Acórdão nº 50267177420208210010 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quarta Câmara Cível, 15-02-2023

Data de Julgamento15 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50267177420208210010
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Quarta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003230371
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

24ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5026717-74.2020.8.21.0010/RS

TIPO DE AÇÃO: Cartão de Crédito

RELATOR: Desembargador FERNANDO FLORES CABRAL JUNIOR

APELANTE: FRANCISCO FIEDLER DE VARGAS LUNARDI (AUTOR)

APELADO: AMAZON AWS SERVICOS BRASIL LTDA (RÉU)

APELADO: NU PAGAMENTOS S.A. - INSTITUICAO DE PAGAMENTO (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por FRANCISCO FIEDLER DE VARGAS LUNARDI em face da sentença prolatada nos autos da ação declaratória de inexigibilidade e inexistência de débito com pedidos de consignação de valores e de indenização por danos morais em que contende com AMAZON AWS SERVICOS BRASIL LTDA e NU PAGAMENTOS S.A. - INSTITUICAO DE PAGAMENTO. Constou na sentença apelada (Evento 55):

“[...]. Em face do exposto, julgo IMPROCEDENTE a ação indenizatória movida por FRANCISCO FIEDLER DE VARGAS LUNARDI contra a NU PAGAMENTOS S/A e AMAZON AWS SERVIÇOS BRASIL LTDA.

Condeno o autor no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios ao patrono das requeridas, os quais arbitro em 10% sobre o valor atualizado da causa (pelo IPCA a contar do ajuizamento), considerados os critérios estabelecidos pelo art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil.

A exigibilidade destes encargos ficará suspensa em razão do deferimento da gratuidade judiciária (art. 98, § 3º, do Código de Processo Civil). ”

Em razões recursais, o apelante requer a reforma da sentença, ao argumento de que a parte ré não comprovou a utilização dos serviços que ensejaram as cobranças em discussão nos autos, seja pelo período supostamente gratuito ou após o pagamento recorrente. Salienta que a parte demandada lhe cobrou, por um ano, um serviço que alega ter buscado cancelar em várias oportunidades. Refere que, muito embora sua conta se encontrasse suspensa em 03/12/2020, as cobranças em questão permaneceram até agosto de 2021. Requer a condenação da parte ré ao pagamento de indenização por danos morais. Pugna pela procedência dos pedidos veiculados na inicial. Pede provimento (Evento 60).

Foram apresentadas contrarrazões pela corré AMAZON AWS SERVICOS BRASIL LTDA no Evento 67, nas quais sustenta, preliminarmente, a inobservância do princípio da dialeticidade, sob o argumento de que o recurso da parte autora deixou de atacar os fundamentos da sentença recorrida. Ademais, reiterou sua ilegitimidade passiva.

É o relatório.

VOTO

A presente apelação, interposta no Evento 60, é tempestiva, pois o prazo para recorrer da sentença iniciou em 21/09/2022 (Evento 57), e findou em 11/10/2022, sendo que o recurso foi interposto no dia 11/10/2022. Além disso, a parte apelante é beneficiária da justiça gratuita, sendo dispensada do recolhimento do preparo (Evento 55).

Dessa forma, considerando que é própria, tempestiva e dispensa preparo, recebo a apelação, a qual passo a examinar.

1. PRELIMINAR CONTRARRECURSAL. NÃO OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. INOCORRÊNCIA.

A parte ré, por ocasião das contrarrazões (Evento 67), alegou, em preliminar, a não observância do princípio da dialeticidade, referindo que a parte autora, em suas razões recursais, deixou de atacar as razões que motivaram a sentença. Por tal motivo, pugna pelo não conhecimento do recurso.

Contudo, não lhe assiste razão.

Ainda que a apelação não tenha utilizado a melhor técnica para contrapor os fundamentos da sentença, é possível depreender as motivações de inconformidade da parte apelante que ataca a decisão quando sustenta a necessidade de reforma da sentença recorrida, a fim de ser julgada procedente a pretensão deduzida na exordial.

Assim, não resta configurada, no caso em tela, hipótese de não conhecimento do recurso, merecendo ser afastada a preliminar contrarrecursal veiculada pela parte ré.

2. AMAZON AWS SERVICOS BRASIL LTDA. ILEGITIMIDADE PASSIVA. INOCORRÊNCIA.

De plano, saliento que não merece acolhida a arguição de ilegitimidade passiva da demandada AMAZON AWS SERVICOS BRASIL LTDA, reiterada por ocasião das contrarrazões (Evento 67).

Isso porque sendo a corré AMAZON AWS SERVICOS BRASIL LTDA e a Amazon Web Services empresas pertencentes ao mesmo conglomerado econômico, tanto que, por ocasião da contestação, a corré Amazon colacionou documentos relacionados à relação havida pela Amazon Web Services, na linha da fundamentação exarada em sentença, tenho que não há falar na ilegitimidade passiva da AMAZON AWS SERVICOS BRASIL LTDA.

Destarte, não há falar na ilegitimidade passiva da demandada.

3. RESPONSABILIDADE CIVIL DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS NAS RELAÇÕES DE CONSUMO. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. INOCORRÊNCIA.

O Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 3º, § 2º, incluiu expressamente a atividade de natureza bancária, financeira e de crédito no conceito de serviço.

Note-se:

Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

§ 1° Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.

§ 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista – grifei.

Nesse contexto, o entendimento atual, tanto na doutrina como na jurisprudência dos Tribunais pátrios, é tranquilo acerca da aplicação do CDC nas operações bancárias, o que restou sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça, inclusive:

Súmula nº 297: O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.

Portanto, a responsabilidade contratual do banco é objetiva, nos termos do art. 14 do CDC, de modo que responde, independentemente de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços.

Reza o art. 14 do CDC:

O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

Trata-se de responsabilidade objetiva fundada na teoria do risco do empreendimento ou da atividade empresarial, segundo a qual, consoante doutrina de Sergio Cavalieri Filho:

“(...) todo aquele que se disponha a exercer alguma atividade no mercado de consumo tem o dever de responder pelos eventuais vícios ou defeitos dos bens e serviços fornecidos, independentemente de culpa. Este dever é imanente ao dever de obediência às normas técnicas e de segurança, bem como aos critérios de lealdade, quer perante os bens e serviços ofertados, quer perante os destinatários dessas ofertas. A responsabilidade decorre do simples fato de dispor-se alguém a realizar atividade de produzir, estocar, distribuir e comercializar produtos ou executar determinados serviços. O fornecedor passa a ser o garante dos produtos e serviços que oferece no mercado de consumo, respondendo pela qualidade e segurança dos mesmos1”.

Nesse sentido, vale reproduzir precedente do...

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