Acórdão nº 50239079520168210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quarta Câmara Cível, 27-04-2022

Data de Julgamento27 Abril 2022
ÓrgãoVigésima Quarta Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50239079520168210001
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001251632
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

24ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5023907-95.2016.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Cartão de Crédito

RELATOR: Desembargador FERNANDO FLORES CABRAL JUNIOR

APELANTE: CLAUDEMIR DOS SANTOS GAUDENCIO (AUTOR)

APELADO: HSBC BANK BRASIL - SA - BANCO MÚLTIPLO (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por CLAUDEMIR DOS SANTOS GAUDÊNCIO em face da sentença prolatada nos autos da ação de revisão de cláusulas contratuais proposta em face do BANCO HSBC S.A., sucedido pelo BANCO BRADESCO S.A.. Constou na sentença apelada (fls. 72/74):

“Diante do exposto, julgo improcedente o pedido, condenando a autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios que arbitro, considerando o trabalho efetuado, em R$ 1.000,00, forte no art. 85, §8º, do CPC, suspensa sua exigibilidade nos termos da Lei n.º 1.060/50.

Transitada em julgado e nada sendo requerido, arquive-se com baixa.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se”

Em suas razões recursais (fls. 76/83), a parte autora salienta a abusividade dos juros remuneratórios pactuados e da cobrança da capitalização. Enfatiza que são notórias as ilegalidades existentes em todos os contratos bancários. Requer a limitação dos juros remuneratórios. Assevera que não pode ser prejudicado em razão da falta de lisura da parte demandada. Alega que devem ser revisadas e desconstituídas todas as cláusulas que regem a relação entabulada com a instituição bancária. Destaca a necessidade de limitação da multa contratual e de vedação da cobrança de comissão de permanência. Refere a possibilidade de repetição em dobro do indébito ou, pelo menos, de repetição na forma simples. Pugna pela inversão do ônus da prova e pela descaracterização da mora. Colaciona julgados em abono a sua pretensão. Requer, ao final, o provimento do apelo e, por conseguinte, a inversão dos ônus sucumbenciais, com a majoração da verba honorária.

Foram apresentadas contrarrazões (fls. 85/91).

É o relatório.

VOTO

A presente apelação, interposta nas fls. 76/83, é tempestiva, pois o prazo para a parte autora recorrer da sentença iniciou em 20/10/2020 (fl. 75), sendo o recurso interposto em 29/10/2020 (fl. 76). Além disso, resta a parte autora dispensada do preparo, porquanto litiga sob o pálio da gratuidade judiciária (fl. 28).

Dessa forma, considerando que é própria e tempestiva, recebo a apelação.

Adianto que deve ser declarada a nulidade da sentença, de ofício.

Com efeito, conforme se depreende do art. 330, §2º, do CPC, cumpre à parte autora indicar de forma precisa, na inicial, quais contratos/operações pretende revisar, indicando as cláusulas que entende abusivas, bem como quantificando o valor incontroverso, sob pena de inépcia da inicial. Vejamos.

Art. 330. A petição inicial será indeferida quanto:

I – for inepta;

[...]

§ 2º Nas ações que tenham por objeto a revisão de obrigação decorrente de empréstimo, de financiamento ou de alienação de bens, o autor terá de, sob pena de inépcia, discriminar na petição inicial, dentre as obrigações contratuais, aquelas que pretende controverter, além de quantificar o valor incontroverso do débito.

§ 3º Na hipótese do § 2º, o valor incontroverso deverá continuar a ser pago no tempo e modo contratados. (grifei)

As determinações do diploma têm por intuito evitar o ajuizamento de ações genéricas, razão pela qual, o pedido deve ser certo e determinado, sendo atribuição da parte autora apontar com clareza e objetividade sua insurgência.

Acerca do tema, esclarecem Teresa Arruda Alvim Wambier, Maria Lúcia Lins Conceição, Leonardo Ferres da Silva Ribeiro e Rogério Licastro Torres de Mello1:

“[...] Entretanto, houve um equívoco cometido nos primeiros tempos de aplicação do Código de Defesa do Consumidor: o de se pressupor estar diante de um contrato com cláusulas necessariamente abusivas, tão somente pela desigualdade das posições das partes, na formação do contrato de adesão. Talvez, por essa razão, em muitas dessas ações em que o autor se dizia hipossuficiente, obtinha liminarmente a suspensão de certas cláusulas contratuais. Essas liminares foram concedidas, não raras vezes, em razão do simples ingresso em juízo para discussão do contrato de adesão celebrado, como decorrência de uma espécie de presunção de que o contrato, por ser de adesão, conteria cláusulas abusivas. 4.5. Muitas dessas ações foram ajuizadas sem um mínimo de fundamento fático ou jurídico, no intuito exclusivo de protelar o cumprimento de obrigações contratuais, sendo evidente a má-fé (processual e contratual) por parte desses autores. Não é difícil prever o impacto negativo dessa prática, em todo o sistema de captação de recursos e, em última análise, para próprio tomador de crédito, diante da elevação do custo da intermediação financeira e consequente redução da oferta do crédito. 4.6. O histórico de leis e decisões para combater esta situação começou em 2004 (Lei 10.931/2004, tendo havido inúmeras decisões relevantes e acabou por desembocar na inclusão de dispositivo de igual conteúdo no CPC/73). 4.7. A decretação da inépcia da petição inicial dessas ações destituídas de fundamento jurídico, com pedido genérico,17 já era a solução prevista pelo sistema jurídico, nos termos dos arts. 286 e 295, parágrafo único, ambos do CPC/73, ou seja, mesmo antes da inclusão do art. 285-B do CPC/73. Assim, ao invés de, indevidamente, se relegar a análise da fundamentação mínima do pedido do autor para a instrução processual, as ações devem ser extintas ab initio, por inépcia da inicial, desde que, tendo-se dado ao autor a oportunidade de emendar a petição inicial (art. 321 do NCPC), não fosse atendido o comando judicial.18 4.8. Além dessas regras processuais, a conduta dos autores de má-fé já poderia, e pode, ser devidamente afastada, pela aplicação do princípio da boa-fé, que orienta todas essas normas processuais e rege os contratos.” (grifei)

Ressalto que o valor incontroverso não pode ser aleatório, devendo ser demonstrado mediante memória de cálculo, discriminando os contratos e os valores efetivamente recebidos em cada operação na qual se busca a revisão, com a incidência dos encargos legais embasados nas súmulas e jurisprudência do STJ.

Cito precedentes desta Câmara, em casos análogos:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATOS DE CARTÃO DE CRÉDITO. Em se tratando de ação revisional cabe à parte autora, além de indicar as cláusulas que pretende revisar, obrigatoriamente, quantificar o valor incontroverso, a teor do art. 330, § 2º, do CPC. Tal...

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