Acórdão nº 50127529320208210021 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Cível, 30-03-2022

Data de Julgamento30 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50127529320208210021
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuinta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001531687
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5012752-93.2020.8.21.0021/RS

TIPO DE AÇÃO: Fornecimento de medicamentos

RELATOR: Desembargador JORGE LUIZ LOPES DO CANTO

APELANTE: VANDERLEI ANTONIO MACHADO (AUTOR)

ADVOGADO: Glenio Lemos Vieira (OAB RS060411)

ADVOGADO: MARILIA DA VEIGA (OAB rs089580)

ADVOGADO: GLAUBER LEMOS VIEIRA (OAB RS031092)

ADVOGADO: Flori Francisco Barreto do Amaral Wegher (OAB RS021256)

APELANTE: UNIMED PLANALTO MEDIO COOPERATIVA DE SERV MEDICOS LTDA (RÉU)

ADVOGADO: Albano Busato Teixeira (OAB RS077782)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

VANDERLEI ANTONIO MACHADO e UNIMED PLANALTO MEDIO COOPERATIVA DE SERVIÇOS MÉDICOS LTDA interpuseram apelações contra a sentença proferida nos autos da ação de obrigação de fazer.

Na decisão atacada, os pedidos foram julgados nos seguintes termos:

Ante o exposto, nos termos do art. 487, inciso I, do CPC, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos deduzidos por VANDERLEI ANTÔNIO MACHADO contra UNIMED PLANALTO MÉDIO COOPERATIVA DE SERVIÇOS MÉDICOS LTDA para o fim de CONDENAR a parte ré à obrigação de fazer consistente no fornecimento à parte autora do medicamento "OCTROIDE ou LANREOTIDE (SANDOSTATIN) ou OCTREOTIDA LAR", conforme prescrição médica, observada a coparticipação da parte segurada, sob pena de fixação de multa diária para a hipótese de descumprimento da presente decisão, confirmando-se, ademais, a medida liminar concedida no feito.

Considerando que houve sucumbência recíproca, condeno as partes, por metade, ao pagamento das custas processuais. Condeno, ainda, as partes ao pagamento de honorários advocatícios ao procurador da parte adversária, fixados no valor de R$ 1.000,00 (mil reais), nos termos dos artigos 85 e 86, ambos do Código de Processo Civil, tendo em vista a natureza da matéria debatida, o trabalho desenvolvido pelos procuradores e o tempo de tramitação da demanda, ficando, contudo, suspensa a exigibilidade dos ônus sucumbenciais em relação à parte autora diante da concessão da Gratuidade da Justiça.

Em suas razões recursais, a parte ré sustentou que o medicamento não tem previsão contratual, bem como não consta no rol da ANS. Asseverou que o medicamento postulado teve sua cobertura negada em razão de ser considerado Off Label para o tratamento do mal que acomete o beneficiário.

Alegou, ainda, que não há obrigatoriedade de cobertura para tratamento considerado experimental, dentre esses aqueles que não possuem as indicações descritas na bula/manual registrado na ANVISA, considerando-se o uso off-label.

Frisou que não se pode impelir à Unimed responsabilidades além daquelas contratadas, reguladas por lei e de acordo com as normas da ANS e da ANVISA, sob pena de causar desequilíbrio econômico-financeiro apto a culminar na impossibilidade de continuidade de prestação de serviços pela operadora de planos de saúde. Defendendo a legalidade da negativa de cobertura, requereu o provimento do recurso.

Por sua vez, a parte autora defendeu a ocorrência de danos morais indenizáveis, tendo em vista a negativa injustificada do tratamento postulado, ainda mais considerando a gravidade do quadro de saúde apresentado.

Afirmou que só obteve a quimioterapia necessitada mediante decisão de agravo de instrumento junto ao Tribunal. Sustentou que a ré em momento algum durante o processo informou a cobrança de coparticipação sobre o tratamento realizado, exigindo sumariamente, após cada aplicação, mais de R$ 1.600,00, o que pode inviabilizar a continuidade da quimioterapia pelo autor.

Colacionando jurisprudência, postulou a majoração da verba honorária arbitrada. Requereu o provimento do apelo.

Contra-arrazoados os recursos, os autos foram remetidos a esta Colenda Corte de Justiça.

É o relatório.

VOTO

Admissibilidade e objeto do recurso

Eminentes colegas, os recursos intentados objetivam a reforma da decisão de primeiro grau, versando a causa sobre contrato de plano de saúde.

Os pressupostos processuais foram atendidos, utilizados os recursos cabíveis, há interesse e legitimidade para recorrer, são tempestivos, foi devidamente preparado o da ré e está dispensado de preparo o do autor.

Assim, verificados os pressupostos legais, conheço dos recursos intentados para o exame das questões suscitadas.

Mérito dos recursos em exame

Preambularmente, é preciso consignar que os planos ou seguros de saúde estão submetidos às disposições do Código de Defesa do Consumidor, enquanto relação de consumo atinente ao mercado de prestação de serviços médicos.

Aliás, sobre o tema em discussão o STJ editou a súmula n. 608, dispondo esta que: aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de autogestão.

Ademais, entendo aplicável ao caso em tela o disposto no art. 47 do Código de Defesa do Consumidor, no que concerne à interpretação de forma mais favorável à parte autora quanto às cláusulas do contrato do plano de saúde avençado, levando-se em conta a relação de consumo entre as partes.

No presente feito, busca a parte autora a cobertura pela demandada do tratamento com o medicamento descrito na inicial, em razão de quadro de tumor neuroendocrino de delgado com metastases em linfonodos abdominais.

Ao analisar os documentos insertos nos autos, constata-se serem aplicáveis ao caso em exame as exigências mínimas previstas no plano-referência de que trata os artigos 10 e 12 da legislação dos planos de saúde.

Assim, o inciso I, “b” do artigo 12 do diploma legal precitado, estabelece que constitui exigência mínima dos planos a cobertura de serviços de apoio diagnóstico, tratamentos e demais procedimentos ambulatoriais, solicitados pelo médico assistente.

Ainda, o inciso II, “g” do mencionado dispositivo, dispõe que é obrigatória a cobertura para tratamentos antineoplásicos ambulatoriais e domiciliares de uso oral, procedimentos radioterápicos para tratamento de câncer e hemoterapia, na qualidade de procedimentos cuja necessidade esteja relacionada à continuidade da assistência prestada em âmbito de internação hospitalar.

Note-se que o medicamento descrito na inicial foi prescrito pelo médico assistente da demandante, tendo em vista a enfermidade que a acomete e a gravidade do seu quadro de saúde.

É oportuno ressaltar que não cabe à demandada determinar o tipo de tratamento que será realizado pela parte autora, uma vez que esta decisão cabe ao médico que o acompanha, que no caso indicou o tratamento com o medicamento referido por ser o mais adequado às condições do demandante.

Ademais, cumpre destacar que o rol de procedimentos publicado pela ANS constitui apenas uma referência básica de coberturas obrigatórias nos planos privados de assistência à saúde.

No ponto em discussão, cumpre salientar que, em que pese a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça tenha firmado o posicionamento jurídico no sentido de que o rol de procedimentos e eventos em saúde da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) é taxativo, o entendimento não restou pacificado no âmbito da Corte Superior, inclusive pelo fato de que a Terceira Turma do Tribunal Superior precitada tem posicionamento jurídico diverso, no sentido de que o rol supracitado é meramente exemplificativo.

Por conseguinte, deve prevalecer no caso o posicionamento jurídico que vem sendo adotado por esta Corte, no sentido de que o rol é meramente exemplificativo, conforme julgados que seguem:

APELAÇÃO CÍVEL. PLANOS DE SAÚDE. AÇÃO DE RESSARCIMENTO. MEDICAMENTO. REGORAFENIBE (STIVARGA). TRATAMENTO DE ADENOCARCINOMA DE CÓLON. NEGATIVA DE COBERTURA. DESCABIMENTO. COBERTURA DEVIDA. O plano de saúde pode estabelecer as doenças que terão cobertura, não lhes cabendo limitar o tipo de tratamento que será prescrito, pois tal incumbência é do profissional que assiste o paciente, a quem compete avaliar os riscos e benefícios do tratamento e indicar a alternativa mais adequada (STJ, Resp nº 668.216-SP, j. 15.03.2007). O rol de procedimentos previsto nas normas da ANS não é taxativo, traduzindo somente um referencial de coberturas básicas para os planos de saúde. Precedentes do TJRS. A ANS não veda o uso off label de um medicamento com registro na ANVISA e comercialização nacional, o que não se confunde com tratamento experimental a que alude o art. 10 da Lei 9.656/98. Precedente do STJ. No caso dos autos, o laudo médico e a prescrição atestam que a autora foi diagnosticada com “Adenocarcinoma de Cólon estágio IV (CID C18.9), necessitando fazer uso da substância Regorafenibe (nome comercial Stivarga), o qual está registrado na ANVISA sob o número 170560108. Cobertura devida. Sentença mantida no ponto. DANO MORAL. NÃO CONFIGURAÇÃO. DESCABIMENTO. Não havendo comprovação adequada dos danos morais alegadamente experimentados, afigura-se descabida a indenização pleiteada. Redimensionamento da sucumbência. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. UNÂNIME.(Apelação Cível, Nº 70083936955, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Denise Oliveira Cezar, Julgado em: 30-04-2020)

APELAÇÕES CÍVEIS. SEGUROS. PLANO DE SAÚDE. PRELIMINAR CONTRARRECURSAL DE INOVAÇÃO RECURSAL SUSCITADA PELA PARTE RÉ ACOLHIDA. REJEITADA A PRELIMINAR RECURSAL DE NULIDADE DA SENTENÇA. APLICABILIDADE DO CDC. AUTISMO. TRATAMENTOS MULTIDISCIPLINARES. DEVER DE COBERTURA EM AMBIENTE AMBULATORIAL RECONHECIDO. REDISTRIBUIÇÃO DO ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. PARTICULARIDADES DO CASO CONCRETO. Inicialmente, tenho que o recurso da parte autora deve ser conhecido apenas em parte, pois se verifica inovação recursal no que tange à alegação de abusividade da cláusula contratual em que prevista a cobrança de coparticipação, de maneira que deve ser acolhida a preliminar contrarrecursal de inovação recursal. No que concerne à preliminar recursal de...

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