Acórdão nº 50165420320208217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Segunda Câmara Cível, 21-01-2021

Data de Julgamento21 Janeiro 2021
ÓrgãoVigésima Segunda Câmara Cível
Classe processualConflito de competência
Número do processo50165420320208217000
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20000500360
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

22ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Conflito de Competência (Câmara) Nº 5016542-03.2020.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Aposentadoria Especial (Art. 57/8)

RELATOR: Desembargador FRANCISCO JOSE MOESCH

SUSCITANTE: Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Alegrete

SUSCITADO: JUÍZO DA 1ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE ALEGRETE

RELATÓRIO

Tratando-se de conflito negativo de competência suscitado pelo JUÍZO DA 2ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE ALEGRETE diante da remessa dos autos pelo JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE ALEGRETE.

O suscitante pondera que em se tratando de demanda proposta contra Autarquia Estadual (IPERGS), com valor da causa inferior a 60 salários mínimos, é consequência lógica que a competência para o seu processamento e julgamento seja do Juizado Especial da Fazenda Pública. Entretanto, argumenta que o autor é menor impúbere e, por essa razão, não poderia figurar como parte no Juizado Especial da Fazenda Pública em virtude da aplicabilidade subsidiária do artigo 8º da Lei 9.099/95, o qual veda expressamente que o incapaz figure como parte no Juizado Especial Cível.

Recebido o conflito, foi nomeado o Juízo suscitante para resolver, em caráter provisório, as medidas urgentes (evento 5).

O juízo suscitado prestou informações.

O Ministério Público opina pelo não acolhimento do conflito.

Vieram os autos conclusos.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

De acordo com om o artigo 148, IV do ECA, a Justiça da Infância e da Juventude é competente para conhecer de ações civis fundadas em interesses individuais, difusos ou coletivos afetos à criança e ao adolescente.

O art. 98 do Estatuto dispõe que as medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados por ação ou omissão da sociedade ou do Estado.

Ainda mais específico, o art. 208, em seu inciso VII, determina reger-se pelas disposições do ECA as ações de responsabilidade por ofensa aos direitos assegurados à criança e ao adolescente, referentes ao não oferecimento ou oferta irregular de acesso às ações e serviços de saúde.

Por sua vez, a Lei Federal nº 12.153/09, a qual dispõe sobre os Juizados Especiais da Fazenda Pública no âmbito dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, estabelece ser de competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública processar, conciliar e julgar causas cíveis de interesse dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, até o valor de 60 (sessenta) salários mínimos.

Em seu artigo 2º, determina que no foro onde estiver instalado o Juizado Especial da Fazenda Pública, a sua competência é absoluta.

Todavia, ainda que a competência do Juizado Especial da Fazenda Pública se dê, de regra, pelo valor da causa, devem ser observadas as hipóteses de exclusão elencadas na legislação regente.

Embora não haja na Lei artigo que expresse claramente a impossibilidade de serem julgados feitos em que figure como parte menor impúbere, o artigo 27 determina a aplicação subsidiária ao Juizado Especial da Fazenda Pública das disposições contidas na Lei nº 9.099/95, a qual preceitua em seu artigo 8º que não poderão ser partes, no processo instituído por esta Lei, o incapaz, o preso, as pessoas jurídicas de direito público, as empresas públicas da União, a massa falida e o insolvente civil.”

Os incapazes, segundo o art. 3º, do Código Civil, são os menores de dezesseis anos; os ébrios atuais; os viciados em tóxicos; os que, por deficiência mental, tenham o discernimento reduzido; os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo; e os pródigos.

Dessa forma, considerando que na ação proposta o autor é menor impúbere, portanto INCAPAZ, ainda que devidamente representado por sua genitora, o mesmo não pode tramitar nos Juizados Especiais da Fazenda Pública.

Além do mais, é sabido que as disposições de Lei especial, como o Estatuto da Criança e do Adolescente, devem se sobrepor ao regramento geral relativo à competência do Juizado Especial da Fazenda Pública.

Na mesma linha, os precedentes do STJ:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. EDUCAÇÃO INFANTIL. MATRÍCULA EM CRECHE DA REDE PÚBLICA DE ENSINO. COMPETÊNCIA ABSOLUTA DO JUÍZO DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE. 1. O Estatuto da Criança e do Adolescente é lex specialis, prevalece sobre a regra geral de competência das Varas de Fazenda Pública, quando o feito envolver Ação Civil Pública em favor da criança ou do adolescente, na qual se pleiteia acesso às ações ou aos serviços públicos, independentemente de o infante estar em situação de abandono ou risco, em razão do relevante interesse social e pela importância do bem jurídico tutelado. 2. Na forma da jurisprudência do STJ, "a competência da vara da infância e juventude para apreciar pedidos referentes ao menor de idade é absoluta, consoante art. 148, inciso IV, do Estatuto da Criança e do Adolescente" (STJ, AgRg no REsp 1.464.637/ES, Rel.Min. Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe de 28.3.2016) 3. Assim, ao afastar a competência da Vara da Infância, da Adolescência e do Idoso para o julgamento de mandamus destinado a assegurar vaga em creche para menor, o Tribunal local dissentiu do entendimento desta Corte Superior, devendo o acórdão vergastado ser reformado. 4. Recurso Especial provido. (REsp 1833909/MS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/11/2019, DJe 19/12/2019)

PROCESSUAL CIVIL. COMPETÊNCIA. VARA DA INFÂNCIA E JUVENTUDE. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. INTERESSES INDIVIDUAIS, DIFUSOS OU COLETIVOS VINCULADOS À CRIANÇA E AO ADOLESCENTE. 1. A pretensão deduzida na demanda enquadra-se na hipótese contida nos arts. 98, I, 148, IV, 208, VII e 209, todos da Lei 8.069/1990 (Estatuto da Criança e Adolescente), sendo da competência absoluta do Juízo da Vara da Infância e da Juventude a apreciação das controvérsias fundadas em interesses individuais, difusos ou coletivos vinculados à criança e ao adolescente. 2. As medidas de proteção, tais como o fornecimento de medicamentos e tratamentos, são adotadas quando verificadas quaisquer das hipóteses do art. 98 do ECA. 3. A competência da Vara da Infância e da Juventude é absoluta e justifica-se pelo relevante interesse social e pela importância do bem jurídico a ser tutelado nos termos do art. 208, VII do ECA, bem como por se tratar de questão afeta a direitos individuais, difusos ou coletivos do infante, nos termos dos arts. 148, inciso IV, e 209, do Estatuto da Criança e do Adolescente. Precedentes do STJ. 4. O Estatuto da Criança e Adolescente é lex specialis e prevalece sobre a regra geral de competência das Varas de Fazenda Pública, quando o feito envolver Ação Civil Pública em favor da criança ou adolescente, na qual se pleiteia acesso às ações ou serviços e saúde, independentemente de a criança ou o adolescente estar em situação de abandono ou risco. 6. Recurso Especial provido. (REsp 1486219/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 25/11/2014, DJe 04/12/2014)

Também é no mesmo sentido a recente jurisprudência deste Tribunal de Justiça:

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. SAÚDE. MENOR INCAPAZ. PROTEÇÃO PELO ECA. COMPETÊNCIA DO JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA AFASTADA. - Não há dúvida de que os incapazes não podem fazer parte de processos que correm em Juizados Especiais da Fazenda Pública, conforme a aplicação subsidiária da Lei nº 9.099/95, mais especificamente em seu art. 8º, apontada pelo art. 27 da Lei nº 12.153/09. Ainda mais nos casos em que há menor em um dos polos da ação, conforme proteção estabelecida pelos arts. 148, IV; 208, VII; e 209 da Lei nº 8.069/90 (ECA), momento em que a competência é da Vara de Infância e Juventude. CONFLITO DE COMPETÊNCIA IMPROCEDENTE.(Conflito de competência, Nº 70083982629, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marilene Bonzanini, Julgado em: 04-03-2020)

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. AÇÃO ORDINÁRIA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. CRIANÇA. JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA. AUTOR MENOR DE IDADE. 1. Está pacificado no âmbito desta Corte que, sendo o custo anual do tratamento por tempo indeterminado inferior a 60 salários-mínimos, a competência para processamento e julgamento das ações contra a Fazenda Pública é dos Juizados Especiais. Todavia, in casu, o parte autora é pessoa menor de idade. 2. Apesar da exclusão da parte incapaz não estar prevista no rol do art. 5, inciso I, da Lei 12.153/09, tal dispositivo deve ser lido conjuntamente com o art. 8º, da Lei 9.099/95. Assim, considerando ser a parte autora menor de idade, na esteira dos precedentes desta Corte, a competência é da Vara da Infância e Juventude 3. Além disso, o Juizado Especial da Fazenda Pública de Bagé foi instalado em 28/11/2012. As ações de saúde, contudo, passaram a ser admitidas nos JEFP’s somente a partir de 23/06/2015, conforme determinado pela Resolução 1.009/2014-COMAG. No caso em concreto, a ação ordinária foi ajuizada em abril de 2015, antes, portanto, da inclusão das ações de medicamentos nos Juizados Especais da Fazenda Pública. ACOLHIDO O CONFLITO DE COMPETÊNCIA, EM DECISÃO MONOCRÁTICA.(Conflito de competência, Nº 70083636373, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Silveira Difini, Julgado em: 20-01-2020)

CONFLITO DE COMPETÊNCIA. SAÚDE. MENOR INCAPAZ. JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA E JUIZADO DA INFÂNCIA E JUVENTUDE. Embora o Legislador não tenha criado expressamente proibição de pessoa incapaz figurar no polo ativo nos casos da Lei nº 12.153/2010, o fez de forma implícita ao determinar a aplicação subsidiária da Lei nº 9.099/1995. Assim, nos termos do art. 8º da Lei nº 9.099/1995, o...

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