Acórdão nº 50166391720228210021 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quarta Câmara Criminal, 01-12-2022

Data de Julgamento01 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Número do processo50166391720228210021
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002952580
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

4ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Recurso em Sentido Estrito Nº 5016639-17.2022.8.21.0021/RS

TIPO DE AÇÃO: Denunciação caluniosa (art. 339)

RELATOR: Desembargador ROGERIO GESTA LEAL

RECORRENTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

RECORRIDO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RECORRIDO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Trata-se de recurso em sentido estrito interposto por Sebastião José do Amarante contra a decisão proferida pelo MM. Juízo da 3ª Vara Criminal da Comarca de Passo Fundo/RS, que reconheceu a inépcia da denúncia e declinou da competência para o Juizado Especial Criminal da Comarca de Passo Fundo.

Nas razões (evento 24, DOC1), o recorrente aduziu que, em que pese a ausência de instauração de inquérito policial em virtude do registro policial, é evidente que Paulo Edivan utilizou a máquina pública indevidamente, configurando o delito do art. 339, do CP. Requereu a concessão da gratuidade da justiça, tendo em vista a hipossuficiência.

Nas contrarrazões (evento 33, DOC1), o Ministério Público postulou o desprovimento do recurso.

O Juízo a quo manteve a decisão (evento 30, DOC1).

Nesta sede, parecer do Ministério Público, de lavra do Procurador de Justiça, Dr. Heriberto Roos Maciel, no sentido do desprovimento do recurso.

VOTO

Não assiste razão ao recorrente.

Sebastião José do Amarante apresentou peça intitulada como "denúncia" em face de Paulo Edivan de Oliveira Santos, atribuindo-lhe a prática do delito tipificado no art. 339, do CP. O MM. Juízo da 3ª Vara Criminal da Comarca de Passo Fundo registrou que a "noticia criminis" deveria ter sido encaminhada ao Ministério Público, titular exclusivo da ação penal pública, ou diretamente à Autoridade Policial para fins de eventual instauração de inquérito policial, com fincas no art. 5º, do CPP, determinando a baixa e cancelamento da distribuição.

Postulada a reconsideração, o MM. Juízo a quo determinou a remessa dos autos ao Ministério Público, sobrevindo a seguinte manifestação:

Primeiramente, verifica-se que peça processual denominada denúncia, inclusive postulando a condenação do suposto autor do fato pela prática do crime de denunciação caluniosa.

Evidentemente, a ação penal é inepta, pois afirma a existência de crime de ação penal pública, cuja titularidade é exclusiva do Ministério Público.

Em segundo lugar, o fato narrado não se enquadra no artigo 339 do Código Penal, pois não houve instauração de inquérito policial, processo investigatório criminal ou processo judicial.

Logo, caso o fato registrado seja inverídico, como alega o noticiante, a conduta se amolda ao tipo penal de comunicação falsa de crime, previsto no artigo 340 do Código Penal, que é infração de menor potencial ofensivo, de competência do juizado especial criminal, cujo prazo prescricional se consumará no próximo mês.

Pelo exposto, o Ministério Público requer a redistribuição deste expediente ao Juizado Especial Criminal.

O Magistrado acolheu o requerimento ministerial (evento 16, DOC1) e determinou a remessa dos autos ao Juizado Especial Criminal da Comarca. Inconformado com a decisão, o requerente interpôs o presente recurso em sentido estrito, com escopo no art. 581, inc. II, do CPP, o que enseja o seu conhecimento.

No mérito, contudo, não há como alterar o entendimento manifestado na origem. Em se tratando o delito do art. 339, do CP, de crime de ação penal pública incondicionada, cuja atribuição exclusiva é do Ministério Público, diante do interesse do Estado na administração da justiça, não há espaço para o seu trâmite da forma pretendida pelo requerente. Nesse sentido, já se pronunciou o Colendo STJ:

HABEAS CORPUS. DENUNCIAÇÃO CALUNIOSA. AÇÃO PENAL PRIVADA SUBSIDIÁRIA DA PÚBLICA. FALTA DE CABIMENTO. AUSÊNCIA DE INÉRCIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. ORDEM CONCEDIDA.
1. Sendo a ação penal relativa ao crime tipificado no art. 339 do Código Penal (denunciação caluniosa) pública incondicionada, a ação penal privada subsidiária da pública só tem cabimento quando há prova inequívoca da total inércia do Ministério Público. Quer dizer, só é permitido ao ofendido atuar de forma supletiva, quando o titular da ação penal pública - já de posse dos elementos necessários à formulação da peça acusatória - deixar de ajuizar a ação penal dentro do prazo legal, sem motivo justificável.
2. No caso, tal situação não ocorreu, porquanto, provocado, o Ministério Público local instaurou procedimento investigatório, que, após acurada investigação, foi arquivado em razão da atipicidade da conduta representada.
3. Mesmo tendo o Procurador-Geral promovido o arquivamento depois de ajuizada a ação penal subsidiária, a falta de manifestação tempestiva está definitivamente suprida pelo parecer recomendando a rejeição da queixa-crime, cujo atendimento - segundo a jurisprudência - é irrecusável.
4. Ordem concedida para trancar a ação penal.
(HC n. 175.141/MT, relator Ministro Celso Limongi (Desembargador Convocado do Tj/sp), Sexta Turma, julgado em 2/12/2010, DJe de 17/12/2010.)

Ademais, em apreciação aos elementos apresentados na "denúncia", o Parquet consignou que não se extraem os requisitos necessários para a configuração do delito de denunciação caluniosa, mas apenas do art. 340, do mesmo Diploma, na hipótese de restar constatado que o fato noticiado é efetivamente falso.

Isso porque dispõe o art. 339, do CP, o seguinte:

Denunciação caluniosa

Art. 339. Dar causa à instauração de inquérito policial, de procedimento investigatório criminal, de processo judicial, de processo administrativo disciplinar, de inquérito civil ou de ação de improbidade administrativa contra alguém, imputando-lhe crime, infração ético-disciplinar ou ato ímprobo de que o sabe inocente: (Redação dada pela Lei nº 14.110, de 2020)

Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa.

§ 1º - A pena é aumentada de sexta parte, se o agente se serve de anonimato ou de nome suposto.

§ 2º - A pena é diminuída de metade, se a imputação é de prática de contravenção.

Independente da vontade do requerente, o tipo exige a investigação administrativa ou processo judicial. Deste modo, não se verificando a sua ocorrência, não há que se cogitar na presença de elementos minimamente constitutivos do delito...

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