Acórdão nº 50359258020188210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Primeira Câmara Criminal, 27-01-2022

Data de Julgamento27 Janeiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50359258020188210001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001445867
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

1ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5035925-80.2018.8.21.0001/RS

PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5035925-80.2018.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Leve (art.129, caput)

RELATORA: Juiza de Direito ANDREIA NEBENZAHL DE OLIVEIRA

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

ADVOGADO: CRISTIANO VIEIRA HEERDT (DPE)

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

O Ministério Público denunciou ISMAEL ALVES BORGES, já qualificado, como incurso nas sanções do artigo 129, §9º, e artigo 147, caput, ambos do Código Penal, na forma da Lei nº 11.340/06.

Consta da denúncia:

“1º FATO: LESÃO COORAL No dia 01/04/2018 de janeiro de 2018, por volta das 22h, na proximidades da residência das partes, na Rua Farroupilha, 86, Bairro Partenon em Porto Alegre/RS, o denunciado ISMAEL ALVES BORGES ofendeu a integridade corporal da vítima MARCIA FERNANDA DE OLIVEIRA MARTINS, sua companheira, causando-lhe lesões corporais descritas no Auto do Exame de Corpo de Delito acostado à fl. 14, “Hematoma infraorbital à esquerda. Refere dor na cabeça”. Na oportunidade, o denunciado agrediu a vítima segurando o pescoço dela com força e desferindo socos na região do rosto, dando causa às lesões corporais acima descritas.

2º FATO: AMEAÇA

Nas mesmas circunstâncias de data, hora e local do primeiro fato, o denunciado ISMAEL ALVES BORGES ameaçou a vítima MARCIA FERNANDA DE OLIVEIRA MARTINS, sua companheira, de causar-lhes mal injusto e grave. Na ocasião, o denunciado afirmou: `Vou te matar; Aqui tu não tem nada; Não vou sair de casa´ [...]”

Após regular instrução processual, sobreveio sentença para julgar procedente a denúncia, condenando o réu à pena total de 04 (quatro) meses e 05 (cinco) dias de detenção, em regime aberto, sendo a pena privativa de liberdade suspensa condicionalmente.

Pelo réu, a Defensoria Pública interpôs recurso de apelação, alegando, em síntese, a fragilidade probatória para amparar o édito condenatório. Aduziu a atipicidade da conduta, vez que o réu se encontrava embriagado por ocasião dos fatos. Alternativamente, pede o afastamento da agravante do artigo 61, inciso II, “f”, do CP reconhecida no crime de ameaça e a isenção da reparação de danos morais.

Apresentadas as contrarrazões.

Em parecer, a Procuradoria de Justiça opinou pelo desprovimento do apelo.

É o relatório.

VOTO

Segundo narra a denúncia, Ismael ofendeu a integridade corporal de sua companheira, Marcia Fernanda, segurando o pescoço da vítima com força, be como desferindo socos na região do rosto; ainda, teria o acusado ameaçado a vítima de causar-lhe mal injusto e grave, dizendo que iria matá-la.

A materialidade dos delitos restou evidenciada pelo registro de ocorrência (fls. 03/04) e pelo auto de exame de corpo de delito (fl. 14), que atestou a existência na ofendida de "Hematoma infraorbital à esquerda. Refere dor na cabeça".

A autoria, de igual forma, restou seguramente demonstrada. Aproveito a transcrição da prova oral realizada pela sentenciante:

“(...) A vítima Marcia Fernanda de Oliveira Martins (fl. 52), em juízo, disse que está junto do acusado há anos, porém ambos "eram do mundo" (sic), explicando que o réu era traficante e ambos eram usuários de drogas. Relatou que a mãe do acusado é pessoa muito religiosa e estava sempre orando pelas partes. Narrou que já um ano decidiram se internar e, então, foram para uma fazenda em Morungava, onde ficaram meses internados. Contou que, nessa fazenda, conseguiram se curar e, atualmente, vivem juntos, em paz, "servindo a Jesus" (sic. Pediu, nesse contexto, para findar o processo, momento em que lhe foi esclarecido que estava apenas seguindo o rumo processual conforme determina a lei. Questionada se queria falar sobre os fatos ou não, respondeu que "não tem nada a esconder" (sic). Perguntada, então, se a lesão no olho e a dor de cabeça aconteceram, aduziu que sim, explicando que o acusado lhe espancava bastante. Inquirida sobre como ocorreram as agressões do dia 01/04/208, contou que o acusado, na época, bebia muito e, por nada, ele lhe espancava. Perguntada se foi Isamel quem lhe agrediu no olho, respondeu que sim, explicando que a agressão se deu com socos. Questionada sobre como ficou com a dor de cabeça, referiu, novamente, que o réu lhe espancava demais e, nesse dia dos fatos, ele bateu com sua cabeça e lhe desferiu socos no rosto, motivo pelo qual ficou com dor de cabeça. Perguntada se o acusado também lhe segurou pelo pescoço, afirmou que sim, que ele tentou lhe enforcar dentro de casa. Inquirida se essas agressões aconteceram em meio a uma discussão, respondeu que sim. Indagada sobre qual foi o primeiro gesto agressivo, mencionou que foi o soco desferido pelo acusado, destacando que sempre era Ismael quem iniciava as agressões. Perguntada sobre a ameaça de morte, referiu que o acusado constantemente lhe ameaçava. Perguntada se o acusado, naquele dia, falou "vou te matar", afirmou que sim. Questionada se o réu disse "aqui tu não tem nada, não vou sair de casa", explicou que, quando brigavam, o réu queria que saísse de casa, então ele falava coisas como "tu não tem nada aqui, vai te embora, pega tuas coisas e vai te embora" (sic). Perguntada se tinha receio de que o acusado, de fato, lhe colocasse para fora de casa, respondeu que sim, esclarecendo que até queria sair da residência para que cessassem as brigas. Questionada se, no dia dos fatos, o acusado estava sob efeito de álcool ou drogas, aduziu que sim, tanto de álcool quanto de crack. Perguntada se recorda dos horários das agressões, respondeu que não. Explicou , no entanto, que o acusado acordava e já ia para rua beber e usar dorgas, sendo que as agressões, naquele dia, aconteceram quando ele retornou para a casa, após o uso de entorpecentes.

O réu Ismael Alves Borges (fl. 52), em seu interrogatório, referiu trabalhar como auxiliar de pedreiro, embora atualmente esteja desempregado. Sobre os fatos, disse que o que consta na denúncia é verdade. Contou, nesse contexto, que ambas as partes usavam drogas e ingeriam bebidas alcoólicas, sendo os fatos decorentes do uso de entorpecentes. Disse que está junto da vítima há 15 anos e, após o ocorrido, resolveram se internar. Referiu que ficaram 11 meses internados em uma fazenda e, após a saída, casaram e atualmente estão "vivendo em paz com Jesus" (sic). Questionado se admite que bateu na ofendida, respondeu que sim. Perguntado se ameaçou a vítima de morte, disse que não se recorda, pois estava muito alcoolizada na ocasião. Indagado se recorda dos fatos, informou que estava muito alcoolizado, tendo em vista que quando acordava "já bebia cachaça pura" (sic). (...)”

Essa é a prova produzida. Com base nela, impositiva a manutenção da sentença condenatória.

Assim porque a palavra da vítima, colhida em juízo, encontra amparo nos demais elementos de prova, estando em consonância com seu relato prestado em sede inquisitorial, bem como às lesões descritas no auto de exame de corpo de delito de fl. 14. Outrossim, e não menos oportuno, verifica-se que o acusado confessou a prática do delito de lesões corporais quando de sua oitiva em sede judicial, tudo a indicar a necessidade de manutenção da sentença condenatória.

Ademais, consabido e referendado pelo ordenamento jurídico que a palavra da vítima adquire especial destaque nos delitos perpetrados no âmbito doméstico, uma vez que tais agressões, como sói acontecer, são perpetradas às escondidas e distantes de demais testemunhas oculares.

Este, inclusive, é o entendimento desta Colenda Câmara Criminal:

APELAÇÃO CRIME. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. AMEAÇA. PALAVRA DA VÍTIMA. SUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. REPAROS NA DOSIMETRIA DA BASILAR E NA SUBSTITUIÇÃO DA PENA REALIZADOS DE OFÍCIO. SENTENÇA PARCIALMENTE MODIFICADA. 1. A palavra da vítima foi consistente e coerente, tanto na prestação dos elementos informativos em sede policial, quanto na produção da prova oral na fase judicial. Outrossim, nos crimes cometidos no âmbito doméstico, a palavra da vítima assume singular importância na elucidação dos fatos, carregando relevante valor probante para conferir segurança a eventual sentença condenatória. Além disso, em que pese o argumento defensivo de insuficiência probatória, a tese defensiva se encontra isolada nos autos, sem qualquer elemento capaz de sustentá-la. 2. A pena-base foi afastada em um mês do mínimo legal com base na culpabilidade, fixada em “grau médio”, feita referência à consciência da ilicitude e à exigibilidade de conduta diversa, circunstâncias que se referem à culpabilidade como elemento do tipo penal. Assim, ausente razão concreta para fixação da reprimenda além do mínimo legal, esta deve ser reduzida para um mês de detenção. 3. Também se mostra necessário realizar reparo, de ofício, na substituição da pena. Isso porque, de acordo com o art. 46 do Código Penal, a prestação de serviços à comunidade ou entidades públicas é aplicável às condenações superiores a seis meses de privação de liberdade. No caso em tela, haja vista que a condenação do réu é inferior ao período estabelecido, viável a modificação de tal imposição por limitação de final de semana, nos exatos termos do art. 48 do Diploma Penal. APELO PARCIALMENTE PROVIDO. Reduzida a reprimenda, por...

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