Acórdão nº 50244835120228210010 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Terceira Câmara Cível, 28-02-2023

Data de Julgamento28 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação / Remessa Necessária
Número do processo50244835120228210010
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Terceira Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003175157
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

23ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação/Remessa Necessária Nº 5024483-51.2022.8.21.0010/RS

TIPO DE AÇÃO: Empréstimo consignado

RELATORA: Desembargadora ANA PAULA DALBOSCO

APELANTE: ANTONIO DA SILVA BITTENCOURT (AUTOR)

APELADO: BANCO ITAU CONSIGNADO S.A. (RÉU)

RELATÓRIO

ANTONIO DA SILVA BITTENCOURT interpõe recurso de apelação em face da sentença que julgou improcedentes os pedidos por si formulados contra BANCO ITAU CONSIGNADO S.A., nos seguintes termos:

Pelo exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados pela parte autora para manter as estipulações pactuadas no contrato ora analisado. Condeno a parte autora, como sucumbente, a arcar com as custas processuais e honorários do advogado da parte adversa. Fixo honorários em R$1000,00 (um mil reais) para o procurador da requerida. Suspensa a exigibilidade à parte autora, em razão da AJG.

Em suas razões, a parte apelante sustenta a limitação dos juros remuneratórios à taxa média de mercado. Alega que a instituição financeira ré descumpriu com o pactuado ao cobrar juros superiores aos contratados, da mesma forma que desrespeitou Instrução Normativa do INSS. Pugna pela repetição do indébito em dobro, bem como pela condenação do réu ao pagamento de indenização por danos extrapatrimoniais. Pede provimento.

Apresentadas contrarrazões, vieram os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

ADMISSIBILIDADE DO RECURSO

Eminentes colegas.

O recurso interposto atende aos pressupostos de admissibilidade, sendo próprio e tempestivo, havendo interesse e legitimidade da parte para recorrer, merecendo conhecimento.

Deixa-se de conhecer do ponto relativo à repetição do indébito em dobro porque, ao que se verifica, não foi ventilado na peça exordial, tampouco enfrentado em sentença, de modo a caracterizar, neste momento, inovação recursal.

Assim, vai conhecido em parte o recurso, o qual passo a analisar.

CONTEXTUALIZAÇÃO

Trata-se a presente demanda de ação revisional do contrato de empréstimo pessoal nº 58716982, na qual a sentença julgou improcedentes os pedidos formulados pelo autor.

A autora sustenta que o contrato previa taxa de juros de 2,14% ao mês, porém, na prática foram cobrados 2,24% ao mês, o que supera a tabela do Bacen no mês da contratação, cuja taxa média era de 1,75% a.m. Não bastasse isto, ultrapassou os limites ditados pelas Instruções Normativas do INSS, esta de 2,14% a.m.

O consumidor, em recurso de apelação, insurge-se, defendendo a limitação dos juros remuneratórios à taxa média de mercado. Requer a repetição do indébito e indenização por danos morais.

Dito isso, passo ao exame da insurgência recursal.

CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

Este colegiado, com a convicção de que se está frente à relação de consumo, entende aplicáveis as disposições do Código de Defesa do Consumidor aos contratos celebrados com instituições financeiras, como na espécie, na esteira de maciça jurisprudência e da Súmula 297 do STJ: O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.

Paralelo a isso, impende referir que é pacífica a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de, em havendo indícios de abusividade, ser possível a apreciação do contrato e de suas cláusulas com o intuito de afastar eventuais ilegalidades, mesmo em face das parcelas já pagas, em homenagem ao princípio que impede o enriquecimento sem causa, sendo inclusive prescindível a discussão a respeito de erro no pagamento.

A única ressalva a respeito do tema, contudo, é a inadmissibilidade de revisão ex officio das cláusulas contratuais consideradas abusivas, ainda que incidentes as regras do Estatuto Consumerista na espécie, na exegese da Súmula nº 381 da Corte Superior: Nos contratos bancários, é vedado ao julgador conhecer, de ofício, da abusividade das cláusulas.

Destarte, tem-se por possível a revisão da relação contratual havida entre as partes, limitada, entretanto, às questões suscitadas pela parte interessada.

EXAME DA ABUSIVIDADE DOS JUROS

Como já referido, o apelante aduz que os juros praticados pelo apelado não são os mesmos contratados e portanto divergem da tabela do Bacen e das Instruções Normativas do INSS, impondo a revisão pela taxa média de mercado.

No norte trilhado pelo eg. STJ, para verificação da configuração, ou não, de abusividade, deve-se fazer o confronto entre as taxas de juros cobradas pela instituição financeira e as constantes da tabela divulgada pelo BACEN para as mesmas operações de crédito, consoante consolidado no Julgamento efetuado pela 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça no REsp nº 1.061.530/RS, julgado pela sistemática dos recursos repetitivos:

ORIENTAÇÃO 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS

a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF;

b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade;

c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02;

d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada – art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto.

No corpo do aresto a mais alta Corte infraconstitucional elegeu, sob a égide dos dispositivos consumeristas, e à falta de outro parâmetro mais incisivo, a taxa medida mensal dos juros cobrados no mercado bancário, homologada e publicada pelo BACEN, como baliza para a aferição do eventual excesso na cobrança dos juros.

Aliás, essa mesma baliza – a taxa média de juros do mercado - também vigora na grande maioria dos países onde, na ausência de limites fixados em lei, o Judiciário é chamado a decidir, através da provocação da parte interessada, se há ou não excesso redutível.

Veja-se o que diz a e. Relatora do Recurso repetitivo em tela, Min. NANCY ANDRIGHI,

Constatada a abusividade, qual taxa deve ser considerada adequada pelo Poder Judiciário?” (...)

Demonstrado o excesso, deve-se aplicar a taxa média para as operações equivalentes, segundo apurado pelo Banco Central do Brasil”.

Mas ali também se admite que o juiz, caso entenda conveniente e de acordo com seu livre convencimento racional, possa adotar outro patamar mais adequado para os juros, segundo as circunstâncias particulares de risco envolvidas no empréstimo”. E meu entendimento é de que tendo a Seção do STJ julgado a matéria sob o farol protetivo das regras do CDC, a conclusão inerradável como corolário do princípio da coerência, é de que esse “patamar mais adequado” (sic) não pode ser superior ao da taxa média e sim, ainda inferior a esta.

Porém, o Tribunal da Cidadania tem reiteradamente decidido no sentido de que o reconhecimento da abusividade dos juros deve ser comprovada diante de discrepância entre a taxa de média de mercado e aquela praticada pela instituição financeira.

Mesmo com convencimento de que a taxa média do Bacen é não apenas o parâmetro para a redução do excesso de juros como, também, para a aferição dele e, de que sempre que ultrapassada, há excesso passível de redução por “processos de revisão bancária” , porque “os juros estão acima do mercado e que acrescentar-se à média outro valor, implica na distorção da própria média, fato é que que o eg. STJ tem firmado posicionamento no sentido de se admitir uma faixa razoável para a variação dos juros.

Como o STJ é o órgão constitucionalmente competente para uniformização da jurisprudência infraconstitucional, e atenta aos ditames do art. 926 do CPC de que ‘os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente’, esta Câmara acolheu a orientação, adotando um parâmetro objetivo e fixo para configuração da abusividade, qual seja juros pactuados acima de 10% da tabela de mercado.

Dessa forma, admita-se a cobrança de juros remuneratórios superiores à taxa média de mercado divulgada pelo Bacen, atentando sempre ao caso concreto e à capacidade econômica do consumidor, conforme as regras contidas no Código de Defesa do Consumidor.

Na hipótese de comprovação de cobrança abusiva de juros, devem ser limitados à taxa média de mercado, conforme precedente do STJ:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO. CONTRATO BANCÁRIO. JUROS REMUNERATÓRIOS LIMITADOS À TAXA MÉDIA DE MERCADO. DECISÃO AGRAVADA MANTIDA. IMPROVIMENTO.
1.- Mantém-se a limitação dos juros remuneratórios à taxa média de mercado quando comprovada, no caso concreto, a significativa discrepância entre a taxa pactuada e a taxa de mercado para operações da espécie.
2.- O agravante não trouxe qualquer argumento capaz de modificar a conclusão do julgado, o qual se mantém por seus próprios fundamentos.
3.- Agravo Regimental improvido. (AgRg no AREsp 504021 / RS AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL2014/0089812-6, Rel. Min. SIDNEI BENETI, Terceira Turma, Julgado em 27.05.2014, DJe em 09.06.2014) grifado

Diante destas considerações, giza-se que os juros remuneratórios pactuados no contrato (revisando) de empréstimo pessoal consignados para aposentados e pensionistas do INSS, não podem superar 10% da tabela do Bacen, assim como devem respeito aos limites normativos estabelecidos pelas Instruções Normativas do INSS, e respectivas atualizações, observadas as datas das contratações, os limites tabelados dos juros remuneratórios descapitalizados.

Assim sendo, no caso em exame, os juros contratados não superam o limite das Instruções Normativas (2,14%) e, da mesma forma, verifica-se que não ultrapassaram o limite de 10% da taxa ditada pelo Bacen, consoante tabela que segue, que...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT