Acórdão nº 50223145520218210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Criminal, 29-06-2022

Data de Julgamento29 Junho 2022
ÓrgãoOitava Câmara Criminal
Classe processualApelação
Número do processo50223145520218210001
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002070114
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

8ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5022314-55.2021.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Furto (art. 155)

RELATOR: Desembargador LEANDRO FIGUEIRA MARTINS

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

O MINISTÉRIO PÚBLICO ofereceu denúncia contra CIRON GONÇALVES ALVES, afirmando estar incurso nas sanções do artigo 155, caput, do Código Penal (CP), pela prática do seguinte fato descrito na peça inicial (processo 5022314-55.2021.8.21.0001/RS, Evento 1, DENUNCIA1):

"No dia 14 de fevereiro de 2021, por volta das 15h25min, na Avenida Assis Brasil, nº 164, bairro São João, nesta Capital, no interior do estabelecimento comercial Bourbon Shopping Assis Brasil, o denunciado, CIRON GONÇALVES ALVES, subtraiu, para si, 01 (uma) garrafa pet de óleo de máquina, 01 (uma) garrafa de óleo de máquina marca Texaco e diversos fios de cobre, com cor predominante preta, tudo pertencente à pessoa jurídica Condomínio Bourbon Shopping Assis Brasil, inscrita no CNPJ sob o nº 03.177.993/0001-60.

Ao agir, o denunciado deslocou-se até o estabelecimento comercial e, por circunstâncias não esclarecidas, entrou no interior do depósito localizado no estacionamento do estabelecimento comercial. Utilizando-se de diversas ferramentas de corte, tais como alicates, facas e tesouras (objetos apreendidos, conforme Auto de Apreensão), o denunciado cortou os fios de cobre que compunham a estrutura do local, apoderando-se dos bens, além de duas garrafas de óleo utilizado para a manutenção das máquinas do local.

Em decorrência de seguranças privados terem visto objetos de corte e também um vulto no depósito do estabecimento, acionaram a Brigada Militar, que compareceu ao local e logrou êxito em deter o denunciado na posse dos bens. Ainda, constatou-se a existência de mandado de prisão expedido em desfavor do acusado pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina (nº 0006126.93.2012.8.24.0069.01.0003-00), conduziram o denunciado até a autoridade policial para lavratura do auto de prisão em flagrante.

Os bens foram apreendidos e restituídos à empresa vítima".

Recebida a denúncia em 04/03/2021 (processo 5022314-55.2021.8.21.0001/RS, Evento 3, DESPADEC1) e produzida a prova, a pretensão, nos seguintes termos, foi julgada procedente (processo 5022314-55.2021.8.21.0001/RS, Evento 64, SENT1):

"Pelo exposto, JULGO PROCEDENTE a ação penal, para CONDENAR o réu CIRON GONCALVES ALVES, já qualificado, como incurso nas sanções do artigo 155, caput, do Código Penal.

Passo à dosimetria da pena.

O réu é plenamente culpável. Os antecedentes serão analisados na próxima fase de aplicação da pena. A conduta social considera-se neutra. Não há dados para analisar a personalidade. As circunstâncias são normais para a espécie. Nas consequências deve-se considerar que o réu praticou danos ao cometer os furtos, o que justifica certo incremento na pena-base. A vítima em nada contribuiu para prática do crime. Dito isso, fixo a pena-base em um (01) ano e seis (06) meses de reclusão. Presente a agravante da reincidência, aumento a pena em seis (06) meses, ficando a pena provisória fixada em dois (02) anos de reclusão, a qual vai definitizada nesse patamar na ausência de outras modificadoras (majorantes e minorantes).

O regime inicial vai fixado no semiaberto, em razão da reincidência. Não há detração a operar.

O local de cumprimento deverá ser definido pela VEC.

Diante da reincidência, deixo de substituir a pena e de aplicar sursis.

A pena de multa vai fixada em dez (10) dias-multa, no valor unitário de 1/30 do salário mínimo cada dia-multa, considerando a falta de efetividade desse tipo de pena, fixando-se no mínimo previsto em lei por se tratar de imposição legal, não podendo o juiz deixar de aplicá-la.

Custas pelo condenado, suspensa a exigibilidade em razão de estar assistido pela DPE, donde presumo carência econômica, indo deferida a AJG.

O réu poderá apelar em liberdade, pois respondeu ao processo nessa condição".

O réu, via Defensoria Pública, ingressou com apelação (processo 5022314-55.2021.8.21.0001/RS, Evento 71, APELAÇÃO1 e processo 5022314-55.2021.8.21.0001/RS, evento 77, PET1), sustentando, em síntese, que (processo 5022314-55.2021.8.21.0001/RS, Evento 86, RAZAPELA1): (a) "a prova produzida no processo não autoriza decreto condenatório", uma vez que "em desfavor do RECORRENTE há somente a palavra da vítima (vigia do estabelecimento), quem sequer viu atitudes do acusado ali dentro, só presenciando o mesmo quando abordado pela PM, não estando lastreada por demais provas ou testemunhas do ocorrido" (fl. 5); (b) era caso de reconhecimento do crime impossível, porquanto "havia eficaz vigilância humana e, para obter êxito na empreitada delitiva, o RECORRENTE ainda teria que se utilizar de uma corda para sair do local, ficando evidenciada a absoluta ineficácia do meio empregado, pois, não conseguiria se evadir e consumar o delito em comento" (fl. 8); (c) incidia o princípio da insignificância, na medida que "a res furtiva restou integralmente apreendida e restituída", sendo que "os bens subtraídos sequer foram avaliados indiretamente" (fl. 10); (d) "Conforme a prova oral colhida em juízo, o acusado foi pego logo após a separação de fios de cobre e de duas garrafas de óleo, ainda dentro do estabelecimento do ofendido, sem que houvesse a inversão da posse da rés delitiva, bem como sem que os bens saíssem do domínio do ofendido, elemento essencial para a caracterização da agressão ao bem jurídico tutelado", de modo que "não houve a consumação do delito ora em julgamento, tratando-se de meros atos preparatórios, ou seja, impuníveis" (fl. 16); (e) "considerando que o acusado apenas teria iniciado o iter criminis (atos preparatórios), com a ausência da inversão da posse (abandonou os produtos no interior do galpão), bem como diante da restituição integral da res, a defesa entende que a pena merece a redução pertinente em seu patamar máximo, ou seja, 2/3" (fl. 16); (f) deveria acontecer o afastamento da valoração negativa do vetor consequências do crime, "pois não houve comprovação de dano e, por conseguinte, ausente comprovação de eventuais prejuízos à empresa vítima" (fl. 17), com redução da basilar para o patamar mínimo legal à espécie; (g) "para cada circunstância judicial valorada negativamente, o aumento deveria ser de 1/8, conforme entendimento fixado pela doutrina e jurisprudência" (fls. 17/18), de modo que deveria ser "reduzido o quantum de elevação para 1/8 da pena, em respeito ao princípio da proporcionalidade" (fl. 18); (h) a agravante da reincidência tinha de ser desconsiderada, sob pena de "violação ao princípio do non bis in idem" (fl. 18); (i) o regime inicial a ser fixado era o aberto, visto que "não há impeditivo de que o condenado, mesmo reincidente, venha a cumprir a pena no regime compatível com a dosimetria aplicada pela observância da proporcionalidade na aplicação da pena" (fl. 19); (j) a aplicação da pena de multa era injusta para "indivíduos sabidamente pobres, como é o caso do réu/recorrente, que não tem condições econômicas para arcar com a pena pecuniária aplicada sem afetar a sua própria subsistência e a de sua família" (fl. 20). Assim, ao final, pediu o provimento do recurso e a absolvição ou, subsidiariamente, o redimensionamento da pena-base, o reconhecimento da tentativa, com redução da pena em grau máximo, o afastamento da agravante da reincidência, a fixação do regime inicial aberto e a não aplicação da pena de multa.

Houve intimação do acusado acerca da sentença (processo 5022314-55.2021.8.21.0001/RS, Evento 73, CERTGM1).

O Ministério Público, em contrarrazões, postulou o não provimento do recurso (processo 5022314-55.2021.8.21.0001/RS, Evento 89, CONTRAZAP1).

Nesta instância recursal, a Procuradoria de Justiça lançou parecer (processo 5022314-55.2021.8.21.0001/TJRS, Evento 6, PARECER1).

É o relatório.

VOTO

Conheço do recurso de apelação, porquanto atendidos os requisitos previstos no artigo 593 do Código de Processo Penal (CPP), notadamente em função do conteúdo da Súmula n. 705 do Supremo Tribunal Federal (STF):

"A renúncia do réu ao direito de apelação, manifestada sem a assistência do defensor, não impede o conhecimento da apelação por este interposta".

Assim, sem efetiva relevância o pronunciamento certificado pelo Oficial de Justiça no processo 5022314-55.2021.8.21.0001/RS, Evento 73, CERTGM1.

1. Manutenção da Sentença Condenatória

A materialidade do delito ficou estampada pela prova oral e pelos seguintes documentos do Inquérito Policial: (1) Auto de Prisão em Flagrante (processo 5015483-88.2021.8.21.0001/RS, Evento 1, P_FLAGRANTE1, fl. 12); (2) Termos de Declarações (processo 5015483-88.2021.8.21.0001/RS, Evento 1, P_FLAGRANTE1, fls. 14/17); (3) Boletim de Ocorrência Policial (processo 5015483-88.2021.8.21.0001/RS, Evento 1, P_FLAGRANTE1, fls. 20/24); (4) Auto de Apreensão (processo 5015483-88.2021.8.21.0001/RS, Evento 1, P_FLAGRANTE1, fls. 25/26); (5) Auto de Restituição (processo 5015483-88.2021.8.21.0001/RS, Evento 1, P_FLAGRANTE1, fl. 27).

A autoria, a seu turno, também ficou delineada pela prova oral, cuja transcrição contida na sentença reproduzo abaixo, a fim de evitar desnecessária repetição (processo 5022314-55.2021.8.21.0001/RS, Evento 64, SENT1), acrescentando que o réu "utilizou seu direito ao silêncio" (processo 5022314-55.2021.8.21.0001/RS, Evento 55, TERMOAUD1):

"Segundo o policial Cassio, foram acionados para ocorrência de furto de fios no Bourbon Shopping Assis Brasil. O responsável pelo local informou que havia um indivíduo "preso" no depósito, local onde estava furtando os fios. O réu portava uma mochila com ferramentas (alicate, chave Philips e uma corda utilizada para entrar...

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