Acórdão nº 50190032720208210022 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Primeira Câmara Cível, 23-03-2022

Data de Julgamento23 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50190032720208210022
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Primeira Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001907474
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

11ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5019003-27.2020.8.21.0022/RS

TIPO DE AÇÃO: Transporte de coisas

RELATOR: Desembargador AYMORE ROQUE POTTES DE MELLO

APELANTE: ELOETE DA ROSA NUNES (AUTOR)

APELADO: TRANSMATHIAS TRANSPORTES E LOGISTICA LTDA (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por ELOETE DA ROSA NUNES em combate à sentença (evento 67, SENT1) proferida nos autos da ação de indenização (processo nº 5019003-27.2020.8.21.0022) que move contra TRANSMATHIAS TRANSPORTES E LOGÍSTICA LTDA perante a 2ª Vara Judicial da Comarca de Itaqui.

Adoto o relatório da sentença recorrida, verbis:

"ELOETE DA ROSA NUNES ingressou com AÇÃO DE INDENIZAÇÃO contra TRANSMATHIAS TRANSPORTES E LOGÍSTICA LTDA. Narrou que na qualidade de transportador autônomo, foi contratado pela empresa ré a realizar o frete especificado na inicial. Alega que em sua viagem passou por praças de pedágio, não tendo recebido vale-pedágio obrigatório devido pela empresa ré, nem por via antecipada, nem com ressarcimento no momento do pagamento do frete. Afirma que dessa forma, teve que arcar com os valores dos pedágios. Narrou a necessidade de ser indenizado em dobro, tendo em vista o ato ilícito praticado pela ré, no valor de R$ 1.239,60. Pugnou pela procedência da demanda, condenando a empresa no pagamento de indenização, bem como AJG. Juntou documentos (evento 1).
Instada a parte autora para que proceda a devida comprovação da situação de hipossuficiência financeira (evento 4), o qual foi atendido (evento 7).

Deferida AJG (evento 9).

Citada (evento 13), a empresa ré apresentou contestação (evento 14), alegando, em sede preliminar, a incompetência do juízo, tendo em vista que o foro de eleição é a presente Comarca de Itaqui (o processo foi impetrado inicialmente na Comarca de Pelotas) e a prescrição da reparação de dano, conforme Lei nº 11.442/2007 e o Código Civil de 2015.
No mérito, alega que os valores de pedágio pleiteados já foram pagos; a ausência de prova do direito alegado e a tentativa de enriquecimento ilícito pelo autor.
Houve réplica (evento 18).

Acolhida preliminar de incompetência do juízo e determinada a remessa dos autos à presente Comarca (evento 20).

Instadas as partes quanto a produção de novas provas (evento 35), a parte ré requereu a produção de prova oral, com a oitiva das testemunhas arroladas (evento 41).

Manifestação da parte autora juntando a rota transcorrida no momento do frete (evento 60).

Realizada a audiência de instrução (evento 61).

A parte requerida apresentou alegações finais escritas (evento 62).

Vieram os autos conclusos para julgamento."

O dispositivo da sentença recorrida está assim redigido, verbis:

"Ante o exposto, extingo o processo com resolução de mérito na forma do art. 487, I, do CPC e JULGO IMPROCEDENTES os pedidos autorais.
Condeno o autor ao pagamento das despesas processuais (art. 82, §2º, do CPC) e de honorários advocatícios, ora fixados em 10% do valor da causa.
monetariamente pelo IGP-M, a contar desta data e juros de mora de 1% ao mês, a partir do trânsito em julgado.
Transitada em julgado e nada requerido, arquive-se com baixa.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se."

Nas razões (evento 72, APELAÇÃO1), o autor afirma que lhe é devida a indenização prevista no art. 8º da Lei nº 10.209/2001, pois a ré não adiantou o vale-pedágio, nos termos da legislação de regência. Aduz que realizou o transporte de cargas de Capão do Leão/RS à Porto Alegre/RS, prescindindo, portanto, de comprovação do pagamento de pedágios, pois presume-se tal situação. Refere que incumbe à ré a comprovação a respeito do adiantamento da quantia destinada ao pagamento dos pedágios. Assim, requer o provimento do recurso.

Em contrarrazões (evento 75, CONTRAZAP1), a ré requer o desprovimento do recurso.

Subiram os autos a esta Corte. Distribuídos, vieram conclusos em 07/01/2022, sendo incluídos na pauta da sessão virtual de julgamentos de 23/03/2022.

Em 20/03/2022, a ré-apelada TRANSMATHIAS TRANSPORTES E LOGÍSTICA LTDA apresentou arquivo de audiovisual (evento 6, PET1), com sustentação oral de argumentos, por sua advogada VANESSA B. AYUB SZYMCZAK, OAB/RS 54.654.

É o relatório.

VOTO

A. EM PRELIMINAR.

1. O recurso é típico, próprio, tempestivo (eventos 68 e 72) e está dispensado do preparo, pois o autor-apelante é beneficiário da gratuidade da justiça (evento 9, DESPADEC1).

2. Ainda neste quadrante preliminar, impende rejeitar a impugnação arguida pela ré-apelada, em relação às capturas de telas inseridas no bojo do recurso de apelação interposto pelo autor.

Analisando as provas coligidas ao caderno processual, observo que as imagens inseridas nas razões recursais pelo autor - alusivas à capturas de tela de uma página de internet destinada a calcular rotas rodoviárias -, integraram a manifestação encartada aos autos pelo autor no evento 60, PET1, durante a fase de instrução probatória da ação, perante o Juízo a quo.

Nesta moldura, não há falar em apresentação de documento novo, razão pela qual rejeito a impugnação.

B. NO MÉRITO.

1. O autor-apelante ingressou em Juízo pleiteando a condenação da ré-apelada ao pagamento de indenização decorrente do não pagamento antecipado do vale-pedágio, instituído na Lei nº 10.209/2001, no âmbito da qual chamo à colação do caso os seguintes dispositivos, verbis:

Art. 1º Fica instituído o Vale-Pedágio obrigatório, para utilização efetiva em despesas de deslocamento de carga por meio de transporte rodoviário, nas rodovias brasileiras.
§ 1º O pagamento de pedágio, por veículos de carga, passa a ser de responsabilidade do embarcador.

§ 2º Para efeito do disposto no § 1º, considera-se embarcador o proprietário originário da carga, contratante do serviço de transporte rodoviário de carga.

§ 3º Equipara-se, ainda, ao embarcador:
I - o contratante do serviço de transporte rodoviário de carga que não seja o proprietário originário da carga;
II - a empresa transportadora que subcontratar serviço de transporte de carga prestado por transportador autônomo.

(...)

Art. 3º A partir de 25 de outubro de 2002, o embarcador passará a antecipar o Vale-Pedágio obrigatório ao transportador, em modelo próprio, independentemente do valor do frete, ressalvado o disposto no § 5o deste artigo.(Redação dada pela Lei nº 10.561, de 13.11.2002)
§ 1º Quando o Vale-Pedágio obrigatório for expedido em modelo próprio, a aquisição, pelo embarcador, para fins de repasse ao transportador de carga, dar-se-á junto às concessionárias das rodovias, podendo a comercialização ser delegada a centrais de vendas ou a outras instituições, a critério da concessionária.

§ 2º O Vale-Pedágio obrigatório deverá ser entregue ao transportador rodoviário autônomo no ato do embarque decorrente da contratação do serviço de transporte no valor necessário à livre circulação entre a sua origem e o destino.

§ 3º Sendo o transporte efetuado por empresa comercial para um só embarcador, aplica-se o disposto no parágrafo anterior.

(...)
Art. 8º Sem prejuízo do que estabelece o art. 5º, nas hipóteses de infração ao disposto nesta Lei, o embarcador será obrigado a indenizar o transportador em quantia equivalente a duas vezes o valor do frete.
[grifei]

O vale-pedágio consiste na obrigação assumida pelo embarcador ou equiparado, no ato do embarque da carga, quanto à antecipação das quantias equivalentes aos pedágios existentes na rota de entrega da carga. Vale dizer: com a previsão legal, ficou proibida a inclusão dos valores despendidos com o pagamento de pedágios no preço final do frete.

Nessa moldura, o art. 8º da Lei nº. 10.209/2001 prevê a obrigação do embarcador ou equiparado ao pagamento de indenização, ao transportador, em quantia equivalente a duas vezes o valor do frete, quando não efetuada a antecipação do vale-pedágio.

Veja-se que o STF decidiu pela constitucionalidade do dispositivo legal em tela ao julgar a ADI nº 6.031, com o seguinte resultado: “O Tribunal, por maioria, converteu o julgamento da medida cautelar em julgamento definitivo de mérito, conheceu da ação direta e, no mérito, julgou improcedente o pedido, para declarar constitucional o art. 8º da Lei n. 10.209/2001, nos termos do voto da Relatora, vencido o Ministro Gilmar Mendes. Não participou deste julgamento, por motivo de licença médica, o Ministro Celso de Mello. - Plenário, Sessão Virtual de 20.3.2020 a 26.3.2020”.

A ementa do julgamento é a que segue, verbis:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. REQUERIMENTO DE MEDIDA CAUTELAR. ART. 8º DA LEI N. 10.209/2001. PAGAMENTO ANTECIPADO DE VALE-PEDÁGIO NA CONTRATAÇÃO DE SERVIÇOS DE TRANSPORTE RODOVIÁRIO DE CARGAS. INDENIZAÇÃO AO TRANSPORTADOR, EM CASO DE DESCUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO PELO CONTRATANTE, EM VALOR VINCULADO AO FRETE CONTRATADO. ALEGADA OFENSA AO ART. 1º E AO INC. LIV DO ART. 5º DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. LEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM. LIMITES DE INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE COMO PARÂMETRO CONSTITUCIONAL DE CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DE ABUSO LEGISLATIVO. PRECEDENTES. INDENIZAÇÃO LEGAL QUE NÃO SE DEMONSTRA DESARRAZOADA. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE JULGADA IMPROCEDENTE.
1. Proposta de conversão de julgamento de medida cautelar em julgamento definitivo de mérito: não complexidade da questão de direito e instrução dos autos. Precedentes.
2. Legitimidade ativa ad causam da Confederação Nacional das Indústrias – CNI: existência de pertinência temática entre os objetivos institucionais e o conteúdo material do texto normativo impugnado. Precedentes.
3. A atividade legislativa sujeita-se à estrita observância de diretriz fundamental pela qual, havendo suporte teórico no princípio da proporcionalidade, vedam-se os excessos normativos e as prescrições irrazoáveis do Poder...

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