Acórdão nº 50295821020148210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Câmara Cível, 31-01-2022

Data de Julgamento31 Janeiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50295821020148210001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001475265
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

20ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5029582-10.2014.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Contratos Bancários

RELATOR: Desembargador DILSO DOMINGOS PEREIRA

APELANTE: BANCO J. SAFRA S.A (RÉU)

APELADO: SETE COMERCIO DE CALCADOS LTDA (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por BANCO J. SAFRA S.A., em face da sentença prolatada nos autos da ação revisional tombada sob o n. 5029582-10.2014.8.21.0001, que lhe move SETE COMÉRCIO DE CALÇADOS LTDA, cujo dispositivo enuncia (Evento 3, PROCJUDIC3, pg. 12):

Pelo exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por SETE COMÉRCIO DE CALÇADOS LTDA em face de BANCO J. SAFRA S/A. resolvendo o mérito, nos termos do artigo 487, I, do CPC, para revisar o contrato firmado entre as partes com o fim de limitar os juros de mora a 1% ao mês e afastar a cobrança de honorários advocatícios extrajudiciais e os efeitos da mora, bem como condenar o réu à devolução dos valores cobrados em excesso ( corrigido pelo IGP-M desde cada parcela paga e juros de 1% ao mês desde a citação), subtraindo-os, se for o caso, das parcelas vincendas, com a repetição simples do indébito caso exista crédito em favor da parte autora após a compensação dos valores. Condeno o autor no pagamento de 20% das custas e despesas processuais, bem assim de honorários ao patrono do réu que fixo em R$400,00. O restante das custas e despesas será encargo do réu, que também arcará com os honorários do procurador do autor, que fixo em R$ 800,00, vedada a compensação (artigo 85, §14º, do CPC). Sobre o valor dos honorários incidirá correção monetária pelo IGPM, a contar desta data, e também juros de 1% ao mês, a partir do trânsito em julgado, nos termos do artigo nos termos do artigo 85, §§ 2º e 8º, do CPC, considerada sobretudo a singeleza da demanda 15 64-1-001/2020/578932 - 001/1.14.0009768-2 (CNJ:.0013103- 27.2014.8.21.0001) e repetitividade da causa. A exigibilidade da verba sucumbencial que cabe ao autor fica suspensa, no entanto, em razão da gratuidade judiciária a ele concedida.

Em suas razões recursais (Evento 3, PROCJUDIC3, fl. 115), o banco apelante discorre sobre a cobrança extrajudicial. Acrescenta que é atribuído ao devedor a responsabilidade por todas as despesas a que ele der causa, em razão de mora ou inadimplemento. Menciona que não há nenhuma ilegalidade na cláusula de cobrança de honorários. Ademais, afirma que há equívoco na sentença, pois a incidência de juros de mora somente ocorre se houver valor em atraso, a partir da mora do devedor. Ressalta que a apelada sempre teve pleno conhecimento das vantagens e desvantagens da utilização da modalidade contratual pactuada. Destaca que, não havendo em falar em revisão do contrato e alteração das cláusulas contratuais, também não há falar em possibilidade de repetição de valores. Por fim, requer que seja reformada a sentença nos pontos atacados, de forma que os encargos moratórios sejam mantidos.

Intimada (Evento 3, PROCJUDIC4, fl. 120), a parte apelada não apresentou contrarrazões.

A seguir, subiram os autos a este Tribunal e vieram-me conclusos para julgamento.

Em razão da adoção do sistema informatizado, os procedimentos ditados pelos artigos 931 e 934, ambos do CPC, foram simplificados, sendo, no entanto, observados em sua integralidade.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

Pretende o apelante a reforma da sentença que limitou o percentual dos juros de mora, descaracterizou a mora e afastou a cobrança de honorários extrajudiciais.

Juros de mora

A jurisprudência do STJ, com relação aos juros de mora, permite a sua cobrança até o limite de 1% ao mês, ou de 12% ao ano. Nesse diapasão é o REsp. nº 402.483-RS, Relator o Ministro Castro Filho, STJ, 2ª Seção, julgado em 26.03.2003, DJU de 05.05.2003, desde que não cumulado com comissão de permanência.

Na hipótese, verifica-se a previsão de juros de mora de 0,256866% ao dia (item 16), mostrando-se, pois, abusivos, na esteira do entendimento do STJ, como bem indicado na sentença.

Logo, no ponto, deve ser desprovido o recurso.

Da descaracterização da mora

O Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento de recurso repetitivo (REsp nº 1.061.530/RS), consolidou entendimento no sentido da possibilidade de afastamento da mora quando constatada a abusividade de encargo incidente na normalidade contratual, ou seja, juros remuneratórios e capitalização.

Nesse ínterim, traz-se à baila o seguinte trecho do voto da i. Ministra Relatora Nancy Andrighi, proferido no julgamento do recurso supramencionado:

(...) CONSOLIDAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA

Logo, os seguintes enunciados representam a jurisprudência

consolidada na 2ª Seção quanto ao tema:

I . Afasta a caracterização da mora:

(i) a constatação de que foram exigidos encargos abusivos na contratação, durante o período da normalidade contratual.

I I . Não afasta a caracterização da mora:

(i) o simples ajuizamento de ação revisional;

(ii) a mera constatação de que foram exigidos encargos moratórios abusivos na contratação.

No caso concreto, inexistindo abusividade nos encargos do período da normalidade contratual, deve ser afastada a descaracterização da mora. De rigor, portanto, o provimento do apelo no tópico.

Honorários extracontratuais

Configura abusividade a exigência de verba honorária em caso de cobrança extrajudicial/judicial.

Nesse diapasão, prevê o art. 51, XII, do CDC:

“Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:

(...)

XII - obriguem o consumidor a ressarcir os custos de cobrança de sua obrigação, sem que igual direito lhe seja conferido contra o fornecedor;”(grifou-se)

Com efeito, a cobrança de honorários advocatícios pela instituição financeira demandada, na seara extrajudicial, é abusiva, pois implica transferência de encargos ao consumidor, tendo em vista que se trata de custo inerente ao próprio serviço e ao risco da atividade desenvolvida pelo fornecedor, cuja contrapartida já ocorre pelos custos da contratação.

Ou seja, os honorários advocatícios decorrentes da cobrança extrajudicial devem ser pagos por quem contratou os serviços do profissional, e não pelo devedor da obrigação principal...

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