Acórdão nº 50308278020198210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Terceira Câmara Cível, 28-01-2021

Data de Julgamento28 Janeiro 2021
ÓrgãoDécima Terceira Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50308278020198210001
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20000452219
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

13ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5030827-80.2019.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Alienação fiduciária

RELATOR: Desembargador ALZIR FELIPPE SCHMITZ

APELANTE: RICHARD ANNUNZIATO MARTINS (RÉU)

APELADO: OMNI S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por RICHARD ANNUNZIATO MARTINS, pois inconformado com a sentença que julgou extinta a ação de busca e apreensão movida por OMNI S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO, dispositivo lavrado nos seguintes termos:

Pelo exposto julgo EXTINTA a ação de busca e apreensão interposta por OMNI S/A CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO contra RICHARD ANNUNZIATO MARTINS, sem resolução do mérito, nos termos do art. 485, IV do CPC.

Condeno a parte autora, como sucumbente, a arcar com as custas processuais e honorários do advogado da parte adversa fixados em R$ 1.500,00 para o procurador da requerida, corrigido monetariamente pelo IGP-M/FGV desde esta data, com juros moratórios de 1% ao mês desde o trânsito em julgado da decisão.

Transitado em julgado, verifiquem as custas judiciais, caso ainda não tenha sido certificado, intimando-se para pagamento. Posteriormente, arquivem-se, com baixa. Observe-se o disposto no PROVIMENTO Nº 030/2016-CGJ, que altera a alínea “a” do art. 189 da Consolidação Normativa Notarial e Registral - CNRR, passando a vigorar com a seguinte redação: “Art. 189 – Far-se-á a averbação: a) à vista da carta de sentença, de mandado judicial, de termos de audiência, de sentenças/mandado, de termos de entendimento homologados, ou qualquer outro documento judicial com efeito de mandado.”

Publique-se.

Registre-se.

Intimem-se.

Em suma, o apelante alega que a sentença deixou de apreciar a reconvenção apresentada ao evento 13, portanto, pede pela sua análise com fulcro no art. 1.013, §3º, do CPC. No mérito, alega a abusividade dos juros remuneratórios e discorre acerca dos Seguros Prestamista e Mondial Serviços. Argumenta acerca da distribuição dos honorários advocatícios nas ação de busca e apreensão, bem como na reconvenção revisional. Pugna pelo provimento do apelo (Evento 58).

Ofertadas contrarrazões pelo banco, nas quais pede pelo desprovimento do recurso (Evento 65).

Autos conclusos para julgamento.

É o breve relatório.

VOTO

Conheço do recurso, pois preenchidos os requisitos de admissibilidade.

A questão devolvida à esta Corte diz respeito ao julgamento da reconvenção apresentada ao evento 13, bem como aos honorários advocatícios arbitrados em sentença para a ação de busca e apreensão movida pelo banco.

Conforme se depreende da leitura dos autos, a financeira ajuizou a presente ação de busca e apreensão em face de Richard, distribuída em 19/09/2019.

Em 13/11/2019, a parte ré apresentou contestação e reconvenção revisional nos autos originários e interpôs o agravo de instrumento de n. 5010684-25.2019.8.21.7000, de minha relatoria.

Em sua reconvenção, Richard alegou a abusividade dos juros remuneratórios e discorreu acerca dos Seguros Prestamista e Mondial Serviços. Pleiteou pela revisão dos encargos previstos para a inadimplência e da comissão de permanência. Requereu a compensação/repetição dos valores pagos a maior e argumentou acerca do afastamento da mora em decorrência das abusividades contratuais, pleiteando pela procedência da ação.

Em 30/01/2020, em julgamento Colegiado, provido o agravo de instrumento interposto, que colaciono a fim de evitar a tautologia:

Recebo o recurso porque preenchidos os requisitos de admissibilidade, vez que deferido o pedido de AJG para fins de análise do presente.

A ação de busca e apreensão, nos termos do artigo 3.º, do Decreto Lei n.º 911/69, pressupõe a existência do inadimplemento do devedor (mora).

É consolidado pela jurisprudência que basta a notificação do devedor para a caracterização da mora. Esta pode ser inclusive por meio de carta com aviso de recebimento, no endereço declinado no contrato, não se exigindo sequer a firma do contratante. Nestes termos, a notificação extrajudicial foi enviada e recebida no endereço informado no contrato (CONTR5, NOT6, Evento 1, do processo principal), cumprido, portanto, o requisito.

Todavia, o contrato juntado aos autos denota abuso na fixação da taxa de juros remuneratórios e, de acordo com os precedentes adotados por essa Câmara, EDcl no AgRg no REsp 842.973/RS, 3ª Turma, Rel. originário Min. Humberto Gomes de Barros, Rel. p/ Acórdão Min. Nancy Andrighi, julgado em 21.08.2008, a verificação da evidente ilegalidade das previsões contratuais para o período da normalidade (juros remuneratórios e capitalização de juros) afasta a configuração da mora.

Nesse sentido:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DECISÃO MONOCRÁTICA. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO (DL 911/67). CONTRATO BANCÁRIO DE OUTORGA DE CRÉDITO COM GARANTIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. CASO CONCRETO. ALEGAÇÃO DE ENCARGOS ABUSIVOS. MATÉRIA DE DEFESA. POSSIBILIDADE DE ANÁLISE. PARADIGMA – RESP. Nº 1.061.530/RS. LIMINAR REVOGADA. AGRAVO PROVIDO. Alegação do devedor fiduciário da existência de abusividades na pactuação. Hipótese em que verificada, em princípio, a abusividade na taxa de juros remuneratórios pactuada. Imperiosa a revogação da liminar de busca e apreensão, diante da incerteza da mora. AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO.(Agravo de Instrumento, Nº 70082589540, Décima Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Angela Terezinha de Oliveira Brito, Julgado em: 24-09-2019)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. DEMONSTRAÇÃO DE ABUSIVIDADE NOS ENCARGOS DO PERÍODO DA NORMALIDADE CONTRATUAL. MORA FRAGILIZADA. LIMINAR REVOGADA. A ação de busca e apreensão possui como requisito a existência da mora do devedor, nos termos do art. 3º do Decreto Lei n.º 911/69. Havendo demonstração de abusividade nos encargos incidentes no período na normalidade contratual, a mora resta fragilizada, descabendo o deferimento da liminar de busca e apreensão. Pedido de restituição do bem que deverá ser deduzido na origem. Inexistindo reconvenção, o pedido de concessão de tutela protetiva deverá ser deduzido na via adequada. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONHECIDO EM PARTE E, NESTA, PARCIALMENTE PROVIDO.(Agravo de Instrumento, Nº 70082416181, Décima Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: André Luiz Planella Villarinho, Julgado em: 26-09-2019)

No ponto, os juros remuneratórios foram contratados à taxa anual de 80%, enquanto a taxa média de mercado para a data da contratação (julho de 2018) era de 22,34% ao ano.

Diante do exposto, não preenchidos os requisitos do artigo 3º do Decreto-Lei nº. 911/69, mesmo que adequada a notificação da parte, diante da alegação e comprovação de abusividade de encargo da normalidade, não há falar em mora, razão pela qual voto por dar provimento ao recurso ao efeito de desconstituir a ordem de busca e apreensão do bem e, se já cumprido o mandado, determinar a imediata restituição do veículo.

Ato contínuo, aos Eventos 37 e 38, o banco reconvindo apresentou réplica à contestação revisional e contestação à reconvenção ajuizada, enquanto o contratante apresentou réplica à contestação da financeira, respectivamente.

Desse modo, embora constatada a ausência de recebimento da reconvenção e de intimação do autor/reconvindo para apresentar resposta, a contestação foi apresentada pela financeira espontaneamente, juntamente de sua réplica (Evento 37).

Importa ressaltar, ainda, que conforme dispõe o § 2º do artigo 343 do Código de Processo Civil, a extinção da ação principal não obsta o prosseguimento do processo quanto à reconvenção.

Assim, inexistindo óbice ao julgamento da reconvenção, pois, in casu, não há falar em afronta aos princípios da ampla defesa e do contraditório, possível a análise do recurso, com base no artigo 1.013, § 3º, inciso I, do Código de Processo Civil.

Nesse sentido:

“APELAÇÃO CÍVEL. LOCAÇÃO. AÇÃO DE MANUTENÇÃO DE POSSE. RECONVENÇÃO. GRATUIDADE JUDICIÁRIA. INDEFERIMENTO. Caso em que a sentença julgou extinta a reconvenção, objeto de insurgência recursal. Impossibilidade de análise do recurso, sobretudo porque não houve pagamento das custas da reconvenção, tampouco despacho do juízo recebendo-a e, por conseqüência, intimação do autor/reconvindo para apresentar contrarrazões, situação que impede o julgamento por esta Corte. SENTENÇA DESCONSTITUÍDA, DE OFÍCIO.” (AC n.º 70067250985/Ana Iser)"

Desse modo, observando o princípio da celeridade e da economia processual, acolho o pedido do apelo, passando à análise do mérito da reconvenção que está apta a julgamento, nos termos do artigo 1.013, § 3º, inciso I, do atual Código de Processo Civil.

De plano, a adoção do CDC é matéria sumulada – verbete 297, do colendo STJ –, não pairando dúvidas quanto a sua aplicabilidade. Todavia, pôr em prática o CDC não implica prover o pleito do consumidor. Impõe-se a prova de que as obrigações impostas pela instituição financeira sejam abusivas.

Outrossim, não mais se debate a possibilidade de limitação dos juros remuneratórios em 12% porque, há muito, o STJ e STF pacificaram o entendimento de liberdade na pactuação da taxa de juros.

Deste modo, antes de enfrentar a situação posta, é preciso termos em mente que os juros remuneratórios não estão limitados pela Constituição Federal, pelo Código Civil ou pela Lei de Usura. De outro lado, não estão de todo liberados como se verá a seguir.

Juros Remuneratórios

Os juros remuneratórios serão analisados a partir do paradigma expresso no Recurso Especial nº 1.061.530/RS, que assim decidiu:

a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios que foi estipulada na Lei de Usura (Decreto...

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