Acórdão nº 50154172920228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segunda Câmara Criminal, 23-02-2022

Data de Julgamento23 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualHabeas Corpus
Número do processo50154172920228217000
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001691637
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

2ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Habeas Corpus (Câmara) Nº 5015417-29.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Crimes de Tráfico Ilícito e Uso Indevido de Drogas (Lei 11.343/06)

RELATORA: Desembargadora GISELE ANNE VIEIRA DE AZAMBUJA

PACIENTE/IMPETRANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

ADVOGADO: MARCELO WINKELMANN (OAB RS067785)

IMPETRADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

MARCELO WINKELMANN, defensor constituído, impetrou a presente ordem de habeas corpus em favor de ALAN DA SILVA ALBAN, apontando como autoridade coatora a 2º JUÍZO DA VARA CRIMINAL DA COMARCA DE CAPÃO DA CANOA/RS.

Relatou o impetrante, em apertada síntese, que o paciente foi preso em flagrante delito em 13.01.2022, pela suposta prática de tráfico de drogas.

Salientou que o flagrado é primário e possui residência fixa.

Sustentou a carência de fundamentação da decisão que decretou a segregação do paciente, apontando a ausência dos requisitos autorizadores da prisão preventiva, em especial, o periculum libertatis.

Aventou tese de posse para consumo, alegando que o paciente é dependente químico e que a quantidade de droga apreendida não é capaz de configurar a traficância.

Requereu que seja concedida extensão dos benefícios concedidos ao coflagrado, em atenção ao princípio da proporcionalidade.

Aduziu que, em caso de eventual condenação, ao paciente será imposto regime menos gravoso do que o fechado.

Ressaltou a possibilidade de substituição da prisão preventiva do paciente por medidas cautelares diversas.

Pugnou, liminarmente, a concessão de liberdade ao paciente, sem ou com a aplicação de medidas cautelares diversas, e no mérito, a concessão definitiva da ordem.

O pleito liminar restou indeferido (evento 4, DESPADEC1).

O Ministério Público ofertou parecer, por meio do Procurador de Justiça, Dr. Roberto Neumann, pela denegação da ordem (evento 10, PARECER1).

É o relatório.

VOTO

Eminentes Desembargadores:

Trata-se de habeas corpus impetrado em favor de paciente preso preventivamente pela suposta prática do crime de tráfico de drogas.

Examinando os autos, concluo pela denegação da ordem.

Como se sabe, o habeas corpus é garantia constitucional fundamental (art. 5º, LXVIII, CF1), com previsão, também, no Código de Processo Penal no artigo 6472 e seguintes.

Tem por finalidade evitar ou fazer cessar a violência ou a restrição da liberdade de locomoção decorrente de ilegalidade ou abuso de poder, mediante ação autônoma, denominada, conforme a melhor doutrina, de ação constitucional.

O artigo 6483 do Código de Processo Penal, arrola as hipóteses em que o writ será passível de concessão. Em que pese a discussão doutrinária a respeito de ser esse rol taxativo ou exemplificativo, a verdade é que o mandamento do inciso I (quando não houver justa causa) poderia abarcar todas as demais situações legais.

No entanto, do exame dos documentos que instruem o presente writ, não verifico qualquer ato ilegal ou abusivo por parte do Magistrado a quo.

Analisando os elementos de convicção ora apresentados, não identifico a ilegalidade na decisão que converteu a prisão em flagrante do paciente em preventiva.

A decisão segregatória restou assim redigida (ev. 24, 5000592-93.2022.8.21.0141):

"Vistos.

Cuida-se de análise quanto à necessidade de conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva, havendo manifestação Ministerial pela conversão e peticionamento pela soltura do acusado VANDERLEI.

Em face das alterações do CPP, em alinhamento ao caráter excepcional da prisão preventiva, somente é cabível quando não for possível a substituição por outra medida cautelar, ex vi do art. 282 do CPP, com redação atual.

No caso, necessária a custódia, além de ser cabível, considerando a pena aplicada ao delito de tráfico, na forma do art. 313, inciso I, do CPP.

Há indícios suficientes de materialidade e de autoria, consoante se infere da própria atuação em flagrante, conforme discorrido e analisado no comando judicial do evento 04.

Nesse contexto, entendo que não se afiguram suficientes as medidas cautelares diversas da custódia, impondo-se a conversão da prisão em flagrante em preventiva ao fundamento da garantia da ordem pública, porquanto a liberdade permitirá a continuidade da prática ilícita, retirando o sossego, a segurança e a tranquilidade dos munícipes, desafiando a própria credibilidade do Poder Judiciário.

Destaco que a repressão ao comércio de substâncias entorpecentes não visa ao dano estritamente individual, mas, sim, um bem maior, o da coletividade, da saúde pública, porquanto a traficância atinge o coletivo, representando um risco social. Afeta um, dois, ou vários indivíduos, muitas vezes jovens e pré-adolescentes que acabam se tornando toxicômanos e, para obter dinheiro para seu vício, terminam por traficar, ou entram no mundo dos ilícitos, desestruturando lares, famílias e lesando a sociedade.

Ademais, de acordo com o STJ "A prisão preventiva pode ter como fundamento a garantia da ordem pública. A constrição ao exercício do direito de liberdade é justificada cautelarmente, a fim de evitar repetição de conduta delituosa ou reagir a vilania do comportamento delituoso, que, por suas características, gera vigorosa reação social."

Segundo entendimento do STF, "No conceito de ordem pública, não se visa apenas prevenir a reprodução de fatos criminosos, mas acautelar o meio social e a própria credibilidade da Justiça, em face da gravidade do crime e de sua repercussão. A conveniência da medida deve ser revelada pela sensibilidade do juiz à reação do meio ambiente à ação criminosa."

Nesse sentido, também o entendimento do TJ/RS:

"PRISÃO PREVENTIVA. TRÁFICO DE ENTOECENTES. MEDIDA QUE SE IMPÕE. DETENÇÃO PROVISÓRIA MANTIDA. Mantém-se a prisão preventiva motivada na garantia da ordem pública. Como é consabido, o tráfico de entorpecentes e seus autores, direta ou indiretamente, são os responsáveis pela quase totalidade da onda de violência que se vem alastrando de maneira quase incontrolável pelo País afora, alarmando e intranqüilizando toda a população. São perigosos, porque atuam como o exército do traficante maior, atacando os territórios dos rivais (onde se mata não apenas traficantes, mas inocentes também), na cobrança de dívidas de usuários ou atemorizando vítimas e testemunhas de fatos delituosos ou moradores de uma comunidade, etc. Além disso, a traficância tumultua a ordem pública, porque leva os usuários a cometimento de delitos contra o patrimônio, roubos e furtos. Portanto, é de se manter a prisão provisória da paciente para garantia da ordem pública e diante dos corretos e adequados argumentos da autoridade judicial quando da prisão preventiva. DECISÃO: Habeas corpus denegado. Unânime." (Habeas Corpus Nº 70062715800, Segunda Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sylvio Baptista Neto, Julgado em 18/12/2014)

"RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. TRÁFICO DE DROGAS. CONCESSÃO DE LIBERDADE PROVISÓRIA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. RESTABELECIMENTO DA PRISÃO PREVENTIVA. No caso dos autos, em que se está diante de típico caso de envolvimento com o tráfico de drogas, o restabelecimento da prisão preventiva se faz necessário para a garantia da ordem pública, conforme prevê o art. 312 do CPP. A liberdade do acusado promoveria a reiteração da prática criminosa, conforme se depreende dos elementos trazidos aos autos. RECURSO PROVIDO." (Recurso em Sentido Estrito Nº 70062548821, Segunda Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Mello Guimarães, Julgado em 18/12/2014)

Em face do exposto, CONVERTO A PRISÃO EM FLAGRANTE EM PREVENTIVA, mantendo a prisão cautelar de VANDERLEI DE OLIVEIRA e ALAN DA SILVA ALBAN com fundamento na garantia da ordem pública.

Comunique-se à Autoridade Policial e Carcerária.

Recomendo os flagrados à Penitenciária Modulada Estadual de Osório/RS - RS.

Ciência ao MP e à Defesa de VANDERLEI.

Após, cumpra-se o determinado no despacho do evento 19 no que tange ao acusado ALAN.

Diligências."

Como se pode observar, a decisão acima que converteu a prisão do paciente em preventiva se encontra devidamente motivada, em atenção ao disposto no artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal.

E, a meu ver, de fato, encontram-se presentes os requisitos do artigo 312 do CPP para a decretação da prisão cautelar, quais sejam: fumus comissi delicti e periculum libertatis.

No caso em tela, uma guarnição policial, em patrulhamento de rotina em local conhecido como ponto de tráfico, avistou dois indivíduos em atitude suspeita, os quais empreenderam fuga quando da aproximação da viatura policial, não logrando êxito.

No caso, o paciente ALAN foi abordado em via pública e, com ele, foram encontradas, em tese, 126 (cento e vinte e seis) pedras de crack, pesando no total 15g; 34 (trinta e quatro) porções de cocaína, pesando 05g; a quantia de R$ 185,00 (cento e oitenta e cinco reais) em moeda diversa; e um aparelho celular (evento 1, AUTOCIRCUNS4).

Por sua vez, o coflagrado Vanderlei fugiu para o interior de sua residência, tendo sido abordado no pátio do imóvel.

No interior da residência do coflagrado, foram apreendidas 14 porções de cocaína, pesando 02g, e 01 porção de maconha, no peso de 01g (evento 1, AUTOCIRCUNS5).

Nesta linha, verifica-se que há indícios mínimos da autoria e materialidade do delito de tráfico de drogas.

De outra parte, presente também o periculum libertatis, mostrando-se necessária a manutenção da segregação cautelar para garantir a ordem pública.

Resta evidenciada a periculosidade social do agente, em face da concreta gravidade concreta do delito, decorrente da variedade das drogas apreendidas. Além do mais, em que pese primário, o paciente responde a outro processo criminal pelo delito de tráfico (5000856-02.2019.8.21.0114).

Nesse sentido, é evidenciado...

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