Acórdão nº 50293419420188210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Nona Câmara Cível, 09-12-2022

Data de Julgamento09 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50293419420188210001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Nona Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002090931
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

19ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5029341-94.2018.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Pagamento

RELATORA: Desembargadora MYLENE MARIA MICHEL

APELANTE: ALVARO MIROVSKI (RÉU)

APELADO: CONDOMINIO EDIFICIO CAROLINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível interposta por ALVARO MIROVSKI contra sentença de procedência proferida nos autos da Ação de Cobrança de Despesas Condominiais em que contende com CONDOMÍNIO EDIFÍCIO CAROLINA.

Eis o dispositivo da sentença (Evento 3 - PROCJUDIC3, págs. 41/49, da origem):

ISSO POSTO, rejeito as preliminares e JULGO PROCEDENTE o pedido nos autos da ação ordinária aforada pelo CONDOMÍNIO EDIFÍCIO CAROLINA contra ALVARO MIROVSKI para condenar o requerido ao pagamento das cotas condominiais e demais despesas inadimplidas vencidas nos respectivos períodos: 11/2017 a 01/2018, incluindo-se a multa de 2%, juros de mora de 1% ao mês e correção monetária desde cada vencimento, além das cotas vencidas até o trânsito em julgado deste feito, amortizado o depósito da fl. 61, extinguindo o feito, com resolução de mérito, forte nos artigos 323, 373, 487, inc. I, do Novo Código de Processo Civil.

Condeno o réu ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios fixados 15% sobre o valor da condenação à parte autora, tendo em vista o tempo despendido e trabalho desenvolvido, forte no art. 85, §2º, do Novo Código de Processo Civil.

Expeça-se alvará em favor da parte autora dos valores depositados nos autos (fl. 61), cabendo à autora apresentar os dados bancários e observando a procuração da fl. 05, amortizando a quantia da condenação.

Transitada em julgado, nada sendo requerido, arquivem-se com baixa. Observe-se o disposto no PROVIMENTO Nº 030/2016-CGJ, que altera a alínea “a” do art. 189 da Consolidação Normativa Notarial e Registral - CNRR, passando a vigorar com a seguinte redação: “Art. 189 – Far-se-á a averbação: a) à vista da carta de sentença, de mandado judicial, de termos de audiência, de sentenças/mandado, de termos de entendimento homologados, ou qualquer outro documento judicial com efeito de mandado.

Os embargos de declaração opostos pela parte ré foram desacolhidos (Evento 3 - PROCJUDIC4, págs. 08/10, da origem).

Nas razões recursais (evento 3, Processo Judicial 4, páginas 15-24, da origem), o apelante sustenta que o condomínio apelado não se desincumbiu do ônus probatório em relação à regularidade do débito condominial, na medida em que amparado em documentos unilateralmente elaborados. Sustenta que o condomínio apelado: i) não apresentou a lista de convocação para realização de assembleia; ii) não comprovou que mais e 2/3 dos condôminos estavam presentes à assembleia; iii) não comprovou ter agido com proporcionalidade antes de aplicar a multa; e iv) não apresentou cópias das notas fiscais do fornecedor de gás do condomínio para comprovar o consumo. Relativamente à cobrança das multas previstas na convenção de condomínio, aponta a necessidade de que estabelecida por norma condominial. No caso concreto, afirma que os documentos de fls. 10/12, 13/23 e 24/26 não foram acompanhadas de prova da convocação de todos os condôminos, além de não estarem assinadas por 2/3 deles. Ainda, invoca o art. 1.337 do CC, afirmando que as multas que lhe foram impostas são nulas. Ainda, acaso mantida a higidez da penalidade, afirma ser parte ilegítima para figurar no polo passivo da ação, na medida em que de acordo com o art. 3º, deve ser aplicada ao ocupante do imóvel. Refere que o condomínio apelado "tentou notificar o ocupante direto do imóvel, como se vê nos documentos de fl. 74 e 78, o qual foi dirigir o ao morador e não ao proprietário, ora apelante". Alega que o condomínio também não realizou qualquer notificação antes de impor a penalidade e que a ocupante do imóvel era a sra. Jhenifer Santiago Campos Schlosser. Em relação à cobrança das despesas de gás, defende a necessidade de reforma da sentença, na medida em que o condomínio não comprovou o pagamento dessa despesa e não demonstrou o rateio que caberia a cada condômino. Nega o consumo de gás atribuído à sua unidade e afirma que caberia ao condomínio comprová-lo. Sustenta que os informantes ouvidos durante a instrução processual não comprovam o consumo de gás pela sua unidade. Alega que o documento de fl. 72 é apócrifo. Requer o provimento do recurso para que a sentença seja reformada em relação à cobrança das multas impostas à unidade e das despesas de gás.

O condomínio apelado apresentou contrarrazões (evento 3, Processo Judicial 4, páginas 27-30, da origem) sustentando, haver comprovado os fatos constitutivos do seu direito e demonstrado a regularidade da cobrança dos débitos condominiais. Requer o desprovimento do recurso.

Remetidos os autos a esta Egrégia Corte, o recurso foi distribuído.

Vieram conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Conheço do recurso, porquanto preenchidos os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade aplicáveis à espécie.

Cuida-se de Ação de Cobrança de Despesas Condominiais proposta pelo CONDOMINIO EDIFICIO CAROLINA, ora apelado, em face de CONDOMINIO EDIFICIO CAROLINA, ora apelante, visando ao pagamento de despesas condominiais e multas inadimplidas referentes aos meses de novembro e dezembro de 2017 e janeiro de 2018.

Citado, o apelante apresentou contestação (evento 3, Processo Judicial 1, páginas 37-49, da origem).

Conforme relatório supra, a ação foi julgada procedente para condenar o apelante ao pagamento do débito condominial inadimplido.

Cinge-se a controvérsia recursal: i) à cobrança de multa aplicadas pela violação aos deveres previstos no regimento interno do condomínio pelos seus ocupantes; e ii) à cobrança de débitos relativos ao consumo de gás da unidade habitacional de sua propriedade.

Sem preliminares a apreciar, passo diretamente ao exame do mérito recursal.

1. Multas:

Os deveres dos condôminos estão previstos no art. 1.336 do CC:

Art. 1.336. São deveres do condômino:
I - contribuir para as despesas do condomínio na proporção das suas frações ideais, salvo disposição em contrário na convenção;
II - não realizar obras que comprometam a segurança da edificação;
III - não alterar a forma e a cor da fachada, das partes e esquadrias externas;
IV - dar às suas partes a mesma destinação que tem a edificação, e não as utilizar de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes.

Como se observa, afora os deveres de contribuir para as despesas do condomínio, o condômino deve utilizar o seu imóvel de modo que não prejudique o sossego e a tranquilidade dos demais possuidores, sejam eles condôminos ou não.

Descumprindo esse dever, o §2º desse dispositivo prevê a possibilidade de aplicação da multa prevista no ato constitutivo ou na convenção condominial:

§ 2 o O condômino, que não cumprir qualquer dos deveres estabelecidos nos incisos II a IV, pagará a multa prevista no ato constitutivo ou na convenção, não podendo ela ser superior a cinco vezes o valor de suas contribuições mensais, independentemente das perdas e danos que se apurarem; não havendo disposição expressa, caberá à assembleia geral, por dois terços no mínimo dos condôminos restantes, deliberar sobre a cobrança da multa.

Na hipótese de descumprimento reiterado dos deveres que lhe cabem, o art. 1.337 do CC permite a majoração da penalidade ao décuplo:

Art. 1337. O condômino, ou possuidor, que não cumpre reiteradamente com os seus deveres perante o condomínio poderá, por deliberação de três quartos dos condôminos restantes, ser constrangido a pagar multa correspondente até ao quíntuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, conforme a gravidade das faltas e a reiteração, independentemente das perdas e danos que se apurem.
Parágrafo único. O condômino ou possuidor que, por seu reiterado comportamento anti-social, gerar incompatibilidade de convivência com os demais condôminos ou possuidores, poderá ser constrangido a pagar multa correspondente ao décuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, até ulterior deliberação da assembleia.

Com efeito, a responsabilidade pelo pagamento da multa imposta pelo descumprimento das regras de conduta previstas na convenção de condomínio é do condômino e independe da aferição de culpa, conforme notas de Nelson Nery Júnior1:

3. Responsabilidade que se apura de forma objetiva. A responsabilidade do condômino aqui é objetiva. Ela decorre do dever correspondente ao direito fundamental previsto na CF 5.º XXII e 170 III: a propriedade obriga. A regra vem da Constituição alemã de 1919 (Constituição de Weimar), que no art. 153, in fine, estabeleceu, por inspiração dos civilistas Martin Wolff (Reichsverfassung und Eigentum, FG Kahl, n. III, p. 10) e Otto von Gierke (Deuts.Privatrecht, v. I, § 28, I, p. 255 e § 28, I, p. 319; v. II, § 120, V, p. 365 e § 125, III, p. 408), os princípios de que “a propriedade obriga” (Eigentum verpflichtet) e da “função social da propriedade” (Gebrauch nach Gemeinem Besten). No condomínio, o primeiro e mais importante consectário dessa regra é o respeito pelo condômino ao direito de propriedade dos demais, que, no contexto da regra ora analisada (CC 1337), privilegia os que se pautam de acordo com os ditames da convenção condominial, da Lei e da ordem. Argumentos que possam afastar a culpa do condômino pelas faltas (v.g., não é o condômino o responsável pela perturbação da vida condominial, mas um parente doente; seu trabalho lhe impõe o uso daquela espécie de equipamento, para cujo deslocamento, todas as manhãs, ele é obrigado a fazer o barulho que incomoda os demais etc.), não, necessariamente, o socorrem.

Logo, responde o condômino pelo pagamento da...

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