Acórdão nº 50232816620228210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Terceira Câmara Cível, 30-06-2022
Data de Julgamento | 30 Junho 2022 |
Tribunal de Origem | Tribunal de Justiça do RS |
Classe processual | Apelação |
Número do processo | 50232816620228210001 |
Tipo de documento | Acórdão |
Órgão | Décima Terceira Câmara Cível |
PODER JUDICIÁRIO
Documento:20002177463
13ª Câmara Cível
Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906
Apelação Cível Nº 5023281-66.2022.8.21.0001/RS
TIPO DE AÇÃO: Alienação fiduciária
RELATORA: Desembargadora ELISABETE CORREA HOEVELER
APELANTE: OMNI S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO (RÉU)
APELADO: ROGERIO ARISTIMUNDO CHANCAS (AUTOR)
RELATÓRIO
Trata-se de apelação cível interposta por OMNI S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos da ação revisional que lhe move ROGERIO ARISTIMUNDO CHANCAS. Referido decisum (evento 20) teve o dispositivo assim redigido:
Assim, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a ação revisional ajuizada por ROGERIO ARISTIMUNDO CHANCAS contra OMNI S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO, para:
1) determinar a revisão do(s) contrato(s) objeto(s) dos autos para:
- limitar os juros remuneratórios à taxa média de mercado, para o mês da contratação, permitida a capitalização, na forma da fundamentação.
2) descaracterizar a mora, razão pela qual o bem deve ficar na posse da parte autora e seu nome não deve ser negativado, ao menos enquanto não apurado o valor efetivamente devido;
3) condenar a parte ré a compensar o débito com o crédito da parte autora decorrente desta revisão, corrigindo-se monetariamente cada pagamento a maior pelo IGP-M, com juros moratórios de 1% ao mês desde a citação e, remanescendo saldo credor em favor da parte autora, os valores deverão ser restituídos, na forma simples, com a mesma forma de atualização monetária e juros determinados na compensação;
4) rejeitar os demais pedidos, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil.
Condeno cada uma das partes ao pagamento de 50% das custas processuais, além de honorários advocatícios ao procurador da parte contrária, os quais fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa. Suspensa a exigibilidade da parte autora em tendo havido o deferimento da AJG.
Nas suas razões de apelação (evento 27) a parte ré alegou que não há falar em excessividade quanto aos juros remuneratórios praticados. Rechaçou a compensação de valores e a repetição do indébito. Prequestionou matéria legal. Postulou o provimento do recurso.
A parte autora apresentou contrarrazões ao evento 28.
Subiram os autos à Corte.
Vieram conclusos.
VOTO
Atendidos os requisitos de admissibilidade, recebo o presente recurso.
DO CONTRATO
Cuida-se da Cédula de Crédito Bancário n.101149000001618, garantida por cláusula de alienação fiduciária, firmada pelas partes em 08 de janeiro de 2018 (CONTRA5- evento 16).
JUROS REMUNERATÓRIOS
Os juros remuneratórios são devidos como compensação ao mutuante pela disposição do dinheiro ao mutuário, sendo lícita a sua incidência. A discussão, pois, diz respeito ao limite de tais juros e sua abusividade, ou não.
O Sistema Financeiro Nacional (SFN) tem como regra a não aplicação das restrições da Lei da Usura (Decreto nº 22.626 de 1933), em se tratando de instituições financeiras, não as sujeitando, pois, à limitação dos juros remuneratórios. Ademais, o §3º do artigo 192 da Constituição Federal, que dispunha sobre a limitação dos juros, foi revogado pela Emenda Constitucional nº 40, de 29/05/2003.
A jurisprudência, com o tempo, encaminhou-se, maciçamente, pela livre pactuação, com restrições pontuais em casos de prova inarredável de abusividade (Resp nº 915.572/RS). Nesse sentido a Súmula n. 382 do Superior Tribunal de Justiça:
“A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade”.
E mais recentemente, o REsp nº 1.061.530/RS - julgado de acordo com o rito dos recursos repetitivos - consolidou o posicionamento no sentido de que a taxa de juros remuneratórios somente se caracteriza como abusiva quando significativamente destoante da média do mercado, apurada pelo Banco Central do Brasil (BACEN) à época da contratação.
Na sedimentação sobre o critério a ser adotado, por seu turno, também indicou o egrégio tribunal superior que a análise deve ocorrer de forma casuística.
Assim aquilatadas as diretrizes supra, entendo que no caso dos autos afiguram-se abusivos os juros remuneratórios pactuados (55,19% ao ano – CONTRA5- evento 16), porquanto ultrapassam o dobro da taxa média de mercado estabelecida pelo BACEN para a data da contratação (22,74%a.a.1, em janeiro/2018), critério esse que vem sendo amplamente aceito pelo Superior Tribunal de Justiça.
Mantenho, portanto, no caso concreto, a taxa de juros remuneratórios à média de mercado (22,74% ao ano) conforme definido em sentença.
COMPENSAÇÃO DE CRÉDITOS E REPETIÇÃO DO INDÉBITO
De plano, vale ressaltar o cabimento da compensação de créditos e débitos líquidos e recíprocos entre as partes, quando reconhecida a ilegalidade de cláusulas contratuais e não estando quitado o contrato. Apurando-se valores pagos a maior em determinadas rubricas e havendo ainda saldo devedor por parte do consumidor, deverá ocorrer a devida compensação, na forma do artigo 368 do Código Civil.
Na hipótese de estar quitado o contrato, por sua vez, devem ser repetidos, na forma simples (dada a ausência de má-fé nas cobranças), os valores pagos a maior pelo consumidor. Na esteira de consolidada jurisprudência desta Corte, a importância a ser devolvida deverá ser corrigida monetariamente pelo IGP-M desde cada desembolso do consumidor, com aplicação de juros legais de 1% ao mês desde a citação. Sobre o ponto, ainda vale referir não ser caso de aplicação da Taxa Selic à reposição moratória. Ocorre que a análise conjunta dos artigos 406 do Código Civil e 161, §1º, do Código Tributário Nacional indica o percentual a ser aplicado aos juros moratórios, enquanto o IGP-M atua como índice à recomposição inflacionária.
Diga-se, por oportuno, que a possibilidade de compensação/repetição de valores na ação revisional, independentemente de demonstração de pagamentos por erro, é entendimento consolidado pelo egrégio Superior Tribunal de Justiça. Nesta senda o Recurso Especial paradigma n.º1.388.972/SC, julgado sob o rito dos artigos 1.036 e seguintes do Código de Processo Civil:
“RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA - ARTIGO 1036 E SEGUINTES DO CPC/2015 - AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATOS BANCÁRIOS - PROCEDÊNCIA DA DEMANDA ANTE A ABUSIVIDADE DE COBRANÇA DE ENCARGOS - INSURGÊNCIA DA CASA BANCÁRIA VOLTADA À...
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