Acórdão nº 50231405220198210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Oitava Câmara Cível, 26-05-2022

Data de Julgamento26 Maio 2022
ÓrgãoDécima Oitava Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50231405220198210001
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001786017
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

18ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5023140-52.2019.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Promessa de Compra e Venda

RELATOR: Desembargador JOAO MORENO POMAR

APELANTE: CHRISTIANE NUNES DE FREITAS (AUTOR)

APELANTE: MARCELO MACHADO SOARES (AUTOR)

APELADO: L3 EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA (RÉU)

APELADO: SPREADSUL FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITORIOS NAO PADRONIZADOS - NP (RÉU)

RELATÓRIO

CHRISTIANE NUNES DE FREITAS (AUTOR) e MARCELO MACHADO SOARES (AUTOR) apelam da sentença proferida nos autos da ação que movem em face de L3 EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA (RÉU) e SPREADSUL FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITÓRIOS NAO PADRONIZADOS - NP (RÉU), assim lavrada:

Vistos, etc.
1.Cuida-se de apreciar ação ordinária ajuizada por MARCELO MACHADO SOARES e CHRISTIANE NUNES FREITAS contra SPREADSUL FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITÓRIOS NÃO PADRONIZADOS - NP e L3 EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA., regularmente processada.

Suma do pedido do autor: seja, após o deferimento de tutela cautelar antecedente consubstanciada em interlocutória de sustação de protesto, julgada procedente a ação para a “decretação da nulidade dos títulos de crédito” e condenação das requeridas ao pagamento de dez mil reais “a título de indenização por danos imateriais” – dado que em fevereiro de 2015 o autor celebrou com a primeira ré contrato de promessa de compra e venda de bem imóvel, contrato que em 2018 foi novado pelas partes em razão de as partes ora requeridas “não disporem de ativos para conclusão da incorporação”, e em face de protesto(s) o autor está surpreso porque a duplicata emitida pela primeira ré “não tem razão de ser, pois é fundada em dívida inexistente, seja pela quitação dos créditos por novação, seja pelas irregularidades formais sob as quais nenhum título de crédito poderia ser emitido”, tendo o autor encaminhado notificação à segunda requerida, que providenciou contra-notificação, a despeito de ser “notória a inexigibilidade da dívida”.

Suma da resposta da segunda ré: os autores não são merecedores de AJG; a contestante opera com aquisição de títulos de crédito, “desde que comprovado o lastro em vendas ou prestação de serviços”, e realizou duas operações de desconto de títulos de crédito com a empresa L3, em junho de 2015, entre os quais duplicatas sacadas contra os autores, títulos dentre os quais vários “foram devidamente pagos”, o que torna sem verossimilhança a alegação dos autores de “desconhecer a aludida cessão”; os títulos encaminhados a protesto o foram em razão da inadimplência; somente três anos depois da cessão os autores notificaram a ré; a cláusula 8ª do aditivo faz referência a pendências junto a factoring, estabelecendo que eventual pagamento de tais pendências ensejaria abatimento no saldo devedor; a cessão foi anterior ao aditivo contratual, dela os autores tinham ciência e “é nulo qualquer valor renegociado que não diretamente com esta contestante”, de modo que com razão a requerida “se opôs a efetivar a baixa dos protestos mediante a contra-notificação extrajudicial”; verifica-se a “inoponibilidade das exceções pessoais” assim como o “direito de regresso da segunda requerida”.

Relatados, decido.
2. Em que pese o fato de que ambas as partes requerem depoimentos pessoais, dispenso e indefiro a produção de tal prova, sob a consideração de sua inutilidade, pois depoimento pessoal tem por escopo a obtenção de confissão, a qual se torna desnecessária na espécie em função de que o exame da documentação presente nos autos, à luz da análise de questões de direito, afigura-se suficiente para a formação segura de convencimento por parte deste juízo, ao qual compete indeferir a produção de provas que se mostrem inúteis ou protelatórias.
Ocorre que a pretensão dos autores, em que pesem os longos arrazoados e invocação de jurisprudência inaplicável (bastando citar o caso de ementas invocadas, relativas a endosso-mandato, o que não é o caso dos autos), esbarra na questão temporal (anterioridade da cessão de crédito em relação ao aditivo contratual em que teria havido novação), na falta de participação da ré no aditivo e em princípios constitucionais, como será visto.

Com efeito.
A cessão de créditos à ré ocorreu em 2016 e o aditivo contratual é de 2018, sem participação da ré, o que de per si evidencia a inviabilidade da pretendida “decretação da nulidade dos títulos”, pois se a própria lei não retroage, por princípio constitucional, menos ainda pode retroagir o pacto privado, de que não participou a ré, para a qual o aditivo representa res inter alios acta, que não pode atingir o ato jurídico perfeito precedente e o direito adquirido pela ré por meio da cessão operada cerca de dois anos antes da assinatura do aditivo.

Os autores tinham ciência da cessão, já que a mesma é mencionada expressamente no aditivo, mais exatamente na cláusula 8ª, assim redigida:

“Cláusula 8ª . As pendências em nome dos PROMISSÁRIOS existente em factoring pela cessão dos créditos pelas PROMITENTES, serão resolvidas pelo jurídico da INTERVENIENTE ANUENTE, e na eventualidade de pagamento a factoring, os valores serão descontados do saldo devedor do valor R$ 601.103,01 acordado neste termo, respeitando as condições aqui apresentadas para o pagamento, não havendo nenhum acréscimo de valor aos promissários. Para isso os PROMISSÁRIOS, como condição para resolução, deverão conceder procuração para o advogado da INTERVENIENTE ANUENTE.”

A redação da mencionada cláusula, como se vê, e independentemente de definir-se se houve ou não novação, ressalvou expressamente e reconheceu o direito da cessionária, ora requerida, que não participou da avença, como dito, e cujo crédito diante dos autores restou preservado e ressalvado expressamente no próprio aditivo, reiterando-se que o pactuado no aditivo só vinculou os signatários daquele pacto e que eventual descumprimento de ajustes por parte dos que ali se obrigaram a esta ou aquela conduta não afeta os direitos da ré, constituídos anteriormente por força de cessão havida dois anos antes, elementos que se me afiguram suficiente para concluir, com segurança, pela improcedência da presente demanda.
3. Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE a presente AÇÃO e condeno a parte autora ao pagamento das custas e honorários advocatícios estes arbitrados em 10% do valor atribuído à causa, sucumbência entretanto com exigibilidade declarada suspensa nos moldes da Lei nº 1.060/50 (AJG).
Registrar e intimar.

A decisão foi alvo de embargos de declaração:

Acolho os embargos da parte ré para suprir a omissão quanto ao pedido de AJG, embora sem infringente, pois rejeito a impugnação na medida em que, a despeito do valor do negócio imobiliário, na casa dos seiscentos mil reais, os requerentes se tornaram inadimplentes ao que parece e embora o indício de suficiência econômica até seja forte a própria inadimplência parece infirmá-lo em certa medida, o que enseja situação de dúvida, no mínimo, a ser solvida em favor da parte, ante a presunção que se deve admitir em relação a pessoa física, como destacado na resposta dos embargos apresentada pelos autores.
No tocante aos embargos da parte autora, vale primeiramente consignar que os mesmos alegam: (a) omissão da sentença no tocante à revelia da ré ….
; (b) omissão da sentença no tocante a aplicação do CDC à espécie; (c) obscuridade da sentença no tocante a jurisprudência sobre endosso-mandato; (d) omissão da sentença no tocante a título constante da relação de “quitados” e em face de “confissão não acolhida”; (e) omissão da sentença no tocante a alegação de “título frio, sem lastro”; (f) omissão da sentença no que tange a títulos sem aceite; (g) contradição da sentença em relação à ciência inequívoca da demandada acerca de títulos frios/sem lastro.
Ocorre que, como se colhe da sentença, a ação foi julgada improcedente com base na análise dos documentos e sob a consideração de que deveria ser rejeitado o pedido de decretação de nulidade dos títulos impugnados, porque: (a) o contrato foi celebrado pelos autores com a empresa L3 em 2015; (b) o aditivo, que os autores chamam de novação, foi firmado em 2018…;(c) houve, no aditivo, expressa ressalva quanto aos títulos cedidos ou endossados, com previsão de que eventuais pagamentos destes ensejariam compensação no saldo devedor do contrato.

Tendo em vista os fundamentos da sentença, apontados acima, os embargos dos autores devem ser rejeitados.

Primeiro, porque a revelia da ré L3 afigura-se irrelevante e sem potencial para modificar a sentença, na medida inclusive em que se verifica entre dita empresa, cedente, e a cessionária Spread, litisconsórcio passivo necessário, a determinar a necessidade de decisão uniforme para todas as partes no tocante à alegada nulidade dos títulos.

Segundo, porque os fundamentos da sentença justificam por si sós a conclusão, e não são afetados, nem na prática e nem em tese, por questões como discussão genérica de aplicabilidade do CDC, jurisprudência sobre endosso mandato, etc..

Terceiro, porque salvo equívoco, não constam da inicial alegações específicas acerca de relação de títulos quitados, alegação de título frio, sem lastro, pois ao reexaminar a inicial pode-se verificar que o pedido de decretação de nulidade tem como causa de pedir a alegação de que houve protesto de títulos que “não tem razão de ser, pois é fundado em dívida inexistente, seja pela quitação dos créditos pela novação, seja pelas irregularidades formais” - quando, como já dito antes, não houve quitação mas ao contrário no aditivo há ressalva dos créditos de fatorizadoras, em operações nas quais evidentemente a construtora buscava recursos para dar andamento a obra, além do que na inicial não parece ter a parte autora indicado as supostas
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