Acórdão nº 50193231420188210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quarta Câmara Cível, 29-06-2022

Data de Julgamento29 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50193231420188210001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Quarta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002064015
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

24ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5019323-14.2018.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Bancários

RELATOR: Desembargador ALTAIR DE LEMOS JÚNIOR

APELANTE: JORGE ALBERTO BENDER (AUTOR)

APELADO: ITAU UNIBANCO S.A. (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta por JORGE ALBERTO BENDER da sentença que julgou procedente a ação de exigir contas movida contra ITAU UNIBANCO S.A.

Eis o relatório da sentença (Evento 37):

JORGE ALBERTO BENDER ajuizou a presente Ação de Prestação de Contas contra ITAU UNIBANCO S.A., narrando que em janeiro de 1977 aplicou Cr$ 138.078,26 em seus fundos do Decreto-Lei n.° 157/67. Requereu o reconhecimento da obrigação da Ré prestar contas desde o início da relação contratual entre as partes.

Custas pagas.

Citado, o Réu contestou. Preliminarmente, alegou a inépcia da inicial. No mérito, discorreu sobre o fundo de investimento 157. Asseverou a prescrição.

Houve réplica.

Julgada procedente a primeira fase da ação (Ev. 3 - PROCJUDIC2, p. 46/50).

Negado provimento ao Agravo de Instrumento (Ev. 3 - PROCJUDC4, p. 1/12).

Prestadas contas pelo Réu, as quais foram impugnadas.

Nada mais, vieram para nova decisão.

É o relatório. Decido.

Assim constou no dispositivo:

Ante o exposto, com fulcro no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, ACOLHO AS CONTAS apresentadas pelo Réu.

Sem custas e honorários, tendo em vista já ter ocorrido sua fixação.

Havendo recurso(s) – excepcionados embargos de declaração – intime(m)-se, independentemente de conclusão (ato ordinatório – arts. 152, VI, CPC, e 567, XX da Consolidação Normativa Judicial), a(s) contraparte(s) para contrarrazões, remetendo-se em seguida os autos ao Tribunal de Justiça (art. 1010, § 3º, do CPC).

Em suas razões recursais, em síntese, a parte autora apontou a necessidade de inversão de ônus da prova. Relatou existência de aquisições de ações e debêntures. Postulou pela utilização do IBOVESPA para a constituição de saldo. Teceu comentários sobre o Fundo 157. Pugnou pelo acolhimento de critérios com a determinação de apuração em sede de liquidação de sentença. Pugnou pela condenação do réu ao pagamento de indenização por danos morais. Subsidiariamente, em caso de desacolhimento, postulou pela desconstituição de sentença (Evento 43).

Foram apresentadas contrarrazões (Evento 47).

Cumpridas as formalidades do artigo 931 e 934 do CPC.

É o relatório.

VOTO

ADMISSIBILIDADE

Apresentado o recurso dentro do prazo recursal previsto no artigo 1.003, § 5°, do CPC, e dispensado do preparo, em razão da AJG concedida ao autor. Presentes, portanto, os pressupostos de admissibilidade, recebo a apelação no duplo efeito.

RESTITUIÇÃO INTEGRAL DOS VALORES INVESTIDOS

A pretensão não merece ser acolhida.

Com efeito, o Decreto-Lei nº 157/67 facultava aos contribuintes, nos exercícios entre 1967 e 1983, pagar o imposto devido em cada exercício com redução prevista na legislação, desde que oferecessem soma equivalente a instituições financeiras, que deveriam investir tais valores "de acordo com a diversificação a que estão sujeitos os Fundos do Investimento, devendo ser aplicados, exclusivamente, na compra de ações ou debêntures conversíveis em ações das empresas a que se refere o artigo 7º dêste Decreto-lei".1

Conforme Resolução do Conselho Monetário Nacional nº 1023/85, os Fundos 157 foram transformados ou incorporados em Fundos Mútuos de Investimento em Ações, atuais fundos de investimento em ações, nos quais o investidor é detentor de um determinado número de cotas.

O investimentos de renda variável, como é o caso das aplicações em fundos de ações, podem dar lucro ou prejuízo, estando sujeitos às variações de cotação das ações que compõem a carteira de investimentos do fundo, além de existirem despesas, a exemplo da taxa de administração, sendo certo que não há relação entre a variação do valor das quotas e a correção monetária do período ou outros indicadores.

Assim, não procede a pretensão do autor de restituição integral do valor investido, com correção monetária e juros, pois não se trata de investimento de renda fixa, em que os juros são prefixados ou a remuneração é atrelada a indicadores de referência.

Desprovido, no ponto.

DO PEDIDO SUBSIDIÁRIO DE DESCONSTITUIÇÃO PARCIAL DA SENTENÇA

A ação de exigir contas possui procedimento próprio, no qual se busca garantir não àquele que teve seu interesse, bem ou direito administrado por outrem, o direito de obter as contas prestadas, podendo também ser proposta por quem tem o dever de prestá-las.

Para isso, o autor especificará, detalhadamente, as razões pelas quais exige as contas, nos termos do art. 550, §1º, do CPC e, após a apresentação de contestação pela parte demandada, o procedimento se desenvolverá em duas fases distintas.

Em um primeiro momento - primeira fase - verifica-se a existência de obrigação da prestação de contas pelo demandado e, posteriormente, sobrevindo sentença de procedência, passa-se à segunda fase, na qual se analisa se há crédito em favor da parte demandante.

No caso, da leitura dos autos principais, observa-se que já se está diante da segunda fase.

Especificamente em relação à inversão do ônus da prova, no caso dos autos, em que se trata de relação de consumo entre investidor e instituição financeira, aplica-se o Código de Defesa do Consumidor, sobretudo o art. 3º, §2º, que incluiu expressamente a atividade bancária no conceito de serviço, consoante se verifica:

Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

§ 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista. - grifei.

A aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor às instituições financeiras também é garantido pela doutrina e pela jurisprudência brasileira, restando, inclusive, sumulada pelo Superior Tribunal de Justiça na Súmula 297, in verbis:

Súmula 297: O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras. - grifei.

Quanto à presunção de veracidade preconizada no art. 400 do CPC, entendo cabível, no momento adequado e caso não apresentada a documentação com o valor investido, no prazo estabelecido, sua aplicação pelo Julgador de origem, uma vez que a negativa de exibição dos documentos necessários ao deslinde do feito acarretará a impossibilidade do agravante apresentar suas contas, a teor do preconizado no § 2º do art. 551 do CPC.

Entretanto, imprescindível o exame da verossimilhança dos valores referidos pela parte autora como investidos e de uma minima comprovação.

Nesse sentido, cito precedente de minha Relatoria:

APELAÇÕES CÍVEIS. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS. FUNDO 157. DA CONVERSÃO DA AÇÃO DE EXIGIR CONTAS EM FASE ÚNICA. DAS CONTAS PRESTADAS. DESCONSTITUIÇÃO DA SENTENÇA. CASO CONCRETO. CONFORME O ART. 550 DO CPC, A AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS É COMPOSTA POR DUAS FASES: NA PRIMEIRA, ANALISA-SE O DEVER DE PRESTAR CONTAS; NA SEGUNDA, SENDO DECLARADO O DEVER DE PRESTAR CONTAS SERÃO ELAS APRECIADAS E JULGADAS SE APRESENTADAS. NO CASO, MOSTRA-SE INCONTROVERSA A ADMINISTRAÇÃO PELA PARTE APELADA DOS VALORES INVESTIDOS PELA PARTE APELANTE NO FUNDO 157 E, CONSEQUENTEMENTE, SEU DEVER DE PRESTAR CONTAS EM RELAÇÃO A SUA GESTÃO, TENDO EM VISTA QUE É DIREITO DA PARTE AUTORA TER CONHECIMENTO DE POSSÍVEIS RENDIMENTOS RELATIVOS AOS SEUS INVESTIMENTOS. TODAVIA, A PARTE APELADA, NO PRAZO DA CONSTESTAÇÃO, APRESENTOU AS CONTAS, BASEANDO O SEU PARECER TÉCNICO EM QUATRO EXTRATOS DOS ANOS DE 1985, 1989, 1990 E 1991 (EVENTO 16 - OUTROS 10), NORMATIVAS DO FUNDO E E-MAILS (EVENTO 16 - OUTROS 11, 12, 13, 14 E 15) CONCLUINDO QUE A PARTE AUTORA TEM 0,00800 EM COTAS NO FUNDO ITAÚ BLUE (EVENTO 16 - OUTROS 16), O QUE IMPORTA NO VALOR LÍQUIDO DE R$ 0,62 CENTAVOS, SENDO O DOCUMENTO IMPUGNADO PELA PARTE CONTRÁRIA (EVENTO 22 - PETIÇÃO 1). A PARTE AUTORA PLEITEOU A COMPLEMENTAÇÃO DA DOCUMENTAÇÃO PELA PARTE DEMANDADA, BEM COMO A ANÁLISE DO PEDIDO DE INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA, MANIFESTANDO-SE NO SENTIDO DE QUE O PROCESSO NÃO ESTÁ PRONTO PARA JULGAMENTO. EMBORA O PEDIDO DA PARTE AUTORA, ENTENDEU O JUÍZO POR SENTENCIAR O FEITO, ACOLHENDO AS CONTAS APRESENTADAS PELO BANCO. OCORRE QUE DEIXOU O JUIZ DE ANALISAR A PETIÇÃO APRESENTADA PELO AUTOR, NA QUAL POSTULA A JUNTADA DE DOCUMENTOS QUE DEMONSTREM A EVOLUÇÃO DOS VALORES INVESTIDOS. ORA, CONFORME DISPOSTO NO ART. 550 DO CPC, §2º, EM SENDO APRESENTADAS AS CONTAS PELO RÉU, PROSSEGUIRÁ O FEITO PARA A PRODUÇÃO DAS PROVAS NECESSÁRIAS. PORTANTO, CONFIGURADO O CERCEAMENTO DE DEFESA, ALÉM DA INOBSERVÂNCIA DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. DESTA FORMA, CABE AFASTAR A DECLARAÇÃO DE CONTAS BOAS, DETERMINANDO O PROSSEGUIMENTO DO FEITO EM SEGUNDA FASE, UMA VEZ QUE RECONHECIDO O DEVER DE PRESTAÇÃO DE CONTAS PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. CUMPRE ESCLARECER, POR OPORTUNO, QUE NAS AÇÕES DE PRESTAÇÃO DE CONTAS DO FUNDO 157, EMBORA POSSÍVEL A INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA, NÃO É DADO À PARTE AUTORA CRIAR VALOR ALEATÓRIO E INVEROSSÍMIL, COMO SENDO ESSE O VALOR INICIAL INVESTIDO. CASO A PARTE AUTORA DISCORDE DO VALOR INICIAL INVESTIDO INFORMADO PELO BANCO, CABERÁ A ELA TRAZER AO PROCESSO COMPROVANTE DO VALOR QUE DIZ TER APLICADO. ISSO IMPEDE A SITUAÇÃO TERATOLÓGICA DE A PARTE AUTORA PODER AFIRMAR QUALQUER VALOR QUE QUISER, SEM A MÍNIMA COMPROVAÇÃO, COMO SENDO O QUE TEM A RECEBER. PORTANTO, DEVE SER DESCONSTITUÍDA A SENTENÇA, DETERMINANDO A ANÁLISE DOS...

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