Acórdão nº 50319276520228210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Oitava Câmara Cível, 16-02-2023

Data de Julgamento16 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50319276520228210001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Oitava Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003052606
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

18ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5031927-65.2022.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Cláusulas Abusivas

RELATOR: Desembargador HELENO TREGNAGO SARAIVA

APELANTE: MARCIMIANA LOITAMAR PEREIRA DOS SANTOS (AUTOR)

APELANTE: FACTA FINANCEIRA S.A. CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

MARCIMIANA LOITAMAR PEREIRA DOS SANTOS e FACTA FINANCEIRA S.A. CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO interpõem recursos de apelação em face da sentença proferida nos autos da ação movida pela primeira em desfavor da segunda, nos seguintes termos:

Pelo exposto, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados pela parte autora para o fim de limitar os juros remuneratórios do contrato de empréstimo não consignado nº 5448448 à taxa média de mercado à época da contratação (2,50% a.m.), condenando o réu à devolução dos valores cobrados em excesso, subtraindo-os, se for o caso, das parcelas vincendas, com a repetição simples do indébito caso exista crédito em favor da parte autora após a compensação dos valores. O valor deverá ser corrigido monetariamente pelo IGP-M a partir de cada desembolso e acrescido de juros de mora de 1% ao mês a contar da data da citação.

Condeno o réu, como sucumbente, a arcar com as custas processuais e honorários do advogado da parte adversa. Fixo honorários em R$1000,00 (um mil reais) para o procurador do requerente.

Opostos embargos de declaração pela parte autora, restaram desacolhidos (Evento 28 - DESPADEC1).

Em suas razões, alega a ré apelante que a parte autora não logrou êxito em demonstrar, em sua petição inicial, a desvantagem exacerbada na cobrança de juros remuneratórios. Afirma que a taxa média de mercado não é um valor fixo, sendo admitida a faixa de variação. Colaciona precedentes. Narra as peculiaridades dos contratos de empréstimo pessoal consignado aos servidores do Estado do Rio Grande do Sul. Acrescenta que, no caso, a taxa de juros é justificada pelo risco de inadimplência da operação. Requer o provimento do recurso.

Subsequentemente, em suas razões recursais, aponta a autora apelante a necessidade de reforma da sentença no que tange à taxa média de juros do BACEN que, para a modalidade e data da contratação era de 1,48% ao mês. Colaciona precedentes. Refere a abusividade da instituição financeira na cobrança dos juros remuneratórios. Postula a restituição dos valores pagos a maior. Requer o provimento do recurso.

Foram oferecidas contrarrazões.

Vieram os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso da ré e conheço em parte do recurso da autora.

Busca a parte autora a revisão do contrato nº 5448448, firmado junto à ré em 23/09/2016 (Evento 1 - CONTR9), sob a alegação de abusividade na cobrança de juros remuneratórios.

A sentença julgou procedentes os pedidos formulados na inicial, razão das inconformidades.

Passo à análise dos recursos.

Inicialmente, com relação ao pedido da autora apelante, no que tange à repetição de valores pagos a maior, ausente o interesse recursal, uma vez que deferido pelo julgador a quo na sentença, razão pela qual não conheço do recurso no ponto.

Quanto à possibilidade de revisão dos contratos, encontra-se respaldo no Código de Defesa do Consumidor e na própria Constituição Federal, justificando-se quando verificada a ocorrência de abusividades que levem ao desequilíbrio contratual, especialmente considerando a vulnerabilidade do consumidor.

Não há, aqui, um desrespeito ao princípio da força obrigatória dos contratos, mas uma readequação do mesmo, evitando-se o enriquecimento injustificado. A possibilidade da revisão dos contratos é matéria pacificada nos Tribunais, admitindo-se inclusive a discussão sobre eventuais ilegalidades em contratos findos, conforme entendimento sumulado pelo STJ (Súmula nº 286).

Neste sentido :

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. CONTRATO BANCÁRIO. INCIDÊNCIA DO CDC. POSSIBILIDADE. MITIGAÇÃO DO PRINCÍPIO PACTA SUNT SERVANDA COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. INVIABILIDADE DE CUMULAÇÃO COM OS DEMAIS ENCARGOS MORATÓRIOS. AGRAVO NÃO PROVIDO.

1. No pertinente à revisão das cláusulas contratuais, a legislação consumerista, aplicável à espécie, permite a manifestação acerca da existência de eventuais cláusulas abusivas, o que acaba por relativizar o princípio do pacta sunt servanda. Precedentes.

2. "A importância cobrada a título de comissão de permanência não poderá ultrapassar a soma dos encargos remuneratórios e moratórios previstos no contrato, ou seja: a) juros remuneratórios à taxa média de mercado, não podendo ultrapassar o percentual contratado para o período de normalidade da operação; b) juros moratórios até o limite de 12% ao ano; e c) multa contratual limitada a 2% do valor da prestação, nos termos do art. 52, § 1º, do CDC". (REsp nº 1.058.114/RS e REsp nº 1.063.343/RS, Segunda Seção, Rel. p/ acórdão o Min. João Otávio de Noronha, DJe de 16/11/2010).

3. Agravo regimental a que se nega provimento.

(AgRg no REsp 1422547/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 20/02/2014, DJe 14/03/2014)

Relativamente aos juros remuneratórios, o STJ já pacificou entendimento em julgamento sujeito ao rito do art. 543-C, do CPC, de que a taxa de juros remuneratórios não está sujeita a limitação e que a revisão da taxa contratada só se dá em situações excepcionais.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL E BANCÁRIO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULAS DE CONTRATO BANCÁRIO. INCIDENTE DE PROCESSO REPETITIVO. JUROS REMUNERATÓRIOS. CONFIGURAÇÃO DA MORA. JUROS MORATÓRIOS. INSCRIÇÃO/MANUTENÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO.

DELIMITAÇÃO DO JULGAMENTO Constatada a multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de direito, foi instaurado o incidente de processo repetitivo referente aos contratos bancários subordinados ao Código de Defesa do Consumidor, nos termos da ADI n.º 2.591-1. Exceto: cédulas de crédito rural, industrial, bancária e comercial; contratos celebrados por cooperativas de crédito; contratos regidos pelo Sistema Financeiro de Habitação, bem como os de crédito consignado. Para os efeitos do § 7º do art. 543-C do CPC, a questão de direito idêntica, além de estar selecionada na decisão que instaurou o incidente de processo repetitivo, deve ter sido expressamente debatida no acórdão recorrido e nas razões do recurso especial, preenchendo todos os requisitos de admissibilidade. Neste julgamento, os requisitos específicos do incidente foram verificados quanto às seguintes questões: i) juros remuneratórios;

ii) configuração da mora; iii) juros moratórios; iv) inscrição/manutenção em cadastro de inadimplentes e v) disposições de ofício.

PRELIMINAR O Parecer do MPF opinou pela suspensão do recurso até o julgamento definitivo da ADI 2.316/DF. Preliminar rejeitada ante a presunção de constitucionalidade do art. 5º da MP n.º 1.963-17/00, reeditada sob o n.º 2.170-36/01.

I - JULGAMENTO DAS QUESTÕES IDÊNTICAS QUE CARACTERIZAM A MULTIPLICIDADE.

ORIENTAÇÃO 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF;

b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade;

c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02;

d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada ? art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto.

ORIENTAÇÃO 2 - CONFIGURAÇÃO DA MORA a) O reconhecimento da abusividade nos encargos exigidos no período da normalidade contratual (juros remuneratórios e capitalização) descarateriza a mora;

b) Não descaracteriza a mora o ajuizamento isolado de ação revisional, nem mesmo quando o reconhecimento de abusividade incidir sobre os encargos inerentes ao período de inadimplência contratual.

ORIENTAÇÃO 3 - JUROS MORATÓRIOS Nos contratos bancários, não-regidos por legislação específica, os juros moratórios poderão ser convencionados até o limite de 1% ao mês.

ORIENTAÇÃO 4 - INSCRIÇÃO/MANUTENÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES

a) A abstenção da inscrição/manutenção em cadastro de inadimplentes, requerida em antecipação de tutela e/ou medida cautelar, somente será deferida se, cumulativamente: i) a ação for fundada em questionamento integral ou parcial do débito; ii) houver demonstração de que a cobrança indevida se funda na...

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