Acórdão nº 50186273620228210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Terceira Câmara Cível, 13-12-2022

Data de Julgamento13 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50186273620228210001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Terceira Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002862766
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

23ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5018627-36.2022.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Empréstimo consignado

RELATORA: Desembargadora ANA PAULA DALBOSCO

APELANTE: FACTA FINANCEIRA S.A. CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO (RÉU)

APELADO: MAURICIO TADEU CARDOZO TELIER (AUTOR)

RELATÓRIO

FACTA FINANCEIRA S.A. CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO interpõe recurso de apelação em face da sentença que julgou procedentes os pedidos formulados por MAURICIO TADEU CARDOZO TELIER, nos seguintes termos:

Ante o exposto, afasto a preliminar arguida e, no mérito, mantenho a medida liminar e JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados por MAURICIO TADEU CARDOZO TELIER para o fim de limitar os juros remuneratórios dos contrato de empréstimo n° 44548594, 44548573 e 44548594 firmados com FACTA FINANCEIRA S.A. CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO à taxa média de mercado à época da contratação, de acordo com as taxa de juros estabelecida pelo Banco Central do Brasil na série 25467, bem como para descaracterizar a mora da parte autora, condenando o réu à devolução dos valores cobrados em excesso, subtraindo-os, se for o caso, das parcelas vincendas, com a repetição simples do indébito caso exista crédito em favor da parte autora após a compensação dos valores. O valor deverá ser corrigido monetariamente pelo IGP-M a partir de cada desembolso e acrescido de juros de mora de 1% ao mês a contar da data da citação.

Sucumbente, condeno o réu a pagar custas e honorários em favor dos procuradores da parte autora, que fixo em R$ 1.000,00 (um mil reais), com base no artigo 20, § 8º do CPC.

Em suas razões a financeira apelante aduz a autorização expressa do conselho monetário nacional para a contratação de juros livres. Discorre sobre os juros remuneratórios, as particularidades do consignado gaúcho em relação ao custo, os índices que compõem a taxa de juros e a inadimplência. Refere sobre a margem consignável. Sustenta a inadequação da taxa média do Bacen como referencial, sob pena de ofensa aos princípios constitucionais da livre concorrência e igualdade material. Assevera que a taxa do Bacen não reflete as peculiaridades do consignado do Estado. Requer, de forma subsidiária, a aplicação das margens de até uma vez e meia a taxa média de mercado. Pede provimento do recurso.

Apresentadas contrarrazões, vieram os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

ADMISSIBILIDADE DO RECURSO

Eminentes colegas.

O recurso interposto atende aos pressupostos de admissibilidade, sendo próprio e tempestivo, havendo interesse e legitimidade da parte para recorrer, merecendo conhecimento.

Assim, passo à análise do mérito recursal.

CONTEXTUALIZAÇÃO

Trata-se a presente demanda de ação revisional do contratos de empréstimo consignado nºs 44548594, 44548573 e 44548594, na qual a sentença limitou os juros remuneratórios à taxa média do Bacen, descaraterizou a mora e determinou a compensação/repetição dos valores.

Em recurso de apelação, insurge-se a financeira, defendendo a cobrança do encargo nos moldes supostamente pactuados. Menciona peculiaridades do "Consignado Gaucho" para servidores públicos do Estado do Rio Grande do Sul, que não estariam contempladas na taxa elaborada pelo Bacen. Arrola dificuldades para a concessão desta modalidade de crédito como, por exemplo, a) a impossibilidade de reservar margem; b) a vantagem legal do Banrisul e Caixa Economica Federal no recebimento dos créditos em detrimento das demais financeiras; c) o custo elevado para a operação do consignado; d) alto índice de inadimplência e riscos elevados e; e) as inúmeras ações judiciais de revisão de juros. Aduz que além do Banrisul e CEF, apenas ela e a Portocred disponibilizam o consignado no Estado do RS e que, a resultante das particularidades, impedem a observância do Recurso Repetitivo do STJ e impossibilidade do uso da taxa do Bacen como referencial sob pena de ofensa aos Princípios Constitucionais da Livre Concorrência e Igualdade Material. Por fim, pede a utilização de outro parâmetro e de forma subsidiária a aplicação das margens de tolerância sobre a taxa média.

Dito isso, passo ao exame da insurgência recursal.

CONSIGNADO SERVIDOR PÚBLICO GAÚCHO

Como relatado na contextualização da demanda no item supra, a apelante Facta Financeira S.A., faz longa explanação acerca das dificuldades para operacionalização do Crédito Consignado aos servidores públicos do Estado do RS, por conta do Decreto Estadual (43.337/2004) e outras particularidades ínsitas do Estado. Requer, em suma, para estes contratos específicos, a não aplicação, na aferição da abusividade contratual, do paradigma (taxa do Bacen) estabelecido no Recurso Repetitivo nº 1.061.530/RS e a criação de uma média específica entre as três instituições financeiras que atuam no mercado do consignado do servidor público gaúcho.

Em que pesem as bem elaboradas razões de defesa e sua consistência, não vejo como acolhe-las, e tampouco como reconhecer ofensa a qualquer principio constitucional.

O argumento de que a concorrência alegadamente privilegiada do Banrisul, na concessão de empréstimos consignados, obriga a recorrente a enfrentar riscos maximizados na realização de seus créditos, não elide nem neutraliza a evidência de que está cobrando taxas superiores à média mensal aferida pelo Bacen. E isso a enquadra nos precedentes do STJ que consideram a ultrapassagem daquela média como indicativa da abusividade na cobrança dos encargos do empréstimo.

Importante referir que o paradigma do STJ, não faz distinção para casos específicos, mas ao contrário, estabelece um critério único e objetivo a ser observado no exame da abusividade da cláusula de pactuação dos juros remuneratórios em todos os contratos de empréstimo.

Por esse prisma, não se pode criticar a eleição dessa taxa média como referencial pelo STJ, eis que, a priori, não se vislumbra, por ora, outra mais adequada do que esta para operar como padrão médio.

Diante disto, passo ao exame da existência ou não da abusividade dos juros, sob o enfoque do Recurso Repetitivo nº 1.061.530/RS.

JUROS REMUNERATÓRIOS

Sabe-se que os juros remuneratórios cobrados pelas instituições financeiras não mais sofrem as limitações da Lei da Usura, consoante determinando na Súmula nº 596 do STF:

Súmula nº 596: As disposições do ...

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