Acórdão nº 50238097120208210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Cível, 29-06-2022

Data de Julgamento29 Junho 2022
ÓrgãoQuinta Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50238097120208210001
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002298571
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5023809-71.2020.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Seguro

RELATORA: Desembargadora LUSMARY FATIMA TURELLY DA SILVA

APELANTE: SINDIFISCO NACIONAL - SINDICATO NACIONAL DOS AUDITORES-FISCAIS DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL (AUTOR)

APELADO: CLAUDIA MARIA GOLDMAN (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por SINDIFISCO NACIONAL - SINDICATO NACIONAL DOS AUDITORES-FISCAIS DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL, nos autos desta ação de cobrança que move em face de CLAUDIA MARIA GOLDMAN, contra a sentença referente ao Evento 54 do processo originário que julgou procedente a ação de cobrança e procedente a reconvenção.

Adoto o relatório da r. sentença, que bem narrou o presente caso:

SINDIFISCO NACIONAL - SINDICATO NACIONAL DOS AUDITORES-FISCAIS DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL ajuizou ação de cobrança em face de CLÁUDIA MARIA GOLDMAN, dizendo que na condição de entidade sindical sem fins lucrativos criou a Unafisco Saúde, operadora de plano de saúde na modalidade de auto-gestão, que oferece planos coletivos para a prestação de serviços médico-hospitalares a associados, dependentes e pensionistas. E que na qualidade de associada a ré aderira ao denominado Unafisco Soft. No entanto, deixara de adimplir parcelas que totalizavam a quantia atualizada de R$ 5.143,24 sendo excluída do plano, conforme a cláusula XVI, alínea ‘e’, que estabeleceu que o beneficiário que tiver atraso no pagamento de mensalidade por período superior a 60 (sessenta) dias referentes às contribuições e/ou valores devidos ao SINDIFISCO NACIONAL, perderá essa condição. Por essa razão, decorridos mais de 60 (sessenta) dias da inadimplência, ela fora excluída. Disse ter tentado realizar a cobrança por meio de cartas, notificações, e-mails e telefonemas, não obtendo êxito. Assim, e com fundamento nos artigos 394 e 397 do Código Civil, pretende a condenação da ré ao pagamento da obrigação inadimplida, devidamente atualizada e acrescida de juros de mora. Juntou documentos e manifestou expresso desinteresse na audiência de conciliação (evento 1).

Citada, a ré apresentou contestação e reconvenção, confirmando a adesão ao plano de saúde denominado Unafisco Saúde Soft, porém discordando do montante cobrado, aduzindo excesso, e sustentando a nulidade de sua exclusão, por ausência de notificação. Disse que embora a pretensão do autor abarque as mensalidades correspondentes aos meses de julho a dezembro de 2019, a notificação supostamente a ela encaminhada menciona apenas os débitos referentes aos meses 08, 09, 10 e 11/2019, pelo que deve ser afastada a cobrança da parcela pertinente ao mês de julho de 2019. Sustentou que a forma de pagamento convencionada se daria por meio de desconto em folha, que não ocorreu, não podendo ser por isso responsabilizada, nem pelos juros decorrentes de eventual mora. Asseverou, também, que os valores lançados no cálculo que instruiu a inicial estão em desacordo com a avença, que previa uma mensalidade de R$ 743,51, pelo que o valor nominal do débito em dezembro de 2020 seria de R$ 3.717,55. Insurgiu-se contra sua exclusão do plano, porque descumprida a cláusula que prevê a necessidade de notificação prévia, quando o inadimplemento for superior a 60 dias. Por fim, disse não ter condições de efetuar o pagamento de todas as parcelas em uma única vez, razão pela qual propôs o adimplemento de R$ 3.717,55, em dez parcelas de R$371,76. Caso não acolhida a proposta, pediu a improcedência da ação e, em Reconvenção, seja declarada a ilegalidade de sua exclusão e determinada a sua readmissão.

O autor replicou e em resposta à reconvenção observou que a ré confessa os débitos relativos aos meses de agosto, setembro, outubro e novembro de 2019, propondo o parcelamento. Defendeu ser devida a parcela atinente ao mês de julho de 2019 porque ajustado que a primeira mensalidade deveria ser quitada por meio de boleto e as demais mediante desconto em folha. Contudo, a ré, ao contrário do que afirma, não autorizou os descontos, o que ensejou automaticamente a emissão dos boletos. Referiu que ao tempo da notificação expedida ela ainda não havia sido excluída do plano, pelo que houve o faturamento do mês de dezembro, tendo sido foi excluída apenas em janeiro de 2020. Assim, defendeu terem sido observadas as diretrizes do contrato, pois a ré fora devidamente notificada sobre o inadimplemento, por notificação encaminhada ao endereço em que foi citada e que constou no instrumento de mandato por ela conferido. Rejeitou a proposta de acordo e reiterou os argumentos de validade da exclusão do plano. Pediu a procedência da ação de cobrança e a improcedência da Reconvenção (evento 36).

Não havendo provas a produzir, o autor pediu o julgamento imediato (evento 48) e a demandada reiterou a proposta de acordo. Caso não aceita, requereu fosse determinada a prova da entrega da notificação, com possibilidade de recurso, conforme prevê o Termo de Adesão (evento 49).

E o dispositivo sentencial foi exarado nos seguintes termos:

ISSO POSTO, JULGO PROCEDENTE A AÇÃO proposta pelo SINDIFISCO NACIONAL - SINDICATO NACIONAL DOS AUDITORES-FISCAIS DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL em face de CLÁUDIA MARIA GOLDMAN, condenando à ré/reconvinte ao pagamento dos valores relativos às mensalidades do plano Unafisco Soft vencidas entre julho e novembro de 2019, a serem corrigidas pelo IGP-M a contar de cada vencimento e acrescidas de juros de mora de 1% ao mês e multa de 2%, nos termos do contrato.

Outrossim, JULGO PROCEDENTE a reconvenção, para reconhecer a ilicitude da exclusão da autora e determinar sua readmissão no plano, ficando o autor autorizado à cobrança dos valores vencidos posteriormente, embora condicionado um novo cancelamento à notificação da contratante, na forma da lei.

A demandada arcará com as custas da ação e honorários advocatícios aos patronos do autor, que, a teor do parágrafo 8º do art. 85 do CPC, fixo em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação.

A seu turno, o reconvindo pagará as custas da reconvenção e honorários advocatícios aos procuradores da reconvinte que, seguindo as mesmas diretrizes, arbitro em R$1.000,00 (um mil reais).

Opostos embargos de declaração pela ré, os quais restaram acolhidos (Evento 72 do processo originário), nos seguintes termos:

Vistos.

Reconheço a obscuridade no dispositivo sentencial (evento 57) e, modo a aclarar o julgado, explicito que reconhecida a ilicitude da exclusão da autora do plano e permitida a sua readmissão, a cobrança autorizada dos valores vencidos posteriormente refere-se às mensalidades que vencerem após ao seu reingresso.

Isso posto, acolho os embargos de declaração opostos pela parte autora (evento 61), nos termos acima.

Em suas razões recursais (Evento 78 do processo originário), a parte autora, por primeiro, discorre acerca da sua personalidade jurídica, apontando que se trata de operadora de plano de saúde de autogestão, sem fins lucrativos e sob sistema mutualista. Aduz que a ré, na condição de beneficiária do plano de saúde, deixou de adimplir mensalidades do plano de saúde, totalizando a quantia de R$ 5.1343,24 em aberto. Pontua que é incontroversa a dívida relativa à mensalidade de dezembro/2019, admitida pela demandada em seu valor nominal de R$ 743,51. Defende a licitude da exclusão da ré do plano de saúde. Sustenta que o cancelamento da avença ocorreu por culpa única e exclusiva da demandada. Refere que houve a notificação acerca do inadimplemento enviada para o mesmo endereço no qual a ré foi citada. Pondera que não há se falar em aplicação da inversão do ônus da prova, alegando que cabia à demandada demonstrar que a notificação não foi recebida. Assevera que, em se tratando de contrato coletivo, a questão deve ser analisada à luz das disposições contratuais, citando o art. 17 da Resolução Normativa 195/2009 da ANS. Aponta que o art. 13, parágrafo único, da Lei 9.656/98 aplica-se somente a planos individuais. Sinala que não há definição de padrão de notificação no regulamento do plano coletivo, aduzindo ser certo e inequívoco o recebimento da comunicação pela beneficiária. Requer o provimento do recurso.

Sobrevieram contrarrazões (Evento 83 do processo originário).

Vieram os autos conclusos para julgamento.

Tendo em vista a adoção do sistema informatizado, os procedimentos previstos nos artigos 931, 932 e 934 do Código de Processo Civil foram simplificados, porém cumpridos na sua integralidade.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

O recurso da parte autora é de ser conhecido, porquanto preenchidos os pressupostos de sua admissibilidade, sendo tempestivo e estando comprovado o recolhimento do preparo (Evento 78, COMP2, do processo originário).

Inicialmente, cumpre referir que não há mais dúvida quanto à aplicação do Código de Defesa do Consumidor aos contratos de seguros e de planos de saúde, exceto nos planos denominados de autogestão, nos termos da Súmula 608 do e.STJ, como é o caso.

Não obstante, tal exclusão de incidência não afasta a aplicação dos ditames gerais do direito contratual, principalmente a interpretação mais favorável ao aderente, a necessidade de observância da boa-fé (subjetiva e objetiva) e da função social do contrato.

Assim leciona o Código Civil:

Art. 421. A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato.

Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.

Art. 423. Quando houver no contrato de...

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