Acórdão nº 50373328220228210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Quinta Câmara Cível, 23-11-2022

Data de Julgamento23 Novembro 2022
ÓrgãoDécima Quinta Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50373328220228210001
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002907116
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

15ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5037332-82.2022.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Cláusulas Abusivas

RELATORA: Desembargadora CARMEM MARIA AZAMBUJA FARIAS

APELANTE: ELDOIR TAVARES DE SOUZA (AUTOR)

APELADO: CREFISA SA CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por ELDOIR TAVARES DE SOUZA em face da sentença que julgou improcedentes os pedidos formulados na ação revisional de contrato bancário movida em desfavor de CREFISA SA CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS, cujo relatório e dispositivo seguem transcritos:

ELDOIR TAVARES DE SOUZA propôs ação revisional de contrato bancário contra CREFISA SA CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS.

A parte autora da ação revisional afirmou ter celebrado os contratos de empréstimo nºs 030200128671 e 03020129610 com a instituição financeira ré. Alegou que no decorrer do contrato houve excesso na cobrança de juros remuneratórios, capitalização, comissão de permanência, juros moratórios, multa pelo que requereu a procedência da ação para revisá-lo, a descaracterização da mora, a compensação dos valores ou a repetição de indébito em dobro.

Foi deferida a gratuidade judiciária.

Foi deferido o pedido de antecipação de tutela.

Citado, o réu contestou. Sustentou, no mérito, que o contrato foi livremente pactuado pela parte autora, inexistindo qualquer abusividade nas cláusulas ajustadas. Requereu a improcedência da ação.

Sobreveio réplica.

Pelo exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados pela parte autora para manter as estipulações pactuadas no contrato ora analisado. Condeno a parte autora, como sucumbente, a arcar com as custas processuais e honorários do advogado da parte adversa. Fixo honorários em R$1000,00 (um mil reais) para o procurador da requerida. Suspensa a exigibilidade à parte autora, em razão da AJG.

REVOGO a tutela de urgência concedida no EVENTO 5.

Transitada em julgado e nada requerido, arquive-se com baixa.

Em suas razões (evento 26), a parte apelante suscita, preliminarmente, a necessidade de juntada pela parte apelada dos contratos originais ou cópias autenticadas, sob pena de aplicação de multa diária em caso de descumprimento da determinação judicial, bem como, subsidiariamente, do art. 400 do CPC/15. No mérito, afirma que as taxas de juros aplicadas pela instituição financeira recorrida são abusivas, pois superam o percentual de 12% ao ano. Refere que se encontra em situação de superendividamento. Aponta a necessidade de limitação dos juros remuneratórios, bem como a impossibilidade de cobrança do IOF, da cobrança da TAC e da capitalização de juros. Defende que, não configurada a mora, é descabida a cobrança de multa contratual e comissão de permanência. Por fim, requer a repetição ou compensação de valores. Pugna pelo provimento do recurso.

Apresentadas contrarrazões recursais, alegando, preliminarmente, a ausência de interesse recursal, pois não houve cobrança de comissão de permanência, correção monetária em caso de inadimplência (sem previsão contratual), TAC (não cobrada, apenas Tarifa de Confecção de Cadastro), Tarifa de Registro (não cobrada e sem previsão contratual), Tarifas Genéricas (sequer descritas), Taxa Administrativa (não cobrada e sem previsão contratual) e seguro (não cobrado e sem previsão contratual).

Após, os autos foram remetidos a esta Corte e vieram-me conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Eminentes colegas.

Conforme exposto no sumário relatório, tratam os autos de ação revisional de contrato bancário, a qual foi julgada improcedente na origem, ensejando a interposição do presente recurso pela parte autora.

Da preliminar de ausência de interesse recursal.

A apelada, preliminarmente, alega a ausência de interesse recursal, pois não houve cobrança de comissão de permanência, correção monetária em caso de inadimplência (sem previsão contratual), TAC (não cobrada, apenas Tarifa de Confecção de Cadastro), Tarifa de Registro (não cobrada e sem previsão contratual), Tarifas Genéricas (sequer descritas), Taxa Administrativa (não cobrada e sem previsão contratual) e seguro (não cobrado e sem previsão contratual).

No que tange à comissão de permanência, de fato, não está sendo cobrada nos contratos revisandos, restando prejudicada a pretensão recursal no ponto.

A TAC - taxa de abertura de crédito, está sendo cobrada sob outra denominação, de TCC - taxa de confecção de cadastro, de modo que ambas possuem o mesmo fato gerador, afastando-se a preliminar de ausência de interesse processual, no ponto.

As demais taxas e seguro não são objeto do recurso, razão pela qual resta prejudicada a análise dos tópicos.

Assim, vai acolhida em parte a preliminar contrarrecursal.

Juntada de documentos. Pena de confissão.

Inicialmente, vai afastada a alegação de necessidade de juntada dos contratos originais ou cópias autenticadas pelo banco demandado, haja vista que os documentos apresentadas em contestação (10-CONTR5;10-CONTR6) são suficientes para demonstrar os termos da relação contratual existente entre as partes.

Ademais, a cópia dos contratos juntadas por ambas as partes não se tratam de "meras tabelas e documentos unilateralmente produzidos pela demandada".

Uma vez comprovada a contratação, não negada pela autora, considerada perfeitamente válida, não há falar em aplicação de multa diária e aplicação do artigo 400 do CPC.

Dos Juros Remuneratórios.

Os juros remuneratórios consistem na remuneração à instituição financeira pelo empréstimo tomado, os quais são definidos no momento da contratação.

Com a revogação expressa do § 3º do art. 192 da Constituição Federal, pela Súmula n° 648 do Supremo Tribunal Federal, a tese de limitação dos juros remuneratórios em 12% ao ano com base na auto-aplicabilidade daquele dispositivo constitucional restou totalmente superada.

Ademais, não há falar em limitação dos juros com base na Lei de Usura, que não se estende às instituições financeiras, consoante o teor da Súmula n° 596 do STF:

"As disposições do Decreto 22.626/1933 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas, que integram o Sistema Financeiro Nacional."

O entendimento jurisprudencial do egrégio Superior Tribunal de Justiça está sedimentado no sentido de que somente é possível a revisão dos juros remuneratórios pactuados quando o índice contratado for abusivo frente à taxa média divulgada pelo BACEN.

A decisão paradigma, RESP 1.061.530/RS, de relatoria da Ministra Nancy Andrighi, julgado em 22/10/08, foi assim ementada:

DIREITO PROCESSUAL CIVIL E BANCÁRIO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULAS DE CONTRATO BANCÁRIO. INCIDENTE DE PROCESSO REPETITIVO. JUROS REMUNERATÓRIOS. CONFIGURAÇÃO DA MORA. JUROS MORATÓRIOS. INSCRIÇÃO/MANUTENÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO. DELIMITAÇÃO DO JULGAMENTO. (...) Neste julgamento, os requisitos específicos do incidente foram verificados quanto às seguintes questões: i) juros remuneratórios; ii) configuração da mora; iii) juros moratórios; iv) inscrição/manutenção em cadastro de inadimplentes e v) disposições de ofício. (...) I - JULGAMENTO DAS QUESTÕES IDÊNTICAS QUE CARACTERIZAM A MULTIPLICIDADE. ORIENTAÇÃO 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS. a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF; b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade; c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02; d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada – art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto. (...) (REsp 1.061.530/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 22/10/2008, DJe 10/03/2009).

Na esteira do entendimento do Superior Tribunal de Justiça, a jurisprudência deste Tribunal de Justiça vem reconhecendo abusividade na pactuação quando a taxa de juros remuneratórios superar em 20% a taxa média de mercado divulgada pelo BACEN, como se vê dos seguintes arestos, assim ementados:

APELAÇÃO CÍVEL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO BANCÁRIO. JUROS REMUNERATÓRIOS. JUROS REMUNERATÓRIOS. DEVIDOS CONFORME CONTRATADOS QUANDO ADEQUADOS À TAXA MÉDIA DE MERCADO APURADA PELO BACEN. QUANDO PACTUADOS EM PERCENTUAL BEM SUPERIOR OU NÃO DEMONSTRADA A TAXA CONTRATADA, DEVEM SER COM BASE NELA LIMITADOS. NO CASO EM ANÁLISE, OS JUROS REMUNERATÓRIOS EXCEDEM EM MAIS DE 20% À TAXA MÉDIA DE MERCADO PARA O TIPO DE CONTRATAÇÃO. O PERFIL DO CONTRATANTE NÃO JUSTIFICA A INCIDÊNCIA DE JUROS ABUSIVOS. SENTENÇA MANTIDA. APELAÇÃO DESPROVIDA.(Apelação Cível, Nº 50060108620198210021, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Antônio Maria Rodrigues de Freitas Iserhard, Julgado em: 11-03-2022) - Grifei;

APELAÇÃO CÍVEL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO PESSOAL. JUROS REMUNERATÓRIOS. LIMITAÇÃO COM BASE NA TAXA MÉDIA DE MERCADO PARA A ÉPOCA E ESPÉCIE DO CONTRATO EM DISCUSSÃO. ENTENDIMENTO SEDIMENTADO NO STJ. ABUSIVIDADE INEXISTENTE. ENTENDIMENTO UNÂNIME DESTA CÂMARA PARA CONSIDERAR ABUSIVAS AS TAXAS QUE EXCEDAM EM 20% A TAXA MÉDIA DE MERCADO CONFORME TABELAS PUBLICADAS PELO BACEN. (...) PRELIMINAR DE INÉPCIA DA INICIAL REJEITADA. APELAÇÃO DO RÉU PARCIALMENTE PROVIDA. APELAÇÃO DO AUTOR IMPROVIDA.(Apelação Cível, Nº 70085217214, Décima Primeira Câmara Cível,...

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