Acórdão nº 50157983220208210008 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quarta Câmara Cível, 23-02-2022

Data de Julgamento23 Fevereiro 2022
ÓrgãoVigésima Quarta Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50157983220208210008
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001472423
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

24ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5015798-32.2020.8.21.0008/RS

TIPO DE AÇÃO: Cláusulas Abusivas

RELATOR: Desembargador FERNANDO FLORES CABRAL JUNIOR

APELANTE: ANITA CESAR REIS (AUTOR)

APELADO: CREFISA SA CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por ANITA CESAR REIS nos autos da ação revisional proposta em desfavor de CREFISA S/A CRÉDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS em face da sentença que assim dispôs:

Isso posto, julgo PROCEDENTES os pedidos formulados na presente ação de revisão contratual com pedido liminar ajuizada por Anita Cesar Reis em desfavor de Crefisa S/A Financiamentos e Investimentos, para, revisando o contrato de n.º031000041539, limitar a taxa de juros remuneratórios à taxa média de mercado informada pelo BACEN para a modalidade; b) autorizar a compensação de valores e/ou a repetição do indébito.

Ante a sucumbência, condeno a ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios ao patrono do autor, que fixo em R$500,00, atento ao disposto no art. 85, § 8º e 16º, do CPC.

Publique-se.

Registre-se.

Intimem-se.

Diante a sistemática do Novo Código de Processo Civil, ante a inexistência de juízo de admissibilidade, art. 1.010, § 3º, do NCPC, em caso de interposição de recurso de apelação, proceda-se na intimação da parte apelada – salvo na hipótese de réu revel sem procurador constituído nos autos (art. 346 do NCPC) -, para que apresente contrarrazões, querendo, no prazo legal.

Decorrido o indigitado lapso temporal, com ou sem manifestação do recorrido, subam os autos ao egrégio TJRS.

Transitado em julgado, arquive-se com baixa.

Em razões, aduz que os juros remuneratórios devem ser limitados à taxa média vinculada à composição de dívidas divulgada pelo Bacen à época da contratação, qual seja, 4,17% ao mês e 63,28% ao ano. Sustenta que os juros de mora devem ser computados desde a citação, e a correção monetária, pelo IGP-M, desde cada desembolso. Requer a majoração dos honorários advocatícios para o valor mínimo de R$ 1.500,00. Pede provimento (evento 18).

Foram apresentadas contrarrazões (evento 27).

É o relatório.

VOTO

A apelação do evento 18 é tempestiva, uma vez que a parte autora tomou ciência da sentença em 11/05/2021 (evento 15) e o recurso foi interposto em 06/05/2021. Quanto ao preparo, a parte autora resta dispensada de seu recolhimento, diante da gratuidade judiciária deferida na origem (evento 3).

Dessa forma, considerando que o recurso é próprio e tempestivo, recebo a apelação, a qual passo ao exame em tópicos.

Inicialmente, saliento que é objeto da revisão o Contrato de Empréstimo Pessoal – renegociação de dívidas - nº 031000041539, firmado em 09.02.2018, no valor de R$ 1.532,35, com juros remuneratórios de 18,50% ao mês e 666,69% ao ano (evento 1 – CONTR9).

1. JUROS REMUNERATÓRIOS.

Relativamente aos juros remuneratórios estabelecidos nos contratos bancários e sua limitação, esta Câmara posicionou-se em consonância com o entendimento sedimentado pelo STJ, que, com o advento da Lei n. 4.595/1964, diploma que disciplina de forma especial o Sistema Financeiro Nacional e suas instituições, restou afastada a incidência da Lei de Usura, tendo ficado delegado ao Conselho Monetário Nacional poderes normativos para limitar as referidas taxas, salvo as exceções legais.

Inclusive, a Súmula n° 596/STF dispõe que: As disposições do Decreto nº 22.626/33 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas, que integram o sistema financeiro nacional”.

O STJ já sedimentou a matéria, no sentido de que a estipulação dos juros remuneratórios em percentual acima de 12% ao ano não indica abusividade.

Esse posicionamento, inclusive, ensejou a formulação da Súmula 382, in verbis:

A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade.

Cito precedentes:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE FINANCIAMENTO. JUROS REMUNERATÓRIOS. SÚMULA N° 382/STJ.

CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. JUROS COMPOSTOS. MORA CONFIGURADA.

1. "A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade" (Súmula n° 382/STJ).

2. "A capitalização dos juros em periodicidade inferior à anual deve vir pactuada de forma expressa e clara. A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada" (2ª Seção, REsp 973.827/RS, Rel. p/ acórdão Ministra Maria Isabel Gallotti, DJe de 24.9.2012). No caso dos autos, houve previsão de taxa mensal de 1,80%, e de taxa efetiva anual de 23,91% (fl. 276). Dessa forma, legítima a cobrança da taxa efetiva anual de juros remuneratórios, tal como convencionada.

3. O reconhecimento da cobrança indevida dos encargos exigidos no período da normalidade contratual descaracteriza a mora do devedor.

No presente caso, contudo, os encargos discutidos em Juízo para o período da adimplência são regulares, resultando que a cobrança, sob esse aspecto, faz-se sobre valores realmente devidos, não havendo motivo para afastar tais consectários, que também estão harmônicos com os parâmetros admitidos pelo STJ.

4. Agravo regimental a que se nega provimento.

(AgRg no REsp 1295204/RS, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 15/08/2013, DJe 22/08/2013)

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE FINANCIAMENTO. LIMITAÇÃO DOS JUROS REMUNERATÓRIOS EM 12% AO ANO.

IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N° 382 DO STJ.

1. A jurisprudência desta Corte é pacífica no sentido de que, nos contratos bancários, não se aplica a limitação da taxa de juros remuneratórios em 12% ao ano, e de que não se pode aferir a exorbitância da taxa de juros apenas com base na estabilidade econômica do país, sendo necessária a demonstração, no caso concreto, de que a referida taxa diverge da média de mercado.

2. Agravo regimental a que se dá provimento.

(AgRg no REsp 889.820/RS, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 07/05/2013, DJe 14/05/2013)

Conquanto aplicável o CDC às instituições bancárias, o STJ consolidou o entendimento de que o pacto referente à taxa de juros só pode ser alterado se reconhecida sua abusividade em cada hipótese, uma vez que a pactuação é livre entre as partes. Desta forma, somente há que se falar em taxa abusiva se constatado que outras instituições financeiras, nas mesmas condições, praticam percentuais bem inferiores ao do contrato objeto de discussão.

Portanto, a limitação dos juros remuneratórios, quando demonstrada a taxa contratada, somente ocorrerá se comprovado que a taxa contratada é superior à taxa média para as operações financeiras similares. A limitação dos juros remuneratórios é medida excepcional, quando demonstrado que a taxa contratada apresenta significativa discrepância em relação à taxa média de mercado.

Neste caso, far-se-á a limitação com base nas taxas divulgadas e publicadas pelo Bacen, que reflete a média de mercado.

A exemplificar esse entendimento, cito os seguintes precedentes da Corte Superior:

DIREITO BANCÁRIO E COMERCIAL. AÇÃO DE COBRANÇA. RECURSO ESPECIAL.

CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO. ADMINISTRADORA. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS CONTRATADA. ABUSIVIDADE.

LIMITAÇÃO À TAXA MÉDIA DE MERCADO PARA OPERAÇÕES DA ESPÉCIE.

1. Recurso especial, concluso ao Gabinete em 09/06/2011, no qual se discute a utilização da taxa média de mercado do "cheque especial" divulgada pelo Banco Central do Brasil para limitação da taxa de juros remuneratórios contratada em operação de cartão de crédito.

Ação de cobrança ajuizada em 2008.

2. Reconhecida a abusividade da cláusula contratual de taxa de juros remuneratórios, limitam-se os juros praticados à taxa média do mercado em operações da espécie.

3. A ausência de divulgação pelo Banco Central do Brasil de taxas médias para a operação de cartão de crédito não é suficiente para fundamentar a transposição das taxas médias apuradas para as operação de "cheque especial", ante a manifesta diversidade de natureza jurídica das operações.

4. Recurso especial provido.

(REsp 1256397/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 17/09/2013, DJe 27/09/2013)

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. BANCÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. JUROS REMUNERATÓRIOS. LIMITAÇÃO. ABUSIVIDADE.

TAXA MÉDIA DE MERCADO. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS. AUSÊNCIA DE PACTUAÇÃO EXPRESSA. TAXA ANUAL NÃO INDICADA PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. REEXAME. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULAS N. 5 E 7 DO STJ.

PRECEDENTE. ART. 543-C DO CPC. DECISÃO MANTIDA.

1. "É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, § 1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto" (REsp n.1.061.530/RS, submetido ao rito do art. 543-C do CPC, Relatora Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 22/10/2008, DJe 10/3/2009).

2. "A capitalização dos juros em periodicidade inferior à anual deve vir pactuada de forma expressa e clara. A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada" (REsp n. 973.827/RS, Relatora para o Acórdão Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 8/8/2012, DJe 24/9/2012). Precedente representativo da controvérsia (art. 543-C do CPC).

3. No caso concreto, o Tribunal local concluiu inexistir expressa previsão contratual da capitalização...

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