Acórdão nº 50159333620188210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sexta Câmara Criminal, 15-06-2023

Data de Julgamento15 Junho 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50159333620188210001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSexta Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003310716
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

6ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5015933-36.2018.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Extorsão (art. 158)

RELATOR: Desembargador JOAO BATISTA MARQUES TOVO

APELANTE: ANA FATIMA DA SILVA MULLER (RÉU)

APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (AUTOR)

RELATÓRIO

Adoto o relatório da sentença, transcrevendo-o:

(...)

O MINISTÉRIO PÚBLICO com base no Auto de Prisão em Flagrante nº 100321/2018/4931, oriundo da 5ª Delegacia de Polícia, ofereceu denúncia contra ANA FÁTIMA DA SILVA MULLER, qualificada na fl. 02, dando-a como incursa nas sanções do artigo 158, §1º, do Código Penal, e imputando-lhe a prática do seguinte fato:

No dia 25 de outubro de 2018, por volta das 15h30min, na Av. Assis Brasil, 8703, Porto Alegre, a denunciada, constrangeu, mediante grave ameaça, e com o intuito de obter para si ou para outrem indevida vantagem econômica, a vítima César Viana Fernandes Lima, a entregar-lhe a quantia de R$ 5.000,00 (cinco mil).

Na ocasião, a denunciada enviou mensagens pelo aplicativo whatsapp para o celular da vítima, exigindo a quantia de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), para devolver o veículo placas ISS-7859, de propriedade do pai da vítima, que havia sido roubado.

A vítima, ameaçada pela denunciada de não reaver o carro, caso não cedesse à extorsão, entrou em contato com Polícia Civil, e depois combinou a entrega da quantia.

Ato contínuo, já no local combinado, a denunciado, a denunciada foi abordada por policiais civis, restando presa em flagrante delito”.

A acusada foi presa em flagrante, conforme Auto de Prisão das fls. 03/33, que restou homologado à fl. 35, mesma oportunidade em que foi concedida a liberdade provisória.

A denúncia foi recebida em 06.05.2019 (fl. 56).

Antes mesmo de ser citada, a acusada compareceu espontaneamente, ocasião em que foi citada e manifestou o interesse em ser assistida pela Defensoria Pública (fl. 60).

Apresentada resposta à acusação, sem rol de testemunhas e documentos (fl. 62).

Durante a instrução foram inquiridas três testemunhas relacionadas pela acusação, a vítima e interrogada a acusada, que negou a prática do fato (fls. 74/76 e 100).

Encerrada a instrução, em memoriais, o Ministério Público requereu a procedência da ação penal, nos termos da denúncia (fls. 102/105).

A Defesa, por sua vez, pugnou pela absolvição da acusada e, subsidiariamente, pelo reconhecimento da forma tentada ao delito (fls. 106/108).

(...)1

Acrescento o que segue.

Sobreveio sentença, assim resumida em dispositivo:

(...)

Isso posto, JULGO PROCEDENTE em parte, o pedido da ação penal, para CONDENAR a réu ANA FÁTIMA DA SILVA MULLES como incursa nas sanções do artigo 158, §1º, do Código Penal, na forma tentada – art. 14, II, CP, às penas de 04 (quatro) anos e 09 (nove) meses de reclusão, acrescida de 53 (cinquenta e três) dias-multa, à razão de 1/30 do salário-mínimo nacional, considerando as condições econômicas da ré.

(...)2

Publicação em 10/11/2020 (página 163, 4.1).

A defesa apela; razões e contrarrazões (respectivamente, páginas 167, 171 e 183, 4.1) oferecidas.

Ré intimada por edital (página 228, 4.1). Os autos sobem.

Neste grau, parecer do ilustre Procurador de Justiça, Dr. Eduardo de Lima Veiga, pelo parcial provimento do recurso defensivo (9.1).

Autos conclusos.

Esta Câmara adotou procedimento informatizado, tendo sido observado o disposto no artigo 613, inciso I, do Código de Processo Penal.

É o relatório.

VOTO

1. SENTENÇA

A decisão hostilizada está assim fundamentada:

(...)

Cuida-se de ação penal, em desfavor de Ana Fátima da Silva Müller, apontada como autora do delito tipificado no art. 158, §1º, do Código Penal, ocorrido dia 25 de Outubro de 2018, na Avenida Assis Brasil, 8703, em desfavor de César Viana Fernandes Lima.

A materialidade está comprovada no registro de ocorrência (04) auto de apreensão (fl. 10), auto de restituição (fl. 23).

Há nos autos prova da autoria.

A vítima, CESAR VIANA FERNANDES (mídia à fl. 100) disse que no dia posterior ao roubo da camionete, passou a receber, via whatsapp, proposta de resgate, no valor de R$ 5.000,00; foi exigido que não envolvesse a polícia, pois sabiam seus dados pessoais e endereço da sua residência. Após conversa com seu pai, proprietário do veículo, resolveu aceitar a “oferta”, no entanto, comunicou a Polícia Civil, que a acompanhou até o Posto Garoupa, local combinado para a entrega do valor; ao chegar no local, deveria esperar pela acusada, que chegaria de Uber. Após informar o código combinado, deveria fazer a entrega da quantia em dinheiro, bem como permanecer ao telefone para confirmar a restituição do veículo. Chegou ao local combinado, acompanhado pelos policiais civis, que ao identificar a denunciada, procederam à prisão em flagrante.

Os policiais civis, PEDRO TRICATE (mídia à fl. 100) e THIAGO ELIUS GAMBA (mídia à fl. 100), compromissados, narraram que, após negociação, confirmaram ter acompanhado a vítima César até o posto de combustível Garoupa, localizado na Av. Assis Brasil, onde restou combinada a entrega da quantia exigida, no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Durante o trajeto, César, manteve-se negociando por telefone, instante em que foi informado que a namorada chegaria num veículo de cor vermelha e o código seria “esse é o dinheiro do aluguel”. Em seguida a acusada chegou no local, acompanhada de Levino, ocasião em que a vítima se aproximou para entregar o dinheiro: procederam à abordagem, sendo ambos conduzidos à Delegacia, onde foi verificado que o condutor do veículo era motorista de aplicativo, contratado pela acusada. Segundo a ré, seu namorado, que se encontrava preso, telefonou solicitando que fosse até o local buscar um dinheiro.

A testemunha, LEVINO GOULART PINTO (mídia à fl. 100) disse ter sido solicitado pela acusada para realizar uma viagem da sua residência, localizada na Av. Antônio de Carvalho, até o Posto Garoupa. Disse que a viagem contratada era de “ida e volta” pois a mesma iria ao local apenas buscar um dinheiro que estavam devendo para ela. Ao chegarem no local, aguardaram por alguns minutos, quando policiais lhes abordaram e prenderam-na em flagrante. Esclareceu que durante a viagem a acusada permanecia falando ao telefone.

A acusada, ANA FÁTIMA DA SILVA MULLER (mídia à fl. 100), negou a prática do fato, bem como ter mantido qualquer contato com a vítima, referindo não conhecê-la antes do ocorrido. Negou, ainda, conhecimento acerca da existência do veículo roubado. Alegou ter ido até o local a pedido de uma amiga chamada Marilene que conheceu no Presídio de Montenegro. Disse que sua amiga ofereceu-lhe a quantia de R$ 100,00 para que fosse ao local buscar uma quantia em dinheiro refente ao aluguel, não tendo desconfiado de nada. Na ocasião, o ofendido aproximou-se do Uber em que estava e perguntou sobre o dinheiro do aluguel. Ao confirmar, foi presa pelos policiais.

Esse foi o cenário probatório do feito.

A autoria restou comprovada.

Observe-se, a ré foi presa em flagrante, no momento em que buscava obter o resultado econômico da extorsão.

Nesse cenário, seria dela o ônus de placitar, nos autos, fundamentos que tornassem legítima a sua conduta, naturalmente, uma missão complicada, dadas as circunstâncias de clara prática delitiva.

O conjunto das provas, no entanto, labutou em prol da denúncia.

A vítima, CESAR VIANA FERNANDES, ao ser ouvida na fase judicial, narrou a prévia ocorrência do roubo do veículo do seu genitor; o contato dos extorsionários, via whatsapp, com a proposta de devolução do veículo, pelo valor de R$ 5.000,00; a oferta foi aceita, ficando acordada a entrega da quantia posto de Gasolina; acionou os policiais, que o acompanharam até o posto de gasolina, onde ocorreu a prisão da acusada.

Tudo muito congruente com o narrado pelos policiais civis, PEDRO TRICATE e THIAGO ELIUS GAMBA.

A prova acusatória veio sólida e convincente.

Ao contrário do que alega a Defesa, houve grave ameça à vítima: a primeiro, na perspectiva de perda definitiva do veículo subtraído, mal significativo, haja vista a dimensão do prejuízo; a segundo, quando o interlocutor referiu que tinha acesso aos dados pessoais e endereço residencial do ofendido, fato que, dadas as circunstâncias de fragilidade emocional da vítima, convolou-se em ameça de mal injusto e grave.

A alegação de desconhecimento do caráter ilícito do fato – erro de tipo -, ficou no plano das vazias alegações.

Segundo a acusada, a pedido de uma amiga, chamada Marilene, teria aceito busca a quantia referente a um aluguel, mediante o pagamento da quantia de R$ 100,00.

Essa versão não veio sustentada em nenhum elemento de prova, ônus que à ré se impunha – art. 156 do CPP.

A acusada alegou a existência dessa terceira, que a envolveu nos fatos delituosos, porém não se empenhou, sequer, em identificá-la.

A par disso, perante a autoridade...

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