Acórdão nº 50128001520218210022 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Terceira Câmara Cível, 30-06-2022

Data de Julgamento30 Junho 2022
ÓrgãoDécima Terceira Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50128001520218210022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002156702
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

13ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5012800-15.2021.8.21.0022/RS

TIPO DE AÇÃO: Usucapião de bem móvel

RELATOR: Desembargador ANDRE LUIZ PLANELLA VILLARINHO

APELANTE: BANCO VOTORANTIM S.A. (RÉU)

APELADO: EDILSON SILVA DA CRUZ (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta por BANCO VOTORANTIM S.A. (sucessora de BV FINANCEIRA S.A.) contra a sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Pelotas que julgou procedente a ação de usucapião de bens móveis ajuizada por EDILSON SILVA DA CRUZ, condenando-a ao pagamento dos consectários da sucumbência.

O autor ajuizou a presente demanda objetivando usucapir três bens móveis (um caminhão trator e dois semireboques), alegando deter sua posse há mais de dez anos, de forma pacífica e contínua, com justo título, boa-fé e animus domini.

Concedida a gratuidade judiciária ao autor (evento 03/1g), a financeira contestou, ocasião em que sustentou o Autor possuía plena ciência de que não era o proprietário direto do bem, já que tal propriedade somente seria consolidada com a quitação integral do contrato [sic], postulando pela improcedência da demanda (evento 08/1g).

Após a instrução, sobreveio sentença de procedência da demanda para declarar o domínio do autor sobre os veículos descritos na inicial [sic]. No capítulo acessório, a financeira foi condenada ao pagamento das custas processuais e de honorários advocatícios em favor do patrono do autor, fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa (evento 14/1g).

Inconformada, a demandada recorreu (evento 22/1g).

Em suas razões, a apelante reedita as alegações apresentadas em sede de contestação, asseverando ser inviável se cogitar de usucapião dos bens, tendo em vista que sobre os bens objetos da presente Ação incidem gravames de alienação fiduciária e remanescem, ainda, débitos em aberto [sic]. Prossegue referindo que, em contratos de alienação fiduciária, ocorre o fenômeno do desdobramento da posse, tornando-se o devedor o possuidor direito da coisa, e o credor – titular da propriedade fiduciária resolúvel -, possuidor indireto. Somente após o pagamento da dívida, a propriedade fiduciária do credor se extingue em favor do devedor, bem como sua posse indireta, tornando-se o devedor proprietário e possuidor pleno [sic]. Insurge-se, por fim, em relação ao percentual fixados a título de honorários advocatícios postulando a exclusão da verba ou a redução do valor para o grau mínimo estabelecido no artigo 85 do CPC. Nesses termos, requer o provimento do recurso, com a reforma da sentença e o redimensionamento da sucumbência.

Com as contrarrazões pelo desprovimento do recurso (evento 33/1g), os autos foram remetidos a este Tribunal (evento 35/1g).

É o relatório.

VOTO

Cuida-se de apelação interposta por BANCO VOTORANTIM S.A. (sucessora de BV FINANCEIRA S.A.) contra a sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Pelotas que julgou procedente a ação de usucapião de bens móveis ajuizada por EDILSON SILVA DA CRUZ, condenando-a ao pagamento dos consectários da sucumbência.

O autor ajuizou a presente demanda objetivando usucapir três bens móveis (um caminhão trator e dois semireboques), alegando deter sua posse há mais de dez anos, de forma pacífica e contínua, com justo título, boa-fé e animus domini.

Julgada procedente a demanda para declarar o domínio do autor sobre os veículos descritos na inicial [sic], contra essa a decisão a instituição financeira recorre.

Em síntese, sustenta ser inviável a usucapião dos bens, tendo em vista que sobre os bens objetos da presente Ação incidem gravames de alienação fiduciária e remanescem, ainda, débitos em aberto [sic], postulando a reforma da sentença. Insurge-se, outrossim, em relação ao percentual fixado a título de honorários advocatícios, sustentando sua desproporcionalidade ao caso e postulando a redução da verba.

Do mérito.

Em que pesem as razões da financeira ao sustentar a necessidade de ser julgada improcedente a demanda, verifico que a apelação apresentada consiste, basicamente, na transcrição da contestação, não havendo qualquer impugnação aos fundamentos da decisão contra a qual se insurge (o fundamento para o reconhecimento da usucapião, no caso, foi a prescrição da dívida nos termos do art. 1.261 do Código Civil), restando inviável o conhecimento da insurgência.

Com efeito, o art. 1.010 do Código de Processo Civil, em seus incisos I a IV, estabelece (grifei):

Art. 1.010. A apelação, interposta por petição dirigida ao juízo de primeiro grau, conterá:
I - os nomes e a qualificação das partes;
II - a exposição do fato e do direito;
III - as razões do pedido de reforma ou de decretação de nulidade;
IV - o pedido de nova decisão.

Comentando o dispositivo legal, Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery (Comentários ao Código de Processo Civil. 2ª ed. em e-book baseada na 16ª ed. impressa. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016) referem que:

Para que o recurso de apelação preencha o pressuposto de admissibilidade da regularidade formal, é preciso que seja deduzido pela petição de interposição, dirigida ao juiz da causa (a quo), acompanhada das razões do inconformismo (fundamentação) e do pedido de nova decisão, dirigidos ao juízo destinatário (ad quem), competente para conhecer e decidir o mérito do recurso, tudo isso dentro dos próprios autos principais do processo. Faltando um dos requisitos formais da apelação, exigidos pela norma ora comentada, não estará satisfeito o pressuposto de admissibilidade e o tribunal não poderá conhecer do recurso. Não existe no sistema do CPC brasileiro vigente a “apelação por instrumento.

E acrescentam que o apelante deve dar as razões, de fato e de direito, pelas quais entende deva ser anulada ou reformada a sentença recorrida, e sem as razões do inconformismo, o recurso não pode ser conhecido.

A esse ônus da impugnação especificada dos fundamentos utilizados pelo julgador na decisão proferida, a doutrina convencionou chamar de princípio da dialeticidade, que na lição de Luiz Orione Neto (Recursos Cíveis. São Paulo: Saraiva. p. 202/205) é assim apresentado:

Consiste o princípio da dialeticidade na necessidade de que o recorrente exponha os fundamentos de fato e de direito pelos quais está inconformado com a decisão recorrida, bem como decline as razões do pedido de prolação de outra decisão. Portanto, de acordo com esse princípio, o recurso deverá ser dialético, isto é, discursivo.

[...]

As razões do recurso são elemento indispensável a que o tribunal, para o qual se dirige, possa julgar o mérito do recurso, ponderando-as em confronto com os motivos da decisão recorrida. A sua falta acarreta o não-conhecimento.

Tendo em vista que o recurso visa, precipuamente, modificar ou anular a decisão considerada injusta ou ilegal, é necessária a apresentação das razões pelas quais se aponta a ilegalidade ou injustiça da referida decisão judicial.

A respeito da impossibilidade de conhecimento de recurso genérico, que não ataca especificadamente a decisão recorrida, o Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE...

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