Acórdão nº 50332588220228210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Sexta Câmara Cível, 01-12-2022

Data de Julgamento01 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50332588220228210001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Sexta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003001675
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

16ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5033258-82.2022.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Cláusulas Abusivas

RELATORA: Desembargadora JUCELANA LURDES PEREIRA DOS SANTOS

APELANTE: VERA REGINA RODRIGUES (AUTOR)

APELADO: FACTA FINANCEIRA S.A. CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta por VERA REGINA RODRIGUES contra sentença que julgou improcedentes os pedidos formulados na ação revisional movida contra a FACTA FINANCEIRA S. A. CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO, cujo dispositivo tem o seguinte teor (evento 19, SENT1):

"Pelo exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados pela parte autora para manter as estipulações pactuadas no contrato ora analisado. Condeno a parte autora, como sucumbente, a arcar com as custas processuais e honorários do advogado da parte adversa. Fixo honorários em R$1000,00 (um mil reais) para o procurador da requerida. Suspensa a exigibilidade à parte autora, em razão da AJG."

Em suas razões, postula a reforma da sentença para limitar a taxa de juros remuneratórios à média divulgada pelo BACEN, qual seja, 1,68% a.m., de acordo com a modalidade de empréstimo pactuada, pois evidente a abusividade; permitir a compensação de valores e a repetição do indébito, com a incidência de correção monetária pelo IGP-M a contar de cada pagamento e juros de mora de 1% ao mês, a partir da citação; e inverter os ônus sucumbenciais (evento 23, APELAÇÃO1).

Apresentadas as contrarrazões (evento 27, CONTRAZAP1).

Foi observado o disposto nos artigos 931 e 934 do CPC.

É o relatório.

VOTO

Presentes os requisitos legais de admissibilidade, conheço do recurso.

A controvérsia diz respeito à revisão da cédula de crédito bancário nº 2863490006, firmada entre as partes, no dia 15.02.2019, no valor total de R$3.504,94, a ser pago em 84 parcelas de R$150,98 (evento 1, CONTR9).

Assiste razão à apelante.

A taxa de juros remuneratórios aplicada é abusiva, dada a significativa discrepância entre os juros pactuados e as taxas de mercado para operações similares.

Não olvido que as instituições financeiras não estão sujeitas à limitação imposta pela Lei de Usura. Considerando que a credora é uma instituição financeira, a fixação de juros remuneratórios em taxa superior a 12% ao ano somente pode ser considerada abusiva se demonstrado que o percentual contratado excede à taxa média praticada pelo mercado; tratando-se da hipótese dos autos.

A propósito, dispõe a súmula 596 STF que: "as disposições do Decreto nº 22.626/33 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas que integram o Sistema Financeiro Nacional".

O STJ também sedimentou seu posicionamento a respeito da limitação dos juros remuneratórios em ação revisional de contratos bancários, quando do julgamento do REsp nº 1.061.530/RS, na sistemática do recurso repetitivo, autorizando a revisão desde que demonstrada cabalmente a abusividade (Rel. Min. Nancy Andrighi, Segunda Seção, julgado em 22/10/2008, DJe 10/03/2009).

Aliás, o STJ editou posteriormente a súmula 382, fixando o entendimento de que: "a estipulação de taxa de juros superior a 12% ao ano, por si só, não indica a abusividade".

Apesar das considerações da instituição financeira, a respeito da inadimplência da carteira de empréstimos consignados de servidores e pensionistas gaúchos e de que a maioria das instituições financeiras não trabalham com esse público, importa salientar que este Colegiado utiliza a taxa média de juros divulgada pelo Banco Central como parâmetro para aferir a abusividade da taxa avençada. A propósito:

"APELAÇÃO CÍVEL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO – ABERTURA DE CRÉDITO ROTATIVO. PESSOA JURÍDICA. [...] JUROS REMUNERATÓRIOS. ABUSIVIDADE DEMONSTRADA. LIMITAÇÃO DO ENCARGO À TAXA MÉDIA DE MERCADO DIVULGADA PELO BACEN PARA OPERAÇÕES DA MESMA MODALIDADE, VIGENTE NA DATA DA CONTRATAÇÃO. TARIFA DE ABERTURA DE CRÉDITO. AFASTAMENTO. CAPITALIZAÇÃO DIÁRIA DE JUROS. EXCLUSÃO, ADMITIDA A MENSAL.CORREÇÃO MONETÁRIA. AUSÊNCIA DE PREVISÃO CONTRATUAL DE INCIDÊNCIA DO ÍNDICE CDI-CETIP. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. INEXISTÊNCIA DE ESTIPULAÇÃO DE SUA COBRANÇA. EMBARGOS À EXECUÇÃO JULGADOS PARCIALMENTE PROCEDENTES. REDIMENSIONAMENTO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS. APELOS PARCIALMENTE PROVIDOS." (Apelação Cível, Nº 70083671867, Décima Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS)

Não se está dizendo que o Banco Central é a instituição competente para regular a taxa média de juros do mercado, mas sim que este referencial é utilizado como parâmetro para aferir a abusividade da taxa avençada.

No caso, as taxas de juros remuneratórios foram pactuadas em 3,8% ao mês e 56,45% ao ano, enquanto as taxas médias de juros apuradas pelo BACEN, para operações similares naquele período, eram de 1,68% ao mês e 22,11% ao ano (https://www3.bcb.gov.br/sgspub Códigos 25467 e 20745 - Crédito pessoal consignado para trabalhadores do setor público).

Nessas condições, não há falar na ausência de ilegalidade, afronta à livre pactuação e à limitação infraconstitucional ou inaplicabilidade da taxa média divulgada pelo BACEN, dada a manifesta discrepância entre os juros cobrados da consumidora e aquela praticada pelo mercado.

Descabe o pedido...

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