Acórdão nº 50290132920228210033 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Quarta Câmara Cível, 18-05-2023

Data de Julgamento18 Maio 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50290132920228210033
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Quarta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003745580
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

14ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5029013-29.2022.8.21.0033/RS

TIPO DE AÇÃO: Alienação fiduciária

RELATOR: Desembargador MÁRIO CRESPO BRUM

APELANTE: GABRIEL STROHER SARAIVA (AUTOR)

APELADO: AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por GABRIEL STROHER SARAIVA em face da sentença que, nos autos da ação de revisão de cláusulas contratuais ajuizada contra AYMORÉ CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A., julgou improcedentes os pedidos deduzidos na inicial, com o seguinte dispositivo (evento 18):

Isso posto, JULGO IMPROCEDENTE a ação revisional ajuizada por GABRIEL STROHER SARAIVA contra AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A., relativa ao(s) contrato(s) objeto(s) dos autos.

Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, os quais fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa, que restam suspensas em tendo havido o deferimento da AJG.

Interposta apelação, intime-se a parte adversa para contrarrazões no prazo legal. Com a juntada das contrarrazões, devolva-se à origem, para remessa de apelação ao Tribunal de Justiça.

Não havendo recurso, devolva-se à origem para providências finais, como apuração de custas, expedição de alvarás e baixa.

Subsistindo crédito em favor de uma das partes e/ou de seus procuradores, o cumprimento de sentença deverá ser promovido em procedimento eletrônico apartado, indicando-se o processo principal ao qual deve ser vinculado., conforme orientação posta no Ofício-Circular nº 077/2019-CGJ, item “6”.

Intimem-se.

Em suas razões recursais (evento 23), defende o autor a abusividade dos juros remuneratórios pactuados, bem como da comissão de permanência, especialmente de forma cumulada com outros encargos de mora. Postula o afastamento da cobrança das tarifas de abertura de crédito (TAC) e de avaliação do veículo. Pede, assim, a reforma da sentença, com a condenação da parte ré ao pagamento dos ônus de sucumbência.

A instituição financeira apresentou contrarrazões (evento 28), requerendo, em síntese, o desprovimento do recurso.

Vieram os autos conclusos para julgamento.

Foram observadas as formalidades dos artigos 931 e seguintes do Código de Processo Civil, tendo em vista a adoção do sistema informatizado nesta Corte.

É o relatório.

VOTO

A discussão devolvida a esta Corte cinge-se aos seguintes tópicos: (a) juros remuneratórios; (b) comissão de permanência; (c) tarifa de abertura de crédito (TAC); e (d) tarifa de avaliação do bem.

Passo ao exame das questões suscitadas.

Inicialmente, destaco que os contratos de financiamento de veículo com cláusula de alienação fiduciária encontram-se sujeitos às disposições do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/1990), consoante orientação jurisprudencial consolidada e descrita na Súmula 297 do Egrégio STJ:

O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.

De tal sorte, mostra-se possível a revisão das cláusulas abusivas, com consequente flexibilização do princípio pacta sunt servanda e do ato jurídico perfeito.

A respeito dos juros remuneratórios, o STJ, ao examinar o REsp n. 1.061.530/RS, submetido ao regime dos recursos repetitivos (Temas 24 a 27 do STJ), fixou sua orientação jurisprudencial nos seguintes termos:

DIREITO PROCESSUAL CIVIL E BANCÁRIO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULAS DE CONTRATO BANCÁRIO. INCIDENTE DE PROCESSO REPETITIVO. JUROS REMUNERATÓRIOS. CONFIGURAÇÃO DA MORA. JUROS MORATÓRIOS. INSCRIÇÃO/MANUTENÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES.

(..)

ORIENTAÇÃO 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS

a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF;

b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade;

c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02;

d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto.

(...)

Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte, provido, para declarar a legalidade da cobrança dos juros remuneratórios, como pactuados, e ainda decotar do julgamento as disposições de ofício.

Ônus sucumbenciais redistribuídos.

(REsp 1061530/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 22/10/2008, DJe 10/03/2009)

Revisei o posicionamento até então adotado, a fim de admitir maior flexibilidade para os juros remuneratórios, quando comparados com a média de mercado divulgada pelo BACEN para operações similares na data da contratação, consoante a orientação fixada pelo STJ no julgamento do aludido REsp n. 1.061.530/RS.

No caso concreto, verifico que o instrumento contratual sob revisão (Contrato 4, evento 10), firmado pelos litigantes em janeiro de 2022, prevê a incidência de juros remuneratórios de 35,79% ao ano, índice que, embora superior, se coaduna com a média de mercado divulgada pelo Banco Central do Brasil à época da contratação (26,87% ao ano), não denotando abusividade. Note-se, no particular, que esta Câmara não considera abusiva a taxa pactuada em percentual até 50% superior à média de mercado, parâmetro observado na hipótese em tela.

Assim, impositiva a confirmação da sentença que, no ponto, determinou a manutenção da taxa de juros remuneratórios contratada.

No que tange à comissão de permanência, o mesmo STJ firmou entendimento no sentido de que é possível a sua cobrança, em caso de inadimplemento, desde que não haja a sua aplicação cumulada com qualquer outro encargo moratório, conforme se verifica do seguinte precedente:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. POSSIBILIDADE DE COBRANÇA DESDE QUE NÃO CUMULADA COM OS DEMAIS ENCARGOS MORATÓRIOS. REPETIÇÃO DO INDÉBITO. CABIMENTO. DESNECESSIDADE DE PROVA DO ERRO NO PAGAMENTO. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. COMPENSAÇÃO. POSSIBILIDADE. 1. É admitida a cobrança da comissão de permanência no período da inadimplência, desde que não cumulada com correção monetária, juros moratórios, multa contratual ou juros remuneratórios, calculada à taxa média de mercado, limitada, contudo, à taxa contratada. (...) 4. Agravo regimental não provido. (AgRg no REsp 555.358/RS, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 28/09/2010, DJe 06/10/2010)

Na hipótese em tela, o pacto celebrado entre os litigantes não prevê a incidência da comissão de permanência, mas, sim, de juros remuneratórios, juros moratórios e multa contratual (conforme cláusula Deveres, item VI, de tal avença), os quais não restaram pontualmente impugnados -, carecendo o requerente, no particular, de interesse processual para pleitear o afastamento de tal encargo (comissão de permanência).

Destarte, impõe-se a manutenção dos encargos moratórios, na forma em que estipulados, inexistindo óbice à cobrança dos juros remuneratórios pactuados para a normalidade também no período da inadimplência, nos termos da Súmula 296 do STJ1.

Quanto à cobrança de tarifas administrativas, ressalto que o Egrégio STJ, ao apreciar o REsp n. 1.251.331/RS, submetido ao regime dos recursos repetitivos, assim dispôs:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CONTRATO DE FINANCIAMENTO COM GARANTIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. DIVERGÊNCIA. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. JUROS COMPOSTOS. MEDIDA PROVISÓRIA 2.170-36/2001. RECURSOS REPETITIVOS. CPC, ART. 543-C. TARIFAS ADMINISTRATIVAS PARA...

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