Acórdão nº 50178451020148210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quarta Câmara Cível, 23-06-2022

Data de Julgamento23 Junho 2022
ÓrgãoQuarta Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50178451020148210001
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002274448
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

4ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5017845-10.2014.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Sistema Remuneratório e Benefícios

RELATOR: Desembargador EDUARDO UHLEIN

APELANTE: ALINE KASSICK CADAVIZ (AUTOR)

APELANTE: ANDERSON ROBERTO AGAPITTO BARROSO (AUTOR)

APELANTE: VINICIUS DA SILVA VILELLA (AUTOR)

APELADO: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por ALINE KASSICK CADAVIZ e OUTROS em face de sentença que julgou improcedente a ação ordinária movida pelos recorrentes contra o ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, objetivando o reconhecimento do direito ao gozo de um terço de sua jornada diária no magistério estadual como de hora-atividade, bem como ao pagamento de indenização pela carga horária de atividades de interação com os alunos que exceder a 2/3 de sua carga horária.

A sentença julgou improcedente a ação, condenando a parte autora nos encargos processuais respectivos.

Em seu recurso, sustentam, preliminarmente, nulidade processual, ante o cerceamento do direito de produzir prova. Referem que formularam, oportunamente, requerimento de juntada dos registros de efetividade pelo ente público réu e, também, de documentos que informem expressamente quantas horas eram reservadas para trabalho em sala da aula (contato direto com os educandos) e quantas horas eram reservadas para as atividades extraclasse, o que é necessário para demonstrar, pormenorizadamente, a composição da jornada de trabalho das ora recorrentes. Noticiam que a primeira sentença proferida pelo juízo a quo, em julgamento antecipado da lide, já havia sido desconstituída por esta Câmara nos autos da Apelação Cível 70079152476, em que se reconheceu a existência de controvérsia fática que deve ser solvida mediante a produção de provas. Pontuam que, não obstante o julgamento da referida apelação, novamente o julgador singular deixou de oportunizar a produção de prova documental que está na posse da parte ré. No mérito, afirmam que a sentença não respeitou o efeito vinculante estabelecido na ADI nº 4.167, pelo qual o STF julgou constitucional a Lei Federal nº 11.738/2008, que, em seu art. 2º, § 4º, estabelece que, na composição da jornada de trabalho, deve ser observado o limite máximo de 2/3 da carga horária para o desempenho das atividades de interação com os educandos. Invocam, a par disso, julgamento do Recurso Extraordinário nº 936.790 - Tema nº 958, realizado em 29/07/2020, em que Eg. Suprema Corte fixou o tese de repercussão geral pertinente caso em apreciação. Asseveram que o Estado não se desincumbiu de sua obrigação legal pelo fato de ter editado o Decreto nº 49.448/2012. Discorrem sobre disposições contidas na Lei Federal nº 9.394/96 e na CF/88 pertinentes à matéria discutida. Pedem o provimento da apelação.

O Estado ofertou contrarrazões.

Subiram os autos e, nesta instância, o Ministério Público opina pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas!

Satisfeitos os pressupostos genéricos e específicos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.

Pretendem as apelantes, professoras estaduais, o reconhecimento do seu direito à hora-atividade não inferior a um terço de sua jornada semanal de trabalho e a condenação do ente público ao pagamento de indenização pela carga horária de atividades de interação com os alunos que exceder a 2/3 de sua carga horária.

Em sessão de julgamento realizada em 28 de janeiro de 2020, esta Câmara deu provimento à Apelação Cível de nº 70079152476, interposta nestes autos pelas ora recorrentes, ao efeito de desconstituir a sentença que julgara antecipadamente a lide, sem se oportunizar às partes a produção de provas. Naquela assentada, reconheceu-se, às expressas, que a causa envolve matéria de fato a ser elucidada em fase instrutória, razão pela qual o feito não comporta o julgamento antecipado de que trata o art. 355 do CPC/2015.

Eis a ementa do respectivo acórdão:

APELAÇÃO CÍVEL. SERVIDOR PÚBLICO. MAGISTERIO. ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. LEI FEDERAL Nº 11.738/2009. ART. 2º, § 4º. HORA-ATIVIDADE. DECRETO ESTADUAL RS Nº 49.448/2012. CERCEAMENTO DE DEFESA CONFIGURADO. No caso concreto, a demonstração dos fundamentos fáticos e jurídicos do que sustentado pela parte autora, desde a petição inicial, depende da oportunização de prova, mormente quando julgado improcedente o pedido, de modo antecipado, sob o fundamento da ausência de comprovação do direito alegado. APELAÇÃO PROVIDA. SENTENÇA DESCONSTITUÍDA.(Apelação Cível, Nº 70079152476, Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eduardo Uhlein, Julgado em: 29-01-2020)

Transitada em julgado essa decisão colegiada, os autos retornaram ao primeiro grau de jurisdição, oportunidade em que as demandantes pugnaram pela exibição de documentos na posse do ente público réu com vistas à demonstração pormenorizada da composição da jornada que efetivamente tem sido cumprida pelas autoras, sendo este o fator fundamental para se definir se as prescrições da Lei Federal nº 11.738/2008, concernentes à hora-atividade, têm sido observadas.

Requereu-se, então, a exibição de atestado que indicasse expressamente o quantitativo horas que cada autora lecionou em sala de aula (diretamente com os educandos) e o quantitativo de horas lhes foram reservadas para as atividades extraclasse. As autoras ainda informaram que tais documentos já foram acostados em processos judiciais de mesma natureza, sendo que eles são mantidos pelas Coordenadorias Regionais de Educação do Rio Grande do Sul (evento 34).

Esse pedido, porém, restou sumariamente indeferido pelo juízo a quo - isto é, sem nem mesmo oportunizar-se manifestação prévia pelo Estado -, sob o fundamento de que "a questão discutida nos autos não depende de produção probatória, uma vez que é possível a constatação, ou não, do alegado prejuízo pela análise da legislação em comento" (evento 37), compreensão essa que, ocioso observar, contradiz frontalmente a decisão proferida por esta Câmara na Apelação Cível de nº 70079152476, desde que nesse julgamento se consignou que a causa não envolve somente questão de direito.

Ademais, a julgadora singular, na sentença proferida logo após a decisão indeferitória de produção de provas, decidiu pela improcedência da ação, ao fundamento de que as autoras não se desincumbiram dos ônus de provar que cumpiram a integralidade da carga horária em sala de aula. Veja-se:

Desta feita, cabe à parte autora demonstrar que cumpria toda a sua jornada de trabalho em sala de aula, ou seja, que não era observada a reserva de 1/3 da carga horária para as atividades extraclasse, para fazer jus a reserva e indenização, todavia não se desincumbiu sendo seu o ônus probatório.

Concessa maxima venia, afigura-se equivocada e até mesmo contraditória intelecção estampada na fundamentação da sentença.

Ademais disso, a julgadora singular, no decisum, também explicitou o entendimento de que "o legislador federal (ao dispor sobre a hora-atividade dos profissionais do magistério público da educação básica) - extrapolou os limites estabelecidos pela Constituição Federal, no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias - no artigo 60, inciso III, alínea "e", comprometendo o pacto federativo, adentrou na competência dos demais entes federados para estabelecerem a própria legislação a respeito do regime jurídico dos seus servidores públicos".

Tal entendimento, porém, encontra-se de todo superado na quadra atual.

Com efeito, a partir do julgamento do Recurso Extraordinário nº 936.790/SC - Tema nº 958, realizado em 29.7.2020, a Eg. Suprema Corte fixou a seguinte Tese de Repercussão Geral: É constitucional a norma geral federal que reserva fração mínima de um terço da carga horária dos professores da educação básica para dedicação às atividades extraclasse.

Eis a ementa do referido...

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