Acórdão nº 50220120220168210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Cível, 30-03-2022

Data de Julgamento30 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50220120220168210001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuinta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001926218
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5022012-02.2016.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Fornecimento de medicamentos

RELATOR: Desembargador JORGE LUIZ LOPES DO CANTO

APELANTE: SUCESSÃO DE HERNO GONÇALVES DE CAMPOS (Sucessão) (AUTOR)

ADVOGADO: GUILHERME WURTH SIMON (OAB RS080731)

APELANTE: UNIMED PORTO ALEGRE - COOPERATIVA MEDICA LTDA (RÉU)

ADVOGADO: JÚLIO CESAR GOULART LANES (OAB RS046648)

APELADO: OS MESMOS

INTERESSADO: BRUNO NAIBERT DE CAMPOS (Sucessor)

ADVOGADO: GUILHERME WURTH SIMON

INTERESSADO: MARLISE PEREIRA DE OLIVEIRA (Sucessor)

ADVOGADO: GUILHERME WURTH SIMON

RELATÓRIO

SUCESSÃO DE HERNO GONÇALVES DE CAMPOS e UNIMED PORTO ALEGRE - COOPERATIVA MÉDICA LTDA interpuseram apelação contra a sentença proferida nos autos da ação de obrigação de fazer movida pelo primeiro.

Na decisão atacada, os pedidos foram julgados nos seguintes termos:

Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos para: [1] tornar definitiva a liminar, e, quanto ao ponto, reconhecer a perda do objeto em razão do óbito, e CONDENAR a ré a reembolsar os valores gastos com base nos documentos juntados na inicial, além dos gastos no curso do processo (que serão aferidos em liquidação de sentença), tão somente em relação aos medicamentos Depakote e Escitalopram, com correção monetária pelo IGPM desde cada desembolso e juros legais desde a citação, e [2] CONDENAR a ré ao pagamento de R$10.000,00, a título de danos morais, o qual deverá ser corrigido monetariamente pelo IGP-M, a partir da data da publicação desta sentença (Súmula nº 362 do STJ), acrescido de juros de mora a partir da citação. Condeno o decaimento recíproco, condeno a ré ao pagamento de 90% das custas processuais e honorários advocatícios aos procuradores dos autores, que fixo em 12% da condenação, nos termos do §2º do art. 85 do Código de Processo Civil. Condeno, ainda, a parte autora ao pagamento das custas restantes e honorários advocatícios, que fixo em R$350,00, nos termos do §8º, do art. 85 do CPC. Suspensa a exigibilidade da sucumbência pela parte autora em razão da gratuidade judiciária.

Em suas razões recursais, a parte ré sustentou a ausência de cobertura obrigatória para os medicamentos requeridos, pois ministrados em domicílio, havendo expressa exclusão contratual deste tipo de cobertura.

Argumentou que, conforme as bulas dos medicamentos Oxalato de Escitalopram e Depakote, ambos não são indicados para o tratamento da doença do autor.

Referiu que a mera negativa de cobertura não enseja dano moral, razão pela qual pleiteou o afastamento da condenação a este título, ou, eventualmente, a redução do montante fixado.

Requereu o julgamento de improcedência do pedido.

Já a parte autora, em suas razões de recurso adesivo, pleiteou, em suma: a concessão do benefício da gratuidade de justiça; que seja considerado o reembolso de todos os medicamentos utilizados no tratamento do câncer do falecido autor, segundo o relatório e as prescrições dos médicos assistentes nos autos; o afastamento do decaimento em relação ao pedido de itens de higiene pessoal por não ter sido requerido na inicial da ação.

Por fim, a parte postulante pleiteou a condenação da ré ao pagamento da multa pecuniária no valor de R$ 100.000,00 ou, alternativamente, ao pagamento do valor de R$ 60.000,00, bem como a majoração dos honorários advocatícios fixados no primeiro grau de jurisdição.

Contra-arrazoados os recursos, os autos foram remetidos a esta Colenda Corte de Justiça.

A parte autora foi intimada quanto à preliminar de não conhecimento do recurso suscitada nas contrarrazões, bem como para comprovar a necessidade da gratuidade de justiça, ou efetuar o pagamento das custas, considerando o pedido de gratuidade efetivado pelos herdeiros do autor, em recurso adesivo.

Diante disso, foi efetuado o pagamento do preparo pela parte autora.

É o relatório.

VOTO

Admissibilidade e objeto dos recursos

Eminentes colegas, o recurso intentado objetiva a reforma da decisão de primeiro grau, versando a causa sobre contrato de plano de saúde.

Os pressupostos processuais foram atendidos, utilizados os recursos cabíveis, há interesse e legitimidade para recorrer, são tempestivos e foram devidamente preparados, inexistindo fato impeditivo do direito recursal noticiado nos autos.

Assim, verificados os pressupostos legais, conheço dos recursos intentados para o exame das questões suscitadas.

Salienta-se que resta prejudicado o pedido de concessão de gratuidade judiciária efetivado pela sucessão do autor, tendo em vista que, intimados para comprovar a necessidade de concessão do benefício, foi efetuado o preparo do recurso, demonstrando a desistência tácita do pleito formulado pelos autores.

Mérito do recurso em exame

Preambularmente, é preciso consignar que os planos ou seguros de saúde estão submetidos às disposições do Código de Defesa do Consumidor, enquanto relação de consumo atinente ao mercado de prestação de serviços médicos.

Aliás, sobre o tema em discussão o STJ editou a súmula n. 608, dispondo esta que: aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de autogestão.

Ademais, entendo aplicável ao caso em tela o disposto no art. 47 do Código de Defesa do Consumidor, no que concerne à interpretação de forma mais favorável à parte autora quanto às cláusulas do contrato do plano de saúde avençado, levando-se em conta a relação de consumo entre as partes.

No caso em análise, busca a parte autora a cobertura pela ré de tratamento oncológico com os medicamentos Dekapote e Escitalopran, bem como de qualquer outro medicamento prescrito pelos médicos assistentes que diga respeito ao tratamento do câncer, em razão de quadro de neoplasia maligna de encéfalo (CID C71.9). Pretende, ainda, a condenação da ré ao reembolso dos valores gastos com medicamentos negados no valor de R$ 4.644,23, bem como ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 15.000,00.

Com efeito, são aplicáveis ao caso em exame as exigências mínimas previstas no plano-referência de que trata os artigos 10 e 12 da legislação dos planos de saúde.

Assim, nos termos do art. 12, inciso I, “c”, da legislação dos planos de saúde, é vedada a exclusão da cobertura securitária de tratamentos antineoplásicos domiciliares de uso oral, incluindo medicamentos para o controle de efeitos adversos relacionados ao tratamento e adjuvantes.

Ainda, o inciso II, “g” do dispositivo precitado prevê a obrigatoriedade da cobertura para tratamentos antineoplásicos ambulatoriais e domiciliares de uso oral, procedimentos radioterápicos para tratamento de câncer e hemoterapia, na qualidade de procedimentos cuja necessidade esteja relacionada à continuidade da assistência prestada em âmbito de internação hospitalar.

Ademais, cumpre salientar que o rol de procedimentos publicado pela ANS constitui apenas uma referência básica de coberturas obrigatórias nos planos privados de assistência à saúde

Outrossim, impende destacar que as diretrizes de utilização estabelecidas pela ANS servem como orientação, não sendo taxativas, de modo que deve ser observada a prescrição do médico assistente da parte autora, porquanto compete exclusivamente a ele a escolha pelo tratamento que entende mais adequado para sua paciente.

No ponto em discussão, cumpre salientar que, em que pese a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça tenha firmado o posicionamento jurídico no sentido de que o rol de procedimentos e eventos em saúde da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) é taxativo, o entendimento não restou pacificado no âmbito da Corte Superior, inclusive pelo fato de que a Terceira Turma do Tribunal Superior precitada tem posicionamento jurídico diverso, no sentido de que o rol supracitado é meramente exemplificativo.

Por conseguinte, deve prevalecer no caso o posicionamento jurídico que vem sendo adotado por esta Corte, no sentido de que o rol é meramente exemplificativo, conforme julgados que seguem:

APELAÇÃO CÍVEL. PLANOS DE SAÚDE. AÇÃO DE RESSARCIMENTO. MEDICAMENTO. REGORAFENIBE (STIVARGA). TRATAMENTO DE ADENOCARCINOMA DE CÓLON. NEGATIVA DE COBERTURA. DESCABIMENTO. COBERTURA DEVIDA. O plano de saúde pode estabelecer as doenças que terão cobertura, não lhes cabendo limitar o tipo de tratamento que será prescrito, pois tal incumbência é do profissional que assiste o paciente, a quem compete avaliar os riscos e benefícios do tratamento e indicar a alternativa mais adequada (STJ, Resp nº 668.216-SP, j. 15.03.2007). O rol de procedimentos previsto nas normas da ANS não é taxativo, traduzindo somente um referencial de coberturas básicas para os planos de saúde. Precedentes do TJRS. A ANS não veda o uso off label de um medicamento com registro na ANVISA e comercialização nacional, o que não se confunde com tratamento experimental a que alude o art. 10 da Lei 9.656/98. Precedente do STJ. No caso dos autos, o laudo médico e a prescrição atestam que a autora foi diagnosticada com “Adenocarcinoma de Cólon estágio IV (CID C18.9), necessitando fazer uso da substância Regorafenibe (nome comercial Stivarga), o qual está registrado na ANVISA sob o número 170560108. Cobertura devida. Sentença mantida no ponto. DANO MORAL. NÃO CONFIGURAÇÃO. DESCABIMENTO. Não havendo comprovação adequada dos danos morais alegadamente experimentados, afigura-se descabida a indenização pleiteada. Redimensionamento da sucumbência. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. UNÂNIME.(Apelação Cível, Nº 70083936955, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Denise Oliveira Cezar, Julgado em: 30-04-2020)

APELAÇÕES CÍVEIS. SEGUROS. PLANO DE SAÚDE. PRELIMINAR CONTRARRECURSAL DE INOVAÇÃO RECURSAL SUSCITADA PELA PARTE RÉ ACOLHIDA. REJEITADA A PRELIMINAR RECURSAL...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT