Acórdão nº 50287989320208210010 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Criminal, 17-02-2023

Data de Julgamento17 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50287989320208210010
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoOitava Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002141650
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

8ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5028798-93.2020.8.21.0010/RS

TIPO DE AÇÃO: Crimes de Trânsito (Lei 9.503/97

RELATOR: Desembargador LEANDRO FIGUEIRA MARTINS

APELANTE: ANTONIO GILMAR DE JESUS (RÉU)

APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (AUTOR)

RELATÓRIO

O MINISTÉRIO PÚBLICO ofereceu denúncia contra ANTÔNIO GILMAR DE JESUS, afirmando estar incurso nas sanções do artigo 306, § 1º, inciso I, da Lei n. 9.503/97 (Código de Trânsito Brasileiro - CTB), pela prática do seguinte fato descrito na peça inicial (evento 2, DENUNCIA2):

Recebida a denúncia em 25/01/2021 (evento 2, OUT5, fls. 1/3) e produzida a prova, a pretensão, nos seguintes termos, foi julgada procedente (evento 43, SENT1):

"Passo à individualização da pena.

Primeira fase: pena-base

A culpabilidade, identificada como o grau de reprovabilidade da conduta, não excedeu ao ordinário.

Nada a considerar em relação aos antecedentes (evento 35).

Não há elementos para aferir a conduta social e a personalidade, portanto, considero-as neutras.

O motivo foi típico para o delito.

As circunstâncias do delito vão sopesadas negativamente, já que a Polícia Rodoviária Federal foi acionada em razão de ocorrência de trânsito em que o réu se envolveu.

Não existem consequências a serem sopesadas.

A vítima é a incolumidade física de outrem.

Considerando o exame operado das circunstâncias judiciais, fixo a pena-base em 7 (sete) meses de detenção.

Segunda fase: pena intermediária

Não verifico a ocorrência de agravantes.

O réu confessou ter ingerido uma cerveja antes de conduzir o veículo. Embora a tese não se coadune à realidade do fato, considerando notadamente os sinais indicativos da embriaguez conjugado pelo resultado da medição do etilômetro, reconheço a confissão parcial, reduzindo a pena em quinze dias.

Assim, a intermediária vai fixada em 6 (seis) meses e 15 (quinze) dias de detenção.

Terceira fase: pena final

Ausentes causas de aumento ou de diminuição. Assim, a pena resta definitiva em 6 (seis) meses e 15 (quinze) dias de detenção.

Fixo o regime inicial aberto para início cumprimento da pena, nos termos do art. 33, § 2º, “c” do Código Penal.

A multa cumulativa vai arbitrada em 15 dias-multa, à vista do exame das circunstâncias judiciais já realizado anteriormente, à razão unitária mínima (1/30 do salário mínimo vigente ao tempo do fato), diante da ausência de comprovação acerca da condição econômica do réu.

Aplico ao réu, ainda, a proibição de dirigir veículo automotor pelo prazo de 3 (três) meses, em simetria às circunstâncias judiciais.

No presente caso, possível sua substituição da pena privativa de liberdade, porquanto atendidas as exigências previstas nos incisos I, II e III do art. 44 do Código Penal.

Presentes os requisitos legais, substituo a pena privativa de liberdade por uma restritiva de direitos, consistente na prestação pecuniária no valor correspondente a um salário-mínimo, observando-se o valor vigente ao tempo da sentença, em favor de entidades públicas ou privadas com destinação social, devendo o valor ser depositado na conta única da VEC.

Por fim, não é caso de fixar indenização mínima, na forma do artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal, uma vez que não há prejuízo material remanescente provocado a outrem.

Diante do exposto, julgo PROCEDENTE a acusação contida na denúncia para CONDENAR o réu ANTÔNIO GILMAR DE JESUS, já qualificado, como incurso nas sanções do artigo 306, § 1º, incisos I, da Lei nº 9.503/97, com a incidência do artigo 65, inciso III, "d", do Código Penal, à pena de 6 (seis) meses e 15 (quinze) de detenção, em regime inicial aberto, e pagamento de 15 dias-multa, no valor unitário de um trigésimo do salário-mínimo vigente ao tempo do fato, corrigido monetariamente, além da proibição de dirigir veículo automotor pelo prazo de 3 (três) meses.

Custas pelo réu. Contudo, suspendo a exigibilidade do pagamento, ante a gratuidade que ora lhe concedo, em deferimento à solicitação do evento 10.

A pena privativa de liberdade foi substituída por uma restritiva de direitos".

O réu ingressou com apelação (evento 50, APELAÇÃO1), alegando, em suma (evento 59, RAZAPELA1): (a) ausência de prova da materialidade em razão da inadequação do teste do etilômetro, visto "que a última calibração do aparelho utilizado havia ocorrido em 23/05/2019, ao passo que o fato adveio mais de 1 (um) ano depois, mais especificadamente em 11/07/2020" (fls. 2/3); (b) que "Não consta no inquérito que a autoridade policial advertiu o réu de que ele não era obrigado a produzir a prova contra si" (fl. 3); (c) inexistir informações acerca do tempo e volume de sopro no momento do exame, o que comprometia a validade da prova; (d) a necessidade de reconhecimento da atenuante da confissão espontânea, reduzindo-se as penas ao mínimo legal. Assim, ao final, pediu o provimento do recurso, ocorrendo absolvição ou redução das reprimendas.

O Ministério Público, em contrarrazões, postulou o não provimento do recurso (evento 62, CONTRAZAP1).

O réu foi intimado da sentença (evento 53, OUT1).

Nesta instância recursal, a Procuradoria de Justiça lançou parecer (evento 7, PARECER1).

É o relatório.

VOTO

Conheço do recurso de apelação, porquanto atendidos os requisitos previstos no artigo 593 do CPP.

Comete o crime do artigo 306 do CTB aquele que conduz veículo automotor com a capacidade psicomotora alterada pelo uso de álcool.

Neste contexto, a materialidade e a autoria do delito imputado ao réu ficaram devidamente comprovadas pelos seguintes documentos: (1) ocorrência policial (evento 2, P_FLAGRANTE3, fls. 9/11); (2) resultado do teste de etilômetro (fl. 12); (3) termos de declarações (fls. 15/16); (4) Boletim de Acidente de Trânsito - BAT (evento 2, INQ4, fls. 55/64).

Assim, objetivamente, a alteração da capacidade psicomotora do acusado acabou demonstrada nos autos.

O resultado do exame de etilômetro do processo 5028798-93.2020.8.21.0010/RS, evento 2, P_FLAGRANTE3, fl. 12 (teste n. 116), informou a presença, no momento da coleta, da quantidade de 1,21mg por litro de ar alveolar, superior àquela prevista no inciso I do § 1º do artigo 306 do CTB:

"Art. 306. Conduzir veículo automotor com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência: (Redação dada pela Lei nº 12.760, de 2012)
Penas - detenção, de seis meses a três anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.

§ 1o As condutas previstas no caput serão constatadas por: (Incluído pela Lei nº 12.760, de 2012)
I - concentração igual ou superior a 6 decigramas de álcool por litro de sangue ou igual ou superior a 0,3 miligrama de álcool por litro de ar alveolar; ou (Incluído pela Lei nº 12.760, de 2012)
II - sinais que indiquem, na forma disciplinada pelo Contran, alteração da capacidade psicomotora.
(Incluído pela Lei nº 12.760, de 2012)".

Neste sentido, acerca do tema e configuração do delito do artigo 306 do CTB, ressalto julgado do Superior Tribunal de Justiça (STJ):

"PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO DO ART. 306 DO CTB. INOCORRÊNCIA. COMPROVAÇÃO DA EMBRIAGUEZ POR MEIO DE TESTE DE BAFÔMETRO SUFICIENTE PARA A CONDENAÇÃO. DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DA ALTERAÇÃO DA CAPACIDADE PSICOMOTORA. ACÓRDÃO RECORRIDO EM CONFORMIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA DESTE STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. ART. 255/RISTJ. INOBSERVÂNCIA. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. A jurisprudência desta Corte Superior firmou o entendimento de que "tendo o delito sido praticado após as alterações procedidas pela Lei nº 11.705/08 e antes do advento da Lei nº 12.760/12, a simples conduta de dirigir veículo automotor em via pública, estando com concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 (seis) decigramas de álcool por litro, configura o delito previsto no art. 306 do CTB, o que torna desnecessária qualquer discussão acerca da alteração das funções psicomotoras do agente" (REsp 1577903/RS, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 10/05/2016, DJe 19/05/2016).
2. A não observância dos requisitos do artigo 255, parágrafos 1º e 2º, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, torna inadmissível o conhecimento do recurso com fundamento na alínea "c" do permissivo constitucional.
3. Agravo regimental a que se nega provimento" (AgInt no AREsp 1161063/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 19/10/2017, DJe 27/10/2017 - grifou-se).

No mais, as considerações trazidas pela defesa nas razões de recurso, relacionadas à falta de materialidade, não merecem trânsito.

A respeito da argumentação referente à calibração do instrumento utilizado para a constatação do delito, mostra-se, inicialmente, necessário diferenciar a calibração da verificação, transcrevendo-se o exposto no site1 do Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (INMETRO):

"Calibração

Operação que estabelece, sob condições especificadas, numa primeira etapa, uma relação entre os valores e as incertezas de medição fornecidos por padrões e as indicações correspondentes com as incertezas associadas; numa segunda etapa, utiliza esta informação para estabelecer uma relação visando a obtenção dum resultado de medição a partir duma indicação.

Verificação de um instrumento de medição
'Procedimento de avaliação da conformidade que resulta na afixação de marca de verificação e/ou a emissão de certificado de verificação'.
[ver também Portaria Inmetro nº 232/2012, 2.44]
A verificação avalia o instrumento de medição de acordo com os critérios contidos em regulamentação técnica metrológica e a Portaria
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