Acórdão nº 50139014720218210003 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Oitava Câmara Cível, 26-04-2022

Data de Julgamento26 Abril 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50139014720218210003
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Oitava Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002012048
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

18ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5013901-47.2021.8.21.0003/RS

TIPO DE AÇÃO: Bancários

RELATOR: Desembargador JOAO MORENO POMAR

APELANTE: IRACI COSTENARO (AUTOR)

APELANTE: BANCO BMG (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

IRACI COSTENARO, autora, e BANCO BMG, réu, apelam da sentença nos autos de ação declaratória de inexistência de débito c/c repetição de indébito e indenização por danos morais, assim lavrada:

IRACI COSTENARO ajuizou a presente ação de declaratória de indébito em desfavor do BANCO BMG S.A., alegando, em síntese, que após consulta ao INSS, constatou a existência de descontos à título de cartão de crédito consignado, o qual afirma não ter contratado. Discorreu sobre o direito que embasa sua pretensão, defendendo a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor. Comentou sobre o dano moral suportado. Pediu, em sede de tutela antecipatória, que a parte autora abstenha-se de reservar margem consignável e cancele/suspenda os descontos, sob pena de multa diária. Por fim, requereu a procedência dos pedidos, para seja declarada a inexistência do contrato, devolvido em dobro os valores adimplidos à tal título, assim como indenizado pelos danos morais sofridos, subsidiariamente, pugnou pela conversão do cartão de crédito consignado para empréstimo consignado, sendo os valores já pagos a título de RMC utilizados para amortizar o saldo devedor, o qual deverá ser feito com base no valor liberado à parte autora, desprezando-se o saldo devedor atual, ou seja, não deverá ser considerado para o cálculo o valor acrescido de juros e encargos. Anexou documentos (evento 1).
Foi concedido o benefício da gratuidade judiciária e indeferidos os pleitos antecipatórios (evento 3).

A parte autora interpôs agravo de instrumento (evento 6), o qual teve seu provimento negado (evento 11).

Citado, o requerido contestou.
Discorreu sobre o contrato entabulado entre as partes, alegando que houve assinatura do “Termo de Adesão Referente a um Cartão de Crédito Consignado Banco BMG e Autorização para Desconto em Folha de Pagamento", para concessão do cartão BMG MASTER nº. 5259.1026.7762.6202, incluído em 26/07/2018, com limite de crédito de R$ 1.575,00. Mencionou a existência de saque vinculado à margem consignável, em 01/08/2018, no importe de R$1.197,00. Comentou sobre a sistemática do cartão de crédito consignável e da reserva de margem consignável. Insurgiu-se contra a inversão do ônus da prova. Asseverou a inocorrência de danos morais indenizáveis. Pontuou a impossibilidade de conversão da modalidade de cartão para empréstimo pessoal. Ao final, pugnou pela total improcedência dos pedidos, com as cominações de praxe. Acostou documentos (evento 10).
Houve réplica (evento 12).

Vieram os autos conclusos para a sentença.

É O RELATÓRIO.
PASSO ÀS RAZÕES DE DECIDIR.

Oportuno o julgamento antecipado do feito, nos termos do art. 355, I, do CPC.
Segundo narrativa inicial, a autora jamais manteve relação contratual com a parte ré, no entanto, sofre mensalmente descontos em seu benefício previdenciário referente ao contrato de empréstimo n.º 52902243.
Por não ter formalizado nenhuma contratação, pediu o cancelamento do contrato, a restituição em dobro dos valores adimplidos a tal título, além da concessão de indenização por danos morais ou subsidiariamente, postulou que seja realizada a readequação/conversão do “empréstimo” via cartão de crédito consignado para empréstimo consignado, sendo os valores já pagos a título de RMC utilizados para amortizar o saldo devedor.
Entretanto, cumprindo com o ônus de provar fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, nos termos do art. 373, inc. II, do CPC, a instituição financeira juntou aos autos o contrato firmado pelo requerente, devidamente assinados por ele, restando evidente a contratação do empréstimo consignado pela modalidade cartão de crédito, bem como a autorização para desconto no seu benefício previdenciário.

Ademais, não há indicativos que o autor teve a sua vontade viciada no ato da contratação do empréstimo.
Aliás, como enfatizado pelo Desembargador Dilso Domingos Pereira em análise de feitos similares ao presente na Apelação Cível Nº 70079319802, da Vigésima Câmara Cível, do Tribunal de Justiça do RS:

“em que pese seja a autora pessoa idosa, tal condição não pressupõe que não entenda o que está assinando, inclusive porque, conforme documentação […], possui inúmeros outros empréstimos, levando a crer que possui familiaridade com esse tipo de contratação”.

Assim, é lícito concluir que, por ocasião da celebração do negócio jurídico, a autora teve ciência da modalidade contratada e dos descontos efetuados de seu benefício previdenciário a título do pagamento mínimo da fatura do cartão de crédito consignado.
Diante disso, não há que se falar em nulidade do contrato.

Por outro lado, a instituição financeira requerida não demonstrou a efetiva utilização do cartão de crédito pelo consumidor, modo a justificar a realização dos descontos a título de RMC.

Juntamente à contestação, o requerido aportou o contrato, as faturas e o comprovante de transferência bancária do valor disponibilizado à parte autora.
Não existem documentos indicando o uso do cartão, conforme as faturas anexas, embora exista um saque inicial, seu valor foi depositado através de TED diretamente em conta da titularidade da autora, o que não comprova a efetiva utilização do cartão de crédito.
Nesse cenário, torna-se verossímil a alegação da parte autora de que queria apenas contratar um empréstimo financeiro comum, consignado em seu benefício previdenciário.

Diante disso, não há como ser mantida a contratação como “cartão de crédito consignado”.
Dispõe o artigo 170 do Código Civil:

“Se, porém, o negócio jurídico nulo contiver os requisitos de outro, subsistirá este quando o fim a que visavam as partes permitir supor que o teriam querido, se houvessem previsto a nulidade”.

Assim, imperioso que o pacto subsista como um contrato de empréstimo consignado para aposentados, devendo ser a avença readequada para esta espécie de operação financeira, com apuração do saldo devedor em sede de liquidação de sentença, conforme a taxa média de juros anual das operações de crédito com recursos livres – pessoas físicas – crédito pessoal consignado para aposentados e pensionistas do INSS divulgada pelo Banco Central do Brasil em seu site.
Corroborando o esposado, o posicionamento da jurisprudência:

APELAÇÃO CÍVEL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE CONTRATUAL C/C REPETIÇÃO DO INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. DESCONTOS SOBRE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO A TÍTULO DE “RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL – RMS”, DECORRENTES DA CONTRATAÇÃO DE CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO. ALEGAÇÃO DE DESCONHECIMENTO DA ADESÃO AO PRODUTO. PEDIDO SUBSIDIÁRIO DE CONVERSÃO DA AVENÇA EM CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO “COMUM”. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. A prova documental inserta nos autos (contrato, autorização para consignação dos descontos em folha de pagamento, cédula de crédito vinculada à avença) confirma de maneira inequívoca a adesão ao cartão de crédito consignado. Contudo, ausente prova nos autos da entrega do cartão à consumidora e de sua efetiva utilização pela mesma, cumpre descaracterizar a avença na forma como originalmente estabelecida. Possibilidade, entretanto, à luz do art. 170, do Código Civil, que a avença subsista como um contrato de empréstimo consignado “comum” ou “padrão”, devendo ser o pacto readequado para esta espécie de operação financeira, com apuração do saldo devedor em sede de liquidação de sentença. Dano moral inexistente. Situação que não chega a consubstanciar violação a direitos personalíssimos, modo a dar ensejo ao reconhecimento do alegado dano moral e autorizar a correspondente reparação pecuniária. Redimensionamento dos ônus de sucumbência, em face do resultado final do julgamento. RECURSO DE APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDO. (Apelação Cível, Nº 70084015544, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Mylene Maria Michel, Julgado em: 02-07-2020).

APELAÇÃO CÍVEL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DECLARATÓRIA CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CONTRATAÇÃO DE CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNÁVEL (RMC) Contrato de Reserva de Margem para Cartão de Crédito – RMC. Pretensão do consumidor de contratar empréstimo pessoal. Não restou demonstrado o uso do cartão de crédito e tampouco há nos autos a prova da entrega deste ao autor. Violação ao dever de informação previsto no art. 52 do CDC. Excessiva desvantagem ao aderente. Conversão do contrato em empréstimo pessoal consignado, nos termos do art. 170 do Código Civil. Compensação de valores. Eventual restituição na forma simples. Danos moral não configurado. Não demonstrado que os eventuais incômodos da situação superaram os limites da normalidade APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. (Apelação Cível, Nº 70081425407, Décima Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Heleno Tregnago Saraiva, Julgado em: 26-09-2019).

Destarte, a procedência do pedido é a medida que se impõe.
Danos moral não configurado.
Situação que não chega a consubstanciar violação a direitos personalíssimos, modo a dar ensejo ao reconhecimento do alegado dano moral e autorizar a correspondente reparação pecuniária.
DO PEDIDO ALTERNATIVO
O pedido alternativo, formulado pelo requerido, deveria ter sido formulada por meio de reconvenção, nos termos do art. 343 do CPC.

Inobservada a lei processual civil quanto ao procedimento e o rito a serem adotados, afigura-se inviável o conhecimento do pedido formulado pelo requerido em contestação.

FUNDAMENTEI.
DECIDO.

Diante do exposto, , com fundamento no art. 487, inc. I, do CPC, julgo PARCIALMENTES PROCEDENTES...

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