Acórdão nº 50254162720178210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Criminal, 23-02-2022

Data de Julgamento23 Fevereiro 2022
ÓrgãoOitava Câmara Criminal
Classe processualApelação
Número do processo50254162720178210001
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001430338
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

8ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5025416-27.2017.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Crimes de Trânsito (Lei 9.503/97

RELATOR: Desembargador LEANDRO FIGUEIRA MARTINS

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (AUTOR)

APELADO: GUILHERME TAISSON ANGELO BATISTA (ACUSADO)

RELATÓRIO

O MINISTÉRIO PÚBLICO ofereceu denúncia contra GUILHERME TAISSON ÂNGELO BATISTA, afirmando estar incurso nas sanções do artigo 306 da Lei n. 9.503/97 (Código de Trânsito Brasileiro - CTB), pela prática do seguinte fato descrito na peça inicial (processo 5025416-27.2017.8.21.0001/RS, evento 3, PROCJUDIC1, fls. 2/5):

"No dia 17 de junho de 2017, por volta da 3h., na Rua João Alfredo, próximo ao n° 553, Bairro Cidade Baixa, nesta Capital, o denunciado conduzia o veículo GM/CHEVETTE JUNIOR, cor prata, de placas IDX3637, com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool.

Na ocasião, o denunciado foi abordado, no endereço supracitado, em uma blitz de trânsito, porque estava sem o espelho do lado esquerdo. Durante a abordagem foi ofertado ao motorista o teste do etilômetro, o resultado foi positivo, tendo o denunciado apresentado 0,45mg e, cerca de 30min após, 0,36mg de álcool por litro de ar expelido pelos pulmões, respectivamente, na prova e contraprova”.

Deixando de ser ofertado o benefício da suspensão condicional do processo e recebida a denúncia em 17/04/2018 (processo 5025416-27.2017.8.21.0001/RS, evento 3, PROCJUDIC2, fls. 5/6), a prova foi produzida e a pretensão julgada improcedente (processo 5025416-27.2017.8.21.0001/RS, evento 3, PROCJUDIC3, fls. 17/22).

O Ministério Público ingressou com apelação (processo 5025416-27.2017.8.21.0001/RS, evento 3, PROCJUDIC3, fls. 26/35), alegando, em síntese, que: (a) a embriaguez e a alteração da capacidade psicomotora do réu estavam comprovadas; (b) no exame clínico, realizado quase duas horas após o flagrante, o acusado admitiu ter ingerido bebida alcoólica; (c) "a simples conduta de dirigir veículo automotor em via pública, estando com concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 (seis) decigramas de álcool por litro, configura o delito previsto no art. 306 do CTB" (fls. 28/29); (d) o teste do etilômetro era fidedigno e foi priorizado pelo legislador, revelando-se inapropriado condicionar sua validade à confirmação por exame clínico; (e) quanto "às provas periciais, por serem irrepetíveis, vigora o contraditório diferido ou postergado, a ser exercido na fase judicial" (fl. 34), inexistindo impugnação ou comprovação de eventual nulidade do teste do etilômetro. Assim, ao final, pediu o provimento do recurso e a condenação do acusado pelo crime do artigo 306 do CTB.

O réu, em contrarrazões, postulou o não provimento do recurso (processo 5025416-27.2017.8.21.0001/RS, evento 3, PROCJUDIC3, fls. 47/50, e PROCJUDIC4, fls. 1/8).

Nesta instância recursal, a Procuradoria de Justiça lançou parecer (processo 5025416-27.2017.8.21.0001/TJRS, evento 6, PARECER1).

É o relatório.

VOTO

Conheço do recurso de apelação do Ministério Público, porquanto atendidos os requisitos previstos no artigo 593 do Código de Processo Penal (CPP).

Com efeito, comete o crime do artigo 306 do CTB aquele que conduz veículo automotor com a capacidade psicomotora alterada pelo uso de álcool.

Neste contexto, a materialidade e a autoria do delito imputado ao réu ficaram devidamente comprovadas pelos seguintes documentos do processo 5025416-27.2017.8.21.0001/RS, evento 3, PROCJUDIC1: (1) ocorrência policial (fls. 8/9); (2) auto de apreensão (fl. 10); (3) resultados dos testes de etilômetro (fls. 11/12); (4) termo de declarações (fl. 14).

Assim, objetivamente, a alteração da capacidade psicomotora do acusado acabou demonstrada nos autos.

Os resultados dos exames de etilômetro do processo 5025416-27.2017.8.21.0001/RS, evento 3, PROCJUDIC1, fls. 11/12 – prova (teste n. 07010) e contraprova (teste n. 07015) –, informaram a presença, no momento da coleta, das quantidades de 0,45mg e de 0,36mg por litro de ar alveolar, superiores àquela prevista no inciso I do § 1º do artigo 306 do CTB:

“Art. 306. Conduzir veículo automotor com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência: (Redação dada pela Lei nº 12.760, de 2012)
Penas - detenção, de seis meses a três anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.

§ 1o As condutas previstas no caput serão constatadas por: (Incluído pela Lei nº 12.760, de 2012)
I - concentração igual ou superior a 6 decigramas de álcool por litro de sangue ou igual ou superior a 0,3 miligrama de álcool por litro de ar alveolar; ou (Incluído pela Lei nº 12.760, de 2012)
II - sinais que indiquem, na forma disciplinada pelo Contran, alteração da capacidade psicomotora.
(Incluído pela Lei nº 12.760, de 2012)”.

Neste sentido, acerca do tema e configuração do delito do artigo 306 do CTB, ressalto julgado do Superior Tribunal de Justiça (STJ):

"PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO DO ART. 306 DO CTB. INOCORRÊNCIA. COMPROVAÇÃO DA EMBRIAGUEZ POR MEIO DE TESTE DE BAFÔMETRO SUFICIENTE PARA A CONDENAÇÃO. DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DA ALTERAÇÃO DA CAPACIDADE PSICOMOTORA. ACÓRDÃO RECORRIDO EM CONFORMIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA DESTE STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. ART. 255/RISTJ. INOBSERVÂNCIA. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. A jurisprudência desta Corte Superior firmou o entendimento de que "tendo o delito sido praticado após as alterações procedidas pela Lei nº 11.705/08 e antes do advento da Lei nº 12.760/12, a simples conduta de dirigir veículo automotor em via pública, estando com concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 (seis) decigramas de álcool por litro, configura o delito previsto no art. 306 do CTB, o que torna desnecessária qualquer discussão acerca da alteração das funções psicomotoras do agente" (REsp 1577903/RS, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 10/05/2016, DJe 19/05/2016).
2. A não observância dos requisitos do artigo 255, parágrafos 1º e 2º, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, torna inadmissível o conhecimento do recurso com fundamento na alínea "c" do permissivo constitucional.
3. Agravo regimental a que se nega provimento" (AgInt no AREsp 1161063/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 19/10/2017, DJe 27/10/2017 - grifou-se).

No mais, importante destacar 3 (três) considerações.

Primeiro, não se vislumbra, na situação em apreço, desatenção ao artigo 155 do CPP1, porquanto a presente decisão condenatória tem especial amparo no resultado do teste do etilômetro, prova não repetível, ou seja, "espécie de prova que, uma vez produzida, não poderá ser novamente coletada ou produzida, em virtude do desaparecimento, destruição ou perecimento da fonte probatória"2, submetida ao contraditório diferido.

A propósito, pela adequação ao caso, menciono o julgado que segue:

"PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ART. 306 DO CTB. EMBRIAGUEZ AO VOLANTE. DECRETO CONDENATÓRIO FUNDADO EM LAUDO PERICIAL, TESTEMUNHOS E CONFISSÃO EXTRAJUDICIAL. PROVA CAUTELAR, ANTECIPADA E NÃO REPETÍVEL. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO ARTIGO 155 DO CPP. CONDENAÇÃO FUNDADA EM CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO VÁLIDO. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.
1. A formulação de juízo condenatório em matéria penal depende da existência de base probatória idônea formada, como regra, pela união das provas produzidas durante a instrução criminal, sob o crivo do devido processo legal, com inerente respeito aos princípios do contraditório e da ampla defesa. É certo que, assim como ocorre noutras hipóteses, essa proposição não revela preceito intangível ou absoluto. A exceção à regra foi expressa e objetivamente tratada pelo legislador ordinário que, na confecção do art. 155, caput, do CPP, previu a possibilidade de o juiz estribar sua convicção - condenatória, inclusive - em provas cautelares, antecipadas e não repetíveis.
2. No caso concreto, a condenação do recorrente foi lastreada no Boletim de Ocorrências, no Auto de Prisão em Flagrante, nos depoimentos colhidos na instrução processual e, principalmente, no Laudo Pericial de Constatação de Embriaguez e na confissão extrajudicial, via do qual se concluiu que o acusado conduzia veículo automotor com alteração da capacidade psicomotora em razão da influência do álcool ou outra substância.
3. No que tange à materialidade delitiva, o contexto fático-probatório considerado pela instância ordinária é mesmo suficiente para constatá-la. Neste caso, o Laudo Pericial de Constatação de Embriaguez, enquanto prova cautelar irrepetível, é suficiente para demonstrar de forma inequívoca a prática do delito do art. 306 do CTB. Inegável o enquadramento deste elemento na hipótese que permite excepcionar a regra da judicialização das provas. Ademais, cumpre observar que, a despeito de ter sido construída cautelarmente antes do processo-crime, tal prova foi submetida ao contraditório diferido, não tendo a defesa buscado de algum modo desconstituí-la.
4. Rever a conclusão da instância ordinária para afastar a condenação demandaria o reexame de matéria fático-probatória, o que, em sede de recurso especial, constitui medida vedada pelo óbice da Súmula n. 7/STJ.
5. Agravo regimental não provido" (AgRg no REsp 1725337/MT, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 21/05/2019, DJe 03/06/2019).

Segundo, o réu, nada obstante a incumbência prevista no artigo 156 do CPP3, não trouxe nenhum dado probatório, ainda que indiciário, a respeito da...

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