Acórdão nº 50332398120198210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Quarta Câmara Cível, 19-05-2022

Data de Julgamento19 Maio 2022
ÓrgãoDécima Quarta Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50332398120198210001
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002118072
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

14ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5033239-81.2019.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Alienação fiduciária

RELATORA: Desembargadora JUDITH DOS SANTOS MOTTECY

APELANTE: EZEQUIEL HEDLUND DE SOUZA (RÉU)

APELADO: BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A. (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por EZEQUIEL HEDLUND DE SOUZA, visando modificar a sentença, proferida em ação de busca e apreensão ajuizada por BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A., que julgou procedente o pedido formulado e improcedente a reconvenção.

Afirma a existência de encargos abusivos no contrato, circunstância que descaracteriza a mora debendi e enseja a improcedência da ação de busca e apreensão. Em reconvenção, requer a limitação dos juros remuneratórios. o afastamento da capitalização de juros, das tarifas de avaliação, TAC/TEC, a repetição em dobro do indébito.

Contrarrazões no evento 103.

VOTO

Encontram-se preenchidos os requisitos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade do recurso interposto, razão pela qual o recebo.

Do contrato.

As partes ajustaram, em 04/07/19, contrato de financiamento com cláusula de alienação fiduciária. Os juros remuneratórios foram fixados em 1,69% ao mês e 22,29% ao ano.

Da aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor.

Aplica-se o CDC às operações de concessão de crédito e financiamento, visto que plenamente caracterizado o conceito de consumidor (art. 2°) e fornecedor (art. 3°). Entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça ao editar a Súmula nº 297: O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às Instituições Financeiras.

Dos juros remuneratórios.

A questão foi analisada no Recurso Especial nº 1.061.530-RS, com o propósito de estabelecer paradigma de julgamento:

DIREITO PROCESSUAL CIVIL E BANCÁRIO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULAS DE CONTRATO BANCÁRIO. INCIDENTE DE PROCESSO REPETITIVO. JUROS REMUNERATÓRIOS. CONFIGURAÇÃO DA MORA. JUROS MORATÓRIOS. INSCRIÇÃO/MANUTENÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO. DELIMITAÇÃO DO JULGAMENTO. (...) Neste julgamento, os requisitos específicos do incidente foram verificados quanto às seguintes questões: i) juros remuneratórios; ii) configuração da mora; iii) juros moratórios; iv) inscrição/manutenção em cadastro de inadimplentes e v) disposições de ofício. (...) I - JULGAMENTO DAS QUESTÕES IDÊNTICAS QUE CARACTERIZAM A MULTIPLICIDADE. ORIENTAÇÃO 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS. a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF; b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade; c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02; d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada – art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto. (...)Vencidos quanto a esta matéria a Min. Relatora e o Min. Luis Felipe Salomão. II- JULGAMENTO DO RECURSO REPRESENTATIVO (REsp 1061530/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 22/10/2008, DJe 10/03/2009).

No caso em exame, a taxa estabelecida no contrato não supera o patamar de uma vez e meia a taxa média de mercado divulgada pelo Banco Central para o período1, impondo-se sua manutenção.

Da capitalização de juros

Nos contratos de financiamento bancário, conforme estabelece o artigo 5º da Medida Provisória nº 2.170-36/2001 e o artigo 4º da MP 2.172-32, e em cédulas de crédito bancário (arts. 28, §1º, I, e 29, V, da Lei nº 10.931/04), as instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional estão autorizadas a capitalizar juros com periodicidade inferior a um ano, desde que o pacto seja firmado após 31/03/2000 e haja previsão contratual nesse sentido. Assim, não há falar em incidência do artigo 4º da Lei de Usura e da Súmula 121 do STF.

Outrossim, nos termos da jurisprudência consolidada do E. Superior Tribunal de Justiça em sede de julgamento de incidente repetitivo (Recurso Especial n. 973827/RS, Quarta Turma, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 27/06/2012), a “previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada”. Ainda, ausente ilegalidade na pactuação de capitalização diária de juros2.

Logo, ante a expressa previsão de capitalização de juros no ajuste, não há ilegalidade que determine a alteração judicial do contrato.

Da tarifa de abertura de crédito e de emissão de carnê.

Em consonância com o entendimento consolidado no Superior Tribunal de Justiça, em sede de julgamento de recursos repetitivos pelo rito art. 543-C do CPC (REsp. nº 1.251.331-RS), nos contratos bancários celebrados até 30.04.2008 é válida a pactuação de tarifas de abertura de crédito (TAC) e de tarifa de emissão de carnê (TEC), ou outra denominação para o mesmo fato gerador, ressalvado o exame da abusividade em cada caso concreto.

In verbis:

(...). 2. Nos termos dos arts. e da Lei 4.595/1964, recebida pela Constituição como lei complementar, compete ao Conselho Monetário Nacional dispor sobre taxa de juros e sobre a remuneração dos serviços bancários, e ao Banco Central do Brasil fazer cumprir as normas expedidas pelo CMN. 3. Ao tempo da Resolução CMN 2.303/1996, a orientação estatal quanto à cobrança de tarifas pelas instituições financeiras era essencialmente não intervencionista, vale dizer, "a regulamentação facultava às instituições financeiras a cobrança pela prestação de quaisquer tipos de serviços, com exceção daqueles que a norma definia como básicos, desde que fossem efetivamente contratados e prestados ao cliente, assim como respeitassem os procedimentos voltados a assegurar a transparência da política de preços adotada pela instituição." 4. Com o início da vigência da Resolução CMN 3.518/2007, em 30.4.2008, a cobrança por serviços bancários prioritários para pessoas físicas ficou limitada às hipóteses taxativamente previstas em norma padronizadora expedida pelo Banco Central do Brasil. 5. A Tarifa de Abertura de Crédito (TAC) e a Tarifa de Emissão de Carnê (TEC) não foram previstas na Tabela anexa à Circular BACEN 3.371/2007 e atos normativos que a sucederam, de forma que não mais é válida sua pactuação em contratos posteriores a 30.4.2008. 6. A cobrança de tais tarifas (TAC e TEC) é permitida, portanto, se baseada em contratos celebrados até 30.4.2008, ressalvado abuso devidamente comprovado caso a caso, por meio da invocação de parâmetros objetivos de mercado e circunstâncias do caso concreto, não bastando a mera remissão a conceitos jurídicos abstratos ou à convicção subjetiva do magistrado. 7. (...) 9. Teses para os efeitos do art. 543-C do CPC: - 1ª Tese: Nos contratos bancários celebrados até 30.4.2008 (fim da vigência da Resolução CMN 2.303/96) era válida a pactuação das tarifas de...

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