Acórdão nº 50357353320228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Criminal, 08-06-2022

Data de Julgamento08 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualHabeas Corpus
Número do processo50357353320228217000
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002205119
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Habeas Corpus (Câmara) Nº 5035735-33.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Estupro de vulnerável CP art. 217-A

RELATOR: Desembargador IVAN LEOMAR BRUXEL

PACIENTE/IMPETRANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

IMPETRADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Trata-se de Habeas Corpus em favor de CESAR A. G., preso desde 07/11/2021, pela prática, em tese, do crime do artigo 217-A, do Código Penal. Denúncia recebida em 17/12/2021.

Alega que "a instrução processual na origem é ilegal, pois foi efetuada sem a disponibilização da integralidade dos elementos de prova à defesa, violando o direito ao contraditório". Busca a reabertura do prazo de resposta à acusação, pois obtido acesso ao IP sigiloso apenas posteriormente.

Liminar indeferida.

Dispensadas as informações.

Parecer pelo não conhecimento.

Em sessão de julgamento realizada no dia 31/03/2022, à unanimidade, o 'writ' não foi conhecido, em decisão assim ementada:

HABEAS COUS. SUBSTITUTO RECURSAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. ACESSO A SUPOSTO IP SIGILOSO. CORREIÇÃO PARCIAL. A ação de Habeas Corpus destina-se a proteger a liberdade de locomoção, o direito de ir e vir, e acessoriamente um constrangimento manifestamente ilegal. Alegação de cerceamento de defesa, pois não disponibilizada a integralidade dos elementos de prova à defesa, violando o direito ao contraditório. Para questões procedimentais, ainda que tanto não signifique que sempre cabível, existe a correição parcial, sujeita a prazo, sob pena de preclusão. O Habeas Corpus é ação constitucional, não podendo ser enquadrado como sucedâneo recursal. HABEAS COUS NÃO CONHECIDO. UNÂNIME. (Habeas Corpus Criminal, Nº 50357353320228217000, Quinta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ivan Leomar Bruxel, Julgado em: 31-03-2022)

Interposto novo Habeas Corpus, além de Recurso Ordinário Constitucional, ambos perante o e. STJ, foi concedida a "ordem de habeas corpus ex officio, para cassar o acórdão proferido no HC n. 5035735-33.2022.8.21.7000 e determinar à Corte de origem a reapreciação incontinenti do pedido formulado na inicial do referido writ, como entender de direito, mas afastada a conclusão de que a pretensão somente poderia ter sido formulada na via recursal própria" (PET no HABEAS COUS Nº 735.980).

Assim, vieram os autos conclusos para rejulgamento.

É o relatório.

VOTO

Conforme já adiantado no relatório, o feito vem agora para rejulgamento, pois desconstituída a decisão anterior desta Corte, que não conheceu do 'writ', interposto como substitutivo recursal.

Na ocasião, esta havia sido a justificativa do parecer:

Os impetrantes sustentam afronta ao contraditório, na medida em que a instrução processual foi feita sem a disponibilização da integralidade dos elementos de prova à defesa. Pleiteiam, assim, a reabertura do prazo de resposta à acusação.

A questão suscitada pelos impetrantes poderia/deveria ser questionada via correição parcial, e não o foi, não decorrendo daí qualquer violação ao direito de ir e vir do paciente, de sorte que não merece conhecimento do presente writ.

Nesse sentido:

HABEAS COUS. ROUBO TRIPLAMENTE MAJORADO. CONCURSO DE AGENTES. RESTRIÇÃO À LIBERDADE DA VÍTIMA. EMPREGO DE ARMA DE FOGO. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO COM NUMERAÇÃO RASPADA. 1. ALEGAÇÃO DE CERCEAMENTO DE DEFESA. PERDA DE PROVA NO ÂMBITO DA DELEGACIA DE POLÍCIA. INSTRUÇÃO ENCERRADA EM JUÍZO. MATÉRIA QUE COMPORTA CORREIÇÃO PARCIAL. NÃO CONHECIMENTO. A utilização da ação do Habeas Corpus como via de correção de ilegalidades evidentes que cerceiem ou restrinjam a liberdade do paciente, conquanto viesse sendo amplamente aceita pelos Tribunais, inclusive nos casos para os quais o legislador havia previsto já recurso específico, por conta da banalização dessa via excepcional, atualmente vem sendo restringida pelas Cortes Superiores. Tanto a Quinta, quanto a Sexta Turmas do E. STJ vêm decidindo, em consonância com a jurisprudência do E. STF, que, embora não deva ser conhecido o habeas corpus substitutivo de recurso especial ou ordinário, em respeito à garantia constitucional prevista no art. 5º, LXVIII da CF, a ordem poderá ser concedida de ofício, quando se verificar existência de manifesta ilegalidade, abuso de poder ou teratologia na decisão combatida. Precedente do E. STJ. Contra o alegado cerceamento de defesa em razão da perda da prova requerida pela defesa, cabe o manejo de correição parcial, a teor do art. 195 do COJE. Situação em análise que, por estar protegida pelo sistema recursal, não ensejava a utilização da via estreita do Habeas Corpus como sucedâneo de medida processual efetivamente prevista, inexistindo, por outro lado, ilegalidade manifesta, relacionada ao direito de ir e vir, que possibilitasse a concessão de ofício da ordem. Tanto que, em consulta ao sistema informatizado desta Corte, verifica-se que, concomitantemente à presente ação, foi interposta correição parcial, tombada sob o nº 70085464527, cuja inicial é absolutamente idêntica quanto ao referido cerceamento de defesa. Não conhecimento do habeas corpus que se impõe. 2. MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVAS. NÃO CONHECIMENTO. Quanto à alegação de possibilidade de aplicação de medidas cautelares alternativas, não deve ser conhecida esta ação constitucional, porque equacionada a questão em writs pretéritos julgados por esta Corte, impetrados em favor dos pacientes (HCs nº 70084284439 e 70084272483). Mera reiteração de pedido, ausente qualquer alteração fático-jurídica. Habeas corpus não conhecido no ponto. 3. EXCESSO DE PRAZO DA PRISÃO. NÃO CARACTERIZAÇÃO. ENCERRAMENTO DA INSTRUÇÃO. ALEGAÇÃO SUPERADA. Encerrada a instrução criminal, fica superada a alegação de constrangimento ilegal por excesso de prazo. Caso em que, segundo informações da autoridade apontada como coatora e os dados constantes no sistema informatizado desta Corte, foi encerrada a instrução em 16.10.2021, estando o feito, atualmente, concluso, aguardando a prolação da sentença. Inteligência da Súmula nº 52 do E. STJ. Alegação superada. ORDEM PARCIALMENTE CONHECIDA E, NA PARTE EM QUE CONHECIDA, DENEGADA.(Habeas Corpus Criminal, Nº 70085464667, Oitava Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Fabianne Breton Baisch, Julgado em: 15-12-2021)

Todavia, ainda que assim não fosse, é de se salientar que a questão já foi corretamente debatida pelo juízo dito coator, o qual afastou, em mais de uma oportunidade, quaisquer violação ao contraditório e ampla defesa.

3. ISSO POSTO, a manifestação é no sentido do NÃO CONHECIMENTO da habeas corpus.

Porto Alegre, 19 de março de 2022.

ANA MARIA SCHINESTSCK,

Procuradora de Justiça.

Pois bem.

Superada a conclusão de inviabilidade da via eleita, passa-se ao exame do mérito da ação.

O feito teve início em 20/10/2021 (eproc 1G n. 5030626-96.2021.8.21.0008), com o pedido de busca e apreensão formulado pela autoridade policial originado a partir do boletim de ocorrência de n. 14363/2021/100510 e depoimentos prestados em Delegacia por vítimas e testemunhas.

Posteriormente, em 04/11/2021, nos mesmos autos, sobreveio a representação policial pela prisão preventiva do ora paciente.

Ainda naqueles autos, verifica-se que foram juntadas pela autoridade policial peças pontuais dos inquéritos de n. 412/2021/100511 (vítimas J. e S.) e n. 453/2021/100511 (vítima B.), além dos resultados e diligências decorrentes do cumprimento do mandado de busca e apreensão (ocorrência de n. 1192/2021/100511), tudo que foi disponibilizado tanto para a acusação quanto para a defesa.

A denúncia foi oferecida em 16/12/2021 (eproc 1G n. 5039030-39.2021.8.21.0008), e assim descreveu os fatos em tese praticados (abreviações ausentes no original):

1º FATO (estupro de vulnerável – vítima J.):

Em datas e horários incertos, mas com início aproximado no ano de 2017, estendendo-se até setembro de 2021, na residência do denunciado, localizada na Rua [...], em Canoas/RS, o denunciado, CÉSAR A. G., por reiteradas e diversas vezes, praticou atos libidinosos diversos da conjunção carnal com a vítima J. S. F., nascida em 24/11/2011, com idade entre 05 (cinco) e 09 (nove) anos à época dos fatos (certidão de nascimento anexa).

DAS CIRCUNSTÂNCIAS DOS FATOS ENVOLVENDO A VÍTIMA J.:

Nas ocasiões, o denunciado CÉSAR, aproveitando-se da tenra idade da vítima J., da natural ingenuidade dela, da relação de vizinhança com a infante e sua família, assim como das relações de amizade com estes, com abuso de autoridade, bem como se prevalecendo das relações domésticas e de hospitalidade, quando a ofendida comparecia na sua casa para brincar com o filho R., a fim de satisfazer sua lascívia, praticou atos libidinosos diversos da conjunção carnal com a criança, consistentes em acariciar libidinosamente o corpo da vítima J., inclusive acariciar e introduzir dedos na vagina da menina.

Na primeira oportunidade, quando a ofendida tinha cinco anos de idade e estava na casa do denunciado, brincando com o filho deste, César chamou a vítima para contar-lhe um “segredinho”, convidando-a para subir para um dos quartos no andar superior, local em que mandou a infante tirar a roupa e, diante da negativa dela, tirou a roupa da menina e passou a acariciar o corpo de J., passando as mãos na vagina, nádegas e seios da infante.

Nas demais oportunidades, o denunciado aproveitava o momento que a menina estava na sua casa para brincar com o filho, a levava para o andar superior, em um dos quartos, tirava a roupa da menina qualquer que fosse a temperatura (inverno e verão), acariciava o corpo desnudo de J., passando as mãos na vagina, ânus, seios, bem como introduzia os dedos na vagina da menina e fazia com ela segurasse o seu pênis e fizesse movimentos para masturbá-lo até que ejaculasse.

Os abusos se repetiram ao longo dos anos, sempre...

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