Acórdão nº 50204346920198210010 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Criminal, 12-05-2023

Data de Julgamento12 Maio 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50204346920198210010
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003755820
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5020434-69.2019.8.21.0010/RS

TIPO DE AÇÃO: Furto (art. 155)

RELATORA: Desembargadora MARIA DE LOURDES GALVAO BRACCINI DE GONZALEZ

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

O Ministério Público ofereceu denúncia contra LUÍS FERNANDO DOS SANTOS DA SILVA, imputando-lhe as condutas subsumidas no artigo 180, caput, do Código Penal, pela prática do seguinte fato delituoso:

"No período compreendido entre os dias 18 de abril de 2017 e 08 de outubro de 2017, na Rua Ângelo Carniel, nº 476, Bairro Planalto, nesta Cidade, o denunciado Luis Fernando dos Santos da Silva recebeu e ocultou, em proveito próprio, coisa que sabia ser produto de crime de furto, consistente em um veículo Ford/F1000 S, de cor vermelha, ano/modelo 1993, chassi nº 9BFBTNM34PDB11213, placas IGL-7772, avaliado em R$ 24.627,00 (vinte e quatro mil seiscentos e vinte e sete reais), conforme auto de avaliação indireta da fl. 09 do inquérito policial, de propriedade da vítima Antoninho Turcatti.

Na oportunidade, o denunciado recebeu o veículo acima descrito, sabendo tratar-se de produto de crime de furto ocorrido no dia 18 de abril de 2017, conforme registro de ocorrência n.º 5343/2017/151008 (fl. 05). Ato contínuo, o denunciado passou a ocultar a caminhonete produto de crime na garagem de sua residência, quando, no dia 08 de outubro de 2017, ele foi preso em decorrência da prática de diversos delitos de organização criminosa, de extorsão e de receptação, ocasião em que os policiais apreenderam diversas peças de tal veículo, como para-lamas, caçamba, rodas, painel, vidros traseiros e eixos (relatórios das fls. 20 e 77-82).

Na mesma data, foi apreendido o aparelho de telefone celular do denunciado, o qual foi analisado pela autoridade policial, conforme autorização judicial - ação cautelar 2.17.0012701-0 (fl. 15 do IP), de onde se extraíram diversas fotografias da caminhonete, estacionada na garagem de sua residência, conforme fotografias das fls. 27-28 e relatório de investigações das fls. 77-82."

Citado (fl. 13 OUT9 evento 2), o acusado apresentou resposta à acusação por intermédio da Defensoria Pública (OUT10 - evento 2).

Encerrada a instrução, os debates orais foram substituídos por memoriais.

O Ministério Público requereu a procedência da ação penal, condenando-se o réu nos termos da denúncia . Na primeira fase da dosimetria da pena, buscou sejam valorados negativamente, a título de personalidade voltada à prática delitiva, os demais processos criminais a que o réu responde. Ainda, as circunstâncias do crime deverão ser valoradas negativamente, já que, ao que tudo indica, o réu fazia de sua casa um desmanche de veículos, havendo fortes indicativos inclusive da aplicação da causa de aumento do §1º do artigo 180 do Código Penal. Referiu que em função do tempo decorrido entre o fato e a presente data, entende dispensável aditamento à denúncia neste momento processual. Por fim, considerando que não há informação quanto à devolução das peças do veículo objeto do processo, requereu seja oficiado ao DETRAN/RS, para que informe se os bens se encontram recolhidos em algum dos seus depósitos e, em caso positivo, seja notificada a vítima para se manifestar sobre o interesse na restituição (evento 44).

Já a defesa, por sua vez, postulou, preliminarmente, pelo reconhecimento da litispendência e extinção do feito. No mérito, afirmou que não há suporte para condenação, porque não comprovado o recebimento do bem e o elemento subjetivo do tipo (dolo), pugnando pela absolvição com fulcro no artigo 386, incisos III ou VII, do Código de Processo Penal. Alternativamente, a desclassificação para a forma culposa (evento 47).

Sobreveio sentença, julgando procedente a denúncia, para condenar o réu LUÍS FERNANDO DOS SANTOS DA SILVA como incurso nas sanções do art. 180, caput, do Código Penal, às penas de 02 (dois) anos de reclusão, em regime semiaberto, bem como ao pagamento de multa de 30 (trinta) dias-multa, à razão de um trigésimo do salário mínimo vigente à época do fato.

Irresignado com a sentença, o réu apelou através da Defensoria Pública ( Evento 55, APELAÇÃO1).

Em suas razões recursais, a defesa do acusado arguiu, em preliminar, litispendência entre o presente processo e os processos 010/2.17.0018381-5 e 010/2.17.0015144-1 (Evento 36) por identidade dos fatos imputados, não reconhecida pelo juiz em sentença.

Salientou que como se observa das denúncias do evento n. 36, o réu já respondeu a processo, com referência aos objetos localizados no interior do seu estabelecimento no dia 08/10/2017. Em que pese se possa argumentar que a receptação da F 1000 não foi objeto daquela denúncia, o certo é que o réu respondeu pelo delito de receptação de vários objetos, sendo caracterizada a conduta como crime único, de acordo com àquela denúncia em questão.

Destacou que a própria denúncia do presente feito (evento n. 01) faz referência à ocorrência (n. 5343/2017/1510008) que deu ensejo à apreensão dos objetos na garagem do réu, qual originou o outro processo.

Segundo a defesa, assim, como o próprio Ministério Público tratou a apreensão de vários objetos de procedência ilícita na garagem do réu como crime único, não pode o réu ser responsabilidade por novo fato decorrente da receptação.

Asseverou ser certo que o mesmo fato (receptação de coisas subtraídas, no dias 08 de outubro de 2017) foi atribuída ao réu em dois processos diferentes, indevidamente e, embora se trata de receptação de outro objeto, a apreensão das coisas ocorreu no mesmo contexto fático que deu origem à outra denúncia, razão pela qual imprescindível a decretação da extinção do presente feito em face da litispendência, sob pena de se configurar flagrante bis in idem.

Quanto ao mérito, sustentou não haver suporte probatório para a condenação do acusado pelo delito de receptação conforme descreve a sentença, destacando que em Juízo, o réu declarou que as peças automotivas que foram apreendidas na sua residência eram de outro carro, que não aquele indicado na denúncia. Referiu que na sua residência existiam duas garagens e a apreensão ocorreu em uma que era alugada por um terceiro. Disse que foi apreendida uma caçamba de metal que era de uma caminhonete sua. Ainda, referiu que o telefone apreendido não era seu.

Aduziu que para a configuração do delito de receptação, era necessário que a acusação demonstrasse satisfatoriamente a prática dos verbos nucleares do tipo constantes na denúncia, isto é, ter o acusado “recebido” o objeto subtraído e, concomitantemente, que “soubesse” se tratar de produto de crime, não havendo prova judicializada a autorizar a condenação do réu, incidindo, no caso, a regra do artigo 155 do CPP.

Disse que em nenhum momento da instrução processual ficou claro que o réu tinha conhecimento inequívoco de que o veículo tinha origem ilícita e, quando se trata de crime de furto ou roubo, efetivamente, incumbiria ao acusado justificar a posse dos objetos. Ao revés, tratando-se de crime de receptação dolosa, como na espécie, compete à acusação comprovar o recebimento (do bem) e o elemento subjetivo do tipo penal (dolo).

Pugnou pelo provimento do recurso, com a reforma da sentença para absolver o réu. Subsidiariamente, requereu o redimensionamento da pena base, a alteração do regime inicial de fixação da pena, a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, a redução da pena de multa e, por fim, a concessão de AJG (Evento 73, PET1).

Em suas contrarrazões, o Ministério Público rebateu as articulações expendidas pela Defensoria Pública em suas razões recursais, postulando pelo improvimento do apelo (Evento 77, CONTRAZAP1).

Subiram os autos a esta Corte, sendo distribuídos a esta Relatora.

Neste grau de jurisdição, dada vista ao Ministério Público, veio aos autos parecer no sentido do improvimento do apelo (7.1).

É o relatório.

VOTO

Trata-se de apelação crime interposta por LUÍS FERNANDO DOS SANTOS DA SILVA, através da Defensoria Pública, em face da sentença que julgou procedente a denúncia, para condená-lo como incurso nas sanções do art. 180, caput, do Código Penal, às penas de 02 (dois) anos de reclusão, em regime semiaberto, bem como ao pagamento de multa de 30 (trinta) dias-multa, à razão de um trigésimo do salário mínimo vigente à época do fato.

PRELIMINAR DE LITISPENDÊNCIA

A defesa do acusado arguiu, em preliminar, litispendência entre o presente processo e os processos 010/2.17.0018381-5 e 010/2.17.0015144-1 (Evento 36) por identidade dos fatos imputados, não reconhecida pelo juiz em sentença.

Não merece acolhida a preliminar. Como bem destacado pelo Magistrado singular, "...o fato ora em análise não está abarcado nas denúncias acostadas ao evento 36. Conforme se observa, a apreensão decorrente do Registro Policial nº 29084/2017/151003 originou mais de uma ação penal, sem, contudo, compreender o presente."

Atente-se que o fato descrito na denúncia (receptação de um veículo Ford/F1000 S, de cor vermelha, ano/modelo 1993, chassi nº 9BFBTNM34PDB11213, placas IGL-7772, avaliado em R$ 24.627,00 (vinte e quatro mil seiscentos e vinte e sete reais), não constou nas três denúncias acostadas pela defesa do ora apelante no evento 36.

Rejeito, pois, a preliminar suscitada.

MÉRITO

A materialidade e autoria do delito restou consubstanciada pelo Registro de Ocorrência nº 2117/2018/151003 (fls. 4-6 INQ3 - evento 2), Registro de Ocorrência nº 5343/2017/151029 (fls. 8-9 INQ3 - evento 2), da Consulta de Veículo (fls. 11-12 INQ3 - evento 2), do Auto de Avaliação Indireta (fl. 15 INQ3 - evento 2), do Registro de Ocorrência nº 29084/2017/151029 (fls. 18-22 INQ3 - evento 2), do Relatório (fls. 27 a 61...

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