Acórdão nº 50273895420218210008 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Primeira Câmara Criminal, 24-05-2023

Data de Julgamento24 Maio 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Número do processo50273895420218210008
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003608363
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

1ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Recurso em Sentido Estrito Nº 5027389-54.2021.8.21.0008/RS

TIPO DE AÇÃO: Homicídio qualificado (art. 121, § 2º)

RELATOR: Desembargador JOSE CONRADO KURTZ DE SOUZA

RECORRENTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

RECORRIDO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Trata-se de recurso em sentido estrito interposto pela defesa técnica, em favor de ALESSANDER OLIVEIRA RODRIGUES, contra sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Criminal da Comarca de Canoas/RS que o pronunciou para que seja submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri.

O Ministério Público ofereceu denúncia contra ALESSANDER OLIVEIRA RODRIGUES, nascido em 17/05/1989, com 30 anos de idade na data do fato, como incurso nas sanções do Art. 121, § 2º, incisos I e IV, do Código Penal.

A denúncia foi assim lavrada:

"1° e 2º Fatos Delituosos:

Em 02 de maio de 2020, por volta das 01h20min, na Rua João Goularte, proximidades do número 100, bairro Industrial, nesta Cidade, o denunciado ALESSANDER OLIVEIRA RODRIGUES, efetuando disparos de arma de fogo, matou as vítimas Guilherme Callegaro Vargas e Paulo Eduardo Oliveira, causando-lhes as lesões descritas nos autos de necropsia, que referem como causa das mortes o seguinte:

Guilherme Callegaro Vargas: "(traumatismo crânio-encefálico por projetil de arma de fogo (...)";

Paulo Eduardo Oliveira: "(traumatismo crânio-encefálico por projetil de arma de fogo (...)".

Os crimes foram cometidos por motivo torpe, qual seja, vingança, pois o denunciado cometeu os delitos por desentendimentos havidos tendo em vista o tráfico de drogas, notadamente porque Paulo, uma das vítimas, fazia transporte de entorpecentes, e Guilherme tivera antes e tinha atualmente, ao que tudo indica, envolvimento com a mercância de drogas.

Os crimes foram cometidos mediante o emprego de recurso que dificultou a defesa das vítimas, qual seja, dissimulação, pois o denunciado, na ocasião, ocultou seu desígnio de matá-las atraindo os ofendidos para um encontro que se daria em torno de possível negociação que faria com as vítimas, quando, então, ao se reunirem, o denunciado efetuou os disparos de arma de fogo em desfavor das vítimas, inclusive pelas costas de Guilherme e estando Paulo Eduardo sob efeito de substância entorpecente. Por estas razões, as vítimas não puderam esboçar reações defensivas."

Recebida a denúncia em 06/10/2021 (evento 3, DESPADEC1).

Citado (evento 57, CERTGM1), o réu apresentou resposta à acusação (evento 64, DEFESA PRÉVIA1).

Durante a instrução foram ouvidas nove testemunhas e efetuado o interrogatório do réu (evento 98, TERMOAUD1 e evento 140, TERMOAUD1).

As partes apresentaram memoriais (evento 151, MEMORIAIS1 e evento 156, ALEGAÇÕES1).

Sobreveio sentença (evento 158, SENT1), publicada em 31/08/2022, pronunciando o réu como incurso nas sanções do Art. 121, § 2º, inciso IV, do Código Penal, para que seja submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri.

A defesa técnica do réu interpôs Recurso em Sentido Estrito (evento 173, RSE1) e, em suas razões (evento 178, RAZRECUR1), busca a despronúncia do réu, sustentando que, no dia dos fatos, o réu havia se envolvido em um acidente de carro, tendo sido levado para sua residência por duas testemunhas, e lá ficou durante toda a noite. Destaca que a acusação de que o réu seria o autor dos crimes surgiu a partir de indicação pela testemunha Ritchelli, durante a investigação policial. No entanto, tal testemunha alterou seu depoimento em juízo e afirmou acreditar na inocência do recorrente Alessander. Narra que o réu e a vítima Guilherme eram amigos desde a infância e que o réu não teria motivos para matar as vítimas. Subsidiariamente, pleiteia o afastamento da qualificadora prevista no inciso IV do Art. 121 do Código Penal.

Foram apresentadas contrarrazões (evento 181, CONTRAZ1).

O réu foi intimado acerca da pronúncia (evento 187, CERTGM1).

O juízo de origem manteve a decisão por seus próprios fundamentos (evento 189, DESPADEC1).

Remetidos os autos a esta Corte, a douta Procuradoria de Justiça exarou parecer pelo desprovimento do recurso defensivo (evento 12, PARECER1).

Vieram-me conclusos os autos.

Registre-se, por fim, que foi cumprido o comando dos artigos 613, inciso I, do Código de Processo Penal e 170 do Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, tendo em vista a adoção do sistema informatizado.

É o relatório.

VOTO

ALESSSANDER OLIVEIRA RODRIGUES foi pronunciado como incurso nas sanções do Art. 121, §2°, IV, do Código Penal, por duas vezes.

A defesa busca a despronúncia do recorrente. Subsidiariamente, requer o afastamento da qualificadora do recurso que dificultou a defesa das vítimas.

Inicialmente, convém destacar que no processo penal pátrio a sentença de pronúncia constitui mero juízo de admissibilidade e de viabilidade da pretensão acusatória narrada na denúncia, restringindo-se à verificação dos pressupostos necessários para o encaminhamento do processo ao Conselho de Sentença1.

Na pronúncia há um mero juízo de prelibação, por meio do qual o Juiz admite ou rejeita a acusação, sem qualquer valoração acerca do mérito, julgando-se admissível o ius accusationis, admitindo todas as acusações que tenham ao menos probabilidade de procedência2.

De acordo com o Art. 413 do Código de Processo Penal constituem pressupostos da pronúncia a existência de prova da materialidade do crime e indícios suficientes de autoria ou de participação do réu3.

A prova da materialidade dos crimes está demonstrada pelo boletim de ocorrência policial, laudo pericial papiloscópico de identificação dos ofendidos (evento 1, INQ1,págs. 6-13); laudo pericial do local do crime (evento 19, DOC2, evento 19, DOC3, evento 19, DOC4) laudos de necropsia nos ofendidos Guilherme e Paulo Eduardo (evento 27, LAUDO5 , evento 27, LAUDO6).

Para melhor análise com relação aos indícios de autoria, transcrevo da pronúncia trecho referente à prova oral colhida nos autos:

"César Cabral Lopes, informou que não conhecia o réu, mas era amigo da vítima Paulo Eduardo Oliveira. A única notícia que recebeu referente ao fato foi dois dias após o ocorrido, que Paulo Eduardo havia sido assassinado. Sabia que o mesmo ultimamente estava trabalhando pelo aplicativo Uber, sem saber informar se realizava corridas por fora da plataforma, no qual contava que este trabalho estava sendo compensativo para sua renda, onde realizava várias corridas longas. Comunicou que ultimamente não tinha tanto contato com a vítima, pois recentemente havia se casado. Anteriormente, quando ainda solteiro, tinham mais proximidade, compartilhavam de vários momentos juntos, como acadêmia, balada e passeios. Atualmente, o único contato mais próximo que possuía com a vítima, era por meio de redes sociais e grupos. Não sabia exatamente por que tinha sido chamado para depor na delegacia, sua suspeita era por conta da afinidade que haviam no passado. Nunca foi de seu conhecimento que a vítima Paulo era envolvido com drogas, desconhecendo completamente esse assunto, porém, no passado, quando a vítima ainda era adolescente, ouvia boatos de que o mesmo era usuário de cocaína, mas reafirmou que durante a sua relação de amizade, nunca soube de qualquer envolvimento. Também não sabe se a vítima estava sofrendo ameaças, o mesmo nunca lhe relatou alguma animosidade com qualquer pessoa (Vídeo 2, Ev. 98).

Mike Callegaro Vargas, irmão da vítima Guilherme Callegaro Vargas, relatou que era conhecido do réu Alessander Oliveira Rodrigues, por conta do seu falecido irmão, porém não possuía relação de amizade próxima com o acusado. Com relação aos fatos, informou que o único conhecimento que tinha naquela data era de que o seu irmão havia saído para se encontrar com o acusado. Informou que a esposa de Guilherme, Ritchelli, havia lhe acordado para avisar da sua saída, onde a mesma possuía mais informações dos momentos que antecederam o fato. Tinha conhecimento do envolvimento do seu irmão com o tráfico de drogas, já havia sofrido uma tentativa de homicídio por conta destes envolvimentos, mas não soube relatar este fato com clareza. Afirmou que mantinha uma relação próxima com o seu irmão, moravam no mesmo pátio, porém, em casas distintas, possuindo uma lavagem automotiva. Referente a outra vítima, Paulo Eduardo de Oliveira, contou que conhecia pelo seu irmão também, onde o mesmo frequentava o seu pátio e era cliente da sua lavagem, relatando que em uma dessas lavagens que havia feito no carro de Paulo, encontrou sangue dentro do carro, entre o banco de trás e o porta-malas, porém, não chegou a questionar. Reafirmou que o acusado Alessander era amigo do seu irmão, estavam sempre juntos, ele já havia frequentado várias vezes a sua lavagem, porém, sem muito contato. Nunca presenciou alguma cena de desentendimento entre os dois, o acusado era muito quieto e só conversava com o seu irmão, não sabendo informar se em algum momento eles possuíram alguma desavença. Ratificou que no dia do fato, quem possuía maiores informações sobre o paradeiro de Guilherme era a sua esposa. Algumas horas depois da saída dele, tentaram entrar em contato com Guilherme, não logrando êxito. O único conhecimento que possuía sobre seu irmão era que ele havia saído com uma quantia em dinheiro para fazer um "brique". Contou que Guilherme havia saído de casa por volta das 23 horas, sem dar mais retorno ou notícias. Informou que no dia que ocorreu o velório do seu irmão, o réu Alessander ligou para lhe contatar e solicitar que não comunicassem aos policias referente ao seu encontro com o ofendido e nem sequer citar o nome dele. Não sabe dizer se realmente foi o réu Alessander quem cometeu este crime, mas confirmou que nesta data e horário eles se encontraram. A esposa do seu irmão também...

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