Acórdão nº 50124264120228210029 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quinta Câmara Cível, 28-02-2023

Data de Julgamento28 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50124264120228210029
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Quinta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002935217
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

25ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5012426-41.2022.8.21.0029/RS

TIPO DE AÇÃO: Contratos Bancários

RELATOR: Desembargador LEO ROMI PILAU JUNIOR

APELANTE: ALIPIA KARKOW RICHARD (REQUERENTE)

APELADO: BANCO AGIBANK S.A (REQUERIDO)

RELATÓRIO

​Trata-se de recurso de apelação cível interposto por ALIPIA KARKOW RICHARD, hostilizando a sentença, cujo teor vai transcrito (evento 4, SENT1, dos autos originários):

Cuida-se de pedido de exibição de contrato bancário, espécie que originou discussão, no âmbito do STJ, a respeito do interesse de agir. No julgado, firmou-se o seguinte entendimento (ao apreciar o REsp. n.º 1.349.453/MS, julgado na forma do art. 543-C do CPC, da Lei 5.869/73):

PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. EXPURGOS INFLACIONÁRIOS EM CADERNETA DE POUPANÇA. EXIBIÇÃO DE EXTRATOS BANCÁRIOS. AÇÃO CAUTELAR DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS. INTERESSE DE AGIR. PEDIDO PRÉVIO À INSTITUIÇÃO FINANCEIRA E PAGAMENTO DO CUSTO DO SERVIÇO. NECESSIDADE.

1. Para efeitos do art. 543-C do CPC, firma-se a seguinte tese:

A propositura de ação cautelar de exibição de documentos bancários (cópias e segunda via de documentos) é cabível como medida preparatória a fim de instruir a ação principal, bastando a demonstração da existência de relação jurídica entre as partes, a comprovação de prévio pedido à instituição financeira não atendido em prazo razoável, e o pagamento do custo do serviço conforme previsão contratual e normatização da autoridade monetária.

2. No caso concreto, recurso especial provido. (REsp. 1349453/MS - RECURSO ESPECIAL 2012/0218955-5, Ministro Relator Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, julgado em 10/12/2014)

A alteração do entendimento sufragado pela Corte deve-se ao surgimento de uma possível "indústria de ações de prestação de contas", nos termos da argumentação tecida no voto-vista da Ministra Maria Isabel Gallotti, a seguir reproduzido:

Também inspiram essa reflexão as ponderações que fiz em voto proferido por ocasião do julgamento do REsp 1.231.027/PR, em que examinado o crescente número de ações de prestação de contas, fenômeno caracterizador do surgimento de "indústria de processos" quanto àquela matéria, o que parece se repetir com o presente tema, e que talvez esteja implícito na gênese do equivocado entendimento do Tribunal de origem limitador da ação autônoma de exibição de documentos:

Transportando esses fundamentos para as ações cautelares de exibição de documento, em que apenas se pretende a segunda via de contratos ou extratos bancários, anoto ser inconteste que os bancos já enviam periodicamente extratos, sendo franqueado igualmente o acesso gratuito aos lançamentos em conta bancária por meio da internet. Se não houver a iniciativa de seu cliente de pedir na agência de relacionamento, pelos canis adequados, a emissão de segunda via dos documentos já fornecidos, não há com se considerar configurada a resistência do banco e, portanto, do interesse de agir que justifique a movimentação do Poder Judiciário para a solicitação dos documentos comuns.

Não pairam dúvidas de que a relação entre os bancos e seus correntistas é regida pelo Código de Defesa do Consumidor. Igualmente, é indisputável que o contrato e os extratos são documentos comuns e que o banco tem o dever de fornecê-los ao cliente, quantas vezes for solicitado. Mas o banco não pode adivinhar que determinado cliente deseja a segunda, a terceira ou a quarta via de tal ou qual documento. Não é razoável que o pedido seja feito diretamente perante o Judiciário, sem que tenha sido solicitado extrajudicialmente ao banco. Assim, é pressuposto para configurar o interesse de agir a demonstração de que o banco, ciente da pretensão, não se dispôs a fornecer os documentos em tempo hábil. Tal demonstração pode decorrer de negativa explícita ou da mera omissão em fornecer os documentos que lhe tenham sido requeridos, pelos canais de relacionamento adequados, nos termos contratuais e da regulamentação da autoridade monetária.

Penso, portanto, que o interesse de agir é condição da ação cautelar de exibição de documentos e ele estará evidenciado se o autor demonstra a recusa ou a inércia da instituição financeira em fornecer, em tempo hábil, os documentos comuns, após cientificada da pretensão.

Destaco, por questões de pragmatismo e segurança jurídica, que dito entendimento atual do STJ tem sido adotado pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:

Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. PRODUÇÃO ANTECIPADA DE PROVAS. INICIAL INDEFERIDA. DECISÃO MANTIDA POR MOTIVO DIVERSO. Em questão, a exibição de contrato de empréstimo para fins de revisão da avença nos termos do artigo 381 do Código de Processo Civil. Todavia, não acostada aos autos a comprovação do prévio pedido administrativo, de modo que tampouco resta comprovada a inércia da ré em entregar os documentos, o que conduz ao desprovimento do recurso e consequente manutenção da sentença de improcedência, ainda que por fundamento diverso. APELAÇÃO DESPROVIDA.(Apelação Cível, Nº 51079100720218210001, Décima Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Deborah Coleto Assumpção de Moraes, Julgado em: 25-08-2022)

Ementa: APELACAO CIVEL. EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. INDEFERIMENTO DA INICIAL. EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS. AUSÊNCIA DE PRÉVIO E IDÔNEO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. CONFORME ENTENDIMENTO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, CONSOLIDADO NO JULGAMENTO DO RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA Nº 1.349.453-MS, PARA CONFIGURAÇÃO DO INTERESSE DE AGIR NAS AÇÕES QUE BUSCAM A EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS, É NECESSÁRIO PRÉVIO PEDIDO À INSTITUIÇÃO FINANCEIRA, NÃO ATENDIDO EM PRAZO RAZOÁVEL, BEM COMO O PAGAMENTO DO CUSTO DO SERVIÇO, CONFORME PREVISÃO CONTRATUAL E NORMATIZAÇÃO DA AUTORIDADE MONETÁRIA. PARTE AUTORA QUE REALIZOU PEDIDO ADMINISTRATIVO POR MEIO DO SITE DO SENACON, NÃO COMPROVANDO O PROTOCOLO DE UMA DE SUAS VIAS NO ESTABELECIMENTO DO REQUERIDO, EM CARTÓRIO DE TÍTULOS E DOCUMENTOS OU CARTA AR COM DECLARAÇÃO DE CONTEÚDO. SENTENÇA MANTIDA POR FUNDAMENTO DIVERSO. RECURSO DESPROVIDO. UNÂNIME. (Apelação Cível, Nº 50066823220218210019, Vigésima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Alberto Vescia Corssac, Julgado em: 27-07-2022) (grifei).

Feitas estas considerações, tem-se que o interesse processual em pedidos de exibição de documentos bancários depende do preenchimento dos seguintes requisitos, que devem ser atendidos quando do ajuizamento do pedido: (i) demonstração da existência de relação jurídica entre as partes; (ii) comprovação de prévio requerimento administrativo formal à instituição financeira não atendido em prazo razoável; (iii) pagamento do custo do serviço conforme previsão contratual e normatização da autoridade monetária.

Ora, a demonstração da existência de relação jurídica entre a parte autora e a instituição financeira exige prova documental da qual se extraiam indícios mínimos da contratualidade. Portanto, o requerimento administrativo, para ser estimado como apto, deve ser: (a) formulado pelo interessado ou representante legal devidamente constituído; (b) individualizando o documento a ser exibido, (c) indicando endereço para resposta, (d) protocolizado em uma de suas vias no estabelecimento do requerido, em cartório de títulos e documentos ou carta AR com declaração de conteúdo; (e) em tempo hábil para ser atendido (no mínimo 30 dias antes do ajuizamento da ação). Por fim, a parte autora deve comprovar o pagamento do custo do serviço ou sua inexigência por parte da instituição financeira, considerando-se que a Resolução n.º 3.919 do BACEN admite sua cobrança.

Diz a Resolução n.º 3.919 do BACEN, no art. 5º, inciso XVII:

Art. 5º Admite-se a cobrança de tarifa pela prestação de serviços diferenciados a pessoas naturais, desde que explicitadas ao cliente ou ao usuário as condições de utilização e de pagamento, assim considerados aqueles relativos a: (...)

XVII - fornecimento de cópia ou de segunda via de comprovantes e documentos;

No caso concreto, a parte autora realizou pedido administrativo por meio do site do "PROTESTE" (evento 1, PROCADM5), não comprovando o protocolo de uma de suas vias no estabelecimento do requerido, bem como no cartório de títulos e documentos e documentos ou carta AR, com a devida declaração de conteúdo.

Além disso, não houve comprovação do pagamento do custo do serviço ou sua inexigência por parte da instituição financeira.

Portanto, ausente pedido administrativo correto, conforme, a tese definida no Recurso Especial Representativo de Controvérsia n.º 1.349.453/MS, entendo carecer o autor de interesse processual, motivo pelo qual indefiro a inicial, com base no art. 330, III, do Código de Processo Civil.

Deixo de fixar sucumbência ante a ausência de angularização processual.

Custas pela parte autora. Restando suspensa sua exigibilidade em razão da gratuidade judiciária que ora defiro.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Preclusa, arquivem-se com baixa.

Em suas razões (evento 7, APELAÇÃO1, dos autos originários), aponta que a sentença recorrida não considerou as tentativas realizadas pela parte autora na via administrativa. Discorre sobre a fragilidade e vulnerabilidade do consumidor e conclui que "resta comprovado ser imprescindível o fornecimento da documentação postulada nesta demanda para o conhecimento da taxa de juros, valor recebido, valor a ser restituído para elaboração do cálculo do valor cobrado a maior, possibilitando assim, a comunicação e tentativa de devolução, de forma extrajudicial, de possíveis valores cobrados a maior". Ao final, pede o provimento.

Depois da determinação do cumprimento do art. 331, caput e §1°, do CPC...

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