Acórdão nº 50142973520188210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Primeira Câmara Criminal, 27-01-2022

Data de Julgamento27 Janeiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Número do processo50142973520188210001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001443521
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

1ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Recurso em Sentido Estrito Nº 5014297-35.2018.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Homicídio qualificado (art. 121, § 2º)

RELATOR: Desembargador SYLVIO BAPTISTA NETO

RECORRENTE: ANDRE VINICIUS OLIVEIRA DOS SANTOS (RECORRIDO)

RECORRENTE: CRISTIANO BARRETO DA COSTA (RECORRIDO)

RECORRENTE: LAURO VINICIUS SILVA MEDEIROS (RECORRIDO)

RECORRENTE: WAGNER DA SILVA NUNES (RECORRIDO)

RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RECORRENTE)

RELATÓRIO

1. André Vinícius Oliveira dos Santos, Cristiano Barreto da Costa, Lauro Vinícius Silva Medeiros e Wagner da Silva Nunes recorreram em sentido estrito da sentença que os pronunciou como incursos nas sanções dos artigos 121, §2º, I, III e IV, 148, 288, § único, e 211, todos do Código Penal. Descreveu a peça acusatória que, no dia 17 de abril de 2018, em Porto Alegre, os denunciados mataram Jonas Mateus de Almeida e ocultaram o seu cadáver, tendo, no dia anterior, privado sua liberdade mediante sequestro. Os denunciados estavam associados, de forma armada, para a prática de crimes.

Inconformada com a decisão, a Defesa recorreu. Os Defensores arguiram a nulidade do reconhecimento fotográfico e, no mérito, pediram a impronúncia dos recorrentes ou o afastamento das qualificadoras e a revogação da prisão preventiva. Em contrarrazões, o Promotor de Justiça manifestou-se pela manutenção da sentença de pronúncia. Esta foi mantida em juízo de retratação.

Em parecer escrito, o Procurador de Justiça opinou pela rejeição da preliminar e, no mérito, pelo desprovimento dos recursos.

VOTO

Antes de iniciar o voto, destaco que o fato de reproduzir parte da decisão com o fundamento do julgador não causa nenhuma nulidade, pois não viola a exigência constitucional da motivação.Neste sentido é a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, a Corte responsável pelo controle da constitucionalidade da lei e de atos judiciais. Exemplo:

“A jurisprudência desta Corte é no sentido de que não viola a exigência constitucional da motivação o acórdão de segunda instância que adota como razões de decidir fundamentos contidos na sentença recorrida. Precedentes. ” (Ag. Reg. no Recurso Extraordinário 1.099.396, Primeira Turma, Relator Roberto Barroso).

Depois, eu poderia, se quisesse, usar da mesma fundamentação da decisão judicial, mas determinando que a minha assessoria, usando os mesmos argumentos, trocassem palavras e verbos por seus sinônimos, invertessem frases ou parte delas etc., e todos diriam que a fundamentação era deste Relator.

Mas o referido acima não seria honesto. Prefiro reproduzir a sentença ou decisão como proferida. Deste modo, valorizo o trabalho do colega quem, efetivamente, teve o esforço intelectual da argumentação jurídica e fática, para mostrar, fundamentalmente, porque tomou aquela decisão.

2. Rejeito a preliminar arguida pela Defesa de Lauro. Trata-se de matéria preclusa, eis que não arguida em sede de memoriais, tampouco rebatida em sentença.

Os recursos também não procedem. Sobre o que se deve valorar para efeitos de pronúncia, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem afirmado:

“A pronúncia, que encerra simples juízo de admissibilidade da acusação, exige o ordenamento jurídico somente o exame da ocorrência do crime e de indícios de sua autoria, não se demandando aqueles requisitos de certeza necessários à prolação de um édito condenatório.” (AgRg no REsp 1317844, Quinta Turma, Relator Jorge Mussi).

“Tratando-se de crime contra a vida, presentes indícios da autoria e materialidade, deve o acusado ser pronunciado, em homenagem ao princípio do in dubio pro societate, cabendo ao Tribunal do Júri respectivo proferir o juízo de mérito aplicável ao caso. Precedente recente do Supremo Tribunal Federal.” (AgRg no AREsp 739.762, Sexta Turma, Relator Sebastião Reis Júnior).

“A exclusão de qualificadoras constantes na pronúncia somente pode ocorrer quando manifestamente improcedente, sob pena de usurpação da competência do Tribunal do Júri, juiz natural para julgar os crimes dolosos contra a vida...” (AgRg no REsp 1295740, Quinta Turma, Relator Reynaldo Soares da Fonseca).

3. A situação referida na jurisprudência citada acima foi o que ocorreu no caso em julgamento. Ou seja, há prova mínima da materialidade dos fatos delituosos e indícios das autorias, o que permite o julgamento dos delitos denunciados pelo Tribunal do Júri.

No sentido referido antes, afirmou a ilustre Julgadora, Dra. Gabriela Irigon Pereira:

"No ponto, a prova da existência do delito de homicídio encontra-se consubstanciada...

"Quanto aos indícios de autoria, vejamos a prova constante dos autos.

"A testemunha Paulo, em juízo, declarou que está sendo ameaçada de morte pela “turma do pedalinho”, os quais são “colegas” dos réus. "quem ameaçou o senhor? É Venicio 1, e o Venício 2... Eu conheço eles assim, só pelo primeiro nome. O primeiro, o segundo que eu não sei… Eu conheço eles de vista. e qual foi a ameaça? Porque não posso ir na audiência. Toda vez que tiver, eu não posso comparecer. Aonde e quando ele falou isso para o senhor? No dia, na frente de casa no dia do sequestro do Gabriel." Mostradas as fotografias dos acusados que constam no processo, reconheceu todos como sendo da região onde mora. Referiu que os moradores do local conhecem André e Lauro como sendo “Venício 1” e “Venício 2”.

"Prosseguindo na oitiva da testemunha Paulo, "Quero que o senhor me conte da morte do Jonas. a primeira vez que eu conheci ele eu não sabia o nome dele nada. Ele tinha um carro lá para arrumar, um carro que estava na chapeação e mecânica. Ele sempre aparecia ali: Oi tudo bem? Mas eu não sabia o nome dele. Um dia ele chegou lá: Cadê o Matheus? Eu não sei quem é Matheus. É aquele ali? É. Dali pouco tempo, os caras do Pedalinho desceram, que estava esse Venício 1 e Venício 2, o Wagner, tinha um monte. Tudo vestido de Polícia Civil, mascarado. É que o Venício uma vez tirou a toca e fez assim: “Ô, véio, se manda dai que tá ruim pra ti. Não vai na audiência que vai ter aí”. Aí foi morto aquele cara, que é o Matheus. […] Sequestraram ele ali um dia, chegou do serviço lá, não sei o que é que houve. O irmão dele chegou pra mim: “ sequestram o meu irmão e levaram”. […] Eu estou recebendo várias ameaças lá de cima do Pedalinho, que eles mandavam lá. E continuou toda essa bagunça. E já morreu muita gente lá. A gente do Pedalinho desce, faz tiroteio. […] Eu tive que fugir. (…) O senhor quando foi ouvido na polícia, o senhor disse que as pessoas o Gabriel foram os mesmos que sequestraram o Jonas Matheus? Foram os mesmos porque, através do irmão do Matheus. Ele falou assim: “É os mesmos”. Daí eu falei assim: o Venicio 1 e o Venício 2? E tem o outro Wagner aí. “É, é, esses caras que tá aí ó. Eu estava lá”. Eu falei: É os caras? “É, eles teve aí” […]. Sabe se essas pessoas que o senhor conhece são dedicadas ao crime, costumam cometer crimes, tráfico morte, alguma coisa? sempre eles desciam ali embaixo, eles estavam de briga, Nazaré com Pedalinho. O senhor sabe por quanto tempo ficou sequestrado Jonas Matheus? Pegou de tarde. Sequestraram ele na parte da tarde, foram achar no outro dia.

"Em sede policial, a testemunha Paulo narrou que estavam na frente de casa quando quatro indivíduos armados chegaram em um veículo Onix, cor preta, fardados com roupa da polícia civil, os quais levaram Gabriel. Referiu que os indivíduos que sequestraram Gabriel foram os mesmos que sequestraram Jonas na segunda-feira. Disse ter ouvido na vila que Vinícius seria o autor do homicídio de segunda feira e também que viu o Vinícius no veículo Onix preto na ocasião em que ocorreu o sequestro de Gabriel. Por fim, que os indivíduos pertencem à facção Bala na Cara e que a provável motivação dos crimes em tela seria a disputa pelo ponto de tráfico na vila. Que a tomada da vila começou na segunda-feira com o sequestro de Jonas (f. 24).

"Realizado auto de reconhecimento de pessoa por fotografia, a testemunha Paulo reconheceu os acusados Lauro e André como autores do sequestro e homicídio de Gabriel (fls. 25/26 do IP).

"A testemunha Iara, ouvida apenas em sede policial, corroborou o depoimento de Paulo. Narrou que os comentários na vila eram de que Vinícius estava descendo e vindo pelo sambódromo fazendo “arte” na vila. Vinícius foi o autor do homicídio de Jonas segunda-feira dia 17/04. Que todos comentam que “os mesmos guris” que sequestraram Gabriel teriam cometido o homicídio de Jonas”. Por fim, disse ter ouvido comentários na vila que são envolvidos com a facção “Bala na Cara”, e querem dominar o tráfico de drogas na região (fl. 28).

"Realizado auto de reconhecimento de pessoa por fotografia, reconheceu os acusados Lauro e André como autores do sequestro e homicídio de Gabriel (fls. 28/29 do IP).

"Ainda, o depoimento de Éverton (sobrinho de Iara e primo de Gabriel), apenas em sede policial. “Declara que na data de hoje, dia 19/04/2018, estava na casa de sua tia, na Vila Amazônia, no portão, quando seu primo ficou desconfiado e mandou o declarante entrar. Nesse momento um veículo Ônix preto chegou com 4 indivíduos, vestidos com camisetas da polícia civil, filmando a localidade e mandaram entrar em casa. Colocaram todos ajoelhados e começaram a perguntar se os moradores do local eram envolvidos no tráfico de drogas. Nesse momento levaram seu primo Gabriel (Gordo) e desferiram coronhadas em sua tia e no declarante. O fato da data de hoje está relacionado ao fato do homicídio ocorrido no Inquérito Policial 46/2018, visto que os tripulantes do veículo Ônix eram os mesmos que sequestraram Jonas, reconhecido pelo declarante no dia 17/04/2018, usando o mesmo veículo inclusive. O indivíduo que desferiu a coronhada no declarante...

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