Acórdão nº 50241117120188210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quarta Câmara Criminal, 11-08-2022

Data de Julgamento11 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50241117120188210001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002230774
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

4ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5024111-71.2018.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Adulteração de sinal identificador de veículo automotor (art. 311)

RELATOR: Desembargador NEWTON BRASIL DE LEAO

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (AUTOR)

APELANTE: BRADESCO AUTO/RE CIA DE SEGUROS REP. POR ADRIANA COUTINHO GOULART (ASSISTENTE DE ACUSAÇÃO)

APELADO: CARLOS DE JESUS CEPA (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

1. O Ministério Público ofereceu denúncia em desfavor de Carlos de Jesus Cepa pela suposta prática dos delitos previstos nos artigos 311 caput e 171 §2º inciso V, c/c o artigo 69 do Código Penal, pela suposta prática de fatos assim narrados na inicial acusatória:

"FATOS DELITUOSOS:

1.º FATO – FRAUDE PARA RECEBIMENTO DE INDENIZAÇÃO OU VALOR DE SEGURO (ART. 171, § 2.º, INCISO V, DO CÓDIGO PENAL).

No período de 16 de janeiro de 2015 (data da Ocorrência n.º 100317/2015/830) a 17 de novembro de 2015 (data da liquidação do sinistro), em horários e endereços diversos de Porto Alegre e Capão da Canoa, o denunciado CARLOS DE JESUS CEPA ocultou coisa própria, com o intuito de haver indenização ou valor de seguro junto a BRADESCO AUTO/RE CIA DE SEGUROS, empresa do GRUPO BRADESCO SEGUROS.

Para dar causa à instauração do Processo Administrativo n.º 2136379 pela BRADESCO AUTO/RE CIA DE SEGUROS e, assim, obter o pagamento de indenização referente à Apólice 654.990.244.014170.0001, o denunciado forjou uma situação de sinistro indenizável por perda total, tendo comunicado, falsamente, no dia 16 de janeiro de 2015, às 11 horas, na 17.ª Delegacia de Polícia de Porto Alegre, a Ocorrência 100317/2015/830 (fls. 15/16), segundo a qual, naquela data, às 08 horas da manhã, na Travessa Java, Jardim Lindoia, Porto Alegre, ele havia sido vítima de roubo do automóvel CHEVROLET/CRUZE LTZ HB, placa IUW-3829 (Porto Alegre), cor bege, RENAVAM 586579613, Chassi 9BGPN68M0EB159163, fabricação/modelo 2013/2014, de propriedade de HOMESTAR BRASIL COMÉRCIO DE MATERIAIS DE CONSTRUÇÕES LTDA.1 , da qual ele é um dos sócios (cf. Consulta Quadro de Sócios e Administradores – QSA, anexa), e alienado fiduciariamente ao BANCO DO BRASIL (fl. 22), como segue:

INFORMA A VÍTIMA QUE DIRIGIA O VEÍCULO UM [AUTOMÓVEL CHEVROLET/CRUZE LTZ, PLACA IUW-3829, CHASSI 9BGPN68M0EB15, RENAVAM 586579613, DE PROPRIEDADE DE HOMESTAR BRASIL COM. DE MAT. DE CONSTRUÇÃO] NA TRAVESSA JAVA COM A RUA FILIPINAS, EM POA-RS, EM CERTA ALTURA DO TRAJETO, O VEÍCULO QUE SEGUIA NA FRENTE DO VEÍCULO PAROU PARA DAR PREFERÊNCIA, OBRIGANDO O AUTOMÓVEL CRUIZE [SIC] A PARAR. QUANDO PAROU O CARRO, A VÍTIMA FOI RENDIDA POR DOIS LADRÕES UM DE CADA LADO DO CARRO E ANUNCIARAM ASSALTO: "DESCE, QUEREMOS O CARRO, É UM ASSALTO", E AO MESMO TEMPO EM QUE APONTARAM UMA ARMA DE FOGO (NÃO SABENDO A VITIMA DIZER SE ERA UM REVOLVER OU PISTOLA). APÓS O ROUBO, OS DOIS LADRÕES FUGARAM [SIC] EM DIREÇÃO À AV. SERTÓRIO. JUNTO COM O CARRO ROUBARAM OS MENCIONADOS EM OBJETO. NADA MAIS. ENCERRA-SE.

Em seguida, o CHEVROLET/CRUZE LTZ HB, placa IUW-3829, falsamente comunicado como roubado, foi conduzido pelo denunciado ou por outra pessoa não identificada até a cidade de Capão da Canoa, onde ficou escondido dentro de uma garagem até a conclusão do Processo Administrativo n.º 2136379.

Com efeito, induzida em erro pelo denunciado, relativamente ao falso roubo do CHEVROLET/CRUZE LTZ HB, placa IUW-3829, BRADESCO AUTO/RE CIA DE SEGUROS acionou o despachante no dia 23 de janeiro de 2015 e, a contar de 31 de março de 2015, autorizou o pagamento da indenização no valor de R$ 75.905,50 (setenta e cinco mil, novecentos e cinco reais, cinquenta centavos), nos seguintes moldes (fl. 55):

31 de março de 2015 – R$ 69.177,58: Pagamento realizado à financeira (BANCO DO BRASIL) via TED;

17 de novembro de 2015 – R$ 2.554,96: Pagamento realizado ao segurado – HOMESTAR BRASIL COMÉRCIO DE MATERIAIS DE CONSTRUÇÕES LTDA.;

03 de dezembro de 2015 – R$ 3.993,00: Pagamento realizado ao despachante – ÉVORA SP REGULARIZAÇÃO DOCUMENTAL.

Consequentemente, o denunciado obteve, para si e para a sua empresa HOMESTAR BRASIL COMÉRCIO DE MATERIAIS DE CONSTRUÇÕES LTDA., vantagem ilícita em prejuízo de BRADESCO AUTO/RE CIA DE SEGUROS, pois, com o montante indenizatório, ele não só conseguiu quitar o saldo devedor do financiamento do CHEVROLET/CRUZE LTZ HB junto ao BANCO DO BRASIL (R$ 69.177,58), mas também recebeu a quantia de R$ 2.554,96.

2.º FATO – ADULTERAÇÃO DE SINAL IDENTIFICADOR DE VEÍCULO AUTOMOTOR (ART. 311 DO CÓDIGO PENAL).

Entre o dia 19 de janeiro de 2016 (data da Ocorrência n.º 100317/2016/1478) e o dia 14 de abril de 2016 (data das Ocorrências n.ºs 100340/2016/1006, 100340/2016/1008 e 100340/2016/2580), em horários e endereços diversos de Porto Alegre, o denunciado CARLOS DE JESUS CEPA adulterou sinal identificador do automóvel CHEVROLET/CRUZE LTZ HB, cor bege, RENAVAM 586579613, Chassi 9BGPN68M0EB159163, fabricação/modelo 2013/2014, de propriedade de HOMESTAR BRASIL COMÉRCIO DE MATERIAIS DE CONSTRUÇÕES LTDA., da qual ele é um dos sócios, tendo substituído a placa original IUW-3829 (Porto Alegre) pela placa falsa ISO-2247 (Porto Alegre), esta última pertencente ao automóvel GM/CORSA HATCH, cor bege, Chassi 9BGXH68X0CC17, RENAVAM 396137091, fabricação/modelo 2011/2012, também de propriedade de HOMESTAR BRASIL COMÉRCIO DE MATERIAIS DE CONSTRUÇÕES LTDA.

Embora BRADESCO AUTO/RE CIA DE SEGUROS tenha liquidado integralmente o sinistro concernente ao “roubo” do CHEVROLET/CRUZE LTZ HB, placa IUW-3829 (1.º FATO), o veículo ainda não havia sido recuperado, daí que, com o escopo de devolvê-lo à circulação sem ter de entregá-lo à seguradora ou a quem esta indicasse, o denunciado comunicou, falsamente, no dia 19 de janeiro de 2016, às 10h31min, na 17.ª Delegacia de Polícia de Porto Alegre, a Ocorrência 100317/2016/1478, (fls. 17/18), segundo a qual, no dia 04 de janeiro de 2016, pelas 9 horas, ele havia “perdido” as placas do automóvel GM/CORSA HATCH, placa ISO-2247 (Porto Alegre), cor bege, Chassi 9BGXH68X0CC17, RENAVAM 396137091, fabricação/modelo 2011/2012, de propriedade de HOMESTAR BRASIL COMÉRCIO DE MATERIAIS DE CONSTRUÇÕES LTDA., da qual ele é um dos sócios.

A comunicação inverídica da perda da placa do GM/CORSA HATCH permitiu ao denunciado solicitar ao DETRAN autorização para confeccionar a segunda via da placa, mas ele colocou a placa falsa ISO-2247 no CHEVROLET/CRUZE LTZ HB e, desde o dia 19 de janeiro de 2016 até o dia 14 de abril de 2016, o veículo passou a trafegar com sinal identificador adulterado.

Com efeito, no dia 14 de abril de 2016, às 19 horas, em frente ao edifíciogaragem do Terminal de Passageiros 01 do Aeroporto Internacional Salgado Filho, na Avenida Severo Dullius, 90010, bairro São João, nesta Capital, alertados por fiscais da EPTC acerca das divergências verificadas entre os dados cadastrais do CHEVROLET/CRUZE LTZ HB e a placa ISO-2247 nele fixada, policiais civis da DPTUR abordaram o veículo, dentro do qual estava o denunciado, e efetuaram a sua apreensão.

O veículo foi guinchado e depositado no CRD AUTOTECH, localizado na Rua do Bosque, 307, bairro Rubem Berta, Porto Alegre, mas, no dia 10 de outubro de 2016, o Delegado de Polícia CLEBER MOURA FERREIRA, da DPTUR, solicitou ao administrador do CRD AUTOTECH que liberasse o CHEVROLET/CRUZE LTZ HB para MARCOS ROGÉRIO DA SILVA HENTZ (fl. 21), sócio da AVS LIBERADORA DE VEÍCULOS LTDA.-ME (fl. 24).

Por fim, o CHEVROLET/CRUZE LTZ HB foi adquirido por ANDERSON AUGUSTO RAMOS MARTINI em um leilão realizado no dia 15 de fevereiro de 2017 (Ocorrência n.º 100510/2017/5335).”

A denúncia foi recebida pelo Juízo singular em 16.04.2018 (fl. 45 do evento 3, PROCJUDIC2).

Após regular tramitação do feito, sobreveio sentença julgando parcialmente procedente para absolver Carlos de Jesus Cepa da imputação de ter incorrido nas sanções do artigo 311 caput do Código Penal, com fulcro no artigo 386 inciso VI do Código de Processo Penal, e o condenou como incurso nas sanções do artigo 171 §2° inciso V do Código Penal, à pena de 01 ano de reclusão, no regime aberto, substituida por 01 pena restritiva de direitos, consistente em prestação serviços à comunidade à razão de 01 hora por dia de pena (evento 54, SENT1).

A decisão foi registrada e publicada em 16.03.2022 (evento 54, SENT1).

Inconformados, o Ministério Público e o assistente de acusação Bradesco Auto/RE Companhia de Seguros apelaram.

Em razões, o Ministério Público insurgiu-se com a absolvição do imputado em relação ao delito previsto no artigo 311 caput do Código Penal, sustentando não compartilhar da tese aventada na sentença de que se tratou de mero exaurimento do delito de estelionato. Destaca que quase 01 ano depois de o réu ter recebido a indenização securitária relativamente ao falso roubo do veículo GM/Cors, que ocorreu em 19.01.2016, portanto, já consumado o estelionato contra a seguradora, lhe ocorreu de registrar novamente fato inverídico (Boletim de Ocorrência Policial 1478/2016/100317 (Evento 3, PROCJUDIC1, fl. 17), oportunidade em que comunicou a suposta perda de duas placas do veículo GM/Corsa, placas ISO 2247, também de sua propriedade, para poder afixá-las no Chevrolet/Cruze, fato que confirmou em juízo. O novo registro falso de Boletim de Ocorrência Policial possibilitou-lhe, igualmente, obter placas novas para o veículo GM/Corsa, uma vez que as tinha retirado para afixar no Chevrolet/Cruze. A alteração das placas ocorreu posteriormente, quando já recebido o total do valor indenizatório. Ressalta que "motivação do ora apelado ao adulterar as placas do veículo é distinta daquela correspondente à fraude contra a seguradora, cujo proveito já havia obtido. Com a adulteração de sinal do veículo,...

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