Acórdão nº 50356327820218210010 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Nona Câmara Cível, 09-12-2022

Data de Julgamento09 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50356327820218210010
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Nona Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002854292
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

19ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5035632-78.2021.8.21.0010/RS

TIPO DE AÇÃO: Empréstimo consignado

RELATOR: Desembargador MARCO ANTONIO ANGELO

APELANTE: ROSANE BOZ PEDROZO (AUTOR)

APELADO: BANCO PAN S.A. (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta por ROSANE BOZ PEDROZO contra a sentença proferida na ação de "cancelamento de empréstimo consignado c/c devolução de valores c/c danos morais e tutela antecipada" ajuizada em face de BANCO PAN S.A., com o seguinte dispositivo (Evento 58 do processo originário):

Isso posto, JULGO IMPROCEDENTE a presente demanda ajuizada por ROSANE BOZ PEDROZO contra BANCO PAN S.A., com resolução de mérito, na forma do artigo 487, I, do Código de Processo Civil, revogando a liminar deferida nos autos (vide evento 9).

Por sucumbente, atribuo à parte autora o pagamento da taxa única e despesas processuais, sem prejuízo dos honorários ao procurador da parte demandada, fixando estes no importe de 10% sobre o valor atualizado da causa, nos termo do artigo 85, § 2º e , do CPC.

A exigibilidade da sucumbência, contudo, fica suspensa em relação à parte demandante, na forma do art. 98, § 3º, do CPC, em razão de estar litigando sob o manto da gratuidade da justiça.

Com o trânsito em julgado, fica a autora autorizada a levantar os valores depositados em juízo.

Intimem-se. Havendo recurso, após processado, remetam-se ao TJRS. Caso contrário, arquivem-se

A parte-autora, declinando suas razões (Evento 64 da origem), requer a reforma da sentença para que sejam julgados procedentes os pedidos da exordial. Alega que o empréstimo consignado em seu benefício se deu em termos distintos àqueles contratados. Aduz que lhe foi ofertado empréstimo no valor de R$ 14.613,84 (quatorze mil, seiscentos e treze reais e oitenta e quatro centavos), cujo pagamento se daria em 60 parcelas no valor de R$ 385,00 (trezentos e oitenta e cinco reais). Entretanto, foi surpreendida com a informação junto ao site MEU INSS de que o pagamento estava previsto em 85 parcelas, ao invés das 60 propostas. Assim, sustenta o cancelamento/extinção do contrato, com restituição de valores e indenização por danos morais. Ainda, pede o prequestionamento da matéria. Ao final, pugna pelo provimento do recurso

Foram apresentadas contrarrazões (Evento 67 do originário).

Cumprido o disposto nos artigos 931, 934 e 935 do CPC/2015.

É o relatório.

VOTO

INEXISTÊNCIA DE FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. COMPROVAÇÃO DA EXISTÊNCIA DE RELAÇÃO CONTRATUAL E DA LEGITIMIDADE DA COBRANÇA.

A Lei n. 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor – CDC) é aplicável aos contratos bancários, pois há uma prestação de serviços, estabelecendo-se uma relação de consumo entre a instituição financeira prestadora e o cliente consumidor.

Esta questão encontra-se resolvida em caráter definitivo, razão pela qual o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula n. 297: “O Código de Defesa do consumidor é aplicável às instituições financeiras” (Súmula 297, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 12/05/2004, DJ 09/09/2004, p. 149).

Os fornecedores de produtos e serviços respondem pelos vícios que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor (arts. 18 e 20 do CDC).

A responsabilidade é objetiva, encontrando fundamento na Teoria do Risco do Empreendimento, pois a instituição financeira deve responder pelos defeitos resultantes do negócio independentemente de culpa.

Por isso, as instituições financeiras somente não serão responsabilizadas por falha ou má prestação dos serviços quando houver prova da inexistência do defeito/vício ou da culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

Nestas circunstâncias, a cobrança indevida representa risco do empreendimento, motivo pelo qual a instituição financeira deve ser responsabilizada pelos eventuais danos decorrentes, salvo se provar inexistência do defeito ou culpa exclusiva do consumidor.

Na hipótese dos autos, o conjunto probatório permite uma conclusão segura no sentido de que não houve falha na prestação de serviços, na medida em que comprovada a existência da relação contratual e da legitimidade da cobrança.

Na petição inicial (Evento 1 da origem), a parte-autora sustentou, em suma, ter contratado empréstimo consignado com a instituição financeira demandada, através de ligação telefônica, em julho de 2021. Referiu que nesta ocasião lhe foi oferecida proposta de empréstimo no valor de R$14.613,84 (quatorze mil, seiscentos e treze reais e oitenta e quatro centavos), a ser pago em 60 parcelas de R$385,00 (trezentos e oitenta e cinco reais). Entretanto, ao verificar seu extrato de empréstimos consignados no sítio eletrônico do MEU INSS, foi surpreendida com a informação de que o empréstimo contratado se deu em termos distintos daqueles prestados por telefone. Assim, aduziu a inclusão de contrato de empréstimo consignado n. 348459129-6, no mesmo valor de R$14.613,84 (quatorze mil, seiscentos e treze reais e oitenta e quatro centavos), mas com previsão de pagamento em 84 parcelas de R$385,00 (trezentos e oitenta e cinco reais). Diante desses fatos, requereu o cancelamento do contrato, com restituição de valores e indenização por danos morais.

Contudo, na contestação (Evento 22 do originário), a parte-ré defendeu que, ao contrário do afirmado na exordial, a contratação se deu por meio digital, tendo todas as informações contratuais sido transmitidas ao consumidor através da plataforma, o qual concordou através de firma eletrônica.

De fato, as provas carreadas aos autos corroboram as alegações da instituição financeira.

Conforme consta na "Cédula de Crédito Bancário - Proposta 348459129" (Evento 22 da origem - ANEXO2), a autora ROSANE BOZ PEDROZO contratou empréstimo consignado com a ré na data de 08 de julho de 2021, às 11:06:38, sendo devidamente informada acerca dos termos deste, constando expressamente o pagamento de 84 (oitenta e quatro) parcelas de R$385,00 (trezentos e oitenta e cinco reais):

Inclusive, o Dossiê de Contratação (Evento 22 da origem - ANEXO2, fls.10-11) atesta o passo a passo seguido pela cliente quando da contratação, mostrando o exato momento em que esta deu o aceite aos termos do contrato:

Veja-se que o número de proposta indicado na assinatura eletrônica é idêntico ao número do contrato indicado pela parte-autora na inicial e presente no extrato de empréstimos consignados do autor (Evento 1 da origem - EXTR7).

Ademais, cumpre destacar que não é necessária a assinatura física para validação do negócio jurídico, sendo plenamente viável a assinatura eletrônica em contratos de mútuo.

Nesse sentido:

RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. EXECUTIVIDADE DE CONTRATO ELETRÔNICO DE MÚTUO ASSINADO DIGITALMENTE (CRIPTOGRAFIA ASSIMÉTRICA) EM CONFORMIDADE COM A INFRAESTRUTURA DE CHAVES PÚBLICAS BRASILEIRA. TAXATIVIDADE DOS TÍTULOS EXECUTIVOS. POSSIBILIDADE, EM FACE DAS PECULIARIDADES DA CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO, DE SER EXCEPCIONADO O DISPOSTO NO ART. 585, INCISO II, DO CPC/73 (ART. 784, INCISO III, DO CPC/2015). QUANDO A EXISTÊNCIA E A HIGIDEZ DO NEGÓCIO PUDEREM SER VERIFICADAS DE OUTRAS FORMAS, QUE NÃO MEDIANTE TESTEMUNHAS, RECONHECENDO-SE EXECUTIVIDADE AO CONTRATO ELETRÔNICO. PRECEDENTES.

1. Controvérsia acerca da condição de título executivo extrajudicial de contrato eletrônico de mútuo celebrado sem a assinatura de duas testemunhas.

2. O rol de títulos executivos extrajudiciais, previsto na legislação federal em "numerus clausus", deve ser interpretado restritivamente, em conformidade com a orientação tranquila da jurisprudência desta Corte Superior.

3. Possibilidade, no entanto, de excepcional reconhecimento da executividade de determinados títulos (contratos eletrônicos) quando atendidos especiais requisitos, em face da nova realidade comercial com o intenso intercâmbio de bens e serviços em sede virtual.

4. Nem o Código Civil, nem o Código de Processo Civil, inclusive o de 2015, mostraram-se permeáveis à realidade negocial vigente e, especialmente, à revolução tecnológica que tem sido vivida no que toca aos modernos meios de celebração de negócios, que deixaram de se servir unicamente do papel, passando a se consubstanciar em meio eletrônico.

5. A assinatura digital de contrato eletrônico tem a vocação de certificar, através de terceiro desinteressado (autoridade certificadora), que determinado usuário de certa assinatura a utilizara e, assim, está efetivamente a firmar o documento eletrônico e a garantir serem os mesmos os dados do documento assinado que estão a ser sigilosamente enviados.

6. Em face destes novos instrumentos de verificação de autenticidade e presencialidade do contratante, possível o...

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