Acórdão nº 50135612020198210021 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Primeira Câmara Criminal, 15-09-2022

Data de Julgamento15 Setembro 2022
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualApelação
Número do processo50135612020198210021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002092801
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

1ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5013561-20.2019.8.21.0021/RS

TIPO DE AÇÃO: Homicídio Simples (art. 121 caput)

RELATOR: Desembargador MANUEL JOSE MARTINEZ LUCAS

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

O Ministério Público, na Comarca de Marau, ofereceu denúncia contra Farid Rosa da Silva pela prática dos fatos delituosos tipificados no artigo 121, §2º, inciso IV (recurso que dificultou a defesa da ofendida) e no artigo 344, ambos do Código Penal, conforme narrado na denúncia.

A denúncia foi recebida em 27 de setembro de 2017.

Citado, o réu apresentou resposta à acusação.

Declarada a suspeição de juízes e promotores que atuavam no feito, na Comarca de Marau, pois figuram como vítimas no processo criminal nº. 109/2.17.0003462-0, no qual se apura eventual prática de tentativa de homicídio, orquestrada por Farid Rosa da Silva e Bruna da Silva Horstmann.

Instruído o feito, foram ouvidas as testemunhas arroladas pelas partes, e, ao final, foi interrogado o réu. Encerrada a instrução, Ministério Público e Defesa apresentaram alegações finais.

Sobreveio decisão a pronunciar o acusado Farid Rosa da Silva como incurso nas sanções dos artigos 121, §2º, inciso IV, e 344, ambos do Código Penal.

Deferiu-se o desaforamento do processo à Comarca de Passo Fundo.

Submetido a julgamento perante o Tribunal do Júri da Comarca de Passo Fundo, o réu Farid Rosa da Silva foi condenado como incurso no artigo 121, §2º, inciso IV, do Código Penal. A pena definitiva foi fixada em 12 anos de reclusão, em regime inicial fechado. Ainda, o réu foi absolvido da imputação do artigo 344 do Código Penal.

Inconformada, a Defesa interpôs recurso de apelação contra a sentença. Em suas razões, sustenta que a decisão é manifestamente contrária à prova dos autos, postulando a realização de novo julgamento.

O Ministério Público apresentou contrarrazões.

Nesta instância, o parecer do Procurador de Justiça Luciano Pretto foi pelo desprovimento do apelo.

VOTO

No tocante ao art. 593, inciso III, alínea “d”, do Código de Processo Penal, consoante se diz e se repete de forma até enfadonha, só tem cabimento a desconstituição do julgamento pelo Tribunal do Júri por esse fundamento, quando a decisão dos jurados é inteiramente divorciada da prova dos autos, chegando às raias da arbitrariedade. A contrario sensu, havendo nos autos qualquer adminículo probatório que respalde aquela decisão, é impositiva a manutenção do veredicto, o que é corolário do preceito constitucional que consagra a soberania do Júri Popular.

Na hipótese, a decisão condenatória encontra consistente respaldo no conjunto probatório, não havendo que se cogitar de eventual anulação do julgamento. Com base nos relatos das testemunhas presenciais, Lais Simão e Cristiano Domingos Cavalheiro, depreende-se que ação delituosa se deu de forma rápida, pois tão logo Rafael dirigiu-se até a porta da Boate Afrodite para receber Farid, que chegava de táxi ao local, foi alvejado por disparos de arma de fogo, efetuados por Farid imediatamente ao desembarcar do táxi e avistar Rafael na Porta da Boate, contexto fático incompatível com legítima defesa, considerando que as testemunhas não reportaram ter ocorrido luta corporal entre os protagonistas do delito (réu e vítima).

Em resumo, quanto à análise da prova, a questão está solvida com absoluta proficiência no parecer do Procurador de Justiça que oficiou no feito, cujos fundamentos, por imelhoráveis, adoto como razões de decidir, até para evitar inútil e fastidiosa tautologia, passando a transcrevê-los:

(...)

O réu Farid Rosa da Silva, ao ser interrogado (mídia da fl. 478), referiu não ter inimizade com as vítimas e testemunhas ouvidas em juízo. Com relação ao fato, refere que matou Rafael em legítima defesa. Esclarece que tinham uma rixa. Rafael estava lhe ameaçando. Não moravam no mesmo bairro. A desavença era com relação “a coisa boba, de piá, jogo de bola...”. Não comunicou as ameaças à Polícia. Foi até a Boate Afrodite a pedido de Rafael. Ao chegar ao local, Rafael lhe mostrou um revólver e disse que iria lhe matar. Entraram em luta corporal. Não foi armado ao local. A arma de fogo pertencia a Rafael. A discussão ocorreu dentro da Boate. Efetuou os disparos dentro da Boate. O fato ocorreu próximo à porta. Não recorda quantos disparos efetuou contra a vítima. Não ameaçou João Luciano. Após o fato, retornou para casa. Conversou com Rafael por cinco minutos sobre a desavença. Antes do fato, Rafael passou na residência do interrogando e pediu que o encontrasse. Não conversaram na residência do interrogando porque tinha criança no local. Rafael passou na casa do interrogando por volta das 14 horas. Ninguém viu Rafael chegar lá. Na residência do interrogando estavam a esposa e os filhos dela. Conversou com Rafael em frente a sua residência. Não recorda para quem ligou, confirma que ligou para um taxista. Nega ter ligado para o taxista após a prática do homicídio.

A testemunha Cristiano Domingos Cavalheiro, ao ser inquirido (mídia da fl. 334), com relação ao crime de coação no curso do processo, referiu não saber se Farid ameaçou João Luciano Martins para que fosse favorecido no presente processo criminal. Em relação ao crime de homicídio, viu o momento em que Farid efetuou os disparos contra Rafael. Esclarece que é taxista e atendeu, a pedido do colega João Luciano Martins, a solicitação de uma corrida feita por Farid. Reconheceu Farid na Delegacia de Polícia por foto. João Luciano Martins passou o endereço e solicitou ao depoente que fizesse a corrida de táxi. Deslocou até o endereço informado, Farid embarcou no táxi e indicou o caminho a ser tomado. Farid havia falado com Rafael por telefone. Esclarece que levou Farid na Boate Vale Verde, como não encontrou Farid no local, retornaram para o centro. Durante a trajetória, Farid recebeu uma ligação de Rafael que informou estar na Afrodite. Deslocaram-se até a Afrodite, no local Farid desembarcou do veículo, conversou com Rafael e efetuou disparos contra ele. Não houve discussão entre Rafael e Farid durante as conversas por telefone. Farid solicitou que o depoente esperasse, a ação durou uns cinco minutos. Ouviu o barulho dos tiros, viu Farid efetuar os disparos contra Rafael. Farid retornou ao táxi com a arma no bolso. Levou Farid de volta para casa. Não conhecia Rafael nem Farid. Farid sentou no banco do carona, ao lado do depoente. Buscou Farid em uma parada de ônibus no Jardim do Sol. Ao chegarem na Boate Afrodite, Rafael chamou Farid que estava dentro do táxi e encontraram-se na porta do estabelecimento. Escutou os tiros e viu que Farid havia disparado contra Rafael, pois Rafael não havia caído ao chão ainda. Foram três ou quatro disparos, “pelo jeito que ele atirou foi pela região da barriga, abdômen, mais ou menos”.

A vítima João Luciano Martins (2º Fato), ao ser inquirido (mídia da fl. 334), com relação ao primeiro fato, referiu que Farid é cliente do táxi. Recebeu uma ligação de Farid, mas como estava em outra corrida não pode atendê-lo. Repassou a solicitação para outro colega taxista. Não sabe o que ocorreu o fato. Em relação ao crime de coação no curso do processo, esclareceu “corre de boca em boca na cidade...se tu for lá e falar alguma coisa ou ...”. Em razão da profissão fica sabendo de muita coisa, mas como teme por represálias não comunica tais fatos. Reafirma que não pôde atender Farid no dia do crime de homicídio, repassando a solicitação para outro colega. Ao ser questionado acerca do posterior contato de Farid, confirmou ter recebido a ligação e dito a ele que não sabia de nada, pois não havia se encontrado com o colega que o levou até o local do fato.

A testemunha Laís Simão, ao ser inquirida em juízo (mídia da fl. 334), referiu trabalhar na boate Afrodite. Rafael chegou a Boate, tomou banho e pediu uma cerveja. De repente chegou um táxi ao local. Não viu quem estava no táxi. Quando escutou o tiro olhou em direção à porta e viu uma pessoa de preto. Ao escutar os tiros saiu correndo pela porta dos fundos. A pessoa que atirou desceu do táxi. Os disparos foram efetuados fora da Boate. Não houve disparos em sua direção. Rafael frequentava a Boate. No dia do fato, ao chegar o táxi, Rafael foi até a porta e iniciaram os disparos. Parecia que Rafael conhecia a pessoa que estava chegando. O atirador não chegou a entrar na Boate, os disparos foram efetuados fora da Boate.

A testemunha Ivan Henrique...

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