Acórdão nº 50267278720168210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Oitava Câmara Cível, 16-02-2023

Data de Julgamento16 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50267278720168210001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Oitava Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003234526
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

18ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5026727-87.2016.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Promessa de Compra e Venda

RELATOR: Desembargador PEDRO CELSO DAL PRA

APELANTE: JOSE AUGUSTO DE MATTOS JUNIOR (AUTOR)

APELANTE: ALPHAVILLE PORTO ALEGRE EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA (RÉU)

APELADO: VILLA NOVA DESENVOLVIMENTO URBANO LTDA. (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por ALPHAVILLE PORTO ALEGRE EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA (RÉ) e VILLA NOVA DESENVOLVIMENTO URBANO LTDA. (RÉ) contra a sentença (evento o 3, PROCJUDIC21, Página 29) que, nos autos da ação de responsabilidade civil ajuizada por JOSÉ AUGUSTO DE MATTOS JUNIOR (AUTOR), assim decidiu a lide:

3 – DISPOSITIVO (artigo 489, III do CPC)

Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos relativos à presente ação ajuizada por JOSÉ AUGUSTO DE MATTOS JUNIOR contra VILLA NOVA DESENVOLVIMENTO URBANO LTDA. e ALPHAVILLE PORTO ALEGRE EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA., para o efeito de condenar as requeridas, solidariamente, ao pagamento do valor equivalente a 2% sobre o valor de mercado do imóvel durante o período da mora da construtora, ou seja, 24/04/2012 a outubro de 2014. Tal valor deverá ser corrigido monetariamente pelo IGP-M, mês a mês e acrescido de juros de mora de 1% ao mês, a contar da citação; bem como ao pagamento do total de R$ 8.000,00 (oito mil reais), a título de indenização por danos morais, corrigidos pelo IGP-M a partir da presente data, acrescidos de juros moratórios de 1% ao mês (artigo 406 do Código Civil de 2002 c/c artigo 161, §1º do Código Tributário Nacional), desde a data da citação.

Diante da sucumbência recíproca (art. 86 do CPC/15), arcarão as partes com o pagamento das custas processuais por metade, e honorários advocatícios ao procurador da parte adversa, fixados em 20% sobre o valor da condenação para cada, observadas as diretrizes do art. 85, §§ 2º do CPC/15.”

As apelantes alegam, em suas razões (evento 3, PROCJUDIC21, Página 49), não haver mora imputável às rés. Referem que realizaram todas as obras e contrapartidas dentro dos prazos estabelecidos. Dizem que eventual demora se deve ao Poder Público. Pedem, de modo alternativo, a redução da multa. Dizem não ser possível fixar juros de mora para cada mês de atraso. Pedem o afastamento de sua condenação ao pagamento de indenização por danos morais ou a redução do quantum. Requerem provimento do recurso..

Contrarrazões no evento 3, PROCJUDIC23, Página 10.

JOSÉ AUGUSTO DE MATTOS JUNIOR (AUTOR) igualmente interpõe recurso de apelação (evento 3, PROCJUDIC22, Página 42), onde alega que deve ser alterado o critério de valor do imóvel para fins de incidência da multa moratória. Pede indenização pela desvalorização do bem, em razão do lixão existente no local. Pugna pela majoração da indenização por danos morais. Pede adequação dos honorários advocatícios imputados ao autor. Requer o provimento do recurso.

Contrarrazões no evento 3, PROCJUDIC23, Página 15.

Remetidos a este Tribunal de Justiça, foram os autos distribuídos por sorteio automático em 03/06/2022, vindo-me após conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas: passo a analisar os recursos em ordem de prejudicialidade.

I. Do recurso de apelação das rés.

Entendo que o recurso prospera em parte.

Cuida-se de ação ordinária, com pedido de reparação de danos, lastreada no atraso de conclusão das obras do empreendimento "Alphaville Porto Alegre" em relação ao prazo ajustado pelas partes, bem como embasada na alegação de propaganda enganosa e dissabores pela questão ambiental do empreendimento.

A parte ré, de seu turno, ofertou defesa, trazendo, como cerne de sua tese defensiva, a existência de caso fortuito e força maior, a justificar o atraso na entrega das obras do loteamento.

A sentença julgou procedente em parte a ação, reconhecendo a inadimplência da parte ré, pelos seguintes fundamentos:

"Assim, não restam elementos suficientes a caracterizar o rompimento do nexo causal entre a falha na prestação do serviço e o dano experimentado, de modo a afastar a responsabilidade da construtora pelo atraso da obra, sobretudo, ante a configuração da violação de dever jurídico estabelecido, com mora de 36 meses, conforme acima exposto, ultrapassando em muito o prazo de prorrogação contratual.

Reconhecida, portanto, a responsabilidade civil das demandadas, passa-se à análise dos danos suportados (ou não) pelo demandante."

Tenho que a sentença, na parte em que reconheceu o inadimplemento da parte ré, nenhuma alteração merece.

De plano, cumpre consignar ser patente o inadimplemento das empreendedoras, fato, inclusive, por elas não negado, que apenas buscam imputar o atraso a fatores alheios à sua vontade.

Vejamos: segundo o contrato, ajustaram as partes que o prazo de conclusão da obra seria de 24 meses, a contar do lançamento do empreendimento, com prazo de tolerância de 180 dias, conforme item V, cláusula 5.1, Quadro Resumo (evento 3, PROCJUDIC1, Página 30), verbis:

"O prazo de conclusão da obra é de 24 (vinte e quatro) meses a partir do lançamento, sujeito à tolerância de mais 180 (cento e oitenta) dias”.

Assim, o prazo fatal para a entrega da obra seria a data de 24/04/2012.

O terreno, entretanto, assim como o empreendimento, foi entregue à parte autora somente em outubro de 2014, extrapolando, e muito, o prazo ajustado no contrato.

As rés, com o intuito de afastar sua responsabilidade, invocam a Cláusula 4.1.2, que consta no contrato, a qual fixa a interrupção ou prorrogação do prazo de entrega, por motivos de força maior ou caso fortuito.

Para tanto, aduzem que restaram implementadas as hipóteses de caso fortuito e de força maior, que, na sua ótica, decorreriam, primeiro, da entrada em vigor da Resolução nº 420, do CONAMA, o que teria exigido delas readequação dos projetos, depois da demora do Poder Público na desapropriação dos terrenos lindeiros e, ainda, da demora na expedição do alvará PPCI pelos bombeiros, fato que teria retardado a licença referente ao trecho “clube” do empreendimento.

Não há, entretanto, como acolher as teses brandidas pelas apelantes.

Cabe esclarecer que nenhuma censura há na cláusula contratual que, de algum modo, exima ou atenue a responsabilidade da fornecedora se concretizada situação identificada com ‘força maior’, já que hipótese de exclusão de responsabilidade civil prevista expressamente no art. 393 do Código Civil.

Portanto, a cláusula que prevê a prorrogação por motivos de força maior ou por caso fortuito não é, por si, nula.

Todavia, evidencia-se a abusividade na busca de relacionar determinadas situações ou eventos como sendo hipóteses de força maior e caso fortuito, quando assim não é.

De fato, descabe estabelecer a prorrogação da conclusão da obra por, como no caso, da entrada em vigor da Resolução nº 420, do CONAMA, demora do Poder Público na desapropriação dos terrenos lindeiros ou, ainda, demora na expedição do alvará PPCI pelos bombeiros, dentre outros.

Primeiro porque constituem fatores que não se amoldam às hipóteses de caso fortuito ou força maior, cujo conceito não está dissociado da ideia de imprevisibilidade, assim compreendida como sendo a impossibilidade de representação da ocorrência de eventos extraordinários, que poderiam atingir a base negocial (as condições econômicas) do contrato. Evidente que normas que exijam readequação de projetos, demora do poder público, entre outros, encontram-se na esfera de previsibilidade de qualquer empreendedor.

Segundo porque a pretensão gera ofensa à norma contida no art. 51, I, Código de Defesa do Consumidor, por trazer em si cláusula que exonera ou atenua a responsabilidade do fornecedor por vícios de qualquer natureza do produto ou serviço.

Ademais, ao sujeitar ao puro arbítrio da fornecedora a estipulação do prazo final para a entrega efetiva do imóvel, conferindo desvantagem exagerada ao consumidor, ofende igualmente o art. 51, IV, Código de Defesa do Consumidor.

Tais fatores, e que teriam, segundo as recorrentes, motivado o atraso na entrega da obra, relacionam-se com os riscos do empreendimento, sendo defeso dividi-lo com o outro contratante, ou atribuir a terceiros essa responsabilidade, pois que inerente ao ramo de atividade profissional exercido pelas rés.

O tema não é novo nesta Corte como se pode inferir do exame dos seguintes julgados:

EMENTA: PROMESSA DE COMPRA E VENDA. INADIMPLEMENTO. ATRASO NA ENTREGA DO IMÓVEL. DESCONSIDERAÇÃO DE CLÁUSULA DESONERANDO A CONSTRUTORA, POR ABUSIVA. CABIMENTO DA INDENIZAÇÃO. Apelação. É nula, por abusiva, a cláusula contratual que desonera a promitente vendedora por atraso na entrega da obra (CDC, art. 51, inc. I). Evidenciado o descumprimento do prazo de entrega da obra, cabível a indenização do promitente comprador por perdas e danos correspondentes à locação de imóvel similar. Responsabilidade ex vi legis que dispensa previsão contratual. Pedido de retenção de multa, formulado em sede recursal, de que não se conhece por inovar a matéria discutida em primeiro grau. Recurso adesivo. Incabível o ressarcimento de valores desembolsados pelo promitente comprador com condomínio e IPTU do apartamento alugado, visto que teria igualmente de suportar tais despesas quanto ao imóvel adquirido, se entregue a tempo. Termo da incidência da correção monetária. Inocorrente sucumbência, senão que mero lapso de redação e de compreensão do dispositivo, que poderia sanar-se por embargos declaratórios, não autorizando o provimento do recurso adesivo. Apelação improvida. Recurso adesivo improvido. (Apelação Cível Nº 70006764443, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Leoberto Narciso Brancher, Julgado em 09/12/2003).

EMENTA:...

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