Acórdão nº 50227335420218210008 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Sétima Câmara Cível, 23-11-2022

Data de Julgamento23 Novembro 2022
ÓrgãoDécima Sétima Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50227335420218210008
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002819795
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

17ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5022733-54.2021.8.21.0008/RS

TIPO DE AÇÃO: Promessa de Compra e Venda

RELATORA: Desembargadora ROSANA BROGLIO GARBIN

APELANTE: CAPA INCOORADORA IMOBILIARIA PORTO ALEGRE III SPE LTDA (RÉU)

APELADO: RODRIGO CHAVES CARDOSO (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por CAPA INCOORADORA IMOBILIARIA PORTO ALEGRE III SPE LTDA da sentença em que, apreciando "ação de rescisão de contrato" ajuizada por RODRIGO CHAVES CARDOSO, a Magistrada a quo julgou procedente a pretensão autoral (evento 49, SENT1).

Constou do dispositivo sentencial:

"(...)

Isto posto, JULGO PROCEDENTE a presente Ação de Rescisão de Contrato ajuizada por Rodrigo Chaves Cardoso contra Capa Incorporadora Imobiliária Porto Alegre III SPE Ltda, partes já qualificadas, para:

a) DECRETAR a rescisão do contrato celebrado entre as partes;

b) CONDENAR a requerida à devolução, para o autor, dos valores por eles comprovadamente pagos. Tais quantias deverão ser corrigidas, pelo INCC-M, a contar da data dos respectivos desembolsos, acrescidos de juros legais, desde a citação, sendo que a restituição deve ser imediata, em uma única só parcela;

c) CONDENAR a ré ao pagamento da multa convencional no montante corresponde a 20% das quantias pagas a título de preço do imóvel;

d) CONDENAR a demandada ao pagamento mensal, a título de pena convencional, do montante equivalente a 0,5% (zero vírgula cinco por cento) sobre os valores pagos pelo autor, em razão do presente contrato, devidamente atualizados, até a data da entrega da(s) unidade(s) autônoma(s) compromissada(s)/conclusão da obra;

e) CONDENAR a requerida ao pagamento de indenização por danos morais, no montante de R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Tal importância deverá sofrer a incidência de juros de mora de 1% ao mês a contar do evento danoso (data em que expirado o prazo para a entrega do imóvel), nos termos da Súmula 54 do STJ apenas até a data do presente julgamento, a partir de quando incidirá exclusivamente a taxa SELIC, que engloba juros e correção monetária (esta – taxa selic - devida a contar do arbitramento, na forma da Súmula nº 362 do STJ).

f) CONDENAR a demandada ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios dos procuradores da parte adversa, os quais fixo em 10% sobre o valor atualizado da condenação, forte no art. 85, § 2º, do CPC.

(...)"

Em suas razões (evento 62, APELAÇÃO1), suscita a demandada, prefacialmente, a existência de sentença extra/ultra petita, sob o argumento de que a exordial não teria requerido a aplicação de pena convencional de 2% sobre o valor pago. No mérito, aduz a incorporadora que o interesse acerca da rescisão contratual é exclusivamente da vontade da parte autora, e que a prorrogação da conclusão da construção se deu por motivos alheios à construtora ré. Refere que a obra restou embargada pelo período de 11 meses, embargo que, sustenta, ter sido reconhecido com indevido, tanto que sobreveio decisão da 18ª Vara do Trabalho de Porto Alegre, determinando o imediato levantamento da interdição realizada. Tergiversa sobre a crise financeira e sanitária dos últimos anos, destacando os decretos do poder público que deram azo a paralisações e falta de insumos. Defende a necessidade de reconhecimento de excludente de responsabilidade, chamando atenção para a existência de cláusula prevendo a prorrogação do prazo ajustado por motivos de caso fortuito ou força maior. Em caso de rescisão contratual, requer seja observada a retenção de 20% sobre os valores adimplidos, bem como seja a devolução de quantias pagas na forma parcelada. Sustenta existência de entendimento jurisprudencial recente no sentido de que o marco inicial dos juros moratórios deve ser da data do trânsito em julgado (REsp 1.740.911/DF). Diz que não pode ser aplicada penalidade de rescisão cumulada com a multa contratual, pois configurará bis in idem. Sustenta não estarem presentes os requisitos dirigidos ao reconhecimento do dever de indenizar, sob o argumento de que a parte demandante não demonstrou ter suportado qualquer dano; subsidiariamente, pugna pela redução do quantum arbitrado a título de danos morais. Ainda, pleiteia que, caso não invertida a sucumbência pelo acolhimento das inconformidades recursais, seja observada a parcial procedência da ação, com revisão da distribuição dos ônus sucumbenciais. Pugna, ao final, o provimento do recurso.

Foram ofertadas contrarrazões (evento 65, CONTRAZ1), nas quais a parte autora assevera, em relação à preliminar de apelo, que "a apelante se utilizou de um equívoco de digitação do apelado para se utilizar do argumento de que a sentença fora ultra petita, sendo que na realidade no decorrer de toda a inicial o apelado aduz inúmeras vezes sobre sua insatisfação e requer a aplicação equânime da multa contratual de 20% contra a apelante".

Remetidos a esta Corte, vieram os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço da apelação, passando ao exame das insurgências.

Consta da exordial terem as partes firmado instrumento particular de compra e venda, em 25 de abril de 2015, para aquisição com entrega futura da unidade nº 201, localizada na torre C e do box de estacionamento nº 100-C, do empreendimento Life Park Colors, pelo preço ajustado de R$ 272.975,37, cujo prazo de conclusão da obra estava previsto para 30/11/2019, além de 180 dias de tolerância (evento 1, CONTR3).

Conta a parte autora que, pactuado o negócio e adimplidas regularmente as obrigações assumidas pela postulante, houve atraso na entrega da unidade, o que ensejou o manejo da ação com pretensão de resolução do contrato; a condenação da requerida à restituição das quantias já adimplidas, acrescidas "da penalidade de 0,5% por mês de atraso" e com "aplicação da multa injusta que refere o contrato, de apenas 2% em favor do autor, bem como custas e honorários advocatícios"; além da reparação de danos morais.

A demanda foi julgada procedente; pronunciamento judicial contra o qual a demandada interpõe o presente apelo, nos termos acima relatados.

DA ALEGAÇÃO DE SENTENÇA ULTRA PETITA

Suscita a parte requerida, preliminarmente, a existência de nulidade no decisum recorrido, porque a penalidade cuja aplicação restou requerida na inicial pela parte autora teria sido a pena convencional de 2% (e não 20%).

Compulsando a sentença guerreada, verifica-se que houve o julgamento do mérito da ação, com alusão à rescisão do contrato sub judice, nos seguintes termos:

"(...)

Isto posto, JULGO PROCEDENTE a presente Ação de Rescisão de Contrato ajuizada por Rodrigo Chaves Cardoso contra Capa Incorporadora Imobiliária Porto Alegre III SPE Ltda, partes já qualificadas, para:

a) DECRETAR a rescisão do contrato celebrado entre as partes;

b) CONDENAR a requerida à devolução, para o autor, dos valores por eles comprovadamente pagos. Tais quantias deverão ser corrigidas, pelo INCC-M, a contar da data dos respectivos desembolsos, acrescidos de juros legais, desde a citação, sendo que a restituição deve ser imediata, em uma única só parcela;

c) CONDENAR a ré ao pagamento da multa convencional no montante corresponde a 20% das quantias pagas a título de preço do imóvel;

d) CONDENAR a demandada ao pagamento mensal, a título de pena convencional, do montante equivalente a 0,5% (zero vírgula cinco por cento) sobre os valores pagos pelo autor, em razão do presente contrato, devidamente atualizados, até a data da entrega da(s) unidade(s) autônoma(s) compromissada(s)/conclusão da obra;

e) CONDENAR a requerida ao pagamento de indenização por danos morais, no montante de R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Tal importância deverá sofrer a incidência de juros de mora de 1% ao mês a contar do evento danoso (data em que expirado o prazo para a entrega do imóvel), nos termos da Súmula 54 do STJ apenas até a data do presente julgamento, a partir de quando incidirá exclusivamente a taxa SELIC, que engloba juros e correção monetária (esta – taxa selic - devida a contar do arbitramento, na forma da Súmula nº 362 do STJ).

f) CONDENAR a demandada ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios dos procuradores da parte adversa, os quais fixo em 10% sobre o valor atualizado da condenação, forte no art. 85, § 2º, do CPC.

(...)"

Ocorre que, malgrado tente o demandante - em contrarrazões - afastar a existência de vício no provimento apelado, da atenta leitura da peça inaugural, observa-se que não há qualquer pedido ou manifestação versando acerca da "pagamento da multa convencional no montante corresponde a 20% das quantias pagas a título de preço do imóvel".

Embora tenha havido menção, na inicial, à verificação de cláusulas contratuais que ostentam flagrante desequilíbrio entre as partes (tendo sido usado como exemplo a que previa o desconto de 20% em favor da vendedora em caso de rescisão da avença por culpa do comprador), o pedido do ora recorrido limitou-se à penalidade de 0,5% por mês de atraso e à multa de 2% em favor do autor.

- Vide fls. 5/6 de evento 1, INIC1:

Tal, inclusive, é corroborado pela conta da condenação que acompanha a peça pórtica ( evento 1, CALC2, evento 1, CALC5 e evento 1, EXTR6 ), que não computou qualquer valor correspondente a 20% dos pagamentos feitos.

- Pedido da inicial (fl. 8 de evento 1, INIC1):

- Conta do valor pleiteado (evento 1, CALC5):

A Magistrada singular, contudo, procedeu na condenação da demandada ao adimplemento de 20% sobre as quantias pagas, tendo, no entanto, ido além do postulado, acolhendo insurgência não objeto da peça inicial da demandante. Destarte, resta flagrante a prolação de sentença ultra petita.

Tratando-se, pois, de decisão ultra...

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