Acórdão nº 50118070320218210141 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Nona Câmara Cível, 10-03-2023

Data de Julgamento10 Março 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50118070320218210141
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Nona Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003194126
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

19ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5011807-03.2021.8.21.0141/RS

TIPO DE AÇÃO: Aquisição

RELATOR: Desembargador MARCO ANTONIO ANGELO

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por FRANCISCO TREMARIN em face da sentença prolatada nos embargos de terceiro opostos por AMBROSIO NICOLAU WEBERS, com o seguinte dispositivo (Evento 58 do processo de origem):

Diante do exposto, na forma do artigo 487, inciso I do Código de Processo Civil, julgo PROCEDENTES os presentes Embargos de Terceiro, para fins de determinar o levantamento das restrições judiciais sobre o automóvel Honda Fit LX FLEX, ano 2009, modelo 2010, placas IQF2C32, Renavam 00170237575, tornando definitiva a liminar deferida no evento 03.

Condeno o embargado ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios ao patrono do embargante, que vão fixados em 12% sobre o valor atualizado da causa, considerando a singeleza da demanda, o labor desenvolvido pelo patrono do embargante, o tempo e o local de tramitação da ação processual, nos termos do art. 85, §2º, incisos I a IV do Código de Processo Civil. Devendo ser observada, na exigibilidade de tais verbas, a Gratuidade de Justiça que vai deferida ao embargado, uma vez presentes os requisitos legais.

Intimem-se.

A parte-embargada FRANCISCO TREMARIN, por suas razões de apelação (Evento 63 do processo de origem), insurge-se contra o acolhimento dos embargos de terceiro. Relata que a restrição judicial objeto dos presentes embargos de terceiro decorre de ação de resolução de contrato de empreitada que move contra MARCELO STUMPF. Indica que o veículo sobre o qual recaiu a restrição foi dado em pagamento a MARCELO STUMPF para que realizasse a empreitada de residência em favor do embargado, obrigação esta inadimplida. Refere que o veículo é a única garantia frente a MARCELO STUMPF, uma vez que este se desfez de todos seus veículos quando do inadimplemento do contrato, esvaziando seu patrimônio. Alega fraude à execução. Sustenta intuito de diminuição patrimonial prevendo discussão judicial do inadimplemento do contrato de empreitada. Indica que a ação de resolução contratual movida contra MARCELO STUMPF está em fase probatória, reclamando manutenção da restrição até o deslinde do litígio. Ao final, pugna pelo provimento do recurso para o fim de manter a restrição sobre o veículo.

Foram apresentadas contrarrazões (Evento 66 do processo de origem).

Cumprido o disposto nos artigos 931, 934 e 935 do CPC.

É o relatório.

VOTO

IMPUGNAÇÃO AO BENEFÍCIO DA GRATUIDADE DA JUSTIÇA.

Nos termos do art. 100 do CPC:

Art. 100. Deferido o pedido, a parte contrária poderá oferecer impugnação na contestação, na réplica, nas contrarrazões de recurso ou, nos casos de pedido superveniente ou formulado por terceiro, por meio de petição simples, a ser apresentada no prazo de 15 (quinze) dias, nos autos do próprio processo, sem suspensão de seu curso.

Parágrafo único. Revogado o benefício, a parte arcará com as despesas processuais que tiver deixado de adiantar e pagará, em caso de má-fé, até o décuplo de seu valor a título de multa, que será revertida em benefício da Fazenda Pública estadual ou federal e poderá ser inscrita em dívida ativa

Em princípio, a simples afirmação da parte no sentido de que não está em condições de pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo próprio ou da família, é suficiente para o deferimento da gratuidade da justiça.

Com efeito, nos termos do § 3º do art. 99 do CPC/2015, presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural.

No entanto, a declaração de insuficiência implica presunção relativa, motivo pelo qual o pedido de gratuidade da justiça pode ser indeferido se houver nos autos elementos capazes de afastá-la.

Nesse sentido a redação do § 2º do art. 99 do CPC/2015, in verbis:

§ 2o O juiz somente poderá indeferir o pedido se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade, devendo, antes de indeferir o pedido, determinar à parte a comprovação do preenchimento dos referidos pressupostos.

Sobre a dúvida fundada quanto à pobreza, cumpre transcrever lição de Nelson Nery Júnior1:

O juiz da causa, valendo-se de critérios objetivos, pode entender que a natureza da ação movida pelo interessado demonstra que ele possui porte econômico para suportar as despesas do processo. A declaração pura e simples do interessado, conquanto seja o único entrave burocrático que se exige para liberar o magistrado para decidir em favor do peticionário, não é prova inequívoca daquilo que ele afirma, nem obriga o juiz a se curvar aos seus dizeres se de outras provas e circunstâncias ficar evidenciado que o conceito de pobreza que a parte invoca não é aquele que justifica a concessão do privilégio. Cabe ao magistrado, livremente, fazer juízo de valor acerca do conceito do termo pobreza, deferindo ou não o benefício.

Jurisprudência do Egrégio STJ sobre a matéria:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DECISÃO DA PRESIDÊNCIA. RECONSIDERAÇÃO. AÇÃO MONITÓRIA. APELAÇÃO. PEDIDO DE JUSTIÇA GRATUITA. [...] PESSOAS FÍSICAS (SÓCIOS/GARANTIDORES). PRESUNÇÃO NÃO AFASTADA. PEDIDO DE DIFERIMENTO DAS CUSTAS. SÚMULA 281/STF. AGRAVO INTERNO PROVIDO PARA CONHECER DO AGRAVO E DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. [...] 3. Para as pessoas físicas, a simples declaração de pobreza tem presunção juris tantum, bastando, a princípio, o simples requerimento, sem nenhuma comprovação prévia, para que lhes seja concedida a assistência judiciária gratuita. Na hipótese, a Corte estadual não apresentou justificativa concreta para afastar a presunção de hipossuficiência alegada pelos sócios/garantidores da devedora principal. [...] 5. Agravo interno provido para conhecer do agravo e dar parcial provimento ao recurso especial, a fim de deferir o benefício da justiça gratuita aos recorrentes pessoas físicas. (AgInt no AREsp 1647231/SP, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 08/06/2020, DJe 25/06/2020).

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. TEMPESTIVIDADE DO RECURSO. RECONSIDERAÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA. JUSTIÇA GRATUITA. INDEFERIMENTO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTO SUFICIENTE. DECLARAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA. PRESUNÇÃO IURIS TANTUM. ART. 99, §§ 2º E 3º, DO CPC/2015. RECURSO PROVIDO. 1. Agravo interno contra decisão da Presidência que não conheceu do recurso especial, por intempestividade. Tempestividade comprovada. Reconsideração. 2. Há presunção juris tantum de que a pessoa física que pleiteia o benefício da assistência judiciária gratuita não possui condições de arcar com as despesas do processo sem comprometer seu próprio sustento ou de sua família. Tal presunção, embora relativa, somente pode ser afastada pelo magistrado quando houver, nos autos, elementos que evidenciem a ausência dos pressupostos para a concessão do benefício (CPC/2015, art. 99, §§ 2º e 3º). 3. Agravo interno provido para reconsiderar a decisão agravada e, em novo julgamento, conhecer do agravo para dar provimento ao recurso especial. (AgInt no AREsp 1478886/SP, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 10/03/2020, DJe 31/03/2020).

Outrossim, nos termos da Conclusão 49ª do Centro de Estudos do TJ/RS:

49ª - O benefício da gratuidade judiciária pode ser concedido, sem maiores perquirições, aos que tiverem renda mensal bruta comprovada de até (5) cinco salários mínimos nacionais.

Na hipótese dos autos, como também indicado no recurso de apelação n. 5011966-43.2021.8.21.0141, em que suscitada a preliminar contrarrecursal de impugnação ao benefício da gratuidade da justiça, trata-se de embargos de terceiro decorrentes do deferimento de restrição RENAJUD em veículo advinda de processo de resolução de contrato de empreitada cumulada com pedido de indenização que a parte-embargada (ora apelante) move em face de MARCELO STUMPF.

Além do deferimento da gratuidade da justiça naquela ação de resolução de contrato (Evento 03 do processo n. 5002284-64.2021.8.21.0141), inexiste nos autos elemento concreto capaz de elidir a referida presunção.

Note-se que o contrato de empreitada que dá ensejo ao litígio do qual decorre a restrição objeto deste processo se refere à construção de residência familiar, com valor de R$30.000,00 (trinta mil reais) pagos mediante dação em pagamento de veículo (doc. "CONTR5" do Evento 01 do processo n. 5002284-64.2021.8.21.0141).

Outrossim, a declaração de imposto de renda da parte-embargada não externa qualquer condição financeira inapta ao deferimento do benefício da gratuidade (doc. "DECL2" do Evento 14 do processo de origem).

Com efeito, a indicação do exercício de corretor de imóveis de alto padrão em rede social e o endereço residencial carente de maiores esclarecimentos, por si, não afastam a presunção de hipossuficiência financeira, tampouco atendem ao ônus de fazê-lo do impugnante, mormente diante do contexto do qual decorre e do objeto o litígio.

REJEITO, pois, a preliminar contrarrecursal de impugnação ao benefício da gratuidade da justiça.

EMBARGOS DE TERCEIRO.

Os embargos de terceiro tem por finalidade a defesa da posse, buscando livrar da apreensão judicial bens integrantes do patrimônio de quem não é parte do processo.

Nos termos da súmula 375 do Superior Tribunal de Justiça:

O reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente”.

Assim, a aquisição de bem livre e desembaraçado presume a boa-fé do adquirente, exigindo demonstração de sua má-fé. Por outro lado, pendendo constrição sobre o bem ao...

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