Acórdão nº 50133168320228210027 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sétima Câmara Cível, 31-08-2022

Data de Julgamento31 Agosto 2022
ÓrgãoSétima Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50133168320228210027
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002610677
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

7ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5013316-83.2022.8.21.0027/RS

TIPO DE AÇÃO: Contra a vida

RELATORA: Desembargadora SANDRA BRISOLARA MEDEIROS

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por ÉRIC W. DE S. G., GUSTAVO P. DA S. e RICHARD M. C. contra a sentença de procedência proferida nos autos da representação oferecida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO que, reconhecendo a responsabilidade dos adolescentes pela prática dos atos infracionais análogos aos tipos previstos no art. 121, § 2º, I, III e IV, na forma do art, 14, II, ambos do CP (primeiro ato), e no art. 121, § 2º, IV, na forma do art. 14, II, ambos do CP (segundo ato), aplicou-lhes a medida socioeducativa de internação sem possibilidade de atividades externas (Evento 163 - origem).

Em suas razões, preliminarmente, pugnam pela aplicação das regras insertas no Código Penal e no Código de Processo Penal. No mérito, em síntese, alegam que a prova é frágil para embasar o juízo de procedência, eis que limitada, basicamente, à palavra da vítima Jean, merecendo reservas. Com esses fundamentos, requererem o provimento do apelo para que a representação seja julgada improcedente, ou, alternativamente, seja aplicada medida socioeducativa em meio aberto (Evento 194 - origem).

Com as contrarrazões (Evento 197 - origem), e o parecer do Parquet, nesta Corte, opinando pelo desacolhimento da preliminar e, no mérito, pelo desprovimento do recurso (Evento 8), vieram os autos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

Inicio analisando a preliminar.

Nos procedimentos para apuração de ato infracional, com finalidade preponderantemente pedagógica, regidos por legislação própria, as regras insertas no Código Penal e no Código de Processo Penal são aplicadas em caráter subsidiário e excepcional, ou seja, quando houver lacuna na lei de regência ou quando inobservado o devido processo legal, com afronta aos princípios do contraditório e da ampla defesa, o que, in casu, não ocorreu.

Ainda, não se pode olvidar, ao menor infrator é aplicada medida socioeducativa, e não pena.

Assim, desacolho a prefacial.

No mérito, adianto, melhor sorte não assiste aos apelantes.

A materialidade resultou suficientemente comprovada, bem como a autoria, que recai de forma incontestável sobre os adolescentes, haja vista o depoimentos das vítimas, firmes, convincentes e coerentes, relatando em detalhes o modus agendi dos representados e seu comparsa, imputável, os quais, no interior de um veículo, efetuaram vários disparos de arma de fogo visando a atingir Jean, que se encontrava junto a um trailer, acabando por atingir também a vítima Maicon que, naquela ocasião, transitava em via pública no interior de outro automóvel.

Jean, pelo fato de pertencer a grupo oponente ao dos representados e do imputável, ambos envolvidos com o tráfico de drogas, os reconheceu e os identificou com segurança, não tendo os agentes logrando êxito em seu intento ilícito, qual seja, causar a sua morte, porque conseguiu fugir e receber imediato atendimento médico.

À palavra dos ofendidos aliam-se os depoimentos das testemunhas, dentre elas policiais militares e civis.

Em atos infracionais que tais, a palavra da vítima assume relevância, em especial quando confortada pelas demais provas, indícios e circunstâncias, caso em comento, nada havendo nos autos no sentido de que ofendidos e testemunhas tivessem imputado falsamente aos representados a prática dos atos infracionais pelos quais foram responsabilizados.

As qualificadoras resultaram igualmente aperfeiçoadas, porquanto, considerando que a motivação foi o desentedimento entre facções rivais, caracterizada a torpeza (art. 121, § 2º, I, do CP - primeiro ato); tendo em vista que os disparos, visando a atingir Jean, foram efetudos em via pública, direcionados a um trailer e a uma casa, onde pessoas se encontravam, caracterizado o emprego de meio que resultou perigo comum (art. 121, § 2º, III, do CP - primeiro ato); e, por fim, o recurso que dificultou a defesa das vítimas (art. 121, § 2º, IV, do CP - primeiro e segundo atos), pois Jean foi atingido enquanto fazia um lanche no trailer e Maicon enquanto circulava na via pública, no interior de um veículo, sem qualquer envolvimento com os representados.

Diante desse contexto, imperativa a procedência da representação.

Tendo em vista a inquestionável gravidades dos atos - homicídios qualificados na forma tentada - e as condições pessoais dos adolescentes, que apesar de primários integram facção criminosa, portanto, em flagrante estado de vulnerabilidade, a medida socioeducativa de internação sem possibilidade de atividades externas mostra-se adequada e em observância ao princípio da proporcionalidade, amparada pelo art. 122, I, do ECA, não comportando abrandamento.

Não é demais relembrar, as medidas socioeducativas apresentam caráter ressocializador, reeducador e retributivo, fazendo com que o menor infrator reflita sobre o ato praticado, conscientizando-se da censurabilidade da conduta assumida e, em sendo aplicada medida em meio fechado, venha reinserir-se, futuramente, de forma ajustada à vida em sociedade.

Com esses fundamentos, em complemento, adoto, também como razões de decidir, a sentença da lavra da douta Magistrada a quo, Dra. Gabriela Dantas Bobsin, evitando a desnecessária tautologia e, igualmente, homenageio a prolatora. Confira-se:

"(...)

No mérito propriamente dito, a materialidade dos atos infracionais restou suficientemente comprovada nos autos pelas ocorrências policiais nº 7866/2022/150507 e 7876/2022/150507, pelos autos de apreensão, pelos termos de declaração, pelos termos de informações, pelos autos de reconhecimento, pelos autos de arrecadação, pelo sautos de apreensão e pelos laudos periciais, todos acostados aos processos nº 50105817720228210027 e 50105817720228210027, vinculados ao presente, bem como pela prova oral produzida no presente feito e pelo laudo pericial juntado ao evento 155.

Pertinente à autoria, também restou plenamente comprovada durante a instrução processual.

O representado Éric W. de S. G., quando ouvido na audiência de apresentação, negou envolvimento nos atos infracionais. Relatou que não conhecia os outros representados, nem as vítimas. Disse que os responsáveis pelos fatos foram Gabriel, Augusto Corrêa e Emerson. Narrou que estava conversando com Emerson na rua, quando ele confessou a autoria, e logo em seguida foram presos pela Brigada Militar. Afirmou que os três indivíduos e mais uma pessoa foram os responsáveis e que eles tinham rixas com a vítima Jean. Falou ser fisicamente parecido com Emerson. Contou que no dia do ocorrido estava em casa com sua mãe.

O representado Gustavo P. da S., quando ouvido na audiência de apresentação, negou envolvimento nos atos infracionais. Falou que nunca teve contato com os representados, nem como as vítimas. Referiu fumar maconha. Mencionou não ter envolvimento tráfico de drogas. Contou não ter inimigos. Disse que no dia dos fatos estava com a avó em casa. Informou que na Delegacia o Éric lhe disse quem seriam os autores dos fatos.

O representado Richard M. C., quando ouvido na audiência de apresentação, negou envolvimento nos atos infracionais. Disse que não conhecia os representados, nem as vítimas. Falou que no momento dos fatos estava na escola.

A vítima Jean V. da S. disse ter ido até o trailer buscar um lanche e ficou no local conversando com o cunhado. Relatou que estava na frente do trailer quanto levou os tiros nas costas. Narrou que os indivíduos pararam o carro na rua, baixaram o vidro e dispararam os tiros. Referiu que, depois saíram correndo do local. Falou que eles já chegaram atirando. Contou ter identificado os indivíduos presentes no carro. Informou não ter desavença com eles, nem envolvimento com drogas. Mencionou conhecer os representados e o imputável Nathan. Assinalou que o carro possuía quatro portas. Disse que, na Delegacia de Polícia, apontou a autoria dos atos e fez reconhecimento por fotografia.

A vítima Maicon Uilian F. disse ter chamado um motorista de aplicativo para ir com um amigo de carro até a Praça do Brahma. Informou que, em direção ao destino final, começaram a disparar tiros na rua. Falou que tinha um ônibus na frente do carro e não conseguiram ver de onde os tiros vinham. Referiu ter ouvido três tiros e que o quarto atingiu o carro. Contou que havia outros carros na rua. Assinalou que o tiro atingiu pulmão e tórax, e que ficou internado uma semana no hospital. Mencionou que nunca frequentou o trailer, nem costumava passar no local. Informou que o tiro entrou no veículo pelo porta-malas.

A testemunha Edison S. da S., arrolada pelo Ministério Público, disse que estava trabalhando dentro trailer e que Jean estava fora, de costas para a rua. Falou que o trailer fica na calçada virado para a rua. Contou que passou um carro preto, que diminuiu a velocidade, quando foi possível ver os vidros baixando e uma pistola para fora da janela. Relatou que foram disparados cerca de 15 tiros, alguns no sentido centro-bairro e outros bairro-centro. Narrou que Jean estava há cerca de meia hora no local. Referiu que, depois dos primeiros tiros, Jean entrou na casa do dono do trailer, que ficava atrás do trailer (2 metros). Assinalou ter saído correndo do trailer e entrado na casa. Falou que os tiros atingiram o trailer e a casa. Contou que eram quatro pessoas no carro e apenas uma pistola apontada para fora.

A testemunha Leonardo S. E., arrolada pelo Ministério Público, policial militar, disse que ao chegar o local só encontrou o proprietário e o funcionário do trailer. Falou que eles relataram que um Sandero preto passou em frente ao local e...

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