de imóvel por natureza, como definido na lei civil, localização fora da zona urbana do Município.

Já o art. 15 do Decreto-lei n. 57/66 reza que o disposto no art. 32 da Lei n. 5.172, de 25 de outubro de 1966, não abrange o imóvel de que, comprovadamente, seja utilizado em exploração extrativa vegetal, agrícola, pecuária ou agro-industrial, incidindo assim, sobre o mesmo, o ITR e demais tributos com o mesmo cobrado.

O Decreto-Lei n. 57/66, contudo, foi revogado pelo art. 12 da Lei n. 5.868/72, que criou o Sistema Nacional de Cadastro Rural, prevendo, em seu art. 6º, caput e parágrafo único:

Para fim de incidência do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural, a que se refere o Art. 29 da Lei número 5.172, de 25 de outubro de 1966, considera-se imóvel rural aquele que se destinar à exploração agrícola, pecuária, extrativa vegetal ou agroindustrial e que, independentemente de sua localização, tiver área superior a 1 (um) hectare.

Parágrafo único. Os imóveis que não se enquadrem no disposto neste artigo, independentemente de sua localização, estão sujeitos ao Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana, a que se refere o Art. 32 da Lei número 5.172, de 25 de outubro de 1966.

No entanto, a inconstitucionalidade do art. 6º, caput e par. único, da Lei n. 5.868/72 foi reconhecida pelo Pleno do STF, no RE n. 93850/MG, de relatoria do Ministro Moreira Alves, julgado em 20/05/1982, com publicação no DJ em 27/08/1982.

E com base em tal julgamento, sobreveio a Resolução n. 313/83 do Senado Federal, suspendendo a execução do artigo supracitado da Lei n. 5.868/72.

A questão foi objeto da Resolução n. 9/2005, do Senado Federal, publicada no DOU em de 08/06/2005, pela qual restou suspensa a execução do art. 12 da Lei n. 5.868/72 no ponto em que revogou o art. 15 do Decreto-Lei n. 57/66.

O Pleno do STF, no mais, reconheceu a constitucionalidade do Decreto-Lei n. 57/66 no RE n. 140773/SP, de relatoria do Ministro Sydney Sanches, com publicação em 04/06/1999, vejamos a ementa:

DIREITO CONSTITUCIONAL, TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. IMPOSTO PREDIAL E TERRITORIAL URBANO (I.P.T.U.). IMPOSTO TERRITORIAL RURAL...

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