Acórdão nº 50122153120198210022 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Câmara Cível, 15-02-2023

Data de Julgamento15 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50122153120198210022
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003216826
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

10ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5012215-31.2019.8.21.0022/RS

TIPO DE AÇÃO: Indenização por dano moral

RELATOR: Desembargador TULIO DE OLIVEIRA MARTINS

APELANTE: JARDEL OLIVEIRA DA SILVA (AUTOR)

APELADO: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de ação indenizatória ajuizada por JARDEL OLIVEIRA DA SILVA em face do ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL buscando a reparação pelos danos materiais e morais em razão de ter sofrido abordagem indevida e excessiva.

Narrou que em 01/02/2019 estava em uma festa familiar quando três policiais militares entraram no local e encaminharam todos os presentes para fora, realizando revista sem mandado judicial. Referiu que é ex-presidiário e quando foi identificado, iniciaram com agressões físicas e morais, encostando uma pistola em sua cabeça, proferindo chutes, pontapés, coronhadas na cabeça com a arma de fogo e com uma faca de cozinha, tudo isso enquanto estava algemado.

Sustentou que o torturaram colocando um saco plástico na cabeça e o asfixiando inúmeras vezes, além de terem destruído os imóveis que guarneciam a residência. Postulou a condenação do réu em danos materiais no valor de R$10.000,00 (dez mil reais) e danos morais no valor de R$100.000,00 (cem mil reais).

Foi deferida a gratuidade judiciária.

Citado, o réu defendeu-se alegando que a policia militar foi chamada para verificar uma ocorrência de perturbação do sossego e o autor negou-se à revista pessoal, além de ter tentado fugir do local. Referiu que não há como reconhecer que houve qualquer abuso nos atos da polícia. Discorreu acerca da ausência do dever de indenizar. Pediu pela improcedência.

Foi apresentada réplica e realizada audiência de instrução.

Sobreveio sentença que julgou o feito improcedente, condenando o autor ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da causa, restando suspensa a exigibilidade em razão do deferimento da gratuidade judiciária.

Inconformado, apelou o demandante. Em suas razões recursais, alegou tanto a prova documental quanto a prova testemunhal foram ao encontro de suas alegações iniciais. Referiu que os agentes do estado devem zelar pela segurança pública e tranquilidade social, mas agiram de forma contrária. Pediu o provimento do recurso.

Apresentadas contrarrazões, os autos subiram a esta Corte para julgamento.

Neste grau de jurisdição, o Ministério Público opinou pelo desprovimento do apelo.

Foi o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

Conheço do presente recurso eis que preenchidos os pressupostos de admissibilidade.

Ingressou o autor com a presente demanda objetivando a condenação do Estado do Rio Grande do Sul ao ressarcimento dos danos materiais e morais sofridos, decorrentes do procedimento adotado por policiais militares, os quais, conforme aduz, o agrediram brutalmente com um cassetete na face, proferiram chutes e pontapés, colocaram detergente em seus olhos e saco plástico em sua cabeça.

Todavia, em que pesem os argumentos alinhados, não merece amparo a pretensão de reforma da sentença que julgou improcedente o pedido, uma vez que as provas constantes da demanda não apresentam solução diversa.

O Estado responde objetivamente por danos que seus agentes causarem a terceiros, sendo suficiente para o reconhecimento do dever de indenizar a ocorrência de um dano, a autoria e o nexo causal, consoante dispõe o artigo 37, § 6º, da Constituição Federal:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

§ 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

A propósito, preleciona Sérgio Cavalieri Filho1:

o constituinte adotou expressamente a teoria do risco administrativo como fundamento da responsabilidade da Administração Pública, e não a teoria do risco integral, porquanto condicionou a responsabilidade objetiva do Poder Público ao dano decorrente da sua atividade administrativa, isto é, aos casos em que houver relação de causa e efeito entre a atividade do agente público e o dano”.

Ocorre que, compulsando os autos, verifica-se que não logrou o autor comprovar a ocorrência dos fatos mencionados na peça inicial.

Conforme os depoimentos colhidos e o acervo probatório, verifica-se que a atitude dos agentes foi razoável, em consonância com a situação e dentro dos limites razoáveis, diante da resistência à prisão.

O requerente, ao que tudo indica, desobedeceu às ordens dos agentes e tentou fugir do local para não ser revistado, sendo necessária a sua imobilização.

Na audiência de instrução foram ouvidas as testemunhas e colhido o depoimento pessoal do autor:

O autor referiu que após a abordagem foi mantido pelos policiais e apanhou muito, sofrendo tortura. Disse que os policiais queriam a senha de um celular que foi achado, mas ele não sabia pois o aparelho não era seu. Alegou que estava na "parte da rua", na calçada, já que a casa não possuía muro. Sustentou que acredita que houve denúncia por som alto e por isso a Brigada Militar foi até o local e foi agredido por ter antecedentes criminais. Narrou que foi levado para a casa de sua ex-esposa na rua 17 e depois de apanhar mais, foi largado dentro da piscina, quando sua vizinha lhe ajudou e foi levado para o hospital onde ficou até a manhã do dia seguinte. Questionado, disse que não bebeu.

Flávio Leandro Hirsch, policial militar, referiu que a primeira abordagem ocorreu em via pública, pois quando chegaram no local já não tinha música alta e sempre que é realizada abordagem em via pública, é realizada revista e o indivíduo é encaminhado para exame de corpo de delito, mas a realização depende da pessoa. Sustentou que assim que chegou próximo do autor, foi dado comando de colocar as mão na parede, este o empurrou, precisando de contenção, quando pegou os braços do demandante e colocando para trás, colocando algemas. Quando o autor se acalmou, as algemas foram retiradas. Disse que populares informaram que o grupo de pessoas que estava na rua haviam brigado entre si. Questionado, afirmou que não entrou na residência e apenas conversou com a dona do local no portão e no momento da revista do autor, outras pessoas estavam sendo revistadas.

Priscila Dias de Freitas, policial militar, referiu que foi utilizado uso moderado da força, sendo que o colega Flávio apenas segurou o autor pelos braços. Questionada, disse que as revistas ocorreram em via pública.

Leandro de Rodrigues Torres, policial militar, referiu que o autor reagiu à abordagem, empurrando o colega Flávio e dizendo que não devia nada para a justiça. Alegou que foi utilizado o uso moderado da força, o indivíduo foi algemado e foi firmado Termo Circunstanciado.

Gabriela Lenira Martins, alegou que o churrasco era na rua 19. Disse que viu o autor apanhar do policial quando estavam dentro da residência na rua 17, que foram até o local para procurar entorpecentes mas nada encontraram. Alegou que bateram no autor, colocaram detergente e areia em seus olhos, quebraram vidros e o fizeram pisar, deram coronhadas, enquanto estava algemado. No término das agressões, retiraram as algemas e o jogaram na piscina. Referiu os demais que foram abordados foram dispensados antes das agressões começarem. Questionada, referiu que já apanhou de policiais militares e também move processo indenizatório.

Esthefani Sousa Dias, disse que quando saiu do local, ouvia os gritos do autor pedindo socorro e toda a agressão ocorreu dentro da residência, quando estavam no pátio deram coronhadas nele e depois, o encaminharam para dentro da casa, quando o agrediram mais.

Maiara da Silva Almeida, disse que era um churrasco familiar, com idosos, crianças, adultos e jovens e a abordagem ocorreu cerca de 04 horas da manhã no dia do fato, chegaram "dando tiro para cima" e revistaram todos que estavam no local, meninas de um lado e meninos de outro, sendo que mantiveram o autor por ser ex-presidiário e que logo foi embora.

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