Acórdão nº 50281865120218210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segunda Câmara Cível, 31-01-2022

Data de Julgamento31 Janeiro 2022
ÓrgãoSegunda Câmara Cível
Classe processualApelação / Remessa Necessária
Número do processo50281865120218210001
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001258248
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

2ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação/Remessa Necessária Nº 5028186-51.2021.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: ICMS/ Imposto sobre Circulação de Mercadorias

RELATOR: Desembargador JOAO BARCELOS DE SOUZA JUNIOR

APELANTE: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (INTERESSADO)

APELADO: VIEZZER & CIA LTDA (IMPETRANTE)

RELATÓRIO

Cuida-se de apelação (evento 53), apresentada pelo ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, e remessa necessária da sentença que concedeu a segurança postulada por VIEZZER & CIA LTDA nos seguintes termos (evento 21):

Em face do exposto, confirmo a medida liminar e CONCEDO A SEGURANÇA postulada para, afastando o ato ilegal previsto no art. 25-E, §3º, Livro III, do RICMS/RS, assegurar que o impetrante não seja obrigado a estornar o imposto presumido das mercadorias que detiver em estoque “no fim do último dia do período de apuração imediatamente anterior àquele em que deixar de apurar o ajuste nos temos do art. 25-A”, bem como, caso tenha sido realizado o estorno, assegurar o direito ao creditamento dos valores indevidamente recolhidos a este título, compensando-se na apuração do ICMS, na forma do art. 60, inciso I, Livro I do RICMS.

Custas (reembolso) pelo impetrado, em razão do princípio da causalidade. Sem honorários, de acordo com as Súmulas 512 do STF e 105 do STJ.

Intimem-se.

Em função do artigo 13 da Lei 12.016/2009, expeça-se, de imediato, ofício à autoridade coatora e ao Estado do Rio Grande do Sul (Procuradoria-Geral do Estado - PGE).

Interposto recurso de apelação, intime-se o recorrido para contrarrazões. Com a juntada, encaminhe-se os autos ao Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, em atendimento ao art. 1010, §3º, do CPC.

Decorrido prazo para recurso voluntário, encaminhem-se os autos ao Tribunal de Justiça para reexame necessário, com fulcro art. 14, § 1º, da Lei nº 12.016/2009.

Diligências legais.

Em razões, o apelante alega, em suma, que a parte apelada atua no comércio varejista, sendo que parte das mercadorias que comercializa está submetida à substituição tributária. Relata que a impetrante vinha realizando o Ajuste ST com base na sistemática prevista no artigo 25-A, Livro III do RICMS, o qual permite o creditamento do imposto no momento da entrada da mercadoria no estabelecimento adquirente, podendo o ICMS da saída (débito) ser lançado somente no mês (ou meses) subsequentes, havendo, portanto, registro de ICMS-ST a favor da impetrante sem que sequer tenha ocorrido a respectiva saída, porque, por característica, nessa sistemática não há uma vinculação direta da apuração do imposto à mercadoria, eis que apesar de ainda não ter ocorrido o registro do débito, as mercadorias que se encontram em estoque já tiveram seu respectivo crédito apropriado pela impetrante. Assevera que, por outro lado, na sistemática do artigo 25-E, que disciplina o Regime Optativo de Tributação da Substituição Tributária – ROT/ST -, não será exigido do contribuinte substituído participante o imposto correspondente à complementação do ICMS retido por substituição tributária, nos casos em que o preço praticado na operação a consumidor final for superior à base de cálculo utilizada para o cálculo do débito de responsabilidade por substituição tributária. Aponta que no ROT/ST, não haverá a apuração de débitos e créditos na modalidade de Ajuste ST. O contribuinte participante não adjudicará crédito nem terá direito à restituição do imposto, tampouco estará sujeito à complementação do imposto devido por substituição tributária. Refere que, para que fosse admitida a manutenção do crédito sobre as mercadorias em estoque, seria preciso dispor que tais mercadorias não poderiam ser incluídas no ROT ST, ou seja, somente as mercadorias entradas no estabelecimento a partir de 01/01/2021 poderiam estar enquadradas no ROT/ST, obrigando o contribuinte a manter duas escriturações em separado: uma para as mercadorias existentes em estoque em 31/12/2021, em relação às quais seguiriam sendo aplicadas as regras do art. 25-A, e outra em relação às ‘novas’ mercadorias entradas no estabelecimento do contribuinte, em relação às quais aplicar-se-iam as regras do artigo 25-E. Entende que a sentença, ao conceder a ordem, permite ao contribuinte apropriar-se do crédito sem nem ao menos confrontá-lo com o débito da saída, pois no ROT/ST não há crédito a apropriar, nem débito a complementar, pois não há ajuste no ICMS-ST, requerendo a impetrante ficar com um crédito que não se sabe se terá direito. Defende ser evidente que essa nova sistemática prevista no artigo 25-B do Regulamento do ICMS permite a apuração de eventual diferença individualizando o cálculo item a item e no momento em que ocorre a efetiva operação de saída da mercadoria, fato que aproxima ao máximo a sistemática ao que preconiza a decisão do STF, porque faz a comparação da base de cálculo da mercadoria adquirida com a da mercadoria vendida. Não obstante, refere que o débito de ICMS relativo às saídas de mercadorias na substituição tributária seja superior ao referido crédito, a empresa deverá informar um débito em sua conta corrente fiscal, o qual poderá ser compensado com eventuais outros créditos que possua e, permanecendo saldo, deverá recolher o imposto devido ao Estado. Acena a falta de direito adquirido a determinada forma de cálculo, na medida em que, uma vez verificado pelo fisco que a metodologia utilizada era prejudicial ao itneresse público por incentivar a sonegação fiscal e antecipar créditos antes da ocorrência do fato gerado, ele tem o poder/dever de adequar a lei, razão pela qual não há ilegalidade na alteração legislativa. Alega que a sentença permite o duplo creditamento do ICMS para uma mesma operação, em ofensa ao princípio da não-cumulatividade, resultando em enriquecimento sem causa para a contribuinte e gerando desequilíbrio concorrencial. Protesta pelo provimento do recurso, fins de que seja modificada a sentença e denegada a ordem, invertendo-se os encargos sucumbenciais.

Foram oferecidas contrarrazões (evento 57).

O Ministério Público de Segundo Grau opinou pelo provimento do recurso (evento 8).

Vieram os autos conclusos.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

Infere-se dos autos que, em 19/03/2021, VIEZZER & CIA LTDA impetrou mandado de segurança contra ato do Subsecretário da Receita Pública Estadual requerendo seja afastada a obrigação de estornar o imposto presumido das mercadorias que detiver em estoque "no fim do último dia do período de apuração imediatamente anterior àquele em que deixar de apurar o ajuste nos termos do artigo 25-A, do Livro III, do RICMS, bem como em caso de já ter realizado o estorno, assegurar o direito ao creditamento dos valores indevidamente recolhidos, mediante compensação na apuração do ICMS, nos termos do artigo 60, I, Livro I, do RICMS."

A sentença concedeu a ordem e, da decisão, recorre o Estado.

É consabido que somente se concede o mandado de segurança quando verificado, de plano, ato ilegal ou revestido de abuso de poder, praticado pela autoridade coatora, que importe em violação do direito líquido e certo da parte impetrante. É o que se extrai da redação do artigo 1º, da Lei nº 12.016/2009 e artigo 5º, inciso LXIX, da Constituição Federal, in verbis:

Art. 1º Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça.

Art. 5º - (...) LXIX - conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público.

No caso, observo a configuração de ato ilegal a violar o direito líquido e certo da impetrante, o que atrai a manutenção da ordem concedida pelo juízo de origem.

Primeiramente, ressalto que a constitucionalidade da restituição da diferença de ICMS pago a mais no regime de substituição tributária, com base no art. 150, § 7º, da CF, foi discutida pelo Supremo Tribunal Federal, no RE 593.849/MG pelo rito dos recursos repetitivos, tendo aquela Corte fixado o seguinte entendimento:

CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. ICMS. RESTITUIÇÃO DA DIFERENÇA DO IMPOSTO PAGO A MAIS NO REGIME DE SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA. BASE DE CÁLCULO PRESUMIDA E BASE DE CÁLCULO REAL. ART. 150, § 7º, DA CF. ADI 2.675/PE, REL. MIN. CARLOS VELLOSO E ADI 2.777/SP, REL. MIN. CEZAR PELUSO, QUE TRATAM DA MESMA MATÉRIA E CUJO JULGAMENTO JÁ FOI INICIADO PELO PLENÁRIO. EXISTÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL.
(RE 593849 RG, Relator(a): Min.
RICARDO LEWANDOWSKI, julgado em 17/09/2009, DJe-191 DIVULG 08-10-2009 PUBLIC 09-10-2009 EMENT VOL-02377-07 PP-01413 LEXSTF v. 31, n. 370, 2009, p. 284-288 LEXSTF v. 31, n. 371, 2009, p. 288-292 )

A questão foi decidida pelo plenário da Corte, tendo sido definido que “é devida a restituição da diferença do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS pago a mais no regime de substituição tributária para a frente se a base de cálculo efetiva da operação for inferior à presumida” – Tema 201, STF:

O Tribunal, apreciando o Tema 201 da repercussão geral, por maioria e nos termos do voto do Relator, conheceu do recurso extraordinário a que se deu provimento, para reformar o acórdão recorrido e afirmar o direito da parte recorrente em lançar em sua escrita fiscal os créditos de ICMS pagos a maior, nos termos da legislação tributária do Estado de Minas Gerais e respeitado o lapso prescricional de 5 (cinco) anos previsto na Lei...

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