Acórdão nº 50146079120218210015 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Oitava Câmara Cível, 16-02-2023

Data de Julgamento16 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50146079120218210015
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Oitava Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003228765
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

18ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5014607-91.2021.8.21.0015/RS

TIPO DE AÇÃO: Usucapião Extraordinária

RELATOR: Desembargador JOAO MORENO POMAR

APELANTE: EDINILSON GOMES DA SILVA (AUTOR)

RELATÓRIO

EDINILSON GOMES DA SILVA apela da sentença que julgou a ação de usucapião que promove, assim lavrada:

Vistos e analisados os autos.

EDINILSON GOMES DA SILVA, qualificado na inicial, ajuizou ação de usucapião extraordinário. Disse que o imóvel a ser usucapido foi adquirido por seu pai, CLAUDIO MARTINS DA SILVA, através de Escritura Pública de cessão e transferência de direitos hereditários (evento 1, ESCRITURA6 e evento 1, ESCRITURA7). Refere que, na Escritura Pública, é apontado que seu pai obteve o imóvel mediante compra dos demais herdeiros de JOVELINA INÁCIA DA SILVA, que, por sua vez, era avó de CLAUDIO e bisavó do autor. Nesse sentido, apesar de seu pai possuir sua cota obtida através de herança, comprou o restante do terreno objeto da ação, conforme já mencionado. Alega que sua bisavó adquiriu o imóvel através de Escritura Pública de compra e venda de imóvel (evento 1, ESCRITURA5), no entanto, não efetuou o registro na matrícula. Salienta que seu pai, após viver mais de 30 anos no local, decidiu fraciona-lo em quatro partes, sendo um terreno para cada um de seus três filhos e a parte restante ficou para si e sua esposa. Postulou a procedência da ação, para que seja declarado o domínio do imóvel usucapiendo em favor do autor, com a expedição do respectivo mandado de registro do imóvel. Juntou documentos.

Recolhida a taxa judiciária, foi intimado para juntar, aos autos, certidão de óbito de Jovelina, a qual resultou em "Certidão Negativa de Óbito", conforme anexado no evento 17, PET1.

Após, vieram os autos conclusos para sentença.

É o relatório, em síntese.

Fundamento e decido.

O exame do caso dar-se-á a partir da regra do art. 1.238 do Código Civil vigente, nos termos postulados na petição inicial, em consonância com a própria narração dos fatos, que faz referência ao tempo de posse (mansa, pacífica e ininterrupta). O usucapião extraordinário, como forma de aquisição da propriedade, apresenta os seguintes pressupostos: coisa hábil ou suscetível de usucapião, posse (com ânimo de dono, de forma contínua e pacífica) e decurso do tempo (15 anos).

Nesse sentido, entendo que, in casu, não resta preenchido o pressuposto da posse com ânimo de dono, uma vez que o autor jamais poderia ter sobre o imóvel, animus domini, na medida em que sabedor que o terreno, por doação, pertencia também a seus irmãos e seus genitores. Ou seja, necessário esclarecer que o autor exerce, atualmente, 1/4 do terreno objeto da ação por meio de mera tolerância dos demais possuidores.

Além disso, para a configuração do direito à usucapião, seria necessário o exercício de posse sem qualquer título, pelo requerente, mas, no caso, o autor está na ordem de linha sucessória do atual herdeiro do imóvel, que, de acordo com o documento da evento 1, ESCRITURA5, efetivamente pertencia à sua bisavó. Ou seja, apesar do autor alegar que sua bisavó deixou de realizar a transferência do imóvel, entendo que, conforme a matrícula do imóvel anexada (evento 1, MATRIMÓVEL4), houve, sim, a transferência, tornando Jovelina proprietária registral do imóvel objeto da ação.

Dessa forma, entendo que configurada a falta de interesse de agir da parte autora, uma vez que devidamente regularizada a propriedade. A meu sentir, o que a parte autora postula é a transferência de propriedade e não uma declaração de aquisição originária de domínio. Logo, não se trata de aplicação da ação de usucapião, mas, sim, de inventário.

Nesse sentido:

APELAÇÃO CÍVEL. USUCAPIÃO ESPECIAL. TRANSFERÊNCIA DE PROPRIEDADE. HERDEIRO. IMPOSSIBILIDADE. PARTILHA DE BENS. Quem recebe a coisa por herança jamais poderá adquiri-la por usucapião, pois a ninguém é lícito mudar o título de sua posse. O instituto da usucapião não se presta à transferência do domínio de bem comum, a favor de um dos co-proprietários, mas sim, à aquisição originária da propriedade. Ademais, atos de mera tolerância, dos herdeiros, irmãos do requerente, que sabedor da doação do imóvel, pela mãe, para dois dos irmãos do requerente, passa o ocupar parte da área usucapienda, por ausência de ânimo de dono, não pode ter a favor uma decreto de prescrição aquisitiva. Sentença confirmada. NEGARAM PROVIMENTO AO APELO. UNÂNIME. (Apelação Cível Nº 70031594443, Décima Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Nelson José Gonzaga, Julgado em 22/04/2010).

Ementa: AÇÃO DE USUCAPIÃO. IMÓVEL RURAL. FALTA DE INTERESSE DE AGIR. EXISTÊNCIA DE CONTRATO DE COMPRA E VENDA. EXTINÇÃO DO PROCESSO. SENTENÇA MANTIDA. Não estão presentes a utilidade, a necessidade e a adequação na pretensão do demandante apresentada por meio da ação de usucapião. No caso em comento, a pretensão do apelante não é adquirir a propriedade originária do imóvel, vez que já adquiriu o mesmo de forma derivada, mas sim a regularização do bem perante o Registro de Imóveis, com a transferência para o seu nome. Sentença mantida. Negaram provimento ao Apelo. Unânime.(Apelação Cível, Nº 70062939202, Vigésima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Dilso Domingos Pereira, Julgado em: 28-01-2015).

Outrossim, apesar do autor alegar que seu pai doou o imóvel entre si e seus irmãos, não há, nos autos, documento que comprove a doação mencionada, obedecendo ao art. 541, do CC, diante da ausência de notícia do óbito de seu genitor a conferir a transferência da posse pelo princípio da saisine (art. 1.243 c/c art. 1.784, ambos do CC).

Ante o exposto, indefiro a petição inicial, com base no artigo 330, inciso III do CPC, e, ato contínuo, JULGO EXTINTO o feito, sem julgamento de mérito, nos termos do artigo 485, inciso I e VI, do mesmo diploma legal.
Custas pela parte autora.

Com o trânsito em julgado, baixe-se.

Sentença publicada e registrada eletronicamente.

Nas razões sustenta que a área usucapida, conforme amplamente demonstrado documentalmente nos autos através da matricula 11043, possui área de 293,99m3, dentro de um todo maior de 7.728m2; que na exordial, consta que o pai do requerente dividiu a área adquirida há mais de 30 anos sem regularização, pois possuía apenas uma compra e venda, detendo este a posse; que há cinco anos o pai do requerente conforme relatado dividiu entre seus filhos o terreno, sendo que cada um edificou, no seu pedaço uma casa no local e lá residem; que desde a morte da bisavó do requerente o bem foi passando para avós, pai, tios, primos e terceiros, sem que fossem realizados os inventários; que o pai do requerente adquiriu alguns direitos, que lhe deram a posse do imóvel onde criou os filhos; que estes foram casando e mesmo solteiro foram com a sua autorização construindo suas casas; que o pai do requerente é vivo, tanto que também possui um processo de usucapião; que a soma das posses de seu pai e do requerente ultrapassam o lapso temporal; que reside com ânimo de dono, sem qualquer oposição; requer a reforma da sentença. Postula o provimento do recurso.

Sem contrarrazões, porquanto não angularizada a relação jurídico-processual.

A Procuradoria de Justiça declinou de sua intervenção.

Vieram-me conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas!

O recurso atende aos pressupostos de admissibilidade e merece conhecimento. Assim, analiso-o.

INTERESSE DE AGIR. CARÊNCIA DE AÇÃO.

As condições da ação estão atreladas ao direito fundamental de acesso à tutela jurisdicional previsto no inciso XXXV do art. 5º da Constituição Federal. É o direito abstrato de agir provocando a atividade jurisdicional que não pode ser negado quando presentes aquelas condições.

O Código de Processo Civil/2015 PC/15 alterou o tradicional elenco das condições da ação suprimindo, como tal, a possibilidade jurídica do pedido, matéria...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT