Acórdão nº 50145761620218210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Segunda Câmara Cível, 20-04-2022

Data de Julgamento20 Abril 2022
ÓrgãoVigésima Segunda Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50145761620218210001
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002019112
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

22ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5014576-16.2021.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: ICMS/ Imposto sobre Circulação de Mercadorias

RELATOR: Desembargador FRANCISCO JOSE MOESCH

APELANTE: ECOMET INDUSTRIA, COMERCIO E RECICLAGEM DE METAIS E PLASTICOS LTDA (AUTOR)

APELANTE: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Adoto o relatório do Ministério Público:

"Trata-se de recursos de apelação interpostos por ECOMET INDUSTRIA, COMERCIO E RECICLAGEM DE METAIS E PLASTICOS LTDA e pelo ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, ambos inconformados com a sentença proferida pelo 1º Juízo da 6º Vara da Fazenda Pública de Porto Alegre que, nos autos de ação ordinária aforada pela entidade empresária em face do ente estadual, para fins de ver declarada a inexigibilidade de ICMS sobre a transferência de mercadorias entre sua matriz (Município de Cachoeirinha/RS) e respectiva filial localizada em outro estado da federação (Cariacica/ES), embora tenha acolhido o pleito relativo ao reconhecimento da inexigibilidade fiscal quanto às aludidas operações, consoante Súmula 166 do STJ, excepcionou de tal silogismo em embargos quanto às mercadorias recebidas ao abrigo da técnica arrecadatória de diferimento do ICMS, nos termos do artigo 34, Livro I, do RICMS. Diante da sucumbência, o Estado foi condenado ao pagamento das custas processuais (reembolso) e dos honorários advocatícios à razão de 10% sobre o valor da causa, em conformidade com o art. 85, §§ 3º e 4º, inc. III, do CPC.(Eventos 34, 52 e 62).

Ofertadas contrarrazões por ambos os recorridos (Eventos 73 e 75), vieram os autos."

Neste grau de jurisdição, o opina o Ministério Público pelo desprovimento do apelo interposto pela autora e pelo provimento da irresignação veiculada pelo Estado do Rio Grande do Sul.

Vieram os autos conclusos.

É o relatório

VOTO

Eminentes Colegas.

Recebo os presentes recursos, porquanto cabíveis e tempestivos, preenchendo os requisitos previstos nos arts. 1.003, § 5º, e 1.010 do CPC.

A autora pretende com a presente ação que seja declarada a ilegalidade dos artigos 3º, inciso I; 4º, inciso I; e 12, inciso I, alínea “b”, da Lei estadual (RS) nº. 8.820/89, para que a autora não venha a ser tributada pelo ICMS em razão do deslocamento de mercadoria da matriz, Cachoeirinha/RS para Cariacica/ES, em razão da não perfectibilização do fato gerador do aludido imposto, bem como, para que não venha a sofrer qualquer ato tendente na imposição de ICMS por vias oblíquas, como o trancamento da mercadoria para forçar o recolhimento da exação.

Foi proferida sentença de procedência da ação, forte no art. 487, I, do CPC, para declarar a inexistência de relação jurídica tributária nas operações de transferências de mercadorias entre o estabelecimento matriz, localizado Cachoeirinha/RS, e sua filial, localizada em Cariacica/ES, reconhecendo, ainda, o direito da autora de não sofrer nenhum ato tendente à imposição de ICMS por vias oblíquas, como o trancamento da mercadoria para forçar o recolhimento da exação.

Após a oposição de embargos de declaração pelo Estado, sobreveio decisão que acolheu os declaratórios, para suprir a omissão indicada pelo réu, reconhecendo que com relação às mercadorias que a autora receber ao abrigo do diferimento e que forem objeto de transferência para outra unidade da Federação, sem incidência de ICMS, o Estado do Rio Grande do Sul poderá, através das vias próprias, exigir o pagamento do ICMS devido na etapa anterior, em face do encerramento do diferimento do pagamento do imposto.

Ambas as partes apelam.

A respeito do tema discutido no presente mandado de segurança, necessário ressaltar o teor da Súmula 166 do Superior Tribunal de Justiça, que desde 1996 entende que: Não constitui fato gerador do ICMS o simples deslocamento de mercadorias de um para outro estabelecimento do mesmo contribuinte.”

Em 2010, o Superior Tribunal de Justiça pronunciou-se novamente no mesmo sentido, ao apreciar o REsp 1.125.133/SP através do regime do art. 543-C do CPC/1973:

PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. ICMS. TRANSFERÊNCIA DE MERCADORIA ENTRE ESTABELECIMENTOS DE UMA MESMA EMPRESA. INOCORRÊNCIA DO FATO GERADOR PELA INEXISTÊNCIA DE ATO DE MERCANCIA. SÚMULA 166/STJ. DESLOCAMENTO DE BENS DO ATIVO FIXO. UBI EADEM RATIO, IBI EADEM LEGIS DISPOSITIO. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA.

1. O deslocamento de bens ou mercadorias entre estabelecimentos de uma mesma empresa, por si, não se subsume à hipótese de incidência do ICMS, porquanto, para a ocorrência do fato imponível é imprescindível a circulação jurídica da mercadoria com a transferência da propriedade. (Precedentes do STF: AI 618947 AgR, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 02/03/2010, DJe-055 DIVULG 25-03-2010 PUBLIC 26-03-2010 EMENT VOL-02395-07 PP-01589; AI 693714 AgR, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira Turma, julgado em 30/06/2009, DJe-157 DIVULG 20-08-2009 PUBLIC 21-08-2009 EMENT VOL-02370-13 PP-02783. Precedentes do STJ: AgRg nos EDcl no REsp 1127106/RJ, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/05/2010, DJe 17/05/2010; AgRg no Ag 1068651/SC, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 05/03/2009, DJe 02/04/2009; AgRg no AgRg no Ag 992.603/RJ, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/02/2009, DJe 04/03/2009; AgRg no REsp 809.752/RJ, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 04/09/2008, DJe 06/10/2008; REsp 919.363/DF, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 19/06/2008, DJe 07/08/2008)

2. "Não constitui fato gerador de ICMS o simples deslocamento de mercadoria de um para outro estabelecimento do mesmo contribuinte." (Súmula 166 do STJ).

3. A regra-matriz do ICMS sobre as operações mercantis encontra-se insculpida na Constituição Federal de 1988, in verbis: "Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: (...) II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;"

4. A circulação de mercadorias versada no dispositivo constitucional refere-se à circulação jurídica, que pressupõe efetivo ato de mercancia, para o qual concorrem a finalidade de obtenção de lucro e a transferência de titularidade.

5. "Este tributo, como vemos, incide sobre a realização de operações relativas à circulação de mercadorias. A lei que veicular sua hipótese de incidência só será válida se descrever uma operação relativa à circulação de mercadorias. É bom esclarecermos, desde logo, que tal circulação só pode ser jurídica (e não meramente física). A circulação jurídica pressupõe a transferência (de uma pessoa para outra) da posse ou da propriedade da mercadoria. Sem mudança de titularidade da mercadoria, não há falar em tributação por meio de ICMS. (...) O ICMS só pode incidir sobre operações que conduzem mercadorias, mediante sucessivos contratos mercantis, dos produtores originários aos consumidores finais." (Roque Antonio Carrazza, in ICMS, 10ª ed., Ed. Malheiros, p.36/37)

6. In casu, consoante assentado no voto condutor do acórdão recorrido, houve remessa de bens de ativo imobilizado da fábrica da recorrente, em Sumaré para outro estabelecimento seu situado em estado diverso, devendo-se-lhe aplicar o mesmo regime jurídico da transferência de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular, porquanto ubi eadem ratio, ibi eadem legis dispositio. (Precedentes: REsp 77048/SP, Rel. Ministro MILTON LUIZ PEREIRA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 04/12/1995, DJ 11/03/1996; REsp 43057/SP, Rel. Ministro DEMÓCRITO REINALDO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 08/06/1994, DJ 27/06/1994)

7. O art. 535 do CPC resta incólume se o Tribunal de origem, embora sucintamente, pronuncia-se de forma clara e suficiente sobre a questão posta nos autos. Ademais, o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão.

8. Recurso especial provido. Acórdão submetido ao regime do art.

543-C do CPC e da Resolução STJ 08/2008.

(REsp 1125133/SP, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 25/08/2010, DJe 10/09/2010)

Do referido precedente é possível extrair que “o deslocamento de bens ou mercadorias entre estabelecimentos de uma mesma empresa, por si, não se subsume à hipótese de incidência do ICMS, porquanto, para a ocorrência do fato imponível é imprescindível a circulação jurídica da mercadoria com a transferência da propriedade”.

Veja-se, portanto, que para caracterizar a circulação jurídica, a ensejar a incidência do ICMS, necessária a existência de transferência de titularidade.

Aproveitando as palavras de José Eduardo Soares de Melo, em ICMS Teoria e Prática, 4ª ed., Dialética, pág. 26, que em tudo é assemelhado ao caso em tela, cite-se:

“O fato físico ‘saída’ de mercadorias do estabelecimento, por si só, é irrelevante para tipificar a hipótese de incidência do ICMS.

A transferência de quaisquer espécie de coisas corpóreas, inclusive de mercadorias, entre estabelecimentos da mesma empresa,...

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