Acórdão nº 50162565420228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segunda Câmara Criminal, 23-02-2022

Data de Julgamento23 Fevereiro 2022
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualHabeas Corpus
Número do processo50162565420228217000
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001739759
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

2ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Habeas Corpus (Câmara) Nº 5016256-54.2022.8.21.7000/RS

PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5000109-37.2022.8.21.0085/RS

TIPO DE AÇÃO: Crimes de Tráfico Ilícito e Uso Indevido de Drogas (Lei 11.343/06)

RELATOR: Desembargador JOSE ANTONIO CIDADE PITREZ

PACIENTE/IMPETRANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

ADVOGADO: BEN HUR DE QUADROS LEIVAS (OAB RS112060)

IMPETRADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado por advogado em favor de RUAN E SILVA ABREU, alegando que este sofre constrangimento ilegal em seu direito de ir e vir, apontando como autoridade coatora o Juízo da comarca de Cacequi, tendo como fundo o cometimento, em tese, de delito de narcotráfico.

O presente habeas corpus busca a concessão de liberdade provisória ao paciente. Sustenta a defesa que este se encontra segregado desde 30JAN2022, modo injustificado.

Refere ausentes os requisitos do artigo 312, do CPP, a justificar a constrição cautelar e a manutenção desta, bem como aduz da falta de fundamentação do decreto de prisão.

Aduz da violação de domicílio, a contaminar a prova dos autos e tornando ilegal a prisão posta.

Afirma que dito paciente apresenta predicados pessoais favoráveis; aduz matéria de mérito, bem como referindo ausência de lesividade em sua conduta, enfatizando que o gravame da prisão não mais lhe pode ser imposto. Assevera que a prisão fere o princípio da presunção de inocência e configura antecipação de punição, endossando a viabilidade de se responder ao feito em liberdade, eis que o delito não se reveste de violência ou grave ameaça.

Pontua que a pandemia do coronavírus impõe a reavaliação da prisão, devendo se destinar a prisão a casos excepcionais.

Busca a aplicação de medidas cautelares contidas no artigo 319, do CPP, caso não lhe seja deferida a liberdade, almejada prioritariamente.

Seguiu-se apreciação da liminar, ocasião em que indeferida a mesma.

Dispensadas as informações, colheu-se, na sequência, o parecer escrito da douta Procuradoria de Justiça, no rumo da denegação da ordem.

É o relatório.

VOTO

Adianto que denego a ordem impetrada, por não vislumbrar o invocado constrangimento ilegal.

Assim me manifestei, quando despachei o pleito liminar:

“Vistos.

Indefiro o pedido de concessão da ordem impetrada em caráter liminar, figura de criação pretoriana e destinada a casos excepcionais, nos quais não se enquadra o presente, malgrado os ponderáveis argumentos expostos na inicial.

Com efeito, em relação à aventada nulidade suscitada pelo impetrante, consigno que não se desconhece, por certo, o decidido em repercussão geral pelo Pleno do Supremo Tribunal Federal (no julgamento do RE n. 603.616), no sentido de que para a adoção da medida de busca e apreensão sem mandado judicial, faz-se necessária a caracterização de justa causa, consubstanciada em razões as quais indiquem a situação de flagrante delito.

No caso em comento, extrai-se que os policiais militares realizavam patrulhamento ostensivo em local indicado como ponto de tráfico de drogas, sendo que após breve campana, visualizaram um indivíduo se aproximar da janela da casa monitorada, quando um homem lhe alcançou algo. Efetuada a abordagem do sedizente suspeito, os agentes públicos encontraram duas buchas contendo um pó branco, com características de cocaína. Indagado, o flagrado confirmou ter adquirido o entorpecente na casa observada.

Ato contínuo, os policiais se deslocaram até o imóvel, tendo o ora paciente, ao perceber a presença da guarnição, evadido para o interior da residência, sendo perseguido e preso. Efetivadas as buscas, os agentes públicos encontraram os entorpecentes e o numerário descritos no auto de apreensão.

Nesse diapasão, necessária que seja reconhecida, por ora, a legalidade da busca domiciliar realizada, já que amparada no fato de o paciente ter sido visualizado comercializando drogas em local já apontado como ponto de tráfico de entorpecentes e na conduta do agente, que teria empreendido fuga para o interior da casa ao constatar a presença da guarnição no local. Inferir de modo diverso, ou seja, pela ilegalidade da busca domiciliar, certamente demandaria o reexame do conjunto fático-probatório, o que não é possível na via estreita do habeas corpus.

Quanto à prisão preventiva, dispõe o artigo 312 do Código de Processo Penal, que a segregação provisória poderá ser decretada para garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, desde que presentes prova da existência do crime e indícios suficientes de autoria.

Vejamos então, a fundamentação empregada pela juíza a quo, ao converter o flagrante em prisão preventiva:

"(...)

Os autos cuidam de prisão em flagrante lavrada com a imputação da prática do crime de tráfico de drogas.

O auto foi homologado.

MP e a defesa do flagrado manifestaram-se. O primeiro, requerimento a decretação da prisão preventiva dos flagrados, porque em liberdade pode interferir na investigação e em razão da potencialidade prejudicial do crime de tráfico para a comunidade. A segunda, manifestou no sentido de não restarem presente os requisitos legais para a conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva.

É o sucinto relatório. Fundamentação.

Avaliados os elementos de convicção até aqui reunidos, é caso da decretação da prisão preventiva do flagrado. Ao que se colhe do conjunto carreado no auto de prisão em flagrante, não é viável a concessão da liberdade provisória tampouco a aplicação das demais medidas cautelares previstas no art. 319 do CPP, por estar em risco a ordem pública (CPP, art. 310, § c/c art. 313), sendo o caso, pois, de conversão do flagrante em prisão preventiva.

A prisão cautelar, assim tida aquela que não decorre de sentença criminal condenatória, é por essência de natureza excepcional e provisória, tendo como objetivos assegurar a ordem pública e econômica e garantir a eficácia de todo o procedimento criminal e do futuro provimento judicial, tendo lugar sempre que haja a possibilidade de tornar-se inútil a persecução criminal se o acusado permanecer em liberdade até que o processo seja efetivamente julgado, tempo esse que é necessariamente longo – em razão da garantia que se dá ao contraditório e a ampla defesa, com os meios inerentes a tais institutos.

Dado à sua natureza cautelar, e excepcional porquanto não decorrente de uma sentença definitiva, deve ser mantida a prisão apenas enquanto concorrerem as (a) condições de admissibilidade (CPP 313), (b) fundamentos (CPP 312) e requisitos (CPP 312, in fine).

Com efeito, para que seja admissível a prisão cautelar em se tratando de delito punido com pena superior a 4 anos (CPP 313, I), se tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvado o disposto no inciso I do caput do art. 64 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal (CPP 313, II), se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência (CPP 313, III) e se houver dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou quando esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la, devendo o preso ser colocado imediatamente em liberdade após a identificação, salvo se outra hipótese recomendar a manutenção da medida ((CPP 313, parágrafo único).

São pressupostos para a decretação a existência de prova da materialidade/existência do fato e indício suficiente de autoria (fumus boni juris), aplicando-se nesse momento processual o princípio “in dubio pro sociedade”, sendo suficientes meros indícios de que o réu seja o responsável pelo fato.

No caso, o Auto de Apreensão (Evento 1) e o levantamento fotográfico (Evento 1) comprovam a apreensão da substância entorpecente na posse do flagrado e os Laudos Preliminares de Constatação da Natureza da Substância (Evento 1, PERICIA25 e PERICIA26), comprovam que as substâncias apreendidas se tratam de maconha e cocaína, as quais causam dependência.

A destinação comercial da droga, por sua vez, está evidenciada não apenas pela quantidade de entorpecente apreendido (38 porções individuais de maconha e duas de cocaína), mas também pela forma como estava acondicionada (em diversas porções embaladas e prontas para a venda), pela presença de dinheiro em espécie e pelo flagrante de uma venda poucos minutos antes da prisão do flagrado.

Ademais, a prisão tem como fundamentos (periculun in mora) as seguintes situações (CPP 312): a) garantia da ordem pública; b) garantia da ordem econômica; c) conveniência da instrução criminal; ou, d) assegurar-se a aplicação da lei penal.

A prisão cautelar que garante a ordem pública tem lugar diante da constatação de que o agente revelar, pelos seus antecedentes ou pela reincidência, ou pela sua periculosidade, que a sua liberdade representa um risco para a sociedade, situação que deve ser considerada excepcional.

Pois bem. Verifico presente o “periculum libertatis” na espécie, calcado no risco à ordem...

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