Acórdão nº 50352631920188210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Sexta Câmara Cível, 05-05-2022

Data de Julgamento05 Maio 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50352631920188210001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Sexta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002091844
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

16ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5035263-19.2018.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Bancários

RELATORA: Desembargadora VIVIAN CRISTINA ANGONESE SPENGLER

APELANTE: FABIANO DA COSTA AGUIAR (AUTOR)

APELADO: BANCO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL S/A - BANRISUL (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por FABIANO DA COSTA AGUIAR em face de sentença proferida nos autos da ação revisional de contrato ajuizada contra BANCO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, cujo dispositivo foi assim vertido:

Pelo exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos para manter as estipulações pactuadas nos contratos analisados. Condeno o autor, como sucumbente, a arcar com as custas processuais e honorários do advogado da parte adversa. Fixo honorários em R$1000,00 (um mil reais) para o procurador da requerida. Suspensa a exigibilidade ao autor, em razão da AJG.

Ao arrazoar, alega o apelante que juros remuneratórios devem ser limitados à taxa média de mercado registrada pelo BACEN na época da contratação e de acordo com a operação. Além disso, é indevida a cumulação da comissão de permanência com juros moratórios e multa, porquanto extremamente onerosa para o consumidor. Refere a ocorrência de cerceamento de defesa, porque após a apresentação da réplica, os autos foram imediatamente conclusos para sentença, sem a intimação das partes para produção de provas. Entende que, nessa ocasião, poderia requerer perícia contábil para apurar os corretos valores devidos e se as taxas foram aplicadas de forma adequada, até porque alegou na inicial a existência de diversos descontos realizados na sua folha de pagamento. Outrossim, o número de prestações e de descontos não coincidem com o número de contratações realizadas. Adimpliu várias parcelas contratuais descontadas diretamente de sua folha de pagamento, cabendo a compensação de valores. Pugna pelo provimento do recurso.

Foram apresentadas contrarrazões.

Subiram os autos a esta Corte para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade, passo ao exame do recurso.

Busca o autor, através da presente demanda, a revisão dos seguintes contratos de financiamento celebrados com o banco réu: Instrumento Particular de Confissão de Dívida c/c. Garantia de Fiança (fls. 73/76) e Cédulas de Crédito Bancário n° 2014002830140155000040 (fls. 80/87), n° 2014002830140155000111 (fls. 90/95) e 2014002830144365000241 (fls. 98/105).

Inicialmente, não me deparo com a configuração do alegado cerceamento de defesa.

Nosso ordenamento jurídico consagra o princípio do livre convencimento fundamentado do Juiz (arts. 370 e 371 do CPC/2015), razão pela qual este pode determinar a produção das provas que considerar imprescindíveis ao desate da lide ou indeferir as meramente protelatórias. No caso em tela, sendo suficiente a prova documental produzida nos autos, mostrava-se desnecessária dilação probatória, situação autorizadora do julgamento antecipado da lide, nos termos do art. 355, inc. I, do CPC/2015. Dessarte, rejeito a prefacial.

No mérito, melhor sorte não assiste ao recorrente.

Juros remuneratórios

Não há óbice à fixação de juros superiores a 12% ao ano. Afinal, trata-se de pactuação envolvendo instituição financeira, a qual se submete à Lei nº 4.595/64, não ao Decreto nº 22.626/331. Ademais, a estipulação de taxa de juros superior a 12% ao ano, por si só, não indica a abusividade (Súmula nº 382/STJ).

Ademais, a revisão das taxas de juros remuneratórios é cabível apenas excepcionalmente, “desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto (REsp 1061530/RS, julgado pelo rito dos recursos repetitivos).

Por sua vez, a constatação de eventual abusividade dos juros remuneratórios apenas ocorre, conforme orientação do Superior Tribunal de Justiça, em caso de fixação em percentual que exceda de forma substancial a taxa média de mercado, conforme tabela divulgada pelo Banco Central. Ressalto que a taxa média de mercado, portanto, serve de parâmetro para se avaliar se há ou não abusividade, o que dependerá da análise do caso concreto.

Nesse sentido:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. PETIÇÃO DE RECONVENÇÃO. POSSIBILIDADE. JUROS REMUNERATÓRIOS. AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE. VALORES DEVIDOS. RESTITUIÇÃO INDEVIDA. RECURSO DESPROVIDO. 1. É cabível a apresentação de reconvenção à ação de busca e apreensão decorrente de alienação fiduciária, com a finalidade de se pleitear a revisão do contrato, bem como a devolução de quantias pagas a maior. Precedente. 2. Quanto aos juros remuneratórios, as instituições financeiras não se sujeitam aos limites impostos pela Lei de Usura (Decreto 22.626/1933), em consonância com a Súmula 596/STF, sendo inaplicáveis, também, os arts. 406 e 591 do CC/2002. Além disso, a simples estipulação dos juros compensatórios em patamar superior a 12% ao ano não indica abusividade. Para tanto, é necessário estar efetivamente comprovado nos autos a exorbitância das taxas cobradas em relação à taxa média do mercado específica para a operação efetuada, oportunidade na qual a revisão judicial é permitida, pois demonstrados o desequilíbrio contratual do consumidor e a obtenção de lucros excessivos pela instituição financeira. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.(AgRg no REsp 1028453 / RJ; AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL; 2008/0018691-5; Ministro VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RS).”

(grifei)

Na mesma linha, assim manifestou-se o Min. Marco Buzzi, no julgamento proferido no AgRg no AREsp 527.855/SC, em 13/04/2016:

A taxa média de mercado, divulgada pelo Banco Central, constitui um valioso referencial, mas cabe somente ao juiz, no exame das peculiaridades do caso concreto, avaliar se os juros contratados foram ou não abusivos. A orientação emanada por esta Corte Federal de Uniformização, para que se reconheça a abusividade nos juros, é no sentido de que não basta o fato de a taxa contratada suplantar a média de mercado, devendo-se observar uma tolerância a partir daquele patamar, de modo que a vantagem exagerada, justificadora da limitação judicial, deve ficar cabalmente demonstrada em cada caso concreto, ante as peculiaridades da demanda” (AgRg no AREsp 527.855/SC, Rel. Min. Marco Buzzi, DJ de 13.4.2016).

No caso concreto, o demandante, apesar de possuir carteira assinada, trouxe contracheques demonstrando que é funcionário público estadual, laborando na Escola Estadual de Ensino Fundamental Dr. Ferreira de Abreu.

Nos instrumentos contratuais, vê-se a menção de que a modalidade da operação era “CPB PRICE PRÉ-CONSIG. FUNC. PUB. -GAR. REAL”,

O Instrumento Particular de Confissão de Dívida c/c. Garantia de Fiança (fls. 73/76) foi firmado em 26/02/2014 previu o parcelamento da quantia financiada em 72 parcelas mensais e sucessivas, com vencimentos de 28/03/2014 (1ª) a 28/02/2020 (última). Foi estipulada, na ocasião, taxa de juros mensal de 1,40% e anual de 18,16%.

A Cédula de Crédito Bancário n° 2014002830140155000040 (fls. 80/87) foi firmada em 26/02/2014, prevendo oi pagamento do valor financiado em 72 parcelas com vencimentos de 02/04/2014 (1ª) a 02/03/2020 (última). Foi estipulada, na ocasião, taxa de juros mensal de 1,45% e anual de 18,86%.

Na data da contratação desses dois primeiros financiamentos (fevereiro de 2014), a taxa média de juros para operações de crédito com recursos livres – crédito pessoal consignado para trabalhadores do setor público – era de 1,74% ao mês e 22,93% ao ano.

A Cédula de Crédito Bancário n° 2014002830140155000111 (fls. 90/95), firmada em 28/05/2014, previu o pagamento do valor financiado em 72 parcelas com vencimentos de 02/07/2014 (1ª) a 02/06/2020 (última). Foi estipulada, na ocasião, taxa de juros mensal de 2,30% e anual de 31,38%, enquanto a taxa média de juros para operações de crédito com recursos livres – crédito pessoal consignado para trabalhadores do setor público – vigente na data da contratação era de 1,78% ao mês e 23,60% ao ano.

Em relação a tais operações, a taxa de juros remuneratórios não apresenta fixação exorbitante frente à taxa média de mercado, não restando demonstrada a abusividade praticada pelo réu.

Entretanto, a Cédula...

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